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SENTENÇA:

RELATÓRIO:
ANA LÍGIA ajuizou reclamação trabalhista em face de BANCO POWER S/A
informando, em síntese, que foi admitida pela reclamada em 05.03.2007, nas funções
de auxiliar administrativa e supervisora a partir de junho de 2008, sendo dispensada
sem justa causa em 13.10.2008; que deve ser enquadrada na categoria de bancário;
que faz jus a horas extras. Deu à causa o valor de R$ 100.000,00 e juntou procuração à
fl. 11. Juntou outros documentos às fls. 142/146. Emendou a petição inicial para constar
a jornada exercida como sendo de segunda-feira a sexta-feira de 8h30 às 20h30/21h00,
com 40 minutos de intervalo (fl. 147).
Regularmente citada, a ré compareceu à audiência una (ata fls. 164/166), na
qual restou infrutífera a tentativa conciliatória. Como consequência, apresentou sua
defesa sob a forma escrita contestando os pedidos.
Colhidos os depoimentos das partes e testemunhas.
Razões finais orais pelas partes.
Encerrada a instrução processual.
Tudo visto e examinado, passa-se a decidir.
FUNDAMENTAÇÃO
1)Enquadramento como bancário:
Pretende a autora ver reconhecida por sentença sua condição de bancário,
por entender que a reclamada, por ser uma instituição financeira, enquadra-se como
banco para os fins de determinação da jornada de trabalho.
Entendo que a autora tem razão.
Com efeito, o C. TST já definiu a questão.
Dispõe a Súmula 55 do C. TST: “As empresas de crédito, financiamento ou
investimento, também denominadas financeiras, equiparam-se aos estabelecimentos
bancários para os efeitos do art. 224 da CLT”.
Percebe-se do entendimento consolidado pelo TST que os empregados de
empresas de financiamento equiparam-se aos bancários apenas para fins de jornada de
trabalho, somente isto.
Não significa que o empregado de empresa de financiamento seja um
bancário.
O que a Súmula diz é que para fins de jornada de trabalho, ocorre a
equiparação, mas o empregado da financeira não passa a ser um empregado bancário.
Desta forma, entendo que apenas com relação à jornada de trabalho há
equiparação da autora aos empregados bancários, aplicando-se o art. 224 da CLT.
Com efeito, a reclamada se constitui em uma instituição financeira, como
denota-se de seu contrato social e por exercer atividades de concessão de
empréstimos, como relatado pelas testemunhas da própria reclamada.
E nos termos do art. 17 da lei 4595/64 “Consideram-se instituições
financeiras, para os efeitos da legislação em vigor, as pessoas jurídicas públicas ou
privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou
aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou
estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de terceiros”.
Ressalte-se que é irrelevante para a aplicação do art. 224 da CLT ao caso
das financeiras qual a função exercida pelo empregado, se típica de bancário ou não.
Assim entendo pois não há qualquer diferenciação na redação da Súmula 55
do TST; se assim fosse haveria uma discriminação inconstitucional que feriria o
princípio da isonomia; seria criado uma questão extremamente difícil de se resolver, que
seria estabelecer quais seriam as funções típicas de bancário; e porque o art. 226 da
CLT é claro no sentido de que para a aplicação da jornada especial de 6 horas não
interessa qual a função exercida, mas o simples fato de ser empregado de banco.
Assim, a autora estava submetida à jornada do art. 224 da CLT de 6 horas
diárias e 30 semanais.
2) Horas extras:
A reclamante alega que laborava de segunda à sexta-feira, das 8h30 às
20h30/21h00, com 40 minutos de intervalo, razão pela qual pretende o pagamento de
horas extraordinárias e reflexos.
A reclamada manifesta em oposição, sustentando que a jornada de trabalho
da reclamante era das 9h00 às 18h00, de segunda-feira a sexta-feira, com 1 hora de
intervalo.
A jornada de trabalho deve ser anotada por meio de cartões de ponto, nos
termo do art. 74, § 2º da CLT, para o empregador com mais de 10 empregados.
