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Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Centro de Tecnologia e Ciências


Instituto de Geografia

Carlos Eduardo Braga de Mesquita

A dinâmica dos espaços de cultura e lazer em Botafogo

Rio de Janeiro
2010
Carlos Eduardo Braga de Mesquita

A dinâmica dos espaços de cultura e lazer em Botafogo

Dissertação apresentada, como requisito parcial


para a obtenção do título de Mestre, ao Programa
de Pós-Graduação em Geografia do Instituto de
Geografia da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro. Área de concentração: Gestão e
Estruturação do Espaço Geográfico.

Orientadora: Profª. Dra. Susana Mara Miranda Pacheco

Rio de Janeiro
2010
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ / REDE SIRIUS / BIBLIOTECA CTC/C

M582 Mesquita, Carlos Eduardo Braga de.


A dinâmica dos espaços de cultura e lazer em
Botafogo. / Carlos Eduardo Braga de Mesquita. – 2010.
115 f. il.

Orientador: Susana Mara Miranda Pacheco


Dissertação (Mestrado) – Universidade do Estado do
Rio de Janeiro, Instituto de Geografia.
Bibliografia

1. Espaço urbano – Teses. 2. Lazer – Botafogo (Rio


de Janeiro, RJ) - Teses. 3. Botafogo (Rio de Janeiro, RJ)
– Vida intelectual – Teses. $. 4. Consumo - Teses. I.
Pacheco, Susana Mara Miranda. II. Universidade do
Estado do Rio de Janeiro. Instituto de Geografia. III.
Título.

CDU 711.4(815.3)

Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta
tese.
________________________________________________ ____________________________________

Assinatura Data
Carlos Eduardo Braga de Mesquita

A Dinâmica dos espaços de cultura e lazer em Botafogo

Dissertação apresentada, como requisito parcial


para a obtenção do título de Mestre, ao Programa
de Pós-Graduação em Geografia do Instituto de
Geografia da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro. Área de concentração: Gestão e
Estruturação do Espaço Geográfico.

Aprovado em 14 de dezembro de 2010


Banca Examinadora:

_____________________________________________________
Profª. Dra. Susana Mara Miranda Pacheco (Orientadora)
Instituto de Geografia da UERJ

______________________________________________________
Prof. Dr. João Baptista Ferreira de Mello
Instituto de Geografia da UERJ

_____________________________________________________
Prof. Dr. Miguel Angelo Campos Ribeiro
Instituto de Geografia da UERJ

_____________________________________________________
Prof. Dr. Marcelo Pereira Matos
Tecgraf/PUC-Rio

Rio de Janeiro
2010
DEDICATÓRIA

Ao meu querido avô que, de onde quer que


esteja, sei que está a iluminar meus
caminhos.
AGRADECIMENTOS

Primeiramente, agradeço aos meus pais, pela educação e suporte em todas as


horas.
A minha grande companheira, Fernanda, que sempre me apoiou me dando
forças e estímulo, sobretudo nas horas em que eu mais fraquejei.
À Professora Susana, a grande responsável pela minha iniciação na vida
acadêmica e pelo gosto pelos estudos do urbano, por mais uma orientação.
Aos professores desta universidade pelos conhecimentos transmitidos e, em
especial, a todos os componentes da banca avaliadora.
Aos funcionários do PPGEO pela atenção demonstrada em todos os
momentos.
Ao grande amigo Aramis, companheiro de trajetória, que compartilhou
momentos de alegria e dificuldade durante estes anos de curso. Feliz daquele que tem
um bom amigo.
Aos meus primos Luis Angel, Ricardo e Silvia, por terem contribuído de alguma
forma na elaboração desta dissertação.
Por fim, a todos meus amigos, familiares, companheiros de trabalho por
sempre me estimularem a seguir adiante.
Meu muito obrigado a todos.
RESUMO

MESQUITA, Carlos Eduardo Braga de. A dinâmica dos espaços de cultura e lazer em
Botafogo. 2010. 115 f. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Universidade do Estado
do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010.

O processo de terciarização da economia, o qual se faz presente claramente


desde os primórdios da cidade do Rio de Janeiro, promoveu profundas transformações
na organização interna da cidade, o que implica em novos usos do espaço urbano e
gera novos processos na cidade, sobretudo em nossa área de estudo, o bairro de
Botafogo. O processo de globalização provoca mudanças significativas na economia
mundial. A cidade, portanto se insere nos espaços de globalização e, assim, sofre
mudanças que vão se refletir em sua estrutura urbana. Desta forma, o setor de serviços
é dinamizado, reforçando, então, o processo de terciarização. Neste caso, se torna
evidente a relação entre urbanização as atividades terciárias. Percebe-se, assim, o
surgimento de um novo modelo de urbanização, atrelado à presença destas atividades
terciárias, as quais serão de suma importância para a constituição de novas
centralidades no espaço interno da cidade, como é o caso de Botafogo. Neste
contexto, os espaços de cultura e lazer têm fundamental importância, visto que atraem
fluxos de consumidores, os quais se aproveitam da infraestrutura proporcionada pelo
Estado, sobretudo de transportes, através do metrô e das inúmeras linhas de ônibus
que servem o bairro. Os espaços de cultura e lazer possuem uma grande importância
no contexto de renovação de Botafogo, uma vez que o bairro apresenta uma grande
concentração de equipamentos desta natureza, os quais contribuem para uma maior
circulação de pessoas em seu espaço interno. Observam-se duas áreas de
concentração destes espaços em Botafogo, as quais se localizam nas extremidades e
adjacências do principal eixo viário do bairro, onde podemos encontrar também onde
se concentram serviços especializados. Então, podemos dizer que, na esfera do
consumo, estes espaços de cultura e lazer surgem como resultado de ações públicas e
privadas. Os espaços de cultura e lazer promovem uma nova dinâmica a Botafogo e
gera impactos na economia urbana do Rio de Janeiro. São responsáveis pelo
surgimento de uma nova centralidade no âmbito da cidade e contribuem, portanto, para
o processo de reestruturação urbana da cidade do Rio de Janeiro.

Palavras-chave: Espaços de cultura e lazer. Botafogo. Nova centralidade.


Reestruturação. Consumo.
ABSTRACT

The process of outsourcing of the economy, which clearly is present since the
beginnings of the city of Rio de Janeiro, fostered profound changes in the internal
organization of the city, which involves new uses of urban space and creates new
processes in the city, especially in our study area, the neighborhood of Botafogo. The
globalization process caused significant changes in the global economy. The city
therefore fall within the spaces of globalization and thus undergoes changes that will be
reflected in its urban structure. Thus, the service sector is driven by strengthening, then
the process of outsourcing. In this case, it becomes apparent the relationship between
urbanization tertiary activities. It is understood, therefore, the emergence of a new
model of urbanization, coupled with the presence of these tertiary activities, which will
be of paramount importance for the establishment of new centers in the inner space of
the city, as is the case with Botafogo. In this context, the spaces of culture and leisure
are of fundamental importance, since they attract flows of consumers who take
advantage of the infrastructure provided by the State, especially in transport, through
the subway and numerous bus lines that serve the neighborhood. The spaces for
culture and leisure have a great importance in the renewal of Botafogo, once the district
has a large concentration of such equipment, which contribute to an increased
movement of people in your inner space. Shows two areas of concentration of these
spaces in Botafogo, which are located at the ends and adjacent to the main road axis of
the neighborhood, where we also find a large concentration of specialized services. So
we can say that the sphere of consumption, these spaces of culture and leisure arise as
a result of public and private actions. Spaces for culture and leisure promote a new
dynamic to Botafogo and generate impacts in the urban economy of Rio de Janeiro. Are
responsible for the emergence of a new center within the city and thus contribute to the
restructuring of the town of Rio de Janeiro.

Keywords: Spaces of culture and leisure. Botafogo. New centrality. Restructuring.


Consumption.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Mapa 1 - Localização da área de estudo..................................... 11


Figura 1 - Etapa carioca da Red Bull Air Race, realizada na
Enseada de Botafogo, 2007........................................
65
Gráfico 1 - Equipamentos culturais, segundo as Áreas de
Planejamento – Rio de Janeiro, 2004...........................
83
Gráfico 2 - Cinemas por número de salas, segundo os bairros do
Rio de Janeiro (2007)...................................................
84
Tabela 1 - IDH, segundo RA´s – Rio de Janeiro, 2000.................. 85
Tabela 2 - Passageiros transportados no metrô (nº em 1000)
segundo as estações – 1995-2009.............................
87
Figura 2 - Unibanco Arteplex...................................................... 91
Figura 3 - Estação Botafogo....................................................... 92
Figura 4 - Cine Estação............................................................... 93
Figura 5 - Restaurante sofisticado na rua Visconde de
Caravelas..................................................................
96
Figura 6 - Bar Joaquina, localizado na Cobal................................. 97
Mapa 2 - Serviços em Botafogo, 2008........................................ 100
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AP Área de Planejamento
AT&T American Telephone and Telegraph
EUA Estados Unidos da América
GETER Grupo de Estudos Terciários do Rio de Janeiro
HP Hewlett-Packard
IBM International Business Machines
IDH Índice de Desenvolvimento Humano
IPP Instituto Pereira Passos
ISS Imposto Sobre Serviços
PEA População Economicamente Ativa
PECRJ Plano Estratégico da Cidade do Rio de Janeiro
PIB Produto Interno Bruto
RA Região Administrativa
YPF Yacimientos Petrolíferos Fiscales
SUMÁRIO

CONSIDERAÇÕES INICIAIS.............................................................. 10
1 EVOLUÇÃO URBANA E TRANSFORMAÇÕES DO SETOR
TERCIÁRIO EM BOTAFOGO............................................................
16
1.1 Breve histórico de Botafogo............................................................ 17
1.2 O processo de transformação da função e composição social.... 23

1.3 A acessibilidade: os transportes coletivos e a importância do


metrô.................................................................................................. 29
1.4 O setor terciário e sua participação na estruturação de
Botafogo............................................................................................ 32
1.4.1 Os serviços: crescimento e transformações na economia.................. 33
1.4.2 As mudanças no setor de serviços em Botafogo................................ 41
2 A AÇÃO DOS AGENTES PÚBLICO E PRIVADO NA
REVITALIZAÇÃO DE ÁREAS............................................................
48
2.1 A ação do poder público na renovação de áreas: O Estado
empreendedor................................................................................... 49
2.2 O agente empreendedor privado, as parcerias público-privadas
e o Planejamento Estratégico.......................................................... 59
3 OS ESPAÇOS DE CULTURA E LAZER EM BOTAFOGO................ 69
3.1 Os espaços de cultura e lazer no contexto da globalização......... 69
3.2 Considerações sobre espaço, cultura e lazer................................ 74
3.3 Os espaços de cultura e lazer em Botafogo................................... 82
3.3.1 A dimensão espacial dos espaços de cultura e lazer em Botafogo.... 89
3.4 Os espaços de cultura e lazer e suas relações com a cidade...... 101
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................ 105
REFERÊNCIAS................................................................................... 108
10

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O bairro de Botafogo passou por uma série de transformações no


transcorrer de sua evolução urbana. Em meados do século XX, afirmou-se
como uma centralidade importante da cidade do Rio de Janeiro, quando
passou a receber uma série de serviços, dentre eles, escolas, clínicas
médicas, cinemas, bares e restaurantes. Atualmente, vem adquirindo outras
características ao receber uma variedade de serviços especializados, o que
lhe confere o caráter de nova centralidade (MESQUITA, 2007), no contexto da
cidade.

Estas transformações pelas quais passou nossa área de estudo ao


longo do tempo se processaram ao mesmo passo em que a cidade se
transformava. O processo de descentralização engendrou profundas
transformações na organização interna da cidade, assim como os processos
de globalização e terciarização da economia, que favoreceram a concentração
das mais diversas atividades terciárias no Rio de Janeiro.

As transformações na economia mundial são notórias, nos dias atuais,


em que o processo de globalização econômica se faz presente e assume
importância fundamental, neste contexto. A cidade se insere, então, nos
espaços da globalização e, com isso, sofre transformações, as quais se
refletem na estrutura urbana. Desta forma, seus impactos reforçam o processo
de terciarização, através do crescimento e dinamização do setor de serviços, e,
em uma cidade como o Rio de Janeiro, que teve seu processo de urbanização
intimamente ligado às atividades terciárias, estes se tornam mais evidentes
(PACHECO, 2006).

O processo de terciarização, que marca nitidamente a cidade do Rio de


Janeiro desde sua fundação, se manifesta em transformações no uso do
espaço urbano, gerando novos processos, padrões, morfologias e conteúdos
no interior da metrópole, em especial, em Botafogo (PACHECO, 2006).

Assim, neste sentido, surge um novo modelo de urbanização vinculado à


presença destas atividades, que se impõe na organização interna da cidade,
(re)qualificando espaços, à medida que passam a engendrar novas
11

centralidades em seu espaço interno, como é o caso de Botafogo, nosso


recorte espacial, representado no mapa abaixo.

Mapa 1 - Localização da área de estudo.


Fonte: INSTITUTO MUNICIPAL DE URBANISMO PEREIRA PASSOS, 2007

As atividades terciárias tiveram importância vital na dinâmica da


descentralização, não só por conta da presença de estabelecimentos voltados
ao lazer, da logística das empresas varejistas como também da administração
pública e das profissões liberais, somando-se a tudo isso a mobilidade
residencial e as vias de circulação que possibilitaram a articulação entre os
lugares da cidade em expansão.

Destarte, Botafogo desenvolve especializações que outros bairros da


cidade não possuem e hoje recebe trabalhadores, visitantes e consumidores de
várias partes da cidade, exercendo então, uma centralidade neste âmbito.

Ainda neste contexto, estabelecemos que Botafogo é um lugar


(CARLOS, 1996) que contém uma multiplicidade de relações e, com o
12

processo de globalização, este ganhou conteúdo diverso. O lugar, então, passa


a concentrar as condições de reprodução da força de trabalho, de vida cultural,
administração etc.

Os espaços de cultura e lazer têm um papel primordial no processo de


renovação do bairro de Botafogo, uma vez que atraem fluxos de pessoas de
diversas áreas da cidade, muitas vezes se beneficiando da acessibilidade
proporcionada pelo metrô e pelas inúmeras linhas de transporte coletivo que
cortam o bairro.

Verifica-se também que, com a globalização, o lugar se refuncionaliza.


No caso de Botafogo, multiplica suas funções, se renova e redefine sua
inserção no contexto da metrópole.

Este trabalho busca discutir algumas das novas formas de organização


do espaço urbano, pretendendo analisar as relações que existem entre as
atividades terciárias e a estrutura socioespacial.

Neste contexto, pretendemos analisar o processo de urbanização


articulado ao de terciarização na sua dimensão espacial. Desta forma,
poderemos perceber a definição de novos padrões espaciais na cidade, assim
como novos modos de vida, inerentes às transformações pelas quais a cidade
passa ultimamente.

Então, buscar-se-á tornar evidente a relação entre terciarização e um


novo modelo de urbanização, com a formação de novas centralidades, como é
o caso de Botafogo.

O trabalho necessitou, para seu desenvolvimento, responder a alguns


questionamentos, os quais serão apresentados a seguir.

 Qual o papel dos espaços de lazer e cultura no contexto da


reestruturação do bairro de Botafogo?

 Como podemos caracterizar estes espaços?

 Quais são os fluxos provocados pela presença destes espaços?


13

 Quais são as transformações decorrentes da presença destes


espaços que podemos verificar em Botafogo?

A justificativa para a escolha desta temática recai sobre o fato de que,


aliado a outras temáticas afins, sua análise pode contribuir para definirmos
algumas faces do atual processo de urbanização da cidade do Rio de Janeiro,
em especial, as transformações pelas quais vem passando o bairro de
Botafogo, em processo de reestruturação de seu espaço.

Nos últimos anos, o Brasil se tornou uma economia na qual o setor


terciário assumiu uma importância fundamental no que tange à concentração
de trabalhadores, abrangendo aproximadamente 2/3 da PEA. Mais da metade
do PIB também se concentra no setor terciário da economia, o que evidencia a
evolução do setor.

Neste sentido, apesar desta importância que verificamos, os estudos


sobre este setor são escassos, sobretudo na esfera da ciência geográfica.
Necessitamos, portanto, mais estudos que se proponham a compreender a
relação entre os processos de terciarização e urbanização. Sabemos que esta
relação interfere diretamente em nossa vida cotidiana, em especial em uma
cidade como a do Rio de Janeiro que apresenta uma relação íntima com as
atividades terciárias. Logo, faz-se mister empreender estudos nesta direção,
objetivando uma melhor compreensão da dimensão espacial do processo de
terciarização. E para isto, elegemos o bairro de Botafogo, cujo espaço é
bastante influenciado pela dinâmica espacial dos serviços. Deve-se enfatizar,
neste sentido, a importância de Botafogo no contexto da cidade do Rio de
Janeiro no que tange às funções de serviços atreladas à cultura e ao lazer.

As transformações nas grandes metrópoles do Brasil são notórias e


ocorrem com grande velocidade. Nos últimos decênios, novas atividades
surgiram e relações foram atualizadas, como as de trabalho, por exemplo, o
que nos mostra a relevância do estudo do setor terciário, responsável por
mudanças nos fluxos no interior da cidade, fator preponderante no processo de
reestruturação urbana.
14

Desta forma, é possível estabelecer que o processo de globalização da


economia contribuiu para revelar-nos a importância do setor terciário na
configuração da estrutura urbana do Rio de Janeiro, principalmente a partir do
final do século XX, quando as ações globalizadoras e a transformação da
sociedade se tornaram mais aparentes.

Então, há a necessidade de buscarmos uma explicação para o


entendimento do processo de urbanização recente, no qual as atividades
terciárias têm papel fundamental, principalmente nos últimos anos.

No caso de Botafogo, a opção por analisar a importância dos


espaços de lazer e cultura no contexto da renovação do bairro decorre da
grande concentração de equipamentos desta natureza no interior do bairro.
São bares, restaurantes, cinemas, livrarias que, atraem usuários não só de
Botafogo, mas também de diferentes áreas da cidade, renovando espaços e
aumentando a circulação de pessoas.

Neste momento, cabe, portanto, indicar as fontes utilizadas para a


fundamentação deste trabalho. Foram utilizadas fontes bibliográficas diversas,
tanto em relação ao tema abordado no trabalho quanto ao nosso recorte
espacial. Desta forma, utilizamos textos de diferentes autores que tratam dos
assuntos em questão.
No que diz respeito à metodologia, esta apresenta-se pautada na leitura
da bibliografia especializada pertinente à temática desenvolvida e ao recorte
espacial. A revisão bibliográfica desempenha um papel fundamental para o
desenvolvimento deste trabalho, uma vez que permite discutir autores que
propiciaram um embasamento teórico–conceitual ao estudo. Neste contexto,
vários são os autores que tratam das temáticas abordadas no trabalho. No
entanto, selecionaremos os estudos que contribuíram de forma mais marcante
em nosso estudo.

Em relação ao recorte espacial, tivemos a contribuição de Lordello


(1981) e Cardoso et al. (1983), Escolano e Moreno (1992), Junquera (1993) e
Bell (1977) tratando sobre o setor de serviços, Compans (2005) e Harvey
(2005) sobre a ação do Estado empreendedor, Colombiano (2007) a respeito
das políticas culturais, Vainer (2009) no que tange ao planejamento estratégico,
15

Santos (2006; 2008a) e Corrêa (1995) em relação ao conceito de espaço,


Chauí (2000) e Santos (2010) sobre cultura, Melo (2008) e Camargo (2006) em
relação ao lazer e, finalmente Pacheco (2000) e Cachinho e Salgueiro (2009)
referentes ao consumo e Capel (2005) se referindo às novas centralidades.

O trabalho também se utilizou de outras fontes, tais como os dados


disponibilizados pelo IPP, o Plano Estratégico da Cidade do Rio de Janeiro (“As
Cidades da Cidade”), além de dados obtidos a partir de Mesquita (2007).

