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Os filhos dos crentes que pertencem à aliança devem ser batizados?

Outrora houve uma controvérsia ocasionada pelos anabatistas’ os quais começaram a se opor
ao batismo infantil. Por isso granjearam o apelido de anabatistas ou catabatistas, proveniente
da repetição do batismo naqueles que uma vez tinham sido batizados, seja com respeito às
crianças já batizadas ou com respeito aos adultos. Pois passam de uma seita de sua família para
outra (a quem rebatizam) para que sejam recebidos na comunhão de sua assembléia.
Entretanto, são chamados de catabatistas em decorrência de sua reprovação do batismo,
especialmente o infantil. Sob esse título geralmente se encaixam todos quantos desprezam o
batismo, tantos quantos consideram seu uso na Igreja de Cristo (que agora é) inválido ou
indiferente.

Antes de tudo observamos que a questão não diz respeito a todas as crianças, mesmo as dos
mfieis e pagaos, dmas somente as dos cristãos que estao inseridas na aliança Porque, quanto
às primeiras, reconhecemos que não podem nem devem ser batizadas, exceto após instrução
prévia e já na idade adulta (ou seja, quando podem apresentar razão de sua fé). Segundo, que
não tratamos da necessidade absoluta do batismo, tal como os romanistas afirmam e nós já
refutamos. Antes tratamos da necessidade hipotética do mandamento, de modo que a questão
é: os fílhinhos dos cristãos (sendo cristão um ou ambos os pais) devem ser batizados porque
Cristo assim ordenou e porque, pelo batismo, graciosa, contudo livremente, Deus, de modo
eficaz, costumeiramente testifica e sela a graça? Os anabatistas negam isso; nós, porém,
afirmamos, firmados nos seguintes argumentos.

Prova-se o batismo infantil: ( 1) com base no mandamento de Cristo.

Isso foi ordenado por Cristo “Ide e ensinai a todas as nações, batizando-as” (Mt 28.19,20). Isso
é evidente (a) porque aquele que ordena que todas as nações fossem batizadas também
ordena que as crianças sejam batizadas, pois um preceito que se refere a um gênero inclui
todas as espécies, (b) O desígnio de Cristo é ensinar a maneira de congregar e conservar a
igreja no mundo até que venha o fim dos tempos, e prescrevê-lo aos apóstolos e seus
sucessores. Ora, como a igreja consiste de crianças, bem como de adultos, de maneira que ela
tem referência a ambos, mas em conformidade com a condição de cada um: que os adultos
sejam instruídos antes do batismo, enquanto que as crianças sejam antes batizadas como
partícipes da aliança e cristãs e, mais tarde, sejam instruídas no devido tempo, (c) Com base
nas antíteses, pois “todas as nações” se opõe a “todos os judeus”, e somente a eles, como a
diferença entre os mandamentos do Antigo e do Novo Testamentos, onde as crianças e os
adultos, respectivamente, eram circuncidados. Portanto, por paridade, a relação do batismo
deve ser a mesma, (d) Com base no costume dos apóstolos, mediante o qual declaram o
significado do preceito e o aprovam mediante sua prática, enquanto batizavam famílias inteiras
(i.e., os pais e seus filhos, At 16.15,33; 18.8; ICo 1.16).

Tampouco se deve objetar que Cristo pôs a instrução antes do batismo e, assim, fala de adultos
que são passíveis de instrução, e não de crianças (“ensinar [mathêteusate]”, diz ele). Ainda que
Cristo tenha posto o ensino antes do batismo, isso deve referir-se ao batismo de adultos, do
qual primeiro e especialmente ele estava falando em referência ao estado da igreja primeva, a
ser constituída de adultos. Portanto, aqui devemos distinguir entre a igreja a ser constituída e a
já constituída. Na primeira, os adultos deviam ser instruídos antes que fossem batizados; na já
constituída, porém, as crianças deviam ser batizadas antes e instruídas depois. Os predicados
são tais que se permite que existam através de seus sujeitos: as criancinhas não são passíveis
de instrução, por isso ela não lhes pertence. Entretanto, o mandamento de Cristo deve ser
entendido analogicamente a respeito de crianças que procedem da natureza da aliança e do
perpétuo costume da igreja desde Abraão (Gn 17.19*). O verbo mathêteuein (usado por Cristo)
significa propriamente não tanto ensinar pela pregação quanto “fazer discípulos” . Isso é
também feito pela ministração do batismo, que é um sacramento de iniciação e a porta de
ingresso na igreja e família de Cristo. Assim, "mathêtaspoiein" (Jo 4.1) não é simplesmente
ensinar, mas fazer discípulos e receber a uma profissão de disciplina, assim como, entre os
judeus, com frequência, se faziam discípulos, não que já fossem instruídos, mas para que
pudessem ser instruídos. Por isso o pagão diz a Hillelm (?Hillel): “Faz-me um prosélito para que
me ensines”. Que isso deve ser entendido nestes termos, prova-se pelo verbo didaskein (que é
adicionado), que pareceria uma tautologia, a menos que mathêteuein se refira a algo mais
além da simples instrução e doutrina.