No caso a reclamada tinha mais de 10 empregados, e dessa forma tinha a
obrigação de anotar a jornada do autor nos cartões de ponto.
Tendo mais de 10 empregados, a reclamada estava legalmente obrigada a
anotar a jornada de trabalho nos cartões de ponto, e nos termos do entendimento
previsto na Súmula 338 do TST, tais cartões de ponto devem ser juntados aos autos
com a contestação, sob pena de se presumir verdadeira a jornada de trabalho alegada
na petição inicial.
A reclamada não juntou aos autos os cartões de ponto.
Assim, assumiu o ônus da prova quanto à jornada de trabalho da autora.
Desse ônus a ré não se desincumbiu.
Com efeito, a testemunha da autora confirmou que a jornada de trabalho
efetivamente cumprida na reclamada pela autora iniciava pelo menos às 8h30
terminando após às 19h30.
As duas testemunhas da ré não souberam informar a jornada de trabalho da
autora.
Sendo assim fixo que a autora cumpria jornada de 8h30 às 20h45, de
segunda-feira a sexta-feira, com 40 minutos de intervalo.
Pela jornada efetivamente cumprida pela autora, condeno a reclamada a
pagar-lhe horas extras, assim consideradas as posteriores à 6ª diária, e 30ª semanal,
não se computando no módulo semanal as horas já computadas no módulo diário,
observando-se os seguintes critérios: adicional de 50%, dias efetivamente laborados,
evolução salarial da autora, base de cálculo na forma da Súmula 264 do C. TST e
divisor 180.
Ante a habitualidade, defiro os reflexos em aviso prévio indenizado, 13º
salários, férias gozadas e indenizadas mais 1/3, FGTS com indenização de 40%, e em
repousos remunerados.
3)Intervalo intrajornada:
Pela jornada comprovada pela testemunha, e fixada como efetivamente
cumprida pela autora, esta não gozou totalmente do seu intervalo para refeição e
descanso.
A CLT, no art. 71, dispõe que o empregado deve gozar de um intervalo de no
mínimo 1 hora para uma jornada de trabalho superior à 6 horas.
Não se aplica, no caso, o intervalo de 15 minutos, pois deve-se levar em
consideração a jornada efetivamente cumprida, e não a contratual, conforme OJ nº 380
da SDI-I do TST que assim dispõe: “Ultrapassada habitualmente a jornada de seis horas
de trabalho, é devido o gozo do intervalo intrajornada mínimo de uma hora, obrigando o
empregador a remunerar o período para descanso e alimentação não usufruído como
extra, acrescido do respectivo adicional, na forma prevista no art. 71, “caput” e § 4, da
CLT”.
E segundo a OJ 307 da SDI-I do TST, “Após a edição da Lei nº 8.923/94, a
não-concessão total ou parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e
alimentação, implica o pagamento total do período correspondente, com acréscimo de,
no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da
CLT)”.
Dessa forma, a autora faz jus ao pagamento de todo o período do intervalo,
qual seja, 1 hora minutos.
Ante a ausência de concessão total do intervalo para refeição e descanso,
condeno a reclamada a pagar a autora uma hora extra por dia de trabalho, observando-
se os seguintes parâmetros: adicional de 50%, dias efetivamente laborados, evolução
salarial do autor, divisor 180 e base de cálculo na forma da Súmula 264 do TST.
Ante a habitualidade, nos termos do entendimento contido na OJ 354 da SDI-
I do TST, defiro os reflexos em aviso prévio indenizado, 13º salários, férias gozadas e
indenizadas mais 1/3, FGTS com indenização de 40%, e em repousos remunerados.
4) Justiça Gratuita – reclamante:
Em face da declaração apresentada (fl. 13), não havendo nos autos
evidências que descaracterizem a situação declarada, concedem-se ao reclamante os
benefícios da gratuidade judicial, isentando-o de despesas processuais, a teor do que
dispõe o artigo 790, § 3º, da CLT.