Também foi realizado um trabalho de campo, a partir do qual foi possível


identificar as áreas de maior concentração dos espaços de cultura e lazer em
Botafogo, a saber: a primeira área encontra-se em um trecho que compreende
o início da rua Voluntários da Pátria, além dos trechos iniciais das ruas São
Clemente, Professor Álvaro Rodrigues e Praia de Botafogo, onde chama a
atenção a presença de cinemas e bares. A segunda se localiza no trecho final
da rua Voluntários da Pátria e compreende as ruas Marques, Capitão Salomão
e um trecho da rua Visconde de Caravelas. Nesta área, merece destaque a
grande presença de bares e restaurantes.
Nesta introdução, cumpre ressaltar que, para sistematizar o
estudo, esta dissertação encontra-se organizada em três capítulos.
O primeiro capítulo trata das transformações pelas quais passou
Botafogo ao longo de sua evolução urbana e a atual organização de seu setor
terciário, que proporcionou o surgimento dos espaços de cultura e lazer no
bairro.
O segundo capítulo analisa a atuação dos setores público e
privado, através de suas políticas específicas na requalificação de áreas, e
suas respectivas ações empreendedoras, através das iniciativas público-
privadas e da adoção do planejamento estratégico como instrumento de
gestão.
Por fim, o terceiro capítulo tem como objetivo identificar os
espaços de cultura e lazer em Botafogo, relacioná-los com a cidade e assim,
evidenciar seu significado para a cidade e sua economia urbana.
16

1 EVOLUÇÃO URBANA E TRANSFORMAÇÕES DO SETOR TERCIÁRIO EM


BOTAFOGO

O elemento histórico representa um fator importante para melhor


entendermos o presente de um determinada área, sua evolução urbana, sua
dinâmica e os processos que nela ocorrem atualmente. Desta forma,
pretendemos fazer, neste primeiro capítulo, um levantamento histórico de
nosso recorte espacial, o bairro de Botafogo, através de sua evolução urbana,
para chegarmos à sua configuração atual, com forte presença do setor
terciário. Neste sentido, buscaremos caracterizar este setor, considerando seu
crescimento, consolidação e as mudanças que provocou na economia mundial
e, sobretudo, na cidade do Rio de Janeiro, em especial, em Botafogo.

Assim, este capítulo será dividido em duas partes principais. Na primeira,


trataremos dos antecedentes da formação e consolidação do bairro de
Botafogo, desde quando ainda era um distante arrabalde pertencente à isolada
freguesia rural de São João Batista da Lagoa, passando pela divisão das
fazendas do Vigário e da Olaria e o começo efetivo da sua ocupação, até as
últimas décadas do século XX, quando a chegada do metrô ao bairro
configurou-se como um marco importante para a estruturação de Botafogo.

A segunda parte abordará o setor de serviços em Botafogo. Caracterizar o


terciário em Botafogo através da mudança nas firmas se faz importante, na
medida em que esta mudança foi um fator primordial para o consequente
surgimento dos espaços de cultura e lazer no bairro. Nesta parte do capítulo,
também abordaremos a questão dos serviços de um modo geral, com as
repercussões de seu crescimento e as consequentes mudanças que provocou
na economia mundial, da cidade e do bairro, especificamente.
17

1.1 Breve histórico de Botafogo

No século XVII, a cidade começa a desenvolver uma área rural, no espaço


compreendido atualmente pela zona sul da cidade, aumentando assim, sua
área ocupada. Com isso, começam a surgir caminhos para esta nova área,
dando início ao processo de ocupação de Botafogo. Apesar desta incipiente
ocupação, esta área era utilizada principalmente como passagem obrigatória
para os fortes do litoral sul ou para a Freguesia de Sacopenapã (atual Lagoa
Rodrigo de Freitas), onde havia o Engenho Real da Lagoa (LESSA, 2001). Tal
fato nos indica o primeiro elemento que delega a Botafogo a fama de “bairro de
passagem” que possui atualmente.

Porém, o início da história de Botafogo remonta ao século XVI, época em


que já havia um Engenho Real e período em que Botafogo recebe seus
primeiros moradores, dentre eles o responsável pela toponímia do bairro, João
de Sousa Pereira Botafogo, que ganhou as terras que iam dos Morros da Viúva
ao da Babilônia; da Enseada à Lagoa de Sacopenapã por ter colaborado numa
batalha contra os franceses e os índios Tamoios. Este pedaço de terra teria
sido cedido por Antônio Francisco, o Velho, ou Francisco Velho, que dava
nome à atual Enseada de Botafogo, antes denominada Enseada de Francisco
Velho. Este, por sua vez, quando da distribuição das sesmarias por Estácio de
Sá havia recebido as terras onde hoje se localiza o bairro de Botafogo.

A cidade, no século XVII, era apenas um núcleo comercial e um porto que


atendia as necessidades da economia açucareira, principal atividade
econômica desenvolvida na colônia. Botafogo caracterizava-se como uma
cercania rural e passagem para os engenhos da Lagoa, mantendo uma
importância secundária em relação a outras áreas rurais mais populosas e
economicamente mais importantes do Rio de Janeiro (LORDELLO, 1981).

Botafogo, até as primeiras décadas do século XIX, era apenas um distante


arrabalde, pertencente à Freguesia da Lagoa, considerada ainda uma zona
rural, não incorporada, portanto, à malha urbana do Rio de Janeiro e com um
papel inexpressivo no contexto da cidade (CARDOSO et al, 1983). Nesta
época, localizava-se ali a Fazenda do Vigário Geral. Pertencente ao Padre Dr.
18

Clemente Martins de Matos, fora desmembrada desde o século anterior, dando


origem a outras fazendas, dentre elas a do Outeiro e da Olaria.

Nesta época, havia já um número crescente de chácaras e casas de


campo de propriedade de pessoas das camadas mais abastadas da sociedade
carioca, de estrangeiros e de ordens religiosas, como os beneditinos, por
exemplo, que possuíam um grande poder de mobilidade e, assim, podiam
habitar terrenos localizados mais afastados do já antigo e congestionado centro
urbano (ABREU, 1997). Abria-se então, mais uma opção de lazer para as
populações mais ricas da cidade, que utilizavam estas chácaras, situadas
basicamente na praia de Botafogo, Rua de São Clemente e na rua de São
Joaquim da Lagoa (atual Voluntários da Pátria), principalmente nos fins de
semana.

Uma das mais antigas e conhecidas dessas casas de campo foi a


localizada na esquina do Caminho Novo de Botafogo (atual Marquês de
Abrantes) com a Praia de Botafogo, que ficou conhecida como Palácio de
Botafogo ou Chácara de Botafogo, por abrigar um membro da recém chegada
família real portuguesa, D. Carlota Joaquina. Sua presença neste local nos
permite identificar o que representa o primeiro traço da centralidade de
Botafogo, pois se tornou o lugar de moradia desta rainha, atraindo além de
membros das classes dirigentes, a atenção de toda a cidade e, principalmente
do poder público, que realizava obras de infraestrutura nos seus arredores,
como abertura e conservação de diferentes tipos de vias públicas (GERSON,
2000).

Assim, já nos primórdios do século, se destaca em Botafogo a


presença do Marquês de Vila Nova, do Visconde do Monte Alegre e
do Visconde do Cachoeira, além dos ricos comerciantes ingleses,
vindos para a cidade devido à intensificação das relações comerciais
com a Inglaterra, e de alguns representantes diplomáticos junto à
Corte de D. João VI (CARDOSO et al, 1983, p.41).

Podemos caracterizar, através deste fato, Botafogo como lugar central


balizados na afirmação de Mello (2002, p. 113) que considera os lugares
centrais como aqueles que “atraem usuários e irradiam idéias e significados”.
19

Assim, pudemos verificar a multiplicação de mansões suntuosas em


Botafogo, visto que famílias ricas da sociedade carioca, a nobreza e
comerciantes mais bem sucedidos passaram a procurar este novo vetor de
expansão da malha urbana da cidade como local de moradia permanente,
conferindo a Botafogo um ar aristocrático.

Neste momento, podemos observar a expansão da área urbana de


Botafogo, visto que a Fazenda da Olaria, fruto da já desmembrada fazenda do
Vigário Geral, foi subdividida e loteada. Nestes novos lotes foram abertas ruas,
dentre elas as que viriam se tornar as mais importantes do futuro bairro, a rua
Real Grandeza e a rua de São Joaquim da Lagoa, citada anteriormente como
uma das que mais concentravam chácaras e casas de campo (GERSON,
2000).

Então, é possível afirmar que a incorporação de Botafogo como um


arrabalde periférico aprazível ao espaço urbano do Rio de Janeiro se deve
basicamente à proliferação destas chácaras das classes mais altas da
sociedade. Botafogo se torna uma área residencial das elites cariocas devido à
sua proximidade com o centro e em virtude das amenidades encontradas nesta
área. Por não ter se caracterizado como uma área de expansão econômica
importante da cidade, Botafogo pôde ser incorporado facilmente ao tecido
urbano da cidade na primeira metade do século XIX, período de grande
expansão da malha urbana carioca (LORDELLO, 1981). É também um período
de grande crescimento populacional e adensamento residencial. Cardoso et al
(1983, p.42) considera que “o período que vai até meados do século XIX pode
ser considerado como a primeira etapa da integração de Botafogo à malha
urbana do Rio de Janeiro”.

No bojo desta crescente urbanização, faz-se mister citar a construção,


em 1831, da Igreja de São João Batista da Lagoa, erguida pela terceira vez a
pedido da população dos arredores, desde o Catete até a Gávea. Este templo
foi erigido na rua de São Joaquim da Lagoa, uma das principais de Botafogo,
por onde as procissões poderiam passar, obedecendo recomendações
anteriores da Igreja (FRIDMAN, 1999). Assim, podemos estabelecer que esta
igreja foi erguida numa rua que já apresentava certo grau de centralidade, no
20

âmbito local, visto que já concentrava um grande número de propriedades. A


presença da nova matriz desta paróquia, criada em 1809, fez com que outras
ruas fossem abertas no seu entorno, como a rua da Matriz, por exemplo,
contribuindo para que a urbanização de Botafogo se desenvolvesse mais
rapidamente (GERSON, 2000). Isto nos indica que, do ponto de vista urbano, a
presença desta igreja teve papel fundamental, à medida que possibilitou a
indução de um dos vetores de expansão da malha urbana da cidade. Tal fato
evidencia o papel central desta igreja no âmbito de Botafogo e de seus
arredores e contribui para reafirmar Botafogo como lugar central, sob um outro
aspecto, o religioso (MESQUITA, 2007).

Botafogo já vinha sendo ocupado de maneira permanente por pessoas


das classes mais altas da população carioca. Apesar de estar localizado na
zona de expansão do tecido urbano carioca, continuava a servir,
primordialmente, como passagem para as zonas rurais mais distantes.
Levando-se em conta tais afirmações, houve então a necessidade de facilitar o
acesso a Botafogo e, consequentemente, o deslocamento dessas pessoas da
área em pauta até o centro urbano, onde desempenhavam suas atividades
profissionais. Sendo assim, pode-se dizer que os meios de transporte foram
impulsionados com o intuito de facilitar a acessibilidade às propriedades da
aristocracia carioca. Por outro lado, tiveram um papel indutor importante no
que se refere à supracitada expansão (MESQUITA, 2007).

Os meios de transporte foram um dos elementos que mais influenciaram


e viabilizaram a expansão do Rio de Janeiro, no século XIX, possibilitando a
ocupação de novas áreas, como Botafogo e dinamizando a ligação entre os
mais diversos pontos da cidade. É neste contexto que, em meados do século
XIX, começam a circular os omnibus, os quais contribuíram, sobremaneira,
para o processo de mudança das residências das camadas mais altas da
sociedade do centro para os arrabaldes em expansão, dentre eles Botafogo.
Este meio de transporte também contribuiu para a expansão do comércio para
estes arrabaldes. Poucos anos depois da inauguração da primeira linha para
Botafogo, nosso recorte espacial já era servido pelo maior número de viagens
diárias dentre as mais novas áreas incorporadas ao tecido urbano do Rio de
Janeiro, o que demonstra que Botafogo já apresentava uma centralidade
21

importante no contexto da cidade (LORDELLO, 1981). Botafogo foi um dos


primeiros arrabaldes a receber este serviço, o que nos mostra que sua
ocupação já apresentava certa expressividade (CARDOSO et al, 1983).

Já em 1843, foi inaugurado o que seria o meio de transporte mais


característico de Botafogo na segunda metade do século XIX (LORDELLO,
1981), uma carreira de barcos a vapor que ligava Botafogo ao atual bairro do
Santo Cristo, antigo Saco do Alferes e, logo depois, em 1844, outra que o
ligava à Ponta do Caju (ABREU, 1997) e, posteriormente, em 1846, ao Cais
Pharoux, com cinco viagens diárias (LESSA, 2001). A partir de 1867, Botafogo
passa a ser servido pela Companhia de barcas Ferry. Em suma, diversas
companhias passaram a dedicar linhas que fizessem a ligação de Botafogo
com diversas áreas da cidade do Rio de Janeiro, contribuindo para o
adensamento da população e a futura diversificação das atividades.

Podemos afirmar que outros meios de transporte serviram Botafogo


nesta segunda metade de século, antes do advento dos bondes. Dentre eles,
destacam-se as diligências, as gôndolas e os tilburis.

Podemos estabelecer que a década de 1840 foi marcante para o


processo de urbanização do Rio de Janeiro e, particularmente, de Botafogo,
uma vez que foi neste período que Botafogo passou a ser uma área de
convergência dos meios de transporte na cidade. Isto traz consequências para
sua estrutura interna, visto que a atividade comercial começa a se desenvolver,
dando início a um ainda incipiente processo de diversificação funcional
(LORDELLO, 1981). Esta grande diversificação e intensidade de serviços de
transporte em Botafogo seria observada até o surgimento dos bondes.

Podemos considerar ainda como um fator importante para a melhora da


acessibilidade a Botafogo, a criação pela Botanical Garden Railroad Company
(posteriormente Companhia Ferro Carril do Jardim Botânico), em 1871, da linha
de bondes elétricos que ligava o centro da cidade à Gávea, na área onde hoje
se localiza a atual Praça Santos Dumont (ABREU, 1997). A presença desta
linha impulsionou a ação dos empreendedores imobiliários e beneficiou
diretamente Botafogo, visto que este se encontrava na passagem entre estes
22

dois pontos e fez com que os serviços supracitados fossem gradativamente


abandonados.

Este meio de transporte se disseminou rapidamente pela cidade e


também por Botafogo, uma vez que tinha uma maior capacidade de carga de
passageiros e eram mais rápidos e confortáveis que os demais. Os bondes,
então, tiveram um importante papel indutor do crescimento urbano de Botafogo
e da atual zona sul da cidade. Sua chegada a Botafogo acelerou a ocupação
da então Freguesia da Lagoa pelas classes abastadas, à medida que se
intensificou o parcelamento do solo nesta área, ocasionando o surgimento de
novas vias, novas chácaras e grandes lotes urbanos, cada vez mais
valorizados e aptos a serem ocupados. No início do século XX, todas as
principais vias estruturais de Botafogo eram servidas pelos bondes
(LORDELLO, 1981).

Vale ressaltar que a inauguração desta linha de bondes foi de suma


importância para que tal situação se consolidasse não só em Botafogo como
em outras localidades, como Jardim Botânico, Copacabana, Ipanema e Leblon,
nestas duas últimas, já no século XX (ABREU, 1997).

A presença dos bondes foi importante à medida que interiorizou o


nascente comércio de Botafogo, que se concentrava basicamente na praia,
colaborando para a sua completa urbanização e para a melhora da
acessibilidade, contribuindo para a centralidade do futuro bairro.

Sendo assim, a partir do que vimos a respeito dos transportes em


Botafogo, podemos considerá-los de grande importância para evidenciar sua
centralidade. Esta acessibilidade, além de atender à demanda da população
residente, possibilitou uma maior circulação de pessoas no então nascente
bairro de Botafogo e possibilitou o início de diversificação de suas funções e
composição social.
23

1.2 O processo de transformação da função e composição social de

Botafogo

A transformação e o crescimento da cidade, resultantes do incremento


populacional e do avanço dos meios de transporte ampliou de maneira
significativa os limites do espaço urbano do Rio de Janeiro, possibilitando a
descentralização de algumas atividades, provocando algumas mudanças no
uso do solo, instalação de infraestrutura e o surgimento de novas
centralidades, como observado em Botafogo, que era alimentado por diversas
linhas, dos mais distintos meios de transporte.

Como vimos acima, os bondes contribuíram para o início da


transformação do conteúdo social de Botafogo. Entretanto, convém afirmar
que, juntamente com São Cristóvão, Botafogo mantinha-se como uma área da
cidade que abrigava as residências das classes abastadas, porém, neste
momento, passava a abrigar também populações oriundas de outros estratos
da sociedade, sobretudo os comerciantes, principalmente portugueses, que
abasteceriam com seus produtos as necessidades básicas da elite moradora
de Botafogo, principalmente as alimentícias (LORDELLO, 1981). Assim,
podemos concluir que o surgimento dos primeiros estabelecimentos comerciais
em Botafogo está diretamente ligado à sua função residencial já consolidada.

Cumpre afirmar ainda que não apenas pequenos comerciantes


portugueses se estabeleceram em Botafogo, como também os prósperos. Este
comércio localizava-se basicamente na rua de São Joaquim da Lagoa, uma
das principais de Botafogo na época (e até hoje), sendo a esquina com a rua
Real Grandeza a área concentradora. A passagem do bonde por esta rua foi
responsável por esta importância comercial por ela adquirida. Este cruzamento
e seu entorno, e no prolongamento da Rua Voluntários da Pátria é, ainda hoje,
apontado como o coração comercial de Botafogo, mantendo uma tradição
iniciada no século XIX (HENRIQUE, 2004). Não podemos deixar de citar ainda
as ruas de São Clemente, da Passagem e Praia de Botafogo. Então, é válido
24

aferir que estas ruas se tornaram importantes eixos comerciais em virtude da


passagem dos bondes por elas.

Outro ponto importante a ser mencionado é a inauguração do Cemitério


de São João Batista, em 1852. A presença deste cemitério, construído nos
limites da cidade de então, acarretou a desvalorização dos terrenos em seu
entorno, possibilitando a atração de indivíduos das classes menos abastadas
da população, sobretudo imigrantes portugueses, cujos ofícios se restringiam
basicamente às atividades de comércio, o que ajudou a retirar de Botafogo seu
caráter exclusivamente aristocrático. Por outro lado, sua presença permitiu o
aumento da circulação entre Botafogo e o centro da cidade (ABREU, 1997), em
virtude das atividades inerentes ao novo cemitério que, assim como a igreja de
mesmo nome, já revelava seu papel central, no âmbito de Botafogo e da
própria cidade do Rio de Janeiro.

Observa-se então, a partir da segunda metade do século XIX uma


mudança marcante em Botafogo, que passa de uma área praticamente sem
nenhuma importância comercial para uma de crescente diversificação. No
entanto, este comércio atendia apenas aos seus moradores.

Então, a partir de meados do século XIX e já durante o século XX, o


perfil do morador do nascente bairro se transforma e a população nobre passa
a conviver com populações de camadas mais baixas da sociedade, e com uma
maior diversificação funcional, a partir dos principais eixos de penetração de
Botafogo. Neste período, as elites passam a buscar a orla oceânica para se
instalar, como o embrionário bairro de Copacabana. É também neste momento
que tem início o processo de especulação imobiliária em Botafogo, que vê
surgirem os primeiros cortiços, pensões, casas de cômodo e vilas, utilizados
como moradia por esta população que chega ao bairro, a mesma que iria
trabalhar nas primeiras indústrias tradicionais instaladas no bairro e na zona sul
como um todo e que contribuíram para o adensamento da utilização do solo. A
maior incidência destes tipos de moradia coincide onde há maior concentração
comercial que, por sua vez, estão nos principais eixos viários de Botafogo. Vale
lembrar ainda, que a partir da década de 1940, as encostas de alguns morros
25

começam a ser ocupadas por casebres de madeira, os quais contribuiriam para


a formação das futuras favelas do bairro (LORDELLO, 1981).

No decorrer do século XX, desenvolve-se um comércio tradicional,


especializado e de pequeno porte em Botafogo que vai servir também à
clientela de outros bairros vizinhos, como a Gávea, conferindo a Botafogo uma
certa centralidade na zona sul da cidade (SOARES, 1995). Assim, o
cruzamento das ruas Real Grandeza e Voluntários da Pátria desenvolve um
papel importante de concentrador deste comércio, com estabelecimentos
tradicionais que se mantêm até os dias de hoje, como por exemplo, a
Confeitaria Imperial.

Neste processo, também não devemos deixar de mencionar as


instituições de ensino e de saúde, tais como asilos, hospitais especializados e
sanatórios, como, por exemplo, a Policlínica de Botafogo. Estas atividades, as
quais antes se concentravam exclusivamente no centro e que, atualmente,
estão presentes de forma marcante no bairro, já naquela época, passaram a
exercer um papel central importante em Botafogo.

A presença de colégios em Botafogo, desde o século XIX, como o


Colégio da Imaculada Conceição e os Colégios Santo Inácio e Andrews, já no
século XX, se deve muito à concentração das elites nas circunvizinhanças,
como a Glória, Laranjeiras e Flamengo e, claro, em seu espaço interno. Já a
localização dos hospitais é devida à relativa distância em relação ao centro e à
sua atmosfera aprazível (LORDELLO, 1981). É importante ressaltar que a
concentração destes serviços antes eminentemente centrais em Botafogo já é
expressiva e aumenta cada vez mais, à medida que sua densificação se
intensifica, principalmente a partir da popularização do concreto armado
(CARDOSO et al, 1983).