Com base na aliança

Os selos ds aliança pertencem também àqueles a quem pertence a aliança divina. Ora, é
evidente que a aliança pertence às crianças com base na própria cláusula da aliança: “Para ser
o teu Deus e da tua descendência” (Gn 17.7); “Pois para vós é a promessa, para vossos filhos e
para quantos ainda estão longe” (At 2.39). De fato, confesso que a aliança divina tem referência
primária e principalmente aos adultos, porque esta aliança consiste de um acordo recíproco
que deve ser voluntário de ambos os lados; e a sabedoria de Deus ensina que uma aliança deve
ser formulada com homens plenos, que possam exercer as operações das faculdades morais.
Porém isso não impede que ela seja também pertinente às crianças, (a) Com base na ordem
divina, porque Deus quis que sua graça se estendesse dos pais a seus filhos, (b) Com base na
natureza da coisa, porque os filhos são parte dos pais e da mesma condição que eles. (c) Entre
os homens os pactos envolvem os filhos das partes contratantes; portanto, da mesma forma
acontece na aliança divina, (d) Porque às crianças pertence a coisa significada (ou seja, a
remissão de pecados, a regeneração, o reino do céu); portanto, também o sinal. Pois se o que é
maior lhes é comunicado, como pode o que é menor ser-lhes negado? Por isso Pedro
argumenta: “Porventura pode alguém recusar a água, para que não sejam batizados estes que,
assim como nós, receberam o Espírito Santo?” (At 10.47).

Sem nenhum fundamento é a resposta: (1) “Então segue que a ceia do Senhor deve ser
também ministrada às crianças, porque também lhes pertence a coisa significada.”

Embora a mesma coisa esteja significada em ambos, contudo há certa diferença na maneira de
significar. Na ceia, a graça de Cristo é selada na forma de alimento sólido, o qual as crianças
não são capazes de receber; no batismo, porém, ela é significada na forma da lavagem de
regeneração, a qual lhes pertence (Jo 3.5). Além disso, a ceia requer uma dupla condição: uma
precedente, no exame; uma concomitante, na comemoração da morte de Cristo, ambas
pressupondo o uso da razão. Nenhuma delas é requerida no batismo e, assim, antigamente, a
Páscoa era distinguida da circuncisão- que esta era ministrada às crianças, e aquela, somente
aos adultos.
“Acrescenta-se que as crianças não são capazes da graça da regeneração, nem das demais
bênçãos da aliança que comumente eram conferidas pelo Espirito mediante a Palavra.” No
entanto, pressupõe-se gratuitamente que elas não são capazes da bênção da aliança. Pois
quem nega que sejam capazes da remissão de pecados e da redenção de Cristo, e de outros
benefícios que dependem da aliança, na qual as crianças são recebidas? Quem porventura
tenha dúvida de que o batismo (com respeito a estas) é apto a ser um sinal distintivo
(introduzindo na igreja visível) e um selo tanto da verdade divina nas promessas federais
quanto de nossa obrigação a deveres mútuos? Pois se não são capazes da obrigação no
presente, podem ser no futuro. No entanto, quanto à regeneração, por que as crianças não
seriam passíveis de regeneração como são de pecado (a menos que digamos que a culpa tem
mais poder que a graça)? E como são racionais (embora não exibam um ato da razão) o que as
impede de serem chamadas santas e crentes pelo Espírito Santo que lhes é outorgado, ainda
que não possam ainda exercer um ato de fé?

Com base na circunsisao

Por paridade, a necessidade do batismo é a mesma da circuncisão. Ora, a circuncisão devia ser
ministrada às crianças segundo o mandamento divino. Portanto, da mesma forma, o batismo
infantil. Prova-se a veracidade do maior (a) porque o batismo é posto no lugar da circuncisão e
a substitui no Novo Testamento (com base em Cl 2.12, onde Paulo exibe a circuncisão no
batismo), (b) Com base no fim de cada um - a circuncisão era o sacramento de iniciação, para
que fossem recebidos na aliança, e a finalidade do batismo é a mesma, (c) Com base na coisa
significada individualmente, que é a circuncisão do coração e a graça da regeneração. (d) A
graça de Deus não é diminuída e restringida no Novo Testamento, ao contrário, ela é ampliada.
Se, pois, a idade infantil é obstáculo no batismo em virtude do defeito da razão, havia o mesmo
impedimento na circuncisão. Pois se as bênçãos divinas então não foram oferecidas
inutilmente por meio da circuncisão, por que seriam inúteis no batismo? Não se deve dizer que
“a circuncisão das crianças foi expressamente ordenada, porém não do batismo infantil” . Uma
coisa é estar expressamente contido, outra, estar contido implicitamente numa ordem geral
(como já afirmamos). Ou que “o argumento não procede corretamente, porque há várias
diferenças entre circuncisão e batismo”. A analogia de ambos os sacramentos deve ser levada
em conta não absolutamente, mas na principal condição relacionada com a confirmação da
aliança da graça e declarada no Novo Testamento (ou seja, que ambos os sacramentos são um
sinal da aliança, um símbolo de iniciação e um emblema de profissão, pelos quais antigamente
os judeus eram distinguidos dos gentios, e agora os cristãos distinguidos dos incrédulos).

CONTINUA (autor- Turrent)

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