5) Honorários advocatícios:
De início, cabe distinguir entre honorários de sucumbência - de natureza
processual - regidos pelo art. 20 do Código de Processo Civil, e pretensão de
ressarcimento dos honorários contratuais devidos pelo Autor a seu patrono com lastro
nos artigos 389 e 404 do Código Civil.
Por se tratar de lide decorrente da relação de emprego, os honorários
advocatícios não são devidos pela mera sucumbência, mas sim pelo preenchimento dos
pressupostos previstos no artigo 14 da Lei 5584/70, os quais não se verificam na
hipótese dos autos.
Acompanho o entendimento das Súmulas 219 e 319 do TST; e OJ 305 SDI-1
do TST. Assim, ausente assistência sindical, ainda que deferida a Justiça Gratuita, não
há que se falar em honorários sucumbenciais.
Quanto à segunda hipótese – honorários decorrentes de inadimplemento de
obrigação trabalhista - este Juízo não acata a aplicação subsidiária dos artigos 389 e
404 do Código Civil.
Tal aplicação viola a regra do jus postulandi e seus desdobramentos, em
vista do princípio da igualdade de tratamento processual, obrigaria fosse também
aplicável em benefício do empregador, observada a dosimetria daquilo que se julgou
improcedente. Portanto, a aplicação subsidiária não guardaria, a bem da verdade,
consequências favoráveis ao empregado, como a princípio intencionam seus
defensores, data máxima vênia.
Por outro lado, os dispositivos civilistas são inaplicáveis na seara trabalhista,
por haver norma específica regulamentadora para a concessão da verba honorária,
restrita à hipótese de sucumbência, se preenchidos os requisitos legais (Lei 5584/70).
Desse modo, julgo improcedente o pedido.
6) Correção monetária:
Os índices de correção monetária deverão respeitar a súmula 381 do C.
TST. Já no que diz respeito aos juros, estes serão de 1% ao mês (simples), pro rata die,
apartir do ajuizamento da ação até o pagamento do crédito do reclamante, incidentes
sobre o principal corrigido (Súmula n. 200 do C. TST).
7) Deduções tributárias e previdenciárias:
Autorizam-se as deduções previdenciária e tributária por imperativo legal.
As contribuições previdenciárias (quotas do empregador e do empregado,
observando-se, neste caso, o teto legal) incidirão sobre as verbas salariais: horas extras
e reflexos em 13º salários, descansos semanais remunerados e férias gozadas e serão
incluídas na execução (art.114, VIII, CF/88; EC 45/2004).
O imposto de renda deverá ser retido no momento do efetivo pagamento do
crédito trabalhista objeto desta decisão, cabendo à fonte pagadora apresentar os
cálculos da dedução devidamente atualizada, sob pena de expedição de ofício à
Receita Federal para as providências cabíveis.
DISPOSITIVO ou CONCLUSÃO:
Pelo exposto e o que mais há dos autos da reclamação trabalhista movida
por ANA LÍGIA em face de BANCO POWER S/A decido julgar PARCIALMENTE
PROCEDENTES os pedidos para condenar a ré a pagar a autora as seguintes verbas:
- horas extras, assim consideradas as posteriores à 6ª diária, e 30ª semanal,
não se computando no módulo semanal as horas já computadas no módulo diário,
observando-se os seguintes critérios: adicional de 50%, dias efetivamente laborados,
evolução salarial da autora, base de cálculo na forma da Súmula 264 do C. TST e
divisor 180 e os reflexos em aviso prévio indenizado, 13º salários, férias gozadas e
indenizadas mais 1/3, FGTS com indenização de 40%, e em repousos remunerados;
- uma hora extra por dia de trabalho, observando-se os seguintes
parâmetros: adicional de 50%, dias efetivamente laborados, evolução salarial do autor,
divisor 180 e base de cálculo na forma da Súmula 264 do TST, e os reflexos em aviso
prévio indenizado, 13º salários, férias gozadas e indenizadas mais 1/3, FGTS com
indenização de 40%, e em repousos remunerados.
Defere-se a reclamante a gratuidade da justiça requerida.