Então, pode-se afirmar que, nestas primeiras décadas do século


passado, inicia-se em Botafogo um processo de concentração de atividades
terciárias nos principais eixos, embrião do que, no final do século, seria um
subcentro na cidade do Rio de Janeiro.
26

Desta forma, a estruturação de Botafogo, que passava por uma fase de


pleno desenvolvimento, sofre influência direta da ocupação de novas áreas do
espaço urbano carioca, principalmente Copacabana (CARDOSO et al, 1983).

Devido à expansão comercial e à sua proximidade com a orla oceânica e


com o centro, a paisagem urbana de Botafogo passa por uma transformação,
visto que os antigos casarões foram refuncionalizados ou passaram a dar lugar
a inúmeros edifícios de apartamentos e salas comerciais, modificando assim a
paisagem característica do bairro. Este processo de verticalização ocorre com
maior ressonância nos eixos servidos inicialmente pelas linhas de bonde, ou
seja, as principais vias de Botafogo. Vale ressaltar que este processo ocorreu
de forma mais lenta do que no bairro vizinho, Copacabana, onde o crescimento
vertical se deu de forma espantosa, sendo seus casarões e palacetes vítimas
de uma feroz especulação imobiliária.

Por outro lado, este extraordinário crescimento e valorização do solo de


Copacabana, em meados do século XX, gerou impactos em Botafogo, que
funcionava como uma zona de obsolescência em relação ao recém
consolidado subcentro de Copacabana (SOARES, 1995), atraindo para si
atividades e serviços menos nobres, como oficinas de automóveis, que ainda
podem ser encontradas hoje em dia, nos arredores do cemitério São João
Batista. Esta área constitui-se como uma das menos valorizadas do bairro,
inclusive com a presença cada vez mais frequente de favelas, nas encostas
dos morros ali presentes.

É a relação de Botafogo com as áreas de expansão acelerada da


Zona Sul, neste período principalmente Copacabana, que imprime ao
bairro as modificações específicas mais significativas e de maior
impacto em sua estrutura espacial e funcional (LORDELLO, 1981, p.
158).

Neste contexto, podemos estabelecer que a presença deste comércio


especializado e serviços, ligados ao mercado de Copacabana conferiu a
Botafogo uma centralidade, visto que a clientela do bairro vizinho buscava
Botafogo para realizar suas atividades que já não podiam ser encontradas em
Copacabana, e também em outras áreas valorizadas da zona sul. Portanto,
Botafogo passava a ser então um ponto de concentração de fluxos de serviços
27

especializados, caracterizando-se, neste sentido, como um lugar central, dada


sua interação não só com Copacabana, como também com outros bairros.

Em consonância ao que foi supracitado, pode-se afirmar que Botafogo,


por se localizar fora da área central oferece, em relação a ela, vantagens
locacionais para a instalação de equipamentos terciários, tais como o custo do
terreno (baixo valor do solo quando comparado com o centro da cidade e áreas
adjacentes), baixos custos de instalação, uma infraestrutura urbana já
implantada e a proximidade do centro e da força de trabalho e do mercado
consumidor. Além disso, Corrêa (2003, p. 46) afirma que:

a descentralização foi viabilizada pelo desenvolvimento de meios de


transporte mais flexíveis, como ônibus, caminhão e automóvel, não
mais presos aos trilhos. Resultou também dos interesses dos
proprietários fundiários e promotores imobiliários.

A existência de terrenos menos valorizados no bairro em relação aos


bairros vizinhos (Copacabana e Ipanema, principalmente), aliada à presença
de prédios e residências antigas e vias de circulação, fez com que Botafogo
atraísse os mais variados tipos de serviços, que serviriam à população de toda
a zona sul.

Então, em meados do século XX, Botafogo passava por uma série de


transformações tanto em sua paisagem1 como em seu conteúdo. Uma gama
de atividades de serviços surgia no bairro enquanto outras já tradicionais se
consolidavam.

Neste contexto, implantam-se no bairro inúmeras clínicas e consultórios


médicos (das mais diversas especializações), prédios de escritórios, clubes2 e
colégios. O setor educacional consolidava-se no bairro, com a presença de um
grande número de estabelecimentos de ensino, seja das redes primária e
secundária, pública ou particular, delegando a Botafogo o caráter de centro

“(...) paisagem é o conjunto de formas que, num dado momento, exprimem as heranças que
representam as sucessivas relações localizadas entre homem e natureza. (...) a paisagem é
transtemporal, juntando objetos passados e presentes, uma construção transversal (SANTOS, 2006, p.
103).
2
Desde o último quartel do século XIX, a praia de Botafogo configura-se como um importante espaço de
lazer, principalmente a partir da valorização do banho de mar e do surgimento dos clubes de regatas
(MELO, 2001).
28

educacional, visto que em seus colégios, estudavam alunos oriundos dos


diversos bairros da zona sul. Este setor encontrava no bairro as condições
necessárias para o seu desenvolvimento, diferentemente de sua
circunvizinhança. Tal fato consolida um fenômeno iniciado ainda no século XIX.

A presença desta variedade de serviços trouxe a reboque outras que se


aproveitaram deste dinamismo para também se instalarem em Botafogo. É o
caso dos restaurantes que, atualmente, são presença marcante no bairro, o
que deu origem ao “pólo gastronômico de Botafogo”, definido pelo Plano
Estratégico, assunto que ainda abordaremos neste trabalho.

Porém, apesar dessa “invasão terciária” (MESQUITA, 2007), Botafogo


não perde sua função residencial. No entanto, os antigos casarões são,
gradativamente, substituídos por prédios de apartamentos, dando
prosseguimento ao processo de verticalização do bairro, capitaneado pela
instalação de escritórios e sedes de grandes empresas, como FURNAS, a
partir da década de 1970 que, juntamente com grandes prédios de outras
grandes empresas, tais como a IBM, contribuem para a mudança na paisagem
do bairro (LORDELLO, 1981), sobretudo em vias como a Praia de Botafogo.

A presença destas empresas traz consigo uma série de novas atividades


complementares e serviços especializados para Botafogo, bem como
restaurantes e outros estabelecimentos voltadas ao lazer e relacionadas às
atividades fins das empresas.

No início da década de 1980, é inaugurado o shopping Rio Sul, o primeiro


shopping center do estado do Rio de Janeiro que, no contexto da
reorganização do espaço de Botafogo, surge como uma alternativa ao seu
comércio de rua ou ao subcentro espontâneo pré-existente, caracterizando-se
então, como um subcentro planejado (PINTAUDI; FRUGOLI JR., 1992). Anexo
ao shopping, ergue-se também a denominada Torre do Rio Sul, um arranha-
céu que concentra uma gama de atividades terciárias, tais como bancos e
empresas (MESQUITA, 2007).

Este shopping instalou-se nesta área aproveitando-se da centralidade de


Botafogo, no que tange à infraestrutura já consolidada, sobretudo as vias de
29

acesso existentes. Ele se localiza em uma das principais vias de ligação de


Copacabana com o Centro e outros bairros da zona sul, como o Flamengo, o
que facilita o acesso dos consumidores e trabalhadores, tornando ampla sua
área de influência. Desta forma, podemos estabelecer que o Rio Sul exerce
uma centralidade importante em Botafogo, pois atrai fluxos não só do próprio
bairro, como também de toda a zona sul.

1.3 A acessibilidade: os transportes coletivos e a importância do metrô

O processo de adensamento da zona sul continuava a exigir o


escoamento do tráfego pelo interior do bairro de Botafogo, mesmo depois da
abertura das galerias do Túnel Rebouças. Assim, algumas obras viárias são
feitas, como a abertura de novos eixos, a fim de melhorar a circulação do
tráfego, cada vez mais repleto de automóveis particulares de passeio.

Desta forma, surge a necessidade de se criar uma alternativa para o


transporte de massas, que não sobrecarregasse os eixos existentes já
saturados ou aqueles que estavam prestes a se saturar a curto prazo.

Com isso, como uma alternativa para solução dos problemas de


transporte do bairro, um ano após a inauguração do shopping Rio Sul, em
1981, é inaugurada a estação do metrô de Botafogo, provocando uma
redefinição do espaço do bairro e a melhora em sua acessibilidade, dando aos
seus moradores, trabalhadores e frequentadores em geral, mais uma opção de
transporte.

Então, é válido afirmar que o metrô vem para atender às novas


necessidades do espaço botafoguense, ou seja, incrementar a acessibilidade e
a mobilidade da população que dele se utilizaria, melhorando a circulação no
espaço urbano para fins diversos, dentre eles o lazer que, em Botafogo,
assume grande ressonância. Logo, este meio de transporte viabilizou e
permitiu a articulação de diversas atividades como trabalho, moradia,
30

educação, comércio, saúde e, é claro, aquelas relacionadas à cultura e ao


lazer.

A maior acessibilidade, proporcionada pelo metrô acarretou novas


possibilidades de uso do solo de Botafogo. Sua implantação passa a se
constituir em um elemento determinante na estruturação não só do seu entorno
imediato, como de todo o bairro. Notou-se uma transformação na forma e no
conteúdo das áreas localizadas nas circunvizinhanças desta estação. Diante
deste quadro, Villaça (2001, p.23) estabelece que “a acessibilidade é mais vital
na produção de localizações do que a disponibilidade de infraestrutura”. Este
mesmo autor reitera ainda que os transportes intraurbanos são os maiores
determinantes das transformações dos pontos (VILLAÇA, 2001), possuindo
efeitos reestruturantes significativos.

Desta forma, Silva (2008) estabelece que um sistema de transporte


urbano está diretamente ligado à estruturação do espaço urbano onde atua e
se constitui em um dos principais aspectos de sua reprodução. O autor
prossegue com seu pensamento afirmando que:

(...) o transporte urbano está estreitamente relacionado com as


questões próprias do urbano, demonstrando o valor das vias de
circulação, infraestrutura e tecnologias de transporte, que imprimem
fluidez às pessoas pelos diferentes pontos do espaço urbano. Esse
mesmo espaço urbano é formado por elementos que requerem uma
certa conectividade, imprescindível para a sua própria reprodução, de
forma que as relações possam ocorrer de maneira coerente e
interligada. O transporte torna-se assim um fator primordial para a
reprodução do modo urbano de viver (SILVA, 2008, p. 27).

Diferentemente do que ocorreu com o cemitério, sua presença acarretou


também a valorização dos imóveis localizados nos seus arredores. Podemos
estabelecer, desta forma, que a maior acessibilidade influenciou diretamente os
usos e os valores do solo urbano de Botafogo. Com isso, possibilitou a
presença de inúmeras empresas no seu entorno, fato que pode ser explicado a
partir das palavras de Ribeiro (1997, p.74):

(...) a tendência é que o solo seja ocupado pelas atividades


econômicas que mais podem pagar pelo seu uso, o que é
determinado pelo papel que a localização assume na geração de
sobrelucro.
31

No entanto, não só as empresas passaram a se localizar em Botafogo.


Empreendimentos imobiliários voltados a classes mais altas escolhem
Botafogo como alternativa a outras áreas na zona sul, já bastante adensadas,
transformando-se então, em elementos reestruturadores definitivos de
Botafogo, “(...) imprimindo uma nova escala para o uso residencial e
modificando sua composição social” (LORDELLO, 1981, p. 201).

Até o ano de 1998, quando a estação Cardeal Arcoverde, em


Copacabana, é inaugurada, a estação de Botafogo era a estação terminal da
linha 1 na zona sul, o que fazia com que usuários de outros bairros desta área
não servidos pelo metrô utilizassem esta estação, transformando-a num ponto
central importante no bairro. Neste sentido, de acordo com as observações de
Lynch (1999, p.53), podemos considerar esta estação como um ponto nodal
importante em Botafogo. Ou seja, a presença desta estação neste local o
transformou em um ponto de convergência no bairro, um centro polarizador de
fluxos de indivíduos.

Lynch define que:

Os pontos nodais são pontos, lugares estratégicos de uma cidade


através dos quais o observador pode entrar, são os focos intensivos
para os quais ou a partir dos quais ele se locomove. Podem ser
basicamente junções, locais de interrupção do transporte, um
cruzamento ou uma convergência de vias, momentos de passagem
de uma estrutura a outra.

Então, de acordo com Kevin Lynch, podemos afirmar que a estação do


metrô é um ponto central por excelência, em Botafogo.

O sistema de transportes, em especial o metrô, ao proporcionar uma


maior acessibilidade ao bairro, viabiliza a estruturação de seu espaço
especializado. A concentração de diferentes atividades em Botafogo se torna
viável e é potencializada pelos transportes que servem ao bairro. É notório que
a concentração destas atividades no espaço de Botafogo requer uma maior
acessibilidade. Esta, por sua vez, possibilita que outras novas passem a ser
32

realizadas no bairro, configurando-se assim, uma relação fundamental para a


existência e desenvolvimento de ambas.

Quando comparado com outros bairros da cidade, Botafogo apresenta


uma grande concentração das mais diferentes atividades, especialmente de
cultura e lazer, como veremos no terceiro capítulo. Isto se deve, em grande
parte, aos meios de transporte e à acessibilidade, conferida pelos diferentes
eixos viários e metroviários que ligam Botafogo a outras áreas da cidade. Estes
elementos não se apresentam de maneira uniforme na cidade, acarretando
assim, uma flagrante diferenciação de áreas. Podemos afirmar então, que
Botafogo é um bairro privilegiado no que diz respeito à oferta de transportes e a
seu fácil acesso.

Portanto, hoje em dia, o que vemos em Botafogo é uma variedade de


serviços e atividades que atendem às mais diferentes classes sociais, idades e
gostos. O bairro tornou-se polo gastronômico, cultural, de lazer, educacional e
de saúde, consolidando assim, no âmbito da cidade, sua posição central.

1.4 O setor terciário e sua participação na estruturação de Botafogo

Na cidade do Rio de Janeiro, a importância das atividades terciárias está


enraizada desde a época de sua fundação quando esta desempenhava uma
função portuária, de um entreposto comercial estrategicamente localizado no
Atlântico Sul. Desta forma, desenvolveu um modelo de urbanização terciária
que se reflete nos padrões espaciais da cidade, sendo atualmente os serviços
elementos fundamentais em sua (re)estruturação urbana, redefinindo-a.

Este processo dinamiza novos modelos locacionais, nos quais as


atividades terciárias se transformam e, no bojo desta transformação, também
modificam sua organização espacial. Desta forma, o modo como elas se
(re)distribuem também implica em transformações no padrão espacial da
cidade. E é neste contexto que surgem novos centros em áreas consolidadas
que se renovam, como é o caso de Botafogo, onde os serviços modernizados
33

tendem a se concentrar em virtude da localização de sedes de algumas


grandes empresas, gerando economias de aglomeração, além de aproveitarem
a fácil acessibilidade ao bairro, proporcionado pela instalação do metrô, na
década de 1980, da facilidade à informação, entre outras vantagens
locacionais. Podemos observar tal tendência através da presença de edifícios
de escritórios em Botafogo.

Desta forma, pode-se perceber que a urbanização em Botafogo


desenvolve-se impulsionada pela importância que as atividades de serviços
adquiriram neste subcentro, pela presença de sedes de empresas e de outras
atividades terciárias, como as de lazer e cultura. Assim, seu espaço passa a
ser influenciado pela dinâmica espacial dos serviços especializados e
modernizados, característicos da atual conjuntura, em que a economia é
globalizada e a fluidez da informação é marcante.

1.4.1 Os serviços: crescimento e transformações na economia

A concentração geográfica das atividades de serviços tem sido foco de


estudos de diversos autores, dada a importância do tema nos dias atuais e
suas implicações na estrutura interna das cidades. E o Rio de Janeiro, por ser
uma grande metrópole e estar inserida no sistema-mundo, não foge à regra,
tendo as atividades terciárias papel importante na produção de seu espaço
urbano e em sua organização interna. Quando falamos de sistema-mundo,
estamos nos baseando no estudo de Dollfus (1993, p. 31) que, a respeito do
assunto admite que este “traduz-se na aceleração das descobertas científicas e
inovações tecnológicas, no desenvolvimento das trocas internacionais”. Os
serviços engendraram, então, neste contexto, transformações importantes na
economia mundial, como abordaremos a seguir.

As transformações na economia mundial, implementadas pelo modo de


produção capitalista, através do processo de globalização, a partir da década
de 1980, ao promover a fusão de empresas e disseminar pelo planeta novos
34

modos de produção, circulação e consumo, fazem com que as cidades,


sobretudo as metrópoles, sejam os locais onde estas transformações se
efetuam, onde há a concentração e reprodução do capital, símbolo do poder
econômico das grandes corporações. No entanto, a cidade não é apenas o
locus destas grandes corporações, mas também o lugar do trabalho e dos
serviços não-especializados e que exigem baixo grau de qualificação
profissional (SILVEIRA, 2004).

Neste contexto, as cidades se adequam à nova conjuntura internacional,


desenvolvem-se e se inserem na rede de cidades mundializadas, cosmopolitas.
Por outro lado, também acumulam problemas característicos de grandes
cidades, tais como a pobreza. Podemos incluir neste caso a cidade do Rio de
Janeiro (PACHECO, 2003).

Verifica-se, atualmente, que a dinâmica da economia mundial vem


apresentando uma tendência ao processo de terciarização, percebida através
de um intenso crescimento que se desenrolou ao longo de todo o século XX.
Tal tendência é evidenciada a partir do momento que analisamos a atividade
econômica nas grandes cidades, onde, “há décadas, o setor terciário absorve
expressivos contingentes de mão-de-obra” (MELO et al, 1997), além de
apresentar-se como o setor mais dinâmico da economia mundial, que emprega
aproximadamente 2/3 dos trabalhadores.

Isto nos permite falar em uma transformação da estrutura social, uma


mudança de paradigma. Esta mudança nos colocou no plano da economia de
serviços, com o advento de novos serviços, novos modos de vida. Com efeito,
a economia de serviços é transformadora da estrutura social, que implica
também em uma mudança de cultura.

Bell (1977) entende que esta tendência é uma revolução que se


processa na estrutura das ocupações e, uma vez que a ocupação é
determinante para as outras modalidades de comportamento, se trata também
de uma revolução na estrutura de classes sociais. Para o autor, esta
transformação no caráter da produção e das ocupações se constitui em um dos
aspectos do advento da sociedade pós-industrial, a qual tem como base os
35

serviços. O crescimento deste setor implica na formação de uma sociedade em


que predominam os empregados de escritório. É a sociedade de serviços.

Escolano e Moreno (1992), também alertam para a existência de uma


sociedade de serviços. Para estes autores, esta sociedade se desenvolve e se
estabelece ao redor da tecnologia, que é encarregada de liberar o homem do
trabalho pesado e perigoso para lhe conceder tempo livre para desfrutar das
atividades que mais lhe interessam e participar mais ativamente da vida em
sociedade. Desta forma, sendo os serviços atividades mais brandas que as da
indústria, podem se desenvolver fortemente para atender às novas
necessidades, tornando-se assim, as atividades predominantes na economia
urbana.

A transição para esta sociedade é indicada também pelo tipo de


atividades executadas, cada vez mais modernizadas.

Bell (1977) estabelece ainda que, na sociedade de serviços, o que conta


não é a força muscular, e sim a informação, que passa a representar o recurso
central e uma fonte de poder nas organizações.

A personalidade central é a do profissional, preparado por sua


educação e por seu treinamento para fornecer os tipos de habilidades
que vão sendo cada vez mais exigidos numa sociedade pós-industrial
(BELL, 1977, p.148).

Os profissionais altamente especializados e bem remunerados formam


uma nova classe operária, a qual substitui a antiga e passa a desempenhar um
papel de suma importância para as organizações capitalistas. Esta nova classe
social que surge no bojo do capitalismo moderno assume um papel primordial
no desenvolvimento econômico da sociedade, uma vez que o “capital humano”
se sobrepõe sobre o “capital físico” (BELL, 1977).

Vale salientar que este pesquisador analisou a sociedade


estadunidense, portanto, de um país desenvolvido. Países como o Brasil
observam esta situação com atraso em relação às economias centrais. Para
Santos (2008a) as relações entre urbanização e terciarização são diferentes
em países desenvolvidos em relação aos subdesenvolvidos. Nestes últimos, há
uma grande disparidade de renda entre os indivíduos e disparidades regionais.
36

Ainda segundo Santos (2008a), cada nível qualitativo e quantitativo da


atividade terciária é correspondente a uma forma particular da divisão do
trabalho internacional e interna de cada país.

A definição qualitativa e quantitativa do terciário correspondente a


cada país depende, de um lado, das formas de realização da vida
coletiva e, de outro lado, das formas de inserção do país no âmbito
da economia mundial. Ambos esses dados reunidos nos dão, a um só
tempo, a importância global da atividade terciária e a sua distribuição
no espaço nacional (SANTOS, 2008a, p.81).

