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O país asiático impôs uma sobretaxa idêntica sobre 545 produtos americanos, que
também somam um total de US$ 34 bilhões. Foram afetados pela medida alguns
dos principais produtos de exportação americanos, como soja, carne de porco, frutos
do mar e veículos elétricos.
Outra bateria de tarifas chinesas, ainda sem data para vigorar, vai atingir mais US$
16 bilhões em produtos americanos, dessa vez afetando exportações de petróleo
bruto, gás natural e alguns refinados de petróleo. As hostilidades no plano comercial
entre as duas potências afetam outros países, como o Brasil.
"O ponto negativo é que essas tensões podem desacelerar o crescimento global, o
que poderia prejudicar os mercados emergentes, tanto em termos de exportações,
quanto em relação ao crescimento do investimento estrangeiro", alerta Penelope
Prime, diretora do Centro de Pesquisa da China na Universidade do Estado da
Georgia (EUA).
Disputa anunciada
Nos últimos meses, os dois países entraram em uma crescente disputa comercial.
Os EUA passaram a aplicar medidas contra a China, além dos recursos dentro da
Organização Mundial do Comércio (OMC). Anunciaram tarifas de importação contra
produtos chineses e restrições de investimento, que o governo chinês vem
retaliando.
A Casa Branca quer reduzir em US$ 100 bilhões o déficit de sua balança comercial
com a China e anunciou em março taxas sobre o aço e o alumínio, ação que
também afetou os exportadores brasileiros. Em resposta, Pequim taxou mais de 100
mercadorias americanas, como carne de porco, frutas e nozes, tubos de aço para a
indústria do petróleo e etanol. Em seguida, os EUA divulgaram uma lista de 1,3 mil
produtos chineses alvo de tarifas de até 25%, itens que somam o equivalente a US$
50 bilhões em importações da China.
Perdas no aço
Mesmo que China e EUA cheguem a uma trégua, Chan reforça que o governo
chinês tem trabalhado muito bem com o Brasil e outras economias emergentes.
Para o economista chinês, uma mudança na cadeia de suprimentos mundial está em
curso, gerando ganhadores e perdedores. "Mesmo sem a guerra comercial, haverá
alterações nas relações entre as economias emergentes. A chamada batalha de
tarifas vai estimular esse processo e fazer com que se torne uma realidade muito
mais rápido", avalia.
Benefício?
Chan acredita que a disputa com Washington vai servir para aproximar mercados
emergentes, como a cooperação Sul-Sul. "Se você descobre que seus fornecedores
não são de confiança, no sentido que as políticas deles podem mudar da noite para
o dia, então, provavelmente, você vai procurar outros parceiros mais confiáveis",
explica.
Mas o conflito pode durar pouco. Gustavo Oliveira, geógrafo e cientista político no
Swarthmore College, na Pensilvânia (EUA), acreditam que os dois países devem
chegar a um acordo sobre essas questões tarifárias em meses. "O que está
acontecendo é um realinhamento, onde você tem menos exportação dos EUA para
a China e mais exportações do Brasil e de outros países para a China."
O especialista aponta que o lucro com o aumento da venda da soja brasileira, para
compensar a diminuição do fornecimento americano, ajuda a trazer um resultado
favorável na balança comercial e gera divisas.
Pior cenário
Segundo Maggi, o país ganha no curto prazo, mas no médio e no longo prazo, a
forte demanda da exportação pode ser um problema, já que o Brasil é um grande
produtor de animais e o setor depende da soja nacional para ração.
Há uma década, 38% da soja que entrava no mercado chinês vinha dos EUA e 34%,
do Brasil. Hoje, 57% da soja que abastece o país asiático vem de lavouras
nacionais, segundo dados da Administração Geral da Alfândega da China.
Além disso, a China importa quase dois terços da produção mundial de soja. "Brasil
e EUA exportam cada um mais de um terço e todos os outros países somados são
responsáveis por menos de um terço. Tirar os EUA ou o Brasil da equação
basicamente significa ter que pegar toda a soja do resto do mundo e toda a soja do
Brasil para atender ao mercado chinês. Todos os outros importadores, fora a China,
teriam que importar exclusivamente dos EUA. Essa é uma situação que não é
realística, por várias questões logísticas, de mercado, de contrato", sinaliza o
pesquisador.
Modelo de desenvolvimento
"Uma grande crise para o agronegócio brasileiro pode ser uma coisa boa para
milhares de famílias sem terra, para milhões de pequenos agricultores e para
diversos outros setores da sociedade brasileira que têm uma visão de
desenvolvimento distinta do agronegócio", Oliveira avalia de Pequim, em entrevista à
BBC News Brasil.
O pesquisador alerta que o atrito entre China e EUA evidencia como o Brasil está
vulnerável, sendo um grande exportador de produtos agrícolas e minérios. "Fica
muito exposto a avanços e retrocessos de negociações entre Pequim e Washington,
onde as empresas ou o Estado brasileiro nem sequer têm peso. O Brasil está refém
de um modelo neocolonial."
Sobre o fato de que a relação do Brasil com a China se resume a exportar produtos
de baixo valor e comprar produtos industrializados da China, Chan, de Hong Kong,
defende que as companhias chinesas já estão produzindo no Brasil computadores,
televisões e maquinário, como um novo desdobrando da cooperação sino-brasileira.
"Elas estão se beneficiando da Zona Franca de Manaus para produzir e vender não
só ao mercado brasileiro, mas à América do Sul", explica.