Os juros de mora deverão incidir a partir da data do ajuizamento da ação
(artigo 883 da CLT), calculados na base de 1%, pro rata die, incidentes sobre o valor já
corrigido monetariamente (Súmula 200 do TST; artigo 39 da Lei nº 8.177/91).
Para o cálculo da correção monetária, deverá ser observado o índice do mês
subsequente ao da prestação de serviços, a partir do dia 1º, conforme o disposto na
Súmula 381 do TST.
Juros e correção monetária incidirão até a data da efetiva quitação do débito
(Sumula 15 TRT 3º Região).
Para efeitos do disposto no artigo 832, § 3º CLT, a natureza da verba
deferida observará o disposto no art. 28, § 9º da Lei 8.212/91 e art. 214, § 9º do Decreto
3.048/99, de modo que tem natureza salarial: horas extras e reflexos em 13º salários,
descansos semanais remunerados e férias gozadas.
Incide contribuição previdenciária sobre as verbas a serem pagas ao
Reclamante, de natureza salarial, calculadas observando o limite máximo do salário-
decontribuição, bem como o disposto no artigo 43 da Lei 8.212/91, podendo deduzir
do valor da condenação, as percentagens de responsabilidade tributária do Reclamante,
na forma da legislação vigente porém tal dedução está limitada ao valor principal sem
abranger juros, multa e demais encargos, pois de responsabilidade exclusiva do
Reclamado, tendo plena aplicação a regra prevista no art. 33 § 5º da Lei nº 8.
212/1991.
Imposto de Renda incide sobre o valor total da condenação, referente às
parcelas tributáveis nos termos do art. 46 da Lei 8.541/92 e, observado o artigo 39 do
Decreto 3000/1999, cabendo ao Reclamado a responsabilidade pela retenção e
recolhimento no momento em que o crédito se tornar disponível (Súmula 368 do TST).
O Reclamado deverá comprovar nos autos o recolhimento das contribuições
previdenciárias e imposto de renda, sob pena de ofício à Receita Federal, em se
tratando do Imposto de Renda, e execução de ofício das contribuições previdenciárias
(art. 114 VIII, da CR/88).
Custas processuais pela Reclamada, no importe de R$ 200,00 calculadas
sobre R$10.000,00, valor arbitrado à condenação.
Tornada líquida a conta, intime-se a União, nos termos do art. 16 § 3º da Lei
11.457/2007 que deu nova redação ao art. 879, § 3º da CLT.
Intimem-se as partes. Nada mais. ( a) Juiz Fulano de Tal
TRANSITADA EM JULGADO A SENTENÇA, PROCEDEU-SE AO LAUDO
PERICIAL QUE SEGUE:
APRESENTADO O LAUDO, AS
PARTES COM ELE CONCORDARAM,
PASSANDO NA SEQUÊNCIA O JUIZ A
PROFERIR A
DECISÃO DE ACERTAMENTO:
Homologo o laudo pericial, fixando o débito em R$ 67.062,84, sendo R$
51.064,37 de principal corrigido e R$ 15.998,47 de juros de mora sobre o
principal, além das contribuições previdenciárias a cargo do Executado, no
importe de R$ 10.612,34, tudo em valores de 01/06/12, sujeito aos acréscimos
legais até a data do efetivo pagamento.
Contribuição previdenciária a cargo da Autora, no importe de R$
4.963,14, a ser retida de seu crédito e posteriormente transferida ao credor
previdenciário, por ocasião da liberação de valores.
Fixo o imposto de renda em R$ 490,01 para a mesma data supra.
Custas a fl. 187 a cargo do Demandado.
Fixo os honorários periciais contábeis em R$ 2.000,00, atualizáveis a
partir de 28/05/12.
Concluída a fase de acertamento de constas e, portanto, apurada a
expressão monetária do título executivo judicial, notifique-se o Executado para
pagamento espontâneo no prazo de quinze dias, nos termos do que dispõe o
artigo 475-J do CPC.
Ribs, 28 de maio de 2012. (a) Juiz Fulano de Tal

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