Na sociedade pós-industrial, observa-se que a figura do profissional


assume grande importância, pois são preparados por sua educação e por seu
treinamento para fornecer os tipos de habilidade que vão ser cada vez mais
exigidos neste contexto de desenvolvimento acelerado dos serviços, ou seja,
de uma sociedade pós-industrial.

Seguindo com este pensamento, a sociedade pós-industrial pode ser


definida pela qualidade da existência avaliada de acordo com os serviços e o
conforto – saúde, educação, lazer e artes, atividades que assumem grande
importância neste contexto. Vale lembrar que com a passagem para a
sociedade de serviços, os indivíduos passam a gastar mais tempo e dinheiro
com artigos de luxo e com atividades voltadas ao lazer. Desta forma, começa a
se desenvolver o setor dos serviços pessoais, tais como aqueles direcionados
a viagens, diversões, restaurantes, atividades culturais diversas, dentre outras.

Se considerarmos o caso brasileiro, no qual se inclui o caso de


Botafogo, segundo o estudo de MELO (1997, p.8), poderemos estabelecer que:

No Brasil as atividades de serviços respondem por parcelas


significativas da geração de emprego e da renda num fenômeno
idêntico ao ocorrido nas economias desenvolvidas. Esta evolução da
estrutura do emprego e do PIB por grandes setores econômicos
apresenta características de terciarização comuns, ou seja, declínio
das atividades agropecuárias e expansão da indústria e dos serviços.

Desta forma, podemos afirmar que este fenômeno é inerente tanto às


economias desenvolvidas como às em desenvolvimento.
37

Os países subdesenvolvidos, especialmente os da América Latina,


viveram processos de modernização e industrialização após a Crise de 1929 e
adotaram modelos econômicos dependentes de capitais externos. Este tipo de
industrialização provocou transformações agrícolas e fortes movimentos de
êxodo rural, o que acarretou a redução da participação da população
empregada ativa no setor primário da economia. Mas este processo não
repetiu a trajetória de transferências da PEA típica dos países centrais, onde o
setor secundário absorvia grande parte dessa força de trabalho.

Porém, o que aconteceu foi um crescimento excessivamente rápido do


setor terciário, causando sua hipertrofia, nas últimas décadas. Ao contrário dos
países desenvolvidos, que passaram por uma Revolução Industrial nos séculos
XVIII e XIX, os subdesenvolvidos não tiveram uma etapa de industrialização
baseada em fábricas de pequeno porte, baixa automação e intensa utilização
de força de trabalho. Por isso, desde o início, a indústria moderna estabelecida
nestes países foi uma indústria cuja produção dependia de menos mão-de-
obra. Em consequência disso, houve a transferência acelerada da mão-de-obra
oriunda do setor primário diretamente para o terciário.

A hipertrofia do setor terciário nos países subdesenvolvidos é causada


devido à sua dimensão qualitativa, pois abriga grandes contingentes de
subempregados ou empregados de baixa qualificação e remuneração, e não
pela sua dimensão quantitativa. Vale lembrar que, no Brasil, a população
empregada e a participação no PIB são maiores que a indústria.

Segundo Melo (1998), as razões para esta hipertrofia se dão em virtude


de alguns elementos estruturais, tais como a concentração de terras e a
incapacidade da indústria de absorver essas camadas da população expulsas
do setor agrícola. Assim, só lhes resta a possibilidade de ocuparem atividades
tradicionais alocadas no setor terciário, o que, ainda segundo a autora, gera
subemprego e exclusão social.

A respeito do tema, Pacheco (2003, p.6) afirma que:

(...) em casos como o brasileiro a concentração do trabalho no setor


terciário não significa que estamos atingindo um estágio de evolução
das forças produtivas e caminhando para a sociedade pós-industrial
38

no sentido stricto do conceito. Afinal, a participação dos serviços nas


taxas de desenvolvimento da economia urbana indicam uma forte
presença do setor chamado informal, voltado para os serviços ao
consumidor, serviços pessoais, sem revelar, portanto, um avanço em
direção à generalização dos serviços mais avançados.

Assim, podemos estabelecer que a economia brasileira, ao transformar


sua estrutura, acompanhou as mudanças pelas quais passou a economia
globalizada internacional, que teve na expansão dos serviços sua principal
repercussão. E devemos reiterar que este processo de terciarização da
economia brasileira foi marcado por um caráter duo, ou seja, expandiram-se
tantos os serviços tradicionais e menos modernizados como os novos,
modernos, da esfera do chamado terciário superior.

Neste sentido, as causas fundamentais para o desenvolvimento dos


serviços, segundo Escolano e Moreno (1992) foram a descoberta de novas
tecnologias de produção, a internacionalização e estandardização da produção,
a consolidação das empresas transnacionais que operam em escala mundial, a
integração regional e internacional dos mercados financeiros e a mobilização
da reserva de trabalho em quase todos os países do mundo.

Desta forma, a aplicação de novas tecnologias na produção significa que


algumas atividades, como engenharia, consultoria e outras de alta e baixa
qualificação proliferam. Conforme anunciou Bell (1977), esta nova forma de
produção é baseada no conhecimento e na informação, que passa a ter um
papel importante no desenvolvimento e reprodução da sociedade de serviços,
descrita como o “motor do desenvolvimento econômico” atual (ESCOLANO;
MORENO,1992, p.30).

Ainda levando em consideração os estudos destes autores acerca desta


temática, pode-se constatar como um fator preponderante para o crescimento
dos serviços o aumento do tempo livre para seu consumo, aliado ao desejo da
população de se manter inserida em um estilo de vida consumista,
característico da atual conjuntura econômica ocidental, na qual vivemos, em
que novas tecnologias são aplicadas no consumo e nas atividades que
39

envolvem o lazer. Assim, atividades voltadas ao lazer e à cultura ganham


importância maior no contexto da sociedade pós-industrial.

De modo geral, segundo Junquera (1993), a noção de serviços pode ser


caracterizada pela grande heterogeneidade. Grandes empresas, de setores
fortemente concentrados como os bancos e seguros convivem com empresas
de pequeno porte. Por outro lado, há setores altamente capitalizados e que
demandam alta qualificação do trabalho coexistindo com outros de baixa
capitalização e menor qualificação da mão-de-obra, sendo uns prestados pelo
Estado e outros pela iniciativa privada, seja atendendo à demanda final ou
intermediária.

O autor ainda estabelece que:

(...)un servicio es una prestación de trabajo o del uso de instalaciones


especializadas. Así, denominamos servicio a la actividad que se
realiza para satisfacer la necesidad de otro como en el caso del
servicio de asistencia legal o de servicio medico,(...) (JUNQUERA,
1993, p.24).

Em seu estudo, ele define como serviços aquelas atividades que se


incluem nos setores de comércio, reparações, hotéis, transportes,
comunicações, bancos, seguros, serviços às empresas, serviços sociais, lazer,
cultura, entre outros, sendo identificados quatro tipos distintos. São eles:
serviços ao produtor, serviços pessoais, serviços sociais e serviços
distributivos.

Outros teóricos acerca da questão dos serviços, Escolano e Moreno


(1992) estabelecem que são muitos os tipos de serviços que se julgam
indispensáveis para o desenvolvimento econômico, sendo o principal, as infra-
estruturas de serviços, tais como transportes, comunicações, educação e
saúde. Também cumpre mencionar os serviços intermediários, como os de
finanças, consultoria, engenharia e, finalmente, os serviços de informação.
Todos estes serviços se mantêm interligados e assim, condicionam o avanço
do setor de modo geral.
40

De acordo com Bell (1977), o setor de serviços pode ser dividido em


diversas áreas, a saber. Em um primeiro grupo, podemos incluir as atividades
que são ligadas diretamente à indústria, como o transporte. Em outro,
atividades relacionadas à distribuição, comércio, finanças e seguro. Em um
terceiro grupo, as que dizem respeito ao lazer, como as viagens, diversões, os
esportes, espetáculos em geral e, por fim, aquelas voltadas à infraestrutura, os
serviços comunitários, sobretudo, saúde e educação.

Para Escolano e Moreno (1992), os serviços possuem características


próprias, que os distinguem dos setores primário e secundário. Além do
tamanho e da fisionomia próprios das empresas, podemos apresentar como
características a intangibilidade, a impossibilidade de armazenamento e o
caráter instantâneo do ato produção-consumo dos serviços e o fato de não
serem palpáveis.

O avanço do setor, indicado acima se deve ao avanço da sociedade de


modo geral, ou seja, para Escolano e Moreno (1992), seguindo o pensamento
de Bell (1977), quanto maior a participação dos serviços na economia, mais
elevado é o progresso da sociedade em que este setor se desenvolve.

Por sua vez, Melo (1998) diferencia os serviços de outras atividades


derivadas da produção agropecuária e industrial, a partir de uma característica
já apresentada acima – eles podem ser consumidos da mesma forma que são
produzidos e são resultados de um processo em que a produção e o consumo
coincidem temporal e espacialmente. Ou seja, há uma relação estreita, através
de um contato direto, entre os que produzem e aqueles que consomem os
serviços.

A autora também atenta para a heterogeneidade dos serviços. Para ela,


em conseqüência disso, o processo de transformação pelo qual passou a
economia mundial, - a chamada terceira revolução industrial, com a presença
da microeletrônica, que gerou novos produtos e garantiu à indústria ganhos de
produtividade – potencializou suas especificidades. A introdução destas novas
tecnologias acarretou impactos em alguns segmentos do setor de serviços, o
que trouxe a reboque ainda, a necessidade da sociedade em se adequar a este
novo paradigma econômico-tecnológico, principalmente no que tange às áreas
41

de educação e treinamento/conhecimento, visto que o trabalho manual é


substituído, sendo então necessária a utilização de mão-de-obra técnica e,
consequentemente, qualificada. Por isso, de acordo com Bell (1977), a área de
educação é fundamental nesta sociedade.

Segundo a autora, esta condição contribui para que a definição de


serviços seja problemática e evidencia a impossibilidade de se tratar de
serviços tão distintos como os de consultoria e financeiros (modernizados) e os
tradicionais como os serviços de armazenamento, de modo homogêneo.

O processo de terciarização da economia e a expansão do setor de


serviços geraram significativas implicações sobre o modo como o espaço
urbano das cidades se organiza, remodelando-o. Neste sentido, tal processo
promove um modo de localização diferenciado das atividades terciárias, uma
vez que estas se dispersam pela cidade, afirmando-se como uma nova
centralidade alternativa à rigidez e ao congestionamento de sua área central
(DOMINGUES, 1994). É o que ocorre, na cidade do Rio de Janeiro com
Botafogo, nossa área de estudo, onde a presença das sedes das empresas e
dos espaços de cultura e lazer em grande quantidade configuram-se como
indicadores fundamentais desta transformação.

1.4.2 As mudanças no setor de serviços em Botafogo

A partir da década de 1980, concomitante à chegada do metrô, que


delegou uma melhor acessibilidade ao bairro, vimos surgirem novas atividades,
que o dinamizaram e geraram novos usos às antigas construções de Botafogo.
Vimos casarões datados do século XIX e prédios serem refuncionalizados.
Prédios estes que passaram a abrigar bares, restaurantes, teatros, museus,
centros culturais, escolas, clínicas médicas especializadas e, sobretudo, sedes
de empresas. Neste contexto, prédios novos com finalidade específica também
são construídos em substituição a antigos prédios que são demolidos para
atender às necessidades da reprodução do capital imobiliário, que passa a
42

construir edifícios de escritórios e de apartamentos voltados para a população


de rendimentos mais elevados, dando início a um processo de revalorização do
bairro.

Vale ressaltar que os espaços de cultura e lazer não correspondem,


usualmente, a espaços renovados (prédios novos) produzidos pelo mercado
imobiliário. Em Botafogo, podem ocupar imóveis tombados.

O atual modelo de urbanização, impulsionado pelo processo de


terciarização da economia, gerou o surgimento de novos usos para o espaço
de Botafogo, onde se constata a presença de uma diversidade de atividades
combinadas e de sedes de empresas como um marco para este novo padrão
espacial.

E são essas empresas, sediadas em Botafogo, sobretudo os serviços


especializados, que revelam o novo padrão já configurado de localização dos
serviços no bairro.

É possível verificar, além da variedade de serviços apresentada, a


concentração destes na esfera do terciário superior, notadamente os serviços
financeiros e de seguros e, principalmente os serviços às empresas, que
alcançaram um marcante ritmo de crescimento nos últimos anos (ESCOLANO;
MORENO, 1992). Esta categoria engloba, dentre outros, segundo classificação
definida pelo GETER (2004), as consultorias e os serviços de informática que,
por sua vez, têm crescido cada vez mais, consolidando sua importância na
economia urbana, além de demonstrar a característica dos dias atuais, com o
avanço do meio técnico-científico-informacional que, segundo Santos (2006,
p.239) tem início com o findar da Segunda Guerra Mundial, tendo se afirmado
nos anos 70 e “é a cara geográfica da globalização”.

Juntas, estas categorias somam mais da metade do total de empresas


identificadas em Botafogo, o que demonstra sua preponderância na economia
urbana (MESQUITA, 2007). São os serviços mais modernos, especializados,
intensivos em conhecimentos específicos e empregadores de uma força de
trabalho altamente especializada.
43

Os serviços às empresas caracterizam-se por não serem serviços


destinados ao consumo direto da população, mas sim ligados à produção de
alguma outra mercadoria, o que podemos estabelecer a partir do que discorrem
Escolano e Moreno (1992, p.11):

la orientación de su actividad va hacia un mercado que no es el final,


sino principalmente otras empresas o instituciones (sean agrarias,
industriales o de servicios). En definitiva, su output se incorpora como
insumo en otro proceso productivo.

Estes autores ainda afirmam, portanto, que não se limitam apenas à


produção do setor terciário, tendo participação também na produção das
atividades agrícola e industrial.

Em Botafogo, dentre os serviços às empresas, os setores que mais se


destacam são o de consultoria, informática e de comunicação, evidenciado
pelo grande número de empresas de publicidade, propaganda e marketing, o
que confirma novamente a característica dos novos tempos, com o avanço do
meio técnico-científico-informacional, como citado anteriormente (MESQUITA,
2007).

Ainda levando em consideração o trabalho de Escolano e Moreno


(1992), podemos ressaltar a presença em Botafogo de duas empresas que
estes autores classificam como sendo dominantes nesta categoria de serviços
às empresas, ambas estadunidenses, a Arthur Andersen, de serviços contábeis
e a IBM, do setor de informática.

Além destas, estão sediadas em Botafogo outras empresas importantes


no contexto mundial, tais como a gigante das telecomunicações AT&T e a
Ernst & Young, especializada em auditoria.

Em Botafogo, também estão localizadas empresas as quais estão dentre


as maiores do Brasil, sejam de capital público ou privado, nacional ou
estrangeiro. São elas: Norberto Odebretch, Volkswagen Brasil,
DaimlerChrysler, Nestlé, HP (Hewlett-Packard), Repsol YPF, Intelig, Coca Cola,
Furnas e Dataprev. Desta forma, pode-se demonstrar a importância de
44

Botafogo na localização das sedes destas empresas de grande porte


(MESQUITA, 2007).

Sobre a localização dos serviços às empresas, Pacheco (1998, p.2)


afirma que:

(...) a localização dos serviços especializados a empresas está


relacionada ao princípio de concentração de atividades de comando e
às economias de aglomeração organizadas sob nova lógica e novo
acesso à informação, entre outras vantagens locacionais.

Neste contexto, a escolha da localização de sua sede para as empresas


e, consequentemente para os serviços às empresas também, fundamentou-se
na busca por lugares dotados de grande oferta de edifícios e escritórios e de
uma boa infraestrutura, onde a acessibilidade seja fácil, como é o caso de
Botafogo. Assim, neste sentido, a característica que delegou a Botafogo a fama
de “bairro de passagem” só o beneficiou, causando impactos positivos para si.

Atualmente, observamos em Botafogo uma presença marcante de


edifícios de escritórios, notadamente na Praia de Botafogo, onde se localizam
os principais Centros Empresariais do bairro, dentre eles o Centro Empresarial
Rio (Edifício Argentina), Centro Empresarial Botafogo (Edifício Caemi) e Centro
Empresarial Mourisco.

Arueira (2001) questiona se a presença destes empreendimentos não


seria uma mudança nas características deste logradouro, uma vez que aí
ainda se concentra uma população com baixo poder aquisitivo. No entanto,
ultimamente, está se transformando em um centro de negócios, justamente em
virtude desta grande presença de Centros Empresariais.

Podemos observar esta tendência a partir da arrecadação de ISS por


estabelecimentos localizados na Praia de Botafogo. Este logradouro constitui-
se como um dos principais em arrecadação de ISS em números absolutos do
Rio de Janeiro (ARUEIRA, 2001).

Este mesmo autor resume:

(...) os dados confirmam a tendência do Rio de Janeiro em


desenvolver novas centralidades, muitas vezes especializadas. A
45

Praia de Botafogo abriga a mais importante concentração de


empresas cariocas de um segmento dinâmico do setor de serviços,
associado à tecnologia, criação e elevado patamar de investimentos
(ARUEIRA, 2001, p.5).

Podemos afirmar que estes Centros Empresariais, devido a algumas de


suas características, se assemelham aos business centers encontrados na
Barra da Tijuca (SILVA JR., 2001), diferenciando-se destes devido a suas
formas mais verticalizadas por encontrarem-se em uma área onde o tecido
urbano já se encontrava consolidado, o que não ocorria naquele bairro da zona
oeste, quando o Downtown foi inaugurado, por exemplo.

Podemos observar, como um fato importante, que a Praia de Botafogo e


as áreas circunvizinhas vão se caracterizar como áreas de grande
concentração de equipamentos de cultura e lazer, conforme analisaremos mais
adiante. Isto nos mostra a importância da relação entre os serviços avançados
e a concentração de espaços de cultura e lazer em Botafogo.

Porém, não é só na Praia de Botafogo que encontramos sedes de


importantes empresas. Citamos também as ruas Mena Barreto, onde está a
sede da empresa de telefonia celular Claro e a Voluntários da Pátria, onde se
localiza a Rio Luz.

Outro reduto importante de sedes de empresas é a Torre do Rio Sul.


Este prédio apresenta um conjunto bastante diversificado e representativo do
universo das categorias observadas em Botafogo, mas mantendo a
predominância dos serviços às empresas (MESQUITA, 2007).

Segundo Mesquita (2007), em Botafogo, outras atividades aparecem


com certo destaque. Isto se deve a um número grande de empresas do ramo
de energia, sejam elas de energia elétrica, nuclear ou até mesmo eólica,
produtoras ou distribuidoras. Empresas de petróleo também marcam presença
neste contexto.

Outro ramo importante que não se enquadra nas categorias de serviços


predominantes na área de estudo é o ramo da mineração. As empresas
mineradoras também aparecem em grande número, colaborando para que
tenham relevância em Botafogo. Outras grandes empresas importantes
46

também devem ser citadas, tais como as montadoras alemãs Volkswagen e


DaimlerChrysler e a do ramo fonográfico Sony/BMG (MESQUITA, 2007).

Não podemos considerar esta participação empresarial como um fato


irrelevante, visto que estas empresas aplicam um grande volume de capital em
suas atividades e não se prendem apenas ao setor terciário, tendo relação com
outros setores da economia, sobretudo o setor industrial, neste caso específico.
Porém, nosso objetivo não é discorrer sobre esta relação.

Desta forma, ao redefinir o padrão espacial de Botafogo e, de certa


forma, alterar a estrutura urbana da cidade, as atividades terciárias ali alojadas,
materializadas especialmente nas sedes de empresas, produzem um nível de
polarização e faz em Botafogo um nó de fluxos. É a centralidade das
empresas, inserindo o Rio de Janeiro e Botafogo no espaço de fluxos
(CASTELLS, 2002).

Nos últimos anos, também em decorrência da chegada desta grande


quantidade de empresas, ganharam importância no contexto de renovação de
Botafogo, os espaços de cultura e lazer. A grande concentração de
equipamentos dessa natureza, como bares, restaurantes, cinemas, teatros e
livrarias transformou espaços e aumentou a circulação de pessoas em seu
interior, reforçando ainda mais sua centralidade, uma vez que estes espaços
atraem fluxos de pessoas de diversas áreas da cidade, muitas vezes se
beneficiando da acessibilidade proporcionada pelo metrô.

Então, por isso, não poderíamos deixar de acrescentar estes novos tipos
de centralidade, inerentes ao fim do século passado e início do século XXI.

O comércio, por sua vez, ocupa uma posição primordial na economia


urbana carioca e também nas transformações por que passa o espaço urbano
na organização interna da cidade e, sobretudo, em Botafogo. Tal fato se aplica
nitidamente em nossa área de estudo, visto que esta tem a função comercial
como uma das mais importantes, sobretudo na rua Voluntários da Pátria. Neste
sentido, a presença de três grandes shopping centers em seus limites só
reforça tal situação. Vale lembrar que estes empreendimentos constituem-se
em importantes concentradores de espaços de lazer.
47

Botafogo não perdeu sua função residencial, mas hoje exerce uma
centralidade no âmbito da cidade à medida que se transformou em uma “nova
centralidade em área consolidada” que reúne tudo que se refere à produção e
prestação de serviços. Tendo as atividades terciárias exercido um papel
estruturador importante nesta nova centralidade, esta se firma como lugar de
cultura e lazer e de consumo de mercadorias e de serviços especializados às
empresas, isto é, atividades inovativas e modernizadas que nos permitem
perceber seu dinamismo.

Considerando as lógicas locacionais destas empresas, podemos afirmar


que Botafogo lhes dá as condições necessárias para que estas aí se instalem,
ou seja, atendendo às condições de facilidade de acesso e infraestrutura de
comunicações, além de características imobiliárias específicas, isto é, com uma
boa oferta de edificações que possam ser readaptadas, ou espaços que lhes
permitam “(...) produzir novas edificações e, por intermédio delas, criar novos
valores fundiários” (SPÓSITO, 1998). Combinado a estes fatores, devemos
acrescentar que a acessibilidade implementada pelo metrô, nos anos 80,
contribuiu para dinamizar este processo e consolidar a centralidade outorgada
não só pelas empresas, mas também pelos espaços de cultura e lazer.
48

2 A AÇÃO DOS AGENTES PÚBLICO E PRIVADO NA REVITALIZAÇÃO DE

ÁREAS

Este capítulo tem como objetivo analisar a participação do poder público,


sobretudo dos governos locais, através de suas políticas específicas e da
iniciativa privada e seus agentes na revitalização de áreas, e suas respectivas
ações empreendedoras. Neste contexto, trataremos das parcerias público-
privadas e do Plano Estratégico como importantes instrumentos de gestão da
cidade.

O Estado capitalista é um dos atores responsáveis pela organização da


cidade e sua atuação é complexa e variável no que se refere ao tempo e ao
espaço, o que reflete a dinâmica da sociedade da qual faz parte. Assim, é
através da implantação de serviços públicos básicos e da elaboração de leis e
normas vinculadas ao uso do solo que sua atuação se faz mais clara
(CORRÊA, 2003).

O poder público configura-se como um agente que busca assegurar os


elementos primordiais para a reprodução das relações sociais de produção e
da força de trabalho, através do consumo coletivo de alguns meios. Logo,
torna-se um articulador do desenvolvimento econômico e atua interferindo na
estruturação do espaço urbano, sendo importante em sua reprodução
(CORRÊA, 2003).

A ação do Estado é caracterizada por choques e conflitos de interesses


dos diversos agentes sociais que, juntos com ele, engendram a materialidade
urbana. Desta forma, tende a privilegiar os interesses dos segmentos da classe
dominante, contribuindo assim, para a construção diferenciada do espaço
(ABREU, 1981).

O Estado atua, fundamentalmente, visando criar condições para a


realização e reprodução da sociedade capitalista, ou seja, condições que
permitam que os processos de acumulação e reprodução das classes sociais
ocorram (CORRÊA, 2003).
49

Vale ressaltar que a ação do Estado se processa em três níveis político-


administrativos: federal, estadual e municipal. Em cada um destes diferentes
níveis sua atuação ocorre de maneira distinta. No entanto, no nível municipal
os interesses das classes dominantes se manifestam de maneira mais
marcante, visto que a legislação confere a esta esfera muitos poderes sobre o
espaço urbano. Neste trabalho, a esfera municipal receberá uma maior
atenção, uma vez que as políticas públicas voltadas para a cultura e o lazer
são levadas a cabo principalmente pela municipalidade.

No entanto, outros agentes também participam do processo de


reprodução do espaço urbano. Estes agentes, juntos com o Estado contribuem
para a implementação das mais diversas políticas públicas.

2.1 A ação do poder público na revitalização de áreas: O Estado

empreendedor

É notória a atuação de forma ativa do Estado no processo de


(re)produção do espaço urbano, promovendo diversas repercussões na
dinâmica socioespacial da cidade do Rio de Janeiro. Atualmente, as políticas
públicas, bem como as intervenções urbanas contribuem para reafirmar o papel
do Estado enquanto agente da dinâmica de organização do espaço urbano e
reforçar sua participação na fragmentação deste espaço (CORRÊA, 2007).

Neste contexto, ao impor medidas que facilitem ou dificultem a forma de


ocupação e uso do solo, o Estado apresenta mecanismos para criar condições
para o estabelecimento de infraestruturas favoráveis a determinados grupos
sociais. Desta forma, o Estado pode promover o processo de ocupação ou
renovação de determinada área da cidade, ao instalar novos equipamentos
urbanos. Assim, o Estado, representado sobretudo pelas administrações
municipais, vê-se pressionado pela coletividade a assumir o papel de promotor
do desenvolvimento econômico.
50

No atual processo de reestruturação do capital, as cidades passam a


assumir atribuições que antes pertenciam aos governos nacionais. Para
Compans (2005), as cidades na nova economia se tornam lugares primordiais
para a produtividade e reprodução do modo de produção capitalista.

Então, ultimamente, com o advento desta nova etapa do


desenvolvimento capitalista, as cidades têm se tornado um elemento
indispensável na organização geográfica das grandes empresas. Com isso, as
administrações locais, principalmente as das grandes cidades, surgem como
atores privilegiados para intermediar a negociação entre os interesses do
capital global e o das coletividades, uma vez que os governos locais
apresentam vantagens em relação aos governos nacionais. A principal delas
apresenta-se na correspondência com certas funções administrativas que,
tradicionalmente, conferem às administrações locais (COMPANS, 2005).

Borja e Castells (1997, apud COMPANS, 2005) afirmam que as


administrações locais são mais aptas que os governos nacionais para
possibilitar a inserção das cidades na nova economia globalizada. Segundo os
autores, isto se deve a uma maior adaptabilidade e flexibilidade institucional e
uma maior capacidade de legitimação política, em função da proximidade física
e seus representados.

Desde meados da década de 1970, nos países desenvolvidos, as


formas de intervenção do Estado na organização do espaço urbano vêm
sofrendo uma série de modificações no sentido da flexibilização, sobretudo das
formas de relacionamento entre os setores público e privado. Estas
modificações se processaram nos EUA, de início, para posteriormente se
disseminarem pela Europa (COMPANS, 2005).

A política urbana estadunidense, e sua reorientação, acompanha o


esgotamento do modelo fordista e a crise fiscal do Estado. Neste bojo, medidas
são tomadas a fim de cortar os gastos públicos, dentre elas a
desregulamentação do mercado de trabalho, redução de impostos e a
privatização de empresas estatais, características do neoliberalismo, em um
momento em que aumentam as competências das municipalidades (HARVEY,
2005).
51

No entanto, não se deve atribuir apenas ao neoliberalismo dos governos


nacionais a reorientação da política urbana dos EUA e europeia. Uma
conjunção de fatores estruturais e conjunturais contribuiu para a ocorrência
deste fenômeno. A falência do modelo de financiamento público, a crise do
welfare state e o esgotamento do fordismo enquanto modelo de
desenvolvimento foram preponderantes. Além disso, a relação entre o Estado e
os diferentes atores econômicos se modificou devido à dependência do
primeiro em relação ao financiamento privado (COMPANS, 2005).

O contexto político-institucional no qual surge um modelo de gestão


urbana empresarial semelhante ao observado em cidades estadunidenses e
europeias, no Rio de Janeiro, é marcado por um ideário reformista, o qual
decorre do processo de redemocratização do país e pelo advento do modelo
neoliberal, que leva o governo a promover uma política de abertura comercial,
aliada ao corte de gastos e privatização de empresas estatais (COMPANS,
2005).

Neste contexto, a partir da promulgação da Constituição Federal em


1988, as competências dos municípios brasileiros aumentaram e estes
ganharam uma maior autonomia política, fiscal e financeira. Os municípios
passaram então, a ter competências exclusivas, tais como o ordenamento
territorial, principalmente os grandes centros urbanos, que concentram grande
parte das atividades econômicas se beneficiaram muito desta situação, uma
vez que puderam aumentar suas arrecadações (COMPANS, 2005). No
entanto, concentram também problemas oriundos do processo de urbanização
periférica que caracteriza nossas cidades, tais como a favelização e a
distribuição desigual no espaço de equipamentos e serviços coletivos de
naturezas diversas, dentre eles os espaços de cultura e lazer, que
analisaremos no capítulo seguinte.

Assim, nas ultimas décadas, as cidades vão ser impulsionadas a novos


desafios, passando a oferecer ao capital as condições ideais à sua mobilidade
e gestão, atraindo a localização de uma série de atividades. Neste sentido,
surge a ideia de cidade empreendedorista, “onde se identifica a ressignificação
52

do Estado-Nação, assim como das cidades, tendo estas o status de


protagonistas do desenvolvimento capitalista” (BORGES, 2009, p.62).

Este modelo de cidade, de acordo com Compans (2005), obedece a um


padrão de comportamento dos atores locais, sobretudo a administração
municipal, a qual se faz presente em diversas localidades que adotam o
empreendedorismo como modelo de gestão. De acordo com esta lógica, o
governo municipal deveria ser inovador e empreendedor, a fim de garantir um
futuro melhor para suas populações (HARVEY, 2005).

Este padrão de comportamento, sinalizado por Compans (2005) se


refere ao advento de um protagonismo das administrações locais na promoção
do desenvolvimento econômico, à participação cada vez mais importante do
setor privado na gestão de serviços e equipamentos públicos e à introdução de
uma lógica empresarial na administração dos negócios públicos.

Então, é válido salientar que, nos últimos anos, principalmente nos


países centrais, há um consenso de que as cidades que adotam uma postura
empreendedora conquistam benefícios positivos, no que tange ao seu
desenvolvimento econômico. Neste contexto, o governo local se torna capaz de
imprimir sua marca empreendedora e empresarial, sendo apto a enfrentar a
grande mudança econômica e social provocada pela reestruturação
tecnológica e industrial, característica do período atual, em que o processo de
globalização se faz presente.

Segundo Harvey (2005), a ascensão do empreendedorismo urbano pode


ter tido uma grande importância na transição da dinâmica do capitalismo de um
regime fordista para um regime de “acumulação flexível” (HARVEY, 2007). Este
processo tem como resultantes o aprofundamento do desenvolvimento
geográfico desigual, a compressão do espaço-tempo devido ao avanço
tecnológico e científico dos meios de comunicação, transporte e informação.

Harvey (2005) salienta que a transição do administrativismo urbano para


o empreendedorismo urbano, ocorrida nas últimas décadas, provocou efeitos
reflexivos na economia urbana, através dos impactos sobre as instituições
urbanas, bem como sobre os ambientes urbanos construídos. A cidade (ou
53

parte dela) passa a ser reflexo das práticas empreendedoras adotadas pelo
governo local.

Assim, ainda segundo este autor:

(...) o poder real de organização da vida urbana está em outra parte,


ou, pelo menos, numa coalizão de forças mais ampla, em que o
governo e a administração urbana desempenham apenas papel
facilitador e coordenador (HARVEY, 2005, p.171).

O poder de organizar o espaço, então, é originado em um conjunto de


forças, no qual diversos agentes são mobilizados. Assim, este novo
empreendedorismo urbano apresenta como um elemento primordial a noção de
parceria público-privada, em que os agentes locais se integram com as
administrações locais na busca por financiamentos externos e novos
investimentos diretos. Este instrumento representa o elemento principal para a
consolidação do empreendedorismo urbano. Sobre as parcerias público-
privadas, falaremos mais adiante.

O empreendedorismo urbano envolve certo nível de concorrência


interurbana. Assim, esta concorrência e o empreendedorismo urbano abriram
os espaços urbanos, sobretudo dos países mais avançados, a todos os tipos
de novos padrões de desenvolvimento. O resultado disso, em muitos casos, é
a reprodução em série de centros culturais e de entretenimento, enobrecimento
de áreas degradadas, grandes shopping centers etc. (HARVEY, 2005). No
entanto, sabemos que este processo também ocorre em algumas cidades
brasileiras.

Este autor ainda ressalta que a ascensão do empreendedorismo urbano


contribuiu para a transição do modernismo de base urbana para o pós-
modernismo no que se refere às formas culturais e ao estilo de vida.

Vale dizer ainda que, por outro lado, o empreendedorismo urbano


contribui para aumentar as diferenças de riqueza e renda e ampliar o
empobrecimento urbano, em especial em algumas áreas da cidade, o que
podemos perceber no Rio de Janeiro. Em muitas cidades, projetos bem
sucedidos se contrastam com problemas sociais e econômicos sérios que se
manifestam no espaço urbano, com a regeneração e o desenvolvimento de
54

certas áreas em detrimento de outras circundantes decadentes onde a pobreza


é presente.

Segundo Harvey (2005), a valorização de áreas urbanas degradadas,


aliada à inovação cultural, a melhoria física do espaço urbano, as atrações para
o consumo e entretenimento se tornaram facetas importantes das estratégias
de regeneração urbana, visto que a cidade deve parecer “um lugar inovador,
estimulante, criativo e seguro para se viver ou visitar, para divertir-se e
consumir” (HARVEY, 2005, p.176).

Neste contexto, a cultura e o lazer também se tornam foco dos


investimentos, uma vez que as atividades culturais, de lazer e artísticas são
essenciais para o empreendimento cultural e contribuem para amenizar ou até
mesmo romper com o processo de estagnação econômica de algumas
cidades.

Em grande parte dos projetos de intervenção urbana, sobretudo


naqueles que se referem a áreas de interesse cultural, os usos do espaço
incidem sobre as formas de representação cotidiana e dos modos de vida
urbana. Assim, as políticas culturais são efetuadas no espaço urbano a partir
de intervenções que privilegiam ora programas de requalificação e/ou
renovação de áreas degradadas, ora projetos de construção e restauração de
equipamentos culturais.

As propostas de reabilitação de áreas urbanas, ultimamente, têm


ocupado posição de destaque na dinâmica urbana. Nas últimas décadas, estas
propostas têm incorporado a cultura como um elemento importante. A cultura e
as suas atividades relacionadas, sobretudo a dita “cultura local”, têm se
transformado em mercadoria bastante valorizada no contexto de reabilitação de
áreas e se tornou um diferencial para colocar a cidade em uma melhor posição
perante outras neste cenário marcado pela competitividade entre cidades, ou
seja, no mercado global de cidades (BOTELHO, 2001). Assim, as cidades
acabam por atrair maiores investimentos locais, ampliando o fluxo de capitais,
negócios, informações e turismo.
55

Neste sentido, há uma articulação entre o Estado e a iniciativa privada


em um processo marcado pela formulação de políticas preservacionistas e de
incentivo à cultura e ao lazer a partir da perspectiva do mercado. A política
neoliberal e a regulação do papel do Estado na economia têm deslocado,
ultimamente, algumas antigas funções do poder público para a iniciativa
privada. Neste contexto, de uma política econômica baseada nas questões do
mercado, as políticas urbanas e culturais, que passam a fazer parte da
globalidade (CALABRE, 2009) não fogem à regra.

Sobre as políticas culturais, são entendidas como programas de:

Intervenções realizadas pelo Estado, instituições civis, entidades


privadas ou grupos comunitários com o objetivo de satisfazer as
necessidades culturais da população e promover o desenvolvimento
de suas representações simbólicas. (...) Esse conjunto de iniciativas
comandadas por esses agentes visa promover a produção,
distribuição e uso da cultura, a preservação e divulgação do
patrimônio histórico e ordenamento do aparelho burocrático por ela
responsável (TEIXEIRA COELHO, 1997, p.293 apud COLOMBIANO,
2007, p.34).

A concepção explicitada acima nos permite visualizar o campo de


atuação destas políticas culturais. Estas atuam em diversas instâncias do
processo de organização social.

Já segundo Calabre (2009, p.9):

As políticas culturais, dentro da esfera pública, devem obedecer à


mesma lógica de elaboração que rege o conjunto das políticas
públicas. Estas, de maneira sintética, podem ser definidas como
resultado das atividades políticas – que envolvem diferentes agentes
e, assim, necessitam de alocação de recursos de natureza diversa, e
possuem caráter normativo e ordenador.

É sabido que uma política pública de cultura não se restringe apenas ao


âmbito estatal. Neste processo contínuo, as práticas sociais geradas fora do
controle do poder público também têm importante participação. Ou seja, uma
política cultural deve envolver diferentes áreas de intervenção e pode se
manifestar de maneira isolada ou combinadas entre si. Assim, pode-se afirmar
que estas áreas de intervenção:
56

Abrangem desde políticas que se relacionem expressivamente com o


mercado cultural, incluindo medidas de financiamento e incentivos
fiscais até aquelas práticas que sejam alheias ao mercado dos
produtos culturais ou não tenham atraído o interesse econômico
(COLOMBIANO, 2007, p.43).

Segundo a mesma autora, as principais medidas executadas por uma


política cultural, quer através do poder público ou privado são: implementação
de equipamentos culturais, leis de incentivos fiscais, conservação do
patrimônio edificado, financiamento e patrocínio, dentre outras.

De maneira geral, as políticas culturais atendem a certas prioridades,


quer dando ênfase na instalação de equipamentos culturais no espaço urbano,
quer atendendo às demandas sociais por mais atividades ligadas à cultura.
Assim, elas deveriam estabelecer uma conjugação de manifestações culturais
específicas a determinada realidade socioespacial com os direitos universais
de cidadania. As políticas públicas, de um modo geral, são práticas
democráticas que são capazes de permitir aos cidadãos exercerem seus
direitos como tal.

Desta forma, as políticas culturais assumem uma importância cada vez


maior no contexto das políticas públicas, sendo a cultura um aspecto
fundamental na vida cotidiana da população. No entanto, não é isso que
acontece na prática.

Cumpre ressaltar que, até a década de 1970, as políticas públicas


relacionadas à cultura eram de responsabilidade da esfera federal, as quais se
concentravam no Rio de Janeiro, o que reforçava a ideia da cidade ser capital
cultural e vitrine do país. No entanto, até esta época, a municipalidade pouco
atuava no setor cultural e, por isso, não havia na cidade instituições voltadas
especificamente para o setor cultural.

Assim, a partir da década seguinte, a dinâmica da política cultural


carioca apresenta uma modificação do quadro pré-existente e se torna mais
complexa, uma vez que começam a surgir ações que se voltam à formação de
um conjunto mais expressivo de equipamentos culturais públicos, como centros
57

culturais e teatros, os quais passaram a ser incorporados pela administração


municipal (COLOMBIANO, 2007).

A organização do espaço, no tocante à presença de equipamentos de


cultura e lazer, apresenta uma grande variedade de agentes e dentre eles
podemos citar o próprio Estado, representado pelas três esferas, os
promotores imobiliários, planejadores e os produtores artísticos e culturais.

No entanto, devemos considerar que estes não são os únicos atores


neste processo. Além dos representantes do capital e das forças de mercado,
os moradores da cidade são atores fundamentais e constituem o elemento que
dá vida à cidade, através das suas formas de sociabilidade, deslocamentos e
estilos de vida. Então, as estratégias de reabilitação, implementadas pelo
Estado, com a participação do poder privado, são resgatadas e apropriadas
pelas populações locais que, através de diversas formas e usos se reapropriam
destes espaços reabilitados.

Desta forma, pode-se estabelecer então, que o processo de reprodução


do espaço urbano é uma fonte de conflito de interesses diversos, sendo a
espacialidade um aspecto produzido pelos mais diferentes agentes.

Os projetos contemporâneos de enobrecimento, ou seja, a intervenção


como forma de recuperar um espaço urbano enquanto espaço público de lazer,
entretenimento e consumo da população realçam os aspectos mercadológicos
do patrimônio e alteram o sentido público e político do espaço ao tomar o
cidadão como consumidor desse espaço, atualizando os nexos entre cultura de
consumo e produção de mercadorias (LEITE, 2006). Como exemplo, podemos
citar o projeto do Corredor Cultural, implementado pelo poder público na área
central do Rio de Janeiro.

As políticas de renovação urbana contribuem para a construção de uma


nova imagem da cidade, através da valorização dos usos econômicos do
patrimônio cultural como forma de reativar os fluxos de investimentos para a
economia local. Esta imagem, concebida através de uma visão que entende a
cultura na perspectiva dos resultados econômicos e a cidade como empresa,
prevê a concentração de escritórios de grandes empresas nas áreas
58

reabilitadas. Aliado à presença de bens culturais, a área reabilitada se torna um


espaço central no espaço urbano da cidade, como é o caso de Botafogo, que
apresenta uma grande concentração, quer de sedes de empresas e de
equipamentos culturais e também de lazer e é alvo de políticas urbanas.

O paradigma empreendedorista pensa o espaço urbano como valor de


troca a ser gerido pela cidade-empresa. Neste sentido, a burguesia passa a
exercer um controle mais poderoso sobre o espaço, uma vez que a “ascensão
do empreendedorismo urbano serve para sustentar e aprofundar as relações
capitalistas de desenvolvimento geográfico desigual” (HARVEY, 2005, p. 190) e
isto afeta o desenvolvimento capitalista.

Segundo Compans (2005), este modelo de cidade empreendedorista


obedece a um padrão de comportamento dos atores locais, sobretudo da
administração municipal, o qual se faz presente em diversos locais onde o
empreendedorismo urbano é adotado como paradigma de gestão. De acordo
com a autora, este padrão de comportamento se deve ao advento de um papel
mais dirigente do governo local na promoção do desenvolvimento urbano, além
de uma participação cada vez maior do setor privado na gestão de serviços e
equipamentos públicos.

A gestão empreendedora de cidades sugere uma coalizão de forças (e


não apenas um governo local), que tem como objetivo a atuação conjunta com
o poder local, a iniciativa privada e a sociedade civil. Assim, a parceria público-
privada configura-se como um instrumento bastante utilizado como justificativa
de dinamizar os processos de intervenção urbana, nos quais as administrações
das cidades se unem ao setor privado local a fim de atrair investimentos
externos. Então, é válido afirmar que esta parceria se constitui em um elemento
primordial para o desenvolvimento e consolidação do empreendedorismo
(HARVEY, 2005). Sobre as parcerias público-privadas no processo de gestão
das cidades, trataremos a seguir.
59

2.2 O agente empreendedor privado, as parcerias público-privadas e o

Planejamento Estratégico

O empreendedorismo urbano, de acordo com Compans (2005), sugere a


adoção de alguns novos instrumentos de gestão da cidade e, dentre eles,
encontra-se a parceria público-privada que, segundo Harvey (2005), é o
elemento principal do novo empreendedorismo.

A parceria público-privada se configura na interação entre governo,


através de suas instituições, e iniciativa privada na consecução de objetivos
comuns específicos, nos quais os benefícios são compartilhados, o que confere
à parceria um caráter de sociedade entre as partes (COMPANS, 2005).

Para Vainer (2009, p.87), “a parceria público-privada assegurará que os


sinais e interesses do mercado estarão adequadamente presentes,
representados, no processo de planejamento e de decisão.”

Compans (2005) afirma que a parceria público-privada se justifica,


segundo estudiosos, planejadores e autoridades, pela ausência de
competência técnica e capacidade de gestão das administrações locais para
desenvolver projetos com elevado grau de complexidade ou gerir
equipamentos e serviços públicos de maneira eficiente.

Por outro lado, este instrumento significa, para os atores privados, a


possibilidade de influenciar e exercer competências do setor público e, assim,
reduzir os riscos na realização dos projetos, ficando apenas com os benefícios,
uma vez que os riscos acabam sendo assumidos pelo setor público (HARVEY,
2005). Este tipo de parceria é utilizada, mais comumente, para a
implementação de projetos de urbanização e também percebe-se sua presença
na construção e gestão de infraestruturas e equipamentos coletivos
(COMPANS, 2005).

Devemos citar um outro importante instrumento de gestão da cidade que


compõe o empreendedorismo urbano: o Planejamento Estratégico. Este
60

instrumento busca inserir a cidade na perspectiva competitiva, em um mercado


global de cidades, promovendo uma adaptação do seu espaço físico e de sua
estrutura. Neste contexto, as parcerias público-privadas são consideradas
como um dos principais aspectos do planejamento estratégico.

As cidades competitivas serão aquelas capazes de enfrentar os


desafios dos novos paradigmas trazidos pela revolução tecnológica e
pela globalização: cidades adaptáveis, flexíveis, receptivas e capazes
de inovar (PECRJ, p.18).

Ainda segundo o Plano Estratégico da Cidade do Rio de Janeiro (2004,


p. 18), o plano estratégico de uma cidade:

É um método ou processo que consiste em prever, identificar e


mobilizar potenciais disponíveis e condições favoráveis, tendo por
objetivo direcionar ações táticas, definir linhas estratégicas e
implementar programas e projetos, visando à obtenção de resultados
desejáveis para o futuro de uma cidade.

O texto ainda estabelece que:

Um Plano Estratégico de uma cidade é um pacto social que abrange


uma vasta gama de objetivos intersetoriais, visando mobilizar a
sociedade a pensar, conceber e realizar um futuro desejável e
possível para a cidade.

Um Plano Estratégico envolve governo e sociedade numa interface e


co-responsabilidade pela decisão de novos rumos, ao enfatizar as
relações de intercâmbio, negociação e colaboração entre todos os
seus segmentos representativos (p.18).

Para Borja (1996, p.98):

Plano estratégico é a definição de um projeto de cidade que unifique


diagnósticos, concretize atuações públicas e provadas e estabeleça
um quadro coerente de mobilização e de cooperação dos atores
sociais urbanos.

Segundo Vainer (2009, p.75), o planejamento estratégico está “entre os


modelos de planejamento urbano que concorrem para ocupar o trono deixado
vazio pela derrocada do tradicional padrão tecnocrático-centralizado-
autoritário.” O autor afirma ainda que este modelo vem sendo bastante
difundido em países da América Latina, incluindo o Brasil, através de uma ação
61

combinada de agências multilaterais e de consultores estrangeiros,


principalmente catalães, o que evidencia o sucesso de Barcelona na adoção
deste modelo.

O planejamento estratégico surgiu na década de 1960 como um


instrumento responsável pela organização do setor privado, sobretudo das
empresas estadunidenses, com o intuito de que estas alcançassem um grau
elevado de eficiência e produtividade. Este modelo está ligado diretamente à
gestão urbana empresarial estadunidense, a qual se alastrou pelo mundo como
consequência da hegemonia dos EUA neste contexto de mundo globalizado.

No entanto, apenas duas décadas mais tarde, ele foi adaptado ao setor
público, quando uma série de cidades dos EUA elaborou planos estratégicos a
fim de alavancar o desenvolvimento econômico. Esta aplicação ao setor
público é vista como um esforço para produzir ações e decisões que
norteariam uma cidade, por exemplo, a alcançar seus objetivos (COMPANS,
2005).

Para Borges (2009), o planejamento estratégico, o qual é um modelo


que pensa a cidade de forma fragmentada, através de intervenções pontuais,
buscando dar mais ênfase a locais específicos do espaço urbano, apresenta-se
como uma forma superficial de se mostrar modernizada e parte integrante do
mundo globalizado, já que os problemas sociais urbanos são negligenciados
pelos governos locais.

Para Borja & Castells (1997 apud BORGES, 2009), a conjugação de


alguns pontos será fundamental para a eficácia de um projeto de gestão de
cidades realizado pelo planejamento estratégico. O primeiro se refere à
capacidade de mobilizar os atores urbanos públicos e privados, uma vez que o
consenso se configura na principal força de um plano estratégico. O segundo
deve atuar na construção ou modificação da imagem da cidade no exterior
através da divulgação de uma imagem positiva, o que permite que se atraiam
investidores, visitantes e consumidores, promovendo então, condições
favoráveis aos agentes públicos e privados. Neste sentido, nas palavras de
Borja (1996, p. 86) “um plano estratégico deve construir e/ou modificar a
imagem que a cidade tem de si mesma e a que se tem dela no exterior”. Por
62

fim, o último ponto diz respeito à realização de uma reforma política radical na
administração da cidade.

Já segundo Vainer (2009), o planejamento estratégico deve ser adotado


pelos governos locais, uma vez que as cidades passam a se submeter às
mesmas condições e desafios que as empresas, apresentando-se como tal, ao
se subordinarem à lógica do mercado, e ao transporem para o plano urbano os
princípios de organização e da produção. Desta forma:

(...) ver a cidade como empresa significa, essencialmente, concebê-la


e instaurá-la como agente econômico que atua no contexto de um
mercado e que encontra neste mercado a regra e o modelo do
planejamento e execução de suas ações. Agir estrategicamente, agir
empresarialmente significa, antes de mais nada, ter como horizonte o
mercado, tomar decisões a partir das informações e expectativas
geradas no e pelo mercado. É o próprio sentido do plano, e não mais
apenas seus princípios abstratos, que vem do mundo da empresa
privada (VAINER, 2009, p.86).

Desta forma, a analogia cidade-empresa pode ser caracterizada também


como cidade-empresários. Então, uma nova lógica surge, em um contexto de
transformação da cidade em ator econômico, em que os grupos empresariais
privados se apropriam dos instrumentos de poder público.

Este mesmo autor (VAINER, 2009) afirma ainda que o planejamento


estratégico se caracteriza como a subordinação da cidade à lógica do mercado
e esta se apresenta ainda, como uma mercadoria, a ser vendida em um
mercado competitivo, no qual outras cidades também estão à venda. Vale
ressaltar que a cidade, travestida de mercadoria, tem um público consumidor
bastante qualificado e específico, por isso, o marketing urbano se torna cada
vez mais determinante no planejamento e gestão de cidades.

A cidade seria destinada então, a um grupo específico de compradores,


e ainda através das palavras de Vainer (2009, p.83):

(...) pode-se afirmar que, transformada em coisa a ser vendida e


comprada, tal como constrói o discurso do planejamento estratégico,
a cidade não é apenas uma mercadoria mas também, e sobretudo,
uma mercadoria de luxo, destinada a um grupo de elite de potenciais
compradores: capital internacional, visitantes e usuários solváveis.
63

Borges (2009) nos lembra que a cultura é hipervalorizada nos planos


estratégicos. Neste contexto, Arantes (2009) afirma que esta situação revela
uma possível simulação da realidade, em uma tentativa de se revalorizar a
cultura local, tratando a cidade como uma mercadoria dotada de valor de troca.
No Plano Estratégico da Cidade do Rio de Janeiro “Cidade das Cidades” isto
fica bem claro.

O Plano Estratégico da Cidade do Rio de Janeiro “As Cidades da


Cidade” foi o segundo implantado no Rio de Janeiro e tem como objetivo
determinar metas estratégicas para que a cidade se torne competitiva e
melhore a qualidade de vida a longo prazo, para assim chegar a um projeto
possível de cidade desejada. Este plano dividiu a cidade em regiões, formadas
por grupos de bairros, os quais foram agrupados de acordo com critérios
histórico-geográficos e demográficos comuns e agregou, além da sociedade
civil, os cidadãos. Portanto, este plano considera:

As tendências e vocações de cada região, adotando como principal


fundamento a busca do diálogo direto com a população, através de
Comissões Regionais aberta à participação de qualquer cidadão e
formadas com o objetivo de pensar, conceber e realizar o futuro
desejável e possível para a região e, a partir dela, para a cidade
(PECRJ, 2004, p.36).

O plano buscou evidenciar e valorizar os aspectos culturais de cada


região, para assim, a partir de suas especificidades, serem definidas
estratégias, as quais se articulariam entre si. Neste contexto, a cultura e o lazer
mereceram uma atenção especial, uma vez que foram considerados como
elementos primordiais para o desenvolvimento socioeconômico da cidade.

Assim, segundo o PECRJ (2004), o resgate da história e tradição dos


bairros, a ampliação de equipamentos culturais, a recuperação do patrimônio
degradado, a criação de roteiros culturais, dentre outras medidas tomadas,
foram as ações mais comuns no âmbito da cultura e do lazer. Neste sentido,
então, levando-se em conta estas ações, projetos como a configuração de
polos gastronômicos nos bairros são privilegiados. Em Botafogo, a partir do
decreto nº 24609, de 09/09/2004, foi criado o Polo Gastronômico de Botafogo,
64

que configura-se como tal devido a grande concentração de bares e


restaurantes no interior do bairro, tal como foi implementado na Tijuca.

Estas ações são fruto do objetivo central do plano para a zona sul da
cidade, o qual se caracteriza em consolidar esta região como a vitrine do
turismo nacional e internacional, da cultura e do lazer que, combinadas formam
a imagem da maneira de ser, de se expressar e de viver do carioca,
reconhecida mundo afora como boêmia, espontânea, hospitaleira,
comunicativa, irreverente, cordial e simpática, dentre outros atributos.

De fato, a zona sul é a região da cidade que concentra a maior


quantidade de equipamentos culturais e de lazer da cidade e onde se
expressam com maior clareza as manifestações que marcam a imagem do
carioca. Então, o plano propõe como estratégias revitalizar estas
manifestações e oferecer mais opções de lazer para a população e turistas,
com o intuito de atingir o objetivo central para a região.

Neste sentido, a valorização desta imagem também reconhecida como


uma estratégia, uma vez que esta é considerada como mais um atrativo para a
cidade, um chamariz de turistas. Tal imagem é difundida ao redor do mundo
através da música, carnaval, filmes, novelas, dentre outros meios. Então, pode-
se dizer que a divulgação deste jeito de ser do carioca, que é um orgulho para
a região e para a cidade é fundamental, “devendo ser valorizado a todo custo”
(PECRJ, 2004, p.198).

Assim, a grande concentração de equipamentos culturais e de lazer,


principalmente bares e restaurantes, na zona sul da cidade e, sobretudo em
Botafogo, contribui sobremaneira para o reforço desta imagem do carioca.

Borges (2009) considera que o Planejamento Estratégico caracteriza-se


muito mais como um projeto de marketing, visando promover a cidade
internacionalmente, do que um projeto voltado ao desenvolvimento
socioeconômico da cidade. Para a autora, “vive-se em busca de ocasiões para
negociá-la” (p.93). Então, é neste contexto que se desenvolvem os grandes
eventos, nos quais a cidade é projetada em escala global.
65

Como exemplo de um destes grandes eventos, podemos citar a etapa


carioca da Red Bull Air Race, o campeonato mundial de corrida aérea,
realizada em abril de 2007, na Enseada de Botafogo, a qual reuniu
aproximadamente 1 milhão de expectadores, segundo números fornecidos pela
Polícia Militar, na época, o que se configurou em um recorde de público para a
competição. Em maio de 2010, novamente o Rio de Janeiro foi sede de mais
uma etapa deste campeonato. Desta vez a estrutura foi montada próxima ao
Aterro do Flamengo e, mais uma vez, apesar da chuva que caía
incessantemente no dia, o evento foi sucesso de público. Vale lembrar que,
além dos expectadores presentes in loco, este evento foi transmitido pela
televisão para vários países, o que colocava mais uma vez em evidência a
cidade do Rio de Janeiro em escala mundial.

A realização deste evento em cartões postais da cidade contribui para a


valorização da imagem da cidade no exterior, através de suas belezas naturais,
e faz com que seja vista e vendida de maneira positiva, resultado da estratégia
de marketing promovida pelos seus administradores.

Figura 1 - Etapa carioca da Red Bull Air Race, realizada na Enseada de Botafogo, 2007
Fonte: www.redbulairrace.com

Além de eventos como este, podemos citar ainda os grandes shows,


com artistas nacionais e estrangeiros. A Enseada de Botafogo, ao lado da
Praia de Copacabana são os espaços onde estes shows se realizam com mais
frequência. Em Copacabana se realizam os shows de maior porte, enquanto
66

em Botafogo, os de menor, de âmbito mais local. Dentre eles, podemos


destacar shows promovidos por emissoras de rádio, os eventos evangélicos e
os do Projeto Acquarius.

No entanto, esta política de realização de grandes eventos nestes


espaços tem sido bastante criticada, visto que muitos recursos são
direcionados a estes eventos, enquanto outras áreas que necessitam
realmente de investimentos são preteridas. Outra crítica recorrente vem dos
moradores dos arredores da Enseada de Botafogo, que reclamam do caos que
se transforma o trânsito, do lixo deixado pelo caminho, do barulho excessivo,
dentre outros distúrbios.

A prefeitura se justifica afirmando que este tipo de show traz retorno


financeiro, uma vez que aumentam as vendas no comércio e,
consequentemente, a arrecadação de impostos. Além disso, permite a uma
parcela da população a possibilidade de assistir gratuitamente a um evento
desta natureza, proporcionando momentos de lazer que, em outras condições
não seriam capazes de ter.

Então, nota-se no atual modelo de gestão uma grande parceria com o


setor privado e uma articulação importante do mercado com as atividades
culturais e de lazer e com os espaços institucionalizados, como teatros,
cinemas e centros culturais. Logo, nesta expansão da temática cultural na
gestão urbana, o Estado atua através de ações como os incentivos fiscais e
políticas públicas que privilegiam e promovem este setor. Por outro lado, a
iniciativa privada, ao investir nesta área, busca um retorno da imagem
institucional e uma autopromoção, através do marketing (COLOMBIANO,
2007).

De um modo geral, as empresas privadas adotam como práticas mais


comuns quando se interessam em investir em cultura o patrocínio a projetos e
a gestão de uma marca própria. Assim, elas passam a se responsabilizar pela
elaboração e execução de seus projetos. No caso de Botafogo, podemos citar
como exemplo, o caso os cinemas do Grupo Estação e o Unibanco Arteplex,
controlados pelo Instituto Moreira Salles do Unibanco, que recentemente se
fundiu com o Itaú. Isto demonstra a aproximação da iniciativa privada com as
67

atividades culturais e de lazer, neste contexto atual de reestruturação


econômica.

Podemos nos lembrar ainda do exemplo do Canecão, casa de shows em


Botafogo, que recentemente fechou suas portas e que, durante os últimos anos
de sua existência, expunha as marcas da Embratel e, posteriormente, da
Petrobras.

No entanto, não são apenas as grandes empresas aquelas que investem


neste ramo, apesar de, no Brasil, existir uma fraca tradição de investimentos de
recursos privados, oriundos de pessoas físicas, na área cultural (BOTELHO,
2001). Segundo a autora, nos EUA, as pessoas físicas são os maiores
financiadores da cultura, com valores que ultrapassam a soma do que é
investido pelos poderes públicos e pelas empresas. Em suas palavras:

Este é um público-alvo fundamental, principalmente quando se trata


de projetos de visibilidade mais restrita, aqueles que provavelmente
não interessarão a grandes empresas, mas que podem ser
extremamente relevantes para grupos ou comunidades específicas. A
escolha do indivíduo é por aquilo que lhe é mais próximo, por aquilo
com o qual mais se identifica e pelo qual ele se dispõe não só a
investir, mas também a lutar. Por isso o investidor individual é a fatia
que o Brasil precisa conquistar na ampliação dos parceiros do jogo
nesta articulação de esforços que, cabe insistir, têm de ser
articulados por uma política pública criteriosamente escolhida
(BOTELHO, 2001, p.14).

Neste sentido, pessoas físicas, as quais constituem firmas,


principalmente atores, vêm cada vez mais investindo, com capital próprio, na
criação, sobretudo, de centros culturais e teatros, transformando-se em
“empreendedores do mundo das artes”, movidos, segundo eles próprios, pelo
amor a arte e, portanto, sem a expectativa de retorno financeiro.

Em Botafogo, o Teatro Poeira, localizado na rua São João Batista e


inaugurado em 2005, é um exemplo deste tipo de empreendimento. O teatro,
que também sedia oficinas, encontros teóricos e outros projetos, é
administrado pelas atrizes Andrea Beltrão e Marieta Severo que, segundo elas,
em recente entrevista ao Jornal Extra, gastaram R$ 1,5 milhão na compra e
reforma do antigo sobrado. A iniciativa é fruto da vontade das atrizes de
68

contribuírem de outras formas com as artes, e não só como atrizes, mas


também como formadoras de profissionais da área artística.

Exemplos como este podem ser encontrados em outras áreas da cidade,


como é o caso do Teatro Rival, na Cinelândia e o Galpão Gamboa, no bairro de
mesmo nome, iniciativas também lideradas por atores.

Como estas iniciativas, existem outras que contribuem para que a zona
sul carioca, em especial Botafogo, concentre grande parte dos equipamentos
de cultura e lazer na cidade. Sobre isto, trataremos no capítulo seguinte.
69

3 OS ESPAÇOS DE CULTURA E LAZER EM BOTAFOGO

Este capítulo se propõe a identificar e apontar a natureza dos diferentes


tipos de espaços de cultura e lazer em Botafogo, sua distribuição espacial e
defini-los em função dos novos paradigmas, relacionando-os com a cidade no
contexto da globalização. Desta forma, é possível analisar o que estes espaços
significam para a cidade e sua economia urbana.

3.1 Os espaços de cultura e lazer no contexto da globalização

O sistema capitalista tem passado por profundas transformações ao


longo das últimas décadas, principalmente a partir do advento de sua fase
informacional (SANTOS, 2006). Logo, é possível afirmar que a globalização é
um processo real e significativo, que tem um alcance mundial e está
diretamente vinculado à expansão deste sistema econômico.

No entanto, não devemos ver a globalização apenas como um processo


meramente econômico. Apesar de ser no plano da economia que ela
apresenta-se de maneira mais marcante e onde as transformações são mais
freqüentes, perceptíveis e mensuráveis, não podemos deixar de considerar as
transformações que ocorrem na dimensão socioespacial, política e cultural,
ensejadas pela globalização. Este processo influi, portanto, em todas as
esferas da sociedade contemporânea, uma vez que a economia ocorre na
sociedade e no espaço (BELL, 1977).

Então, a globalização, entendida como um processo histórico, deve ser


analisada levando-se em consideração todas estas dimensões que, por sua
vez, perpassam pela dimensão espacial, visto que as manifestações sociais,
políticas, culturais e econômicas se manifestam no espaço.

Segundo Sassen (1998), para compreendermos o novo papel da cidade


na economia mundial, devemos considerar o grande crescimento do processo
70

de globalização, potencializado a partir da década de 1980. Este processo


provocou um aumento no volume das transações internacionais, com o
crescimento cada vez maior da participação de empresas transnacionais de
grande porte e o consequente aumento dos serviços às empresas e dos
serviços avançados.

A autora afirma que, apesar deste aumento da complexidade das


operações decorrentes, estas também atuam em escalas geográficas e grau de
complexidade menores e dá como exemplo as empresas que atuam em escala
regional.

Neste sentido, pode-se afirmar que a globalização se torna, no


entendimento da autora, uma questão de escala e de ampliada complexidade,
uma vez que há um grande crescimento na demanda por serviços por parte
das empresas, sendo a cidade o local preferido para a produção e
desenvolvimento dos serviços. Tal fato nos permite estabelecer então, que há
um processo de formação de uma nova economia urbana, baseada na
atividade terciária. A expansão deste setor de serviços apresenta-se como uma
característica comum a países desenvolvidos e subdesenvolvidos, como vimos
no primeiro capítulo.

Então, atualmente, com os mercados cada vez mais globalizados e a


economia internacionalizada, percebe-se uma nova dinâmica das atividades
econômicas, o que provoca efeitos em alguns setores da nova economia
urbana. A grande competitividade, característica do mercado nos tempos
atuais, faz com que estes setores e suas atividades passem por
transformações, tais como a fusão de empresas. Estas, por sua vez, ou se
adaptam à nova realidade ou são substituídas por aquelas que têm uma maior
capacidade de atração de investimentos.

Podemos citar como exemplo as lojas que atendem a população dos


bairros, ou seja, aquelas que atendem a uma demanda local, bem restrita.
Estas acabam sendo substituídas por lojas de maior porte, de marcas
reconhecidas. Outro exemplo que podemos considerar é o de atividades
ligadas ao lazer e à cultura, como os bares e os cinemas. Neste caso, percebe-
se a presença cada vez mais marcante de grandes redes nacionais e
71

internacionais. Em Botafogo, podemos visualizar tal fenômeno, na rede


internacional de cinemas Cinemark, que chegou ao bairro para ocupar a lacuna
deixada por antigos cinemas tradicionais que existiam no bairro. Também
verificamos a presença de novos bares e restaurantes, voltados a uma clientela
mais refinada, em substituição àqueles mais tradicionais ou que atendiam a
uma demanda menos exigente. Cumpre relembrar que, como vimos no
primeiro capítulo, com o advento da sociedade de serviços, as pessoas
passam a gastar mais tempo e dinheiro com artigos de luxo e atividades que
contemplam o lazer.

Nesta primeira década de século XXI, vemos que a globalização é um


processo irreversível. De acordo com Bauman (1999, p. 7), “estamos todos
sendo globalizados”. Neste sentido, ser local em mundo cada vez mais
globalizado é estar fora do contexto, ou então nas palavras do autor
supracitado (p.8) “é sinal de privação e degradação social”. Ou seja, aqueles
que não acompanham o avanço da sociedade e da economia perdem espaço
neste mundo competitivo.

Desta forma, pode-se dizer que a globalização promove um


distanciamento entre as elites, as quais já se encontram globalizadas, ou seja,
no atual ritmo do mundo, e o restante da população, ainda muito ligado às
questões locais, sem acesso, portanto, às benesses que a globalização traz.

Para Ortiz (1994), há uma distinção entre globalização e mundialização.


Para ele, o processo de globalização se refere aos aspectos econômicos e
tecnológicos, cujos mecanismos são os mesmos para o mundo inteiro. No
entanto, a mundialização se refere à cultura e expressa o processo de
globalização.

Contudo, esse autor considera que embora a mundialização atinja os


países de maneira distinta, ela envolve uma espécie de “padrão civilizatório”,
que comporta uma variada gama de símbolos, os quais são compartilhados por
indivíduos das mais diferentes partes do mundo. Estes símbolos são
constituídos por objetos de consumo, os quais são gerados no bojo do
mercado mundial globalizado e se vinculam ao espaço também globalizado.
72

Severiano e Estramiana (2006) estabelecem que os produtos culturais


estão subordinados à lógica do capital por se associarem à lógica do mercado
globalizado, transparecendo sua faceta de mercadoria. Neste sentido, os
autores afirmam que “na pós-modernidade, a dita centralidade da cultura não
significa sua autonomia, mas a excessiva utilização de símbolos culturais a
serviço do mercado” (p.63).

Podemos utilizar como exemplo o tão famoso jeito de ser do carioca,


propagado mundo afora como sendo alegre, irreverente e cordial, utilizado pelo
Plano Estratégico da Cidade do Rio de Janeiro como um aspecto a ser
explorado, com o intuito de atrair turistas para a nossa cidade (PECRJ, 2004).
Valorizar este modo de viver a vida do carioca e utilizá-lo com o produto
cultural torna-se importante neste sentido e configura-se como uma estratégia
de mercado fundamental para as pretensões dos empreendedores. E neste
contexto, os espaços de cultura e lazer são elementos primordiais para a
consolidação desta imagem, uma vez que é neles que esta também se
expressa.

Este exemplo se encaixa no que Ortiz (1994) denomina segmentos


mundializados, uma vez que a segmentação se daria no interior de um país (no
caso da cidade do Rio de Janeiro, em uma região: a zona sul), de acordo com
as características inerentes a seus diferentes consumidores. No entanto, estes
objetos de consumo não se distribuem e não são consumidos de maneira
homogênea por toda a população do planeta e, sequer do país e mesmo da
cidade. Há uma diferenciação do consumo entre as classes sociais. As classes
mais altas da sociedade têm muito mais acesso à oferta destes objetos e,
consequentemente, acabam consumindo mais, inclusive cultura,
caracterizando o consumidor mais-que-perfeito definido por Santos (2007).
Desta forma, Severiano e Estramiana (2006, p.66) estabelecem que “a
globalização se refere a uma expansão do capital no nível da oferta e não,
necessariamente, da demanda”.

Então, estas preferências de consumo, a adoção de um estilo de vida e


o consumo de determinados serviços nos permite visualizar as diferenças e a
distância existente entre as classes mais altas e as mais baixas. Estas
73

diferenças se refletem no espaço urbano e na forma como as classes o


consomem. Os espaços de cultura e lazer em Botafogo são exemplos bem
claros desta situação. Como veremos adiante, estes são mais consumidos por
grupos sociais pertencentes às camadas mais elevadas da sociedade.

Vivemos em uma sociedade de consumo, a qual propicia algumas


mudanças nos equipamentos comerciais, de serviços, de cultura, lazer, enfim,
terciários, os quais passam a se preocupar também na atração de mais
consumidores através de ações e estratégias específicas, como combinar sua
atividade fim à prestação de novos serviços, com o intuito de proporcionar um
ambiente favorável e de prazer aos consumidores. Tal fato reitera o que foi
explicitado acima, em que a expansão da oferta se faz presente e faz com que
os consumidores sejam atraídos por esta nova cultura do consumo. Assim, a
partir da criação destes ambientes, se reforça a ligação entre o consumo e o
lazer (CACHINHO; SALGUEIRO, 2009), uma vez que o consumo, além de uma
necessidade dos tempos atuais, se torna também uma prática de lazer.

Canclini (1999) afirma que as grandes cidades são lugares onde os


movimentos globalizadores se manifestam de forma mais clara no âmbito da
indústria e das finanças, nas comunicações, nos serviços etc.. Com isso, as
transformações no espaço, sobretudo o espaço público, nos permitem
compreender as tendências destes movimentos e sua relação com a cultura
local. No caso carioca e, sobretudo de Botafogo, isto se manifesta a partir da
requalificação e refuncionalização de espaços e neste sentido, atividades
relacionadas à cultura e ao lazer assumem papel fundamental neste processo,
uma vez que expressam as características mais marcantes do jeito de ser do
carioca.

Para o autor supracitado, nos últimos anos, as redes de comunicações,


bibliotecas, os centros comerciais e, mais recentemente, as grandes
multissalas de cinema se redistribuíram através do espaço urbano. No entanto,
no caso da cidade do Rio de Janeiro, foi uma redistribuição desigual, uma vez
que algumas áreas da cidade apresentam grandes concentrações destas
atividades, enquanto outras não as recebem. O mesmo autor afirma ainda que
muitas destas ofertas culturais têm a propriedade de se vincular a setores da
74

população com experiências internacionais, ou seja, os estratos mais altos da


sociedade. Assim, a cidade pode ser entendida como um lugar no qual se
concentram informações, espetáculos internacionais e inovações e imaginários
globalizados (CANCLINI, 1999). Para o autor, as atividades ligadas ao
entretenimento estão dentre as que se desenvolvem com mais dinamismo.

Para Santos (1993), o espaço também se globaliza, se adapta à nova


era. Segundo o autor:

Atualizar-se é sinônimo de adotar os componentes que fazem de uma


determinada fração do território o locus de atividades de produção e
de troca de alto nível e por isso considerados mundiais. Esses
lugares são espaços hegemônicos em que se instalam as forças que
regulam a ação em outros lugares (SANTOS, 1993. p.17).

Sobre o conceito de espaço, trataremos a seguir, assim como os de


cultura e lazer.

3.2 Considerações sobre espaço, cultura e lazer

As diferentes concepções de espaço tal como os geógrafos entendem


como nos aponta CORRÊA (1995) estão vinculadas às diversas correntes do
pensamento geográfico.
Na década de 1970 ocorreu o surgimento da chamada geografia crítica
fundamentada no materialismo histórico e na dialética, como entre outros,
aponta CORRÊA (1995). O espaço, de acordo com esta concepção, passa a
ser entendido como espaço social, pois não é uma extensão preexistente, mas
algo constituído pelas coisas. O espaço torna-se o espaço construído pela
sociedade. Ele é parte concreta de uma sociedade, ou seja, representa a
dimensão espacial da sociedade. Desse modo, não é externo, não é palco, e
sim elemento componente da sociedade, como as pessoas, a cultura, a
economia, a história, a política e outros. Conforme aponta CORRÊA (1995,
p.25):
75

o espaço entendido como espaço social, em estreita correlação com


a prática social não deve ser visto como espaço absoluto, nem como
um produto da sociedade. O espaço não é nem o ponto de partida –
espaço absoluto, nem o ponto de chegada – espaço como produto
social.

Portanto, compreender o espaço como elemento constitutivo da


sociedade abre uma via extremamente rica e importante para o entendimento
da realidade.
Na perspectiva de uma Geografia crítica, Santos (2008b) apresenta o
espaço como fator social e não apenas um reflexo social e ressalta que o
espaço deve ser analisado a partir das categorias estrutura, processo, função e
forma. O espaço segundo SANTOS (2008b, p.153) se apresenta como:

um conjunto de relações realizadas através de funções e de formas


que se apresentam como testemunho de uma história escrita por
processos do passado e do presente. Isto é, o espaço se define como
um conjunto de formas representativas de relações sociais do
passado e do presente e por uma estrutura representada por relações
sociais que estão acontecendo diante de nossos olhos e que se
manifestam através de processos e funções. O espaço é, então, um
verdadeiro campo de forças cuja aceleração é desigual. Daí porque a
evolução espacial não se faz de forma idêntica em todos os lugares.

A contribuição de Milton Santos através de sua vasta obra para a


discussão do conceito de espaço é enorme. Em Santos (2006), o espaço é
discutido como sendo um conjunto indissociável de sistemas de objetos e
sistemas de ações. Assim, de acordo com suas palavras:

O espaço é formado por um conjunto indissociável, solidário e


também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações,
não considerados isoladamente, mas como o quadro único no qual a
história se dá. No começo a natureza era selvagem, formada por
objetos naturais, que ao longo da história vão sendo substituídos por
objetos fabricados, fazendo com que a natureza artificial tenda a
funcionar como uma máquina. Através da presença desses objetos
técnicos – estradas de rodagem, fábricas, fazendas, portos, cidades,
o espaço é marcado por esses acréscimos, que lhe dão um conteúdo
extremamente técnico (SANTOS, 2006, p. 63).

Os sistemas de objetos condicionam a forma como se dão as ações e o


sistema de ações leva à criação de objetos novos ou se realiza sobre objetos
preexistentes. É assim que o espaço encontra a sua dinâmica e se transforma,
76

conforme indica SANTOS (2006). Assim, objetos e ações interagem de


maneira contínua. Os objetos podem condicionar a forma como as ações
ocorrem, enquanto estas conduzem à criação de novos objetos ou até mesmo
se realizam sobre aqueles pré-existentes, conferindo-lhes sentido.
Os modos de organizar a sociedade no espaço são produzidos de
maneiras diferentes, uma vez que há esta integração entre a materialidade dos
objetos e a subjetividade das ações humanas. Desta forma, esta integração
permite compreender o espaço, sua natureza e dinâmica. Então:

Ao nosso ver, a questão a colocar é a da própria natureza do espaço,


formado, de um lado, pelo resultado material acumulado das ações
humanas através do tempo e, de outro lado, animado pelas ações
atuais que hoje lhe atribuem um dinamismo e uma funcionalidade.
Paisagem e sociedade são variáveis complementares cuja síntese,
sempre por refazer, é dada pelo espaço humano.
Os movimentos da sociedade, atribuindo novas funções às formas
geográficas, transformam a organização do espaço, criam novas
situações e ao mesmo tempo novos pontos de partida para um novo
movimento. Por adquirirem uma vida, sempre renovadas pelo
movimento social, as formas – tornadas assim formas-conteúdo -
podem participar de uma dialética com a própria sociedade e assim
fazer parte da própria evolução do espaço (SANTOS, 2006, p. 106).

Podemos perceber esta relação em nossa área de estudo, uma vez que,
em Botafogo, há uma grande quantidade de prédios datados de outras épocas
e que hoje passam a abrigar bares, restaurantes, teatros, centros culturais,
conferindo uma nova função a estes prédios e contribuindo, sobremaneira,
para a transformação do espaço de Botafogo.
O espaço, para este autor, adicionalmente:

é um sistema de valores que se transforma permanentemente.


O espaço uno e múltiplo, por suas diversas parcelas, e através do
seu uso, é um conjunto de mercadorias, cujo valor individual é função
do valor que a sociedade, em um dado momento, atribui a cada
pedaço de matéria, isto é, cada fração da paisagem (SANTOS, 2006,
p. 104).

É esta sociedade que anima as formas espaciais, atribuindo-lhes um


conteúdo, uma vida. Uma casa vazia ou um terreno baldio, um lago, uma
montanha são transformados em espaços a partir do momento em que lhes
são atribuídos determinados valores. O espaço é a síntese, sempre provisória,
entre o conteúdo social e as formas espaciais.
77

Torna-se pertinente, neste trabalho, evidenciar a necessidade de


relacionar as manifestações e dimensões culturais com este conteúdo social e
as classes e grupos que o constituem, uma vez que a discussão sobre cultura
pode nos ajudar a pensar sobre a realidade social do Rio de Janeiro.

Pode-se dizer que, quando falamos em cultura, falamos de um termo


carregado de complexidade e inúmeras contradições (CHAUI, 2000). A cultura
é capaz de possuir conotações e significados distintos, em períodos e espaços
variados. Assim, cada cultura é resultado de uma história particular, e isso
também inclui suas relações com outras culturas, que podem apresentar
características distintas. Vale ressaltar que, neste sentido, cultura está sendo
tratado como tudo aquilo que é característico de uma população ou grupo
humano. Já para Botelho (2001), a cultura é tudo que o ser humano elabora e
produz, simbólica e materialmente falando.

Assim, de modo geral, a cultura é entendida como um conjunto de


conhecimentos absorvidos pelo ser humano enquanto ser social, “é uma
dimensão do processo social, da vida de uma sociedade” (SANTOS, 2010, p.
44). Desta forma, devemos estar atentos para não confundirmos o cultural com
o social.
De uma maneira geral, a cultura está muito associada a estudo,
educação, formação acadêmica. Muitas vezes fala-se em cultura para se referir
exclusivamente às diversas manifestações artísticas, tais como o teatro e a
música, por exemplo. A cultura também é identificada através das festas, modo
de se vestir e alimentar, do idioma de um povo.
O termo cultura é de origem latina e seu significado original se relaciona
às atividades agrícolas. O significado do termo foi se ampliando e passou a se
referir também ao refinamento pessoal, sofisticação pessoal, educação de uma
pessoa (SANTOS, 2010). Estes significados têm sido usados até hoje.
Segundo Chauí (2000), para a antropologia, pode-se definir a cultura sob
três perspectivas. A que nos interessa, entende-a como um:

Conjunto de práticas, comportamentos, ações e instituições pelas


quais os humanos se relacionam entre si e com a Natureza e dela se
distinguem, agindo sobre ela ou através dela, modificando-a. Este
78

conjunto funda a organização social, sua transformação e sua


transmissão de geração a geração (CHAUI, 2000, p. 295).

Já segundo Aranha e Martins (2007), para a antropologia, a cultura


assume vários significados e se refere a tudo que o ser humano produz ao
construir sua existência, ou seja, as práticas, as teorias, as instituições etc.. As
autoras afirmam que seu contato com o mundo é feito através dos símbolos e,
neste caso, “a cultura é o conjunto de símbolos elaborados por um povo”
(ARANHA; MARTINS, 2007, p. 25).
As autoras atentam para a infinita possibilidade humana de simbolizar.
Por isso, as culturas são múltiplas e variadas e representam inúmeras
maneiras de pensar, se expressar e agir. Assim, as manifestações artísticas,
maneiras de trabalhar e de ocupar o tempo livre se transformam.
De acordo com Botelho (2001), em sua dimensão antropológica, a
cultura se produz através da interação social dos indivíduos, que elaboram
seus modos de pensar e sentir, constroem seus valores, manejam suas
identidades e diferenças e estabelecem suas rotinas. Assim, cada indivíduo
ergue à sua volta, e em função de determinações de tipos diversos, pequenos
mundos de sentido que lhe permitem uma relativa estabilidade.
Chauí (2000) prossegue seu pensamento afirmando que “a cultura é a
maneira pela qual os humanos se humanizam por meio de práticas que criam a
existência social, econômica, política, religiosa, intelectual e artística” (CHAUI,
2000, p. 295).
Desta forma, Santos (2010) aponta para a existência de duas
concepções básicas de cultura. A primeira se refere a todos os aspectos de
uma dada realidade social, enquanto a segunda diz respeito às crenças, ideias,
ou seja, ao conhecimento de um povo. Neste trabalho, nos remetemos mais à
primeira concepção, uma vez que, de acordo com ela, “cultura diz respeito a
tudo aquilo que caracteriza a existência social de um povo ou nação ou então
de grupos no interior de uma sociedade” (SANTOS, 2010, p.24). Assim,
poderemos falar na cultura carioca.
A cultura pode se referir também à “alta cultura”, a qual corresponde à
cultura dominante, aquela característica das camadas dominantes da
sociedade (SANTOS, 2010).
79

Nos últimos anos, segundo Colombiano (2007), as definições de cultura


e lazer, visto como entretenimento, começam a se confundir. A autora
estabelece que, uma vez que há uma forte interdependência destes elementos,
em diversas ocasiões o lazer (entretenimento) é visto como um mero
passatempo, uma questão sem muito valor. No entanto, atualmente, este
elemento torna-se fundamental na vida em sociedade, se configurando em um
fenômeno social.
As preocupações com o lazer e seus espaços não são recentes. No
Brasil, as primeiras iniciativas de intervenção relacionadas ao controle e
organização das atividades de lazer remontam ao século XIX, em seu quartel
final, notadamente na cidade do Rio de Janeiro, a antiga capital. Estas
iniciativas iniciais têm origem na preocupação com o tempo livre dos cidadãos
e em decorrência do surgimento das primeiras organizações de trabalhadores
(MELO, 2008).
O contexto de modernização da sociedade brasileira, na época,
contribuiu para que os momentos de vida festiva, de entretenimento, se
tornassem importantes para as grandes cidades, as quais observavam um
grande crescimento urbano e populacional. Neste contexto, o que o autor
supracitado denomina “mercado de diversões” passou a ser mais buscado,
inicialmente com o teatro e depois com o cinema.
Camargo (2006) afirma que o lazer se beneficiou da redução da jornada
de trabalho e pode ser considerado, portanto, fruto do trabalho. Neste contexto,
Freitas e Nacif (2005, p. 15) estabelecem que “é do peso do trabalho como
sacrifício que emerge a importância do lazer – este espaço de liberdade e
expressão forjado pela imposição do trabalho e da utilidade”. No entanto,
Camargo (2006) complementa dizendo que o lazer também se beneficiou da
redução do tempo gasto com outras atividades e necessidades
complementares, tais como a alimentação e o sono. Desta forma, o autor
define o lazer como um conjunto de atividades:

(...) prazerosas, voluntárias e liberatórias, centradas em interesses


culturais, físicos manuais, intelectuais, artísticos e associativos,
realizadas num tempo livre roubado ou conquistado historicamente
sobre a jornada de trabalho profissional e doméstico e que interferem
no desenvolvimento pessoal e social dos indivíduos (CAMARGO,
2006, p. 97).
80

No entanto, Melo (2008) alerta para a necessidade de analisar o assunto


de uma forma mais crítica, não considerando o lazer apenas como um conjunto
de atividades com o único intuito de passar o tempo. Camargo (2006)
estabelece que nas escolhas de lazer, há a necessidade da busca do prazer,
para se obter um relaxamento agradável, principalmente após um grande
esforço ou um extenuante dia de trabalho. O lazer se configuraria em um
elemento compensatório deste esforço realizado.
Para Freitas e Nacif (2005), o lazer se tornou a atividade que atingiu o
maior crescimento entre aquelas que podem ser consideradas exteriores ao
trabalho ou aquelas que ocupam o tempo livre, cuja extensão se deve aos
avanços tecnológicos e, em grande parte, à mobilização de empresários que
vislumbram a necessidade de se estender o tempo de consumo do lazer, o que
expressa o momento atual em que vivemos, no qual a globalização se faz
presente promovendo transformações na sociedade.
O autor afirma ainda que o lazer se caracteriza por um tempo precioso
voltado ao exercício do conhecimento e da satisfação de uma curiosidade
intelectual e pode ser materializado através de uma conversa aparentemente
banal com os amigos, por exemplo. Nesta atividade de lazer, há um marcante
conteúdo de sociabilidade, refletido no contato com os amigos, parentes,
colegas de trabalho etc.. Desta forma, consideram-se as atividades de lazer
como sendo representações sociais, pois propiciam o estreitamento de
relações sociais de amizade, romance, dentre tantas outras. Ainda de acordo
com Camargo (2006, p. 25), fala-se em “atividades associativas de lazer, para
exprimir o interesse cultural no contato com as pessoas”.
Estas atividades, através das quais a sociabilidade é estabelecida são
realizadas nos diferentes espaços de lazer, como os bares e restaurantes.
Então, podemos afirmar que estes espaços de lazer se tornam os espaços
onde se exerce o direito ao lazer e seu consumo. O lazer é considerado, hoje,
uma das formas de consumo e suas iniciativas e momentos apresentam-se,
atualmente, como uma dimensão fundamental da vida social dos cidadãos.
No entanto, o acesso a este consumo é bastante restrito no Brasil e, em
especial, na cidade do Rio de Janeiro. As oportunidades de acesso ao
consumo do lazer se desenvolvem de maneira seletiva, visto que só é
81

acessível em total plenitude às camadas mais elevadas da sociedade, ou seja,


a uma pequena parcela da população. Tal situação reflete a estrutura
socioespacial da metrópole carioca, que apresenta uma evidente segmentação
de classes, como as demais metrópoles brasileiras.
Contudo, ultimamente, verifica-se que a demanda pelo acesso ao
consumo do lazer e seus equipamentos e aos bens culturais por parte das
camadas mais pobres da sociedade vem aumentando, já que temos
observado, nos últimos anos, uma melhora nas condições de vida e aumento
da renda média de parte desta população oriunda das classes menos
abastadas.
Estas classes, muitas vezes representadas por associações
comunitárias, consideram as iniciativas de cultura, lazer e também esportivas
como essenciais, já que estas ações, por serem frequentemente relacionadas à
educação e à ocupação do tempo livre, têm a capacidade de se contrapor à
violência a que estão expostas estas populações, principalmente as crianças e
os jovens.
Uma vez mantido o caráter compensatório em relação ao trabalho,
segundo Freitas e Nacif (2005), o lazer oferece ao indivíduo a possibilidade de
ele ser o mais autêntico possível, visto que, neste sentido, ele estaria livre das
pressões sociais. As atividades de lazer, por sua vez, são restritas, como
abordamos anteriormente, ainda mais se levarmos em consideração as
desigualdades no que diz respeito à oferta de equipamentos e a concentração
dos espaços de lazer nas áreas onde vivem populações mais abastadas da
cidade e os custos das respectivas atividades, as quais nem sempre podem ser
consumidas pelas populações que não habitam estas áreas.
No Rio de Janeiro, a concentração destes espaços em algumas áreas
da cidade, sobretudo no Centro e na zona sul, em especial Botafogo, nossa
área de estudo, é bem marcante. Na seção seguinte, abordaremos esta
questão.
82

3.3 Os espaços de cultura e lazer em Botafogo

Vale destacar neste momento a relevância de Botafogo no que tange à


concentração de espaços de lazer e cultura em relação a outras áreas da
cidade e ainda, identificar no interior do bairro as áreas de maior concentração
destes espaços.
A distribuição espacial dos equipamentos de cultura e lazer e da
infraestrutura urbana está inserida na organização espacial da cidade do Rio
de Janeiro, que se traduz pela “expressão da produção material do homem,
resultado de seu trabalho social. Como tal, refletirá as características do grupo
que a criou” (CORRÊA, 2007, p.55). Esta distribuição reproduz, então, as
desigualdades sociais decorrentes desta organização espacial, expressando,
assim, uma espacialidade resultante do próprio processo de expansão do
tecido urbano.
Desta forma, verifica-se que as iniciativas de implementação de
equipamentos de cultura e lazer pelos diversos agentes reforçam alguns
elementos da dinâmica urbana, tais como a fragmentação e a articulação da
malha urbana, o que gera uma forma espacial específica, a qual é resultante da
distribuição destes equipamentos pela cidade.
Assim, observa-se a partir da análise de dados fornecidos pelo IPP
(Instituto Pereira Passos) que há uma concentração destes equipamentos em
áreas da cidade onde a população é menor, ou seja, no Centro e na zona sul e
nota-se um número reduzido de equipamentos culturais nas áreas onde a
população é maior, isto é, nas zonas norte e oeste. Segundo a fonte utilizada,
os equipamentos culturais correspondem a museus, bibliotecas populares e
especializadas, escolas e sociedades musicais, galerias de arte, teatros e salas
de espetáculo e cinemas.
Neste sentido, a Região Administrativa de Botafogo aparece como a
segunda RA, no contexto da cidade, que mais concentra estes equipamentos,
atrás apenas do Centro, área tradicional de concentração deste tipo de
equipamento, conforme indicado no gráfico 1.
83

Gráfico 1 - Equipamentos culturais, segundo as Áreas de Planejamento – Rio de


Janeiro, 2004
Fonte: INSTITUTO MUNICIPAL DE URBANISMO PEREIRA PASSOS, 2010

No que diz respeito às salas de cinema, conforme podemos ver no


gráfico 2, Botafogo conta com o total de 22, sendo o segundo bairro do Rio de
Janeiro com o maior número de cinemas, atrás apenas da Barra da Tijuca, que
possui 45 salas. No entanto, Botafogo merece destaque, pois apresenta uma
maior variedade no que tange à variedade de tipos de salas de cinema. No
referido bairro, encontramos ainda cinemas de rua, ao contrário da Barra da
Tijuca, onde os cinemas estão confinados nos shopping centers. Vale ressaltar
que durante o Festival do Rio de Cinema 2010, realizado entre os dias 23 de
setembro e 7 outubro deste ano, grande parte das atrações se realizaram em
cinemas localizados em Botafogo. Junto com o Centro e com a Gávea,
Botafogo foi o bairro que dispôs de salas de cinema no evento.
84

Gráfico 2 - Cinemas por número de salas, segundo os bairros do Rio de Janeiro, 2007
Fonte: INSTITUTO MUNICIPAL DE URBANISMO PEREIRA PASSOS, 2010

Botafogo também se destaca em relação ao número de bares e


restaurantes que possui. De acordo com Barbara (2010), Botafogo apresenta
aproximadamente 10% do total de bares e restaurantes escolhidos dentre os
melhores da cidade pelo seu Guia de Restaurantes. Dos mais de 600 bares
indicados no guia, 61 encontram-se na nossa área de estudo. No entanto, no
trabalho de campo realizado, pudemos observar a presença de outros
estabelecimentos que não apareceram no referido guia.
Se levarmos em consideração que as áreas de maior concentração
destes equipamentos fora do Centro da cidade são as da AP2 (Área de
Planejamento 2), a qual abrange as regiões administrativas da zona sul da
cidade, além da Tijuca, perceberemos que estes equipamentos estão
localizados em sua maioria nas áreas onde se encontram as maiores faixas de
renda da cidade.
Segundo Melo e Peres (2005), é possível estabelecer uma relação direta
entre a concentração de equipamentos de cultura e lazer e o IDH (Índice de
Desenvolvimento Humano) dos bairros cariocas. Observa-se que os bairros
que possuem o índice mais elevado, apresentam uma maior quantidade destes
equipamentos. Dentre estes bairros, encontra-se Botafogo.
85

Tabela 1 - IDH, segundo RA´s – Rio de Janeiro, 2000

Índice de Desenvolvimento
Região Administrativa Humano Municipal (IDH)
Copacabana 0,956
Lagoa 0,951
Botafogo 0,947
Tijuca 0,923
Barra da Tijuca 0,918
Vila Isabel 0,916
Centro 0,894
Santa Teresa 0,868
Méier 0,865
Ilha do Governador 0,862
Irajá 0,851
Jacarepaguá 0,844
Madureira 0,834
Inhaúma 0,833
Ramos 0,828
Ilha de Paquetá 0,822
São Cristovão 0,814
Realengo 0,813
Penha 0,805
Anchieta 0,805
Campo Grande 0,792
Bangu 0,792
Pavuna 0,767
Cidade de Deus 0,754
Santa Cruz 0,747
Guaratiba 0,746
Rocinha 0,735
Jacarezinho 0,731
Maré 0,719
Complexo do Alemão 0,709

Fonte: INSTITUTO MUNICIPAL DE URBANISMO PEREIRA PASSOS, 2010

Cumpre ressaltar que, segundo dados do Instituto Pereira Passos,


Botafogo está entre os bairros do Rio de Janeiro cuja população apresenta
maiores médias de escolaridade. Soma-se a isto a informação que nos é
passada por Henrique (2004) de que, quando da inauguração da primeira
biblioteca virtual do país, a megastore Armazém Digital, a qual se localizava no
Shopping Rio Plaza, seu proprietário, ao fazer uma pesquisa para escolher o
86

local de seu empreendimento, descobriu que Botafogo era o bairro do Rio de


Janeiro com o maior número de moradores com nível superior.
Então, assim como em outras cidades do mundo, observa-se no Rio de
Janeiro uma tendência de concentração de equipamentos de cultura e lazer no
núcleo central da cidade e em bairros de classe média, como Botafogo. Esta
concentração pode ser explicada em virtude de serem áreas de maior
acessibilidade e de concentração de serviços.
Botafogo é um bairro que, ultimamente tem recebido uma gama de
atividades terciárias e sedes de empresas (MESQUITA, 2007) e é dotado de
uma grande acessibilidade, pois é servido pelo metrô e uma série de linhas de
ônibus, além de ser cortado por eixos viários que ligam o Centro a outros
bairros da zona sul como Copacabana, por exemplo. Isto provoca uma
irradiação e convergência de fluxos em Botafogo, dotando o bairro de uma
importante centralidade no âmbito da cidade, conforme pode ser observado a
partir da análise dos dados de circulação de passageiros nas estações do
metrô da cidade do Rio de Janeiro, contidos na tabela que segue.
Por ter sido a estação terminal da linha 1 até o ano de 1998, quando a
estação cardeal Arcoverde em Copacabana foi inaugurada, observava-se em
Botafogo um maior fluxo de passageiros em relação às outras estações da
zona sul da cidade. Atualmente, de acordo com dados de 2009 disponibilizados
pelo IPP, podemos observar que a estação de metrô de Botafogo é, depois da
estação Central, a que apresentou o maior volume de passageiros. Se
levarmos em consideração que a estação Central é a estação que integra o
sistema metroviário da cidade com a estação terminal do sistema ferroviário da
região Metropolitana do Rio de Janeiro e, naturalmente absorve um grande
número de passageiros, chegaremos à conclusão que este número
apresentado por Botafogo é extremamente relevante e aponta a grande
centralidade exercida pelo bairro.
87

Tabela 2 – Passageiros transportados (n º em 1000), segundo estações (1995-2009)

Fonte:Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos, 2010


88

Então, pode-se perceber, a partir desta concentração de equipamentos


de cultura e lazer em determinadas áreas da cidade, uma grande diferenciação
intraurbana no que diz respeito ao direcionamento das ações de
implementação de equipamentos de cultura e lazer na cidade, uma vez que
percebem-se enfoques distintos em relação às áreas pobres e àquelas mais
enobrecidas. Então, podemos perceber uma distribuição extremamente
desigual das benesses urbanísticas no espaço urbano carioca, tais como
serviços e infraestruturas. Vale lembrar que, segundo o Plano Estratégico da
Cidade do Rio de Janeiro, a zona sul é a vitrine da cidade e um de seus
objetivos principais é valorizar o lazer nesta região, ressaltando o modo de
viver do carioca. Assim, a presença dos equipamentos de cultura e lazer neste
recorte são fundamentais para que este objetivo seja alcançado.
Os equipamentos de cultura e lazer funcionam, em determinadas
situações, como fortes pontos de centralidade, concentrando serviços diversos
e atraindo fluxos de diferentes tipos. De acordo com Spósito (1998), uma nova
centralidade produz um nível de polaridade, constitui um nó de fluxos e
expressa a escolha de uma sociedade.
Então, sob este prisma, a centralidade é considerada em decorrência
das interações entre os lugares centrais e suas respectivas áreas de influência,
ou seja, concentração e irradiação de fluxos diversos, tais como os fluxos
sociais (Mello, 2002).
O aumento da importância do lazer e das atividades culturais no âmbito
da cidade pode provocar a imposição de novas formas de centralidade.
Consequentemente, redefinem-se ainda o cotidiano das pessoas, a lógica da
localização e o uso dos equipamentos e serviços (SPÓSITO, 1998).
O surgimento destas novas centralidades de cunho cultural e de lazer
em áreas externas ao Centro, em especial em Botafogo, além de modificar os
fluxos existentes, os quais passam a convergir com mais intensidade a estes
equipamentos, modifica ainda a forma espacial. Esta reorganização dos fluxos
contribui sobremaneira para a reestruturação urbana do Rio de Janeiro, uma
vez que estes podem modificar a função de uma determinada área. No caso de
Botafogo, agem consolidando uma função que o bairro já detém, a função de
lazer.
89

Estes equipamentos de cultura e lazer em Botafogo contribuem para


reafirmar a centralidade do bairro no âmbito da cidade. Assim, podemos
concluir que em Botafogo, levando-se em conta a grande concentração de
equipamentos de cultura e lazer, encontram-se inúmeros lugares centrais, tais
como a Cobal e os cinemas de rua, uma vez que estes atraem usuários e
irradiam ideias e significados (MELLO, 2002).

3.3.1 A dimensão espacial dos espaços de cultura e lazer em Botafogo

No domínio da construção do urbano, surgem novas formas para


viabilizar a reprodução do capital. Neste sentido, assumem importância os
espaços de cultura e lazer. Como dissemos anteriormente, consideramos
espaços de cultura e lazer os cinemas, teatros, bares e restaurantes, shopping
centers, centros culturais, livrarias e museus. No entanto, diante da grande
concentração de cinemas, bares e restaurantes em Botafogo, daremos
destaque a estes espaços. Vale lembrar ainda, que utilizamos como áreas de
estudo, os principais eixos viários de Botafogo, servidos por linhas de ônibus
regulares, os quais se constituem naqueles que fazem a conexão de Botafogo
com outras áreas da cidade e serão identificadas, neste sentido, as áreas de
concentração dos espaços de cultura e lazer na referida área de estudo.
Dentre os tipos de cinema presentes em Botafogo, podemos encontrar
os que se organizam em salas multiplex, como o Cinemark, no Botafogo Praia
Shopping, localizado na Praia de Botafogo. Neste caso, o Cinemark assume
um papel de estabelecimento âncora deste shopping, uma vez que atrai uma
grande quantidade de pessoas que vão consumir na praça de alimentação e
em suas lojas. Outro exemplo que podemos citar é o Kinoplex, localizado no
shopping Rio Sul.
Outro tipo presente em Botafogo é o cinema de rua. Este se caracteriza
por aquele cinema localizado junto à calçada. Os cinemas do grupo Estação
(Espaço de Cinema e Estação Botafogo, ambos localizados no início da rua
Voluntários da Patria) e o Unibanco Arteplex, na Praia de Botafogo, são os que
se caracterizam como cinema de rua em Botafogo. No entanto, estes cinemas
se diferenciam daqueles tradicionais cinemas de que se espalhavam pela
90

cidade. Estes são espaços que passaram por reformas e combinam uma série
de atividades afins, como cafés, livrarias, restaurantes, locadoras e outros, os
quais foram incorporadas ao consumo da cultura. Vale ressaltar que a
existência destes serviços se condicionou à presença do cinema, e não o
contrário.
O público freqüentador destes cinemas é formado por pessoas que
buscam uma alternativa ao circuito comercial de filmes. Estes cinemas atraem
um público mais intelectualizado, instruído, com maior grau de instrução,
portanto, sofisticado, que vê no circuito de arte uma forma de aliar a cultura ao
lazer. O conteúdo exibido nas salas desses cinemas é fundamental na escolha
destes indivíduos. Isto reforça a ideia de cultura que vimos anteriormente, que
a relaciona com o estudo, a educação, caracterizando a “alta cultura”.
O fato de receber um público, de um modo geral, tão homogêneo faz
com que o cinema não seja visto apenas como um espaço de consumo, mas
também como um espaço de encontros, de troca e irradiação de ideias, o que o
transforma em um lugar central (Mello, 2002).
Cumpre lembrar que há diferenças entre os cinemas do Grupo Estação
e o Unibanco Arteplex. Este último é localizado na Praia de Botafogo, onde
outrora funcionavam os cinemas Coral e Scala, que exibiam filmes
pornográficos, e, além de exibir filmes do circuito alternativo, também veicula
obras do grande circuito. É dotado de salas com alto padrão tecnológico, com
som e imagem de última geração e poltronas dispostas de maneira que a
visibilidade não seja prejudicada, o que possibilita um maior conforto para o
consumidor.
91

Figura 2 - Unibanco Arteplex


Fonte: O autor, Nov/2010.

Próximo ao Unibanco Arteplex, retratado acima, a apenas alguns metros


de distância, se localizava o Cine Opera, que hoje dá lugar a uma filial da loja
varejista Casa & Vídeo.
Portanto, podemos afirmar que o eixo formado pela Praia de Botafogo e
o trecho inicial da rua Voluntários da Pátria se constitui na principal área de
concentração destes equipamentos em Botafogo, abrangendo quase a
totalidade de salas de cinema existentes no bairro.
Ao tratarmos destes novos cinemas de rua de Botafogo, vimos que no
interior dos espaços dos cinemas, como o Unibanco Arteplex, surgem
atividades afins como cafés, livrarias, locadoras, bares, restaurantes e outros.
Então, pode-se afirmar que estes espaços, sobretudo os maiores, definem uma
espacialidade que lhes assegura uma irradiação sobre seu entorno,
promovendo, assim, a aglomeração de atividades e a interação social.
É possível, pois, perceber uma convergência e uma consequente
aglomeração de espaços de cultura e lazer em uma área relativamente restrita,
neste caso, alguns poucos quarteirões, especialmente no entorno do Cine
Estação e do Estação Botafogo, onde verifica-se uma relação entre estes
92

espaços e os grupos sociais que os consome, além de algumas respectivas


características socioculturais.

Figura 3 - Estação Botafogo


Fonte: O autor, Nov/2010.

Nesta concentração de espaços de cultura e lazer os frequentadores se


encontram e não só moldam espaços, como também sociabilidades e práticas
de lazer e cultura, transformando-se assim, em um lugar central em Botafogo,
uma vez que atraem fluxos e cada vez mais atividades para esta área. É
possível perceber, principalmente nas noites de fim de semana uma presença
importante de trabalhadores informais e, geralmente nos horários de início e
fim de sessões mais concorridas do cinema, pequenos congestionamentos de
veículos.
93

Figura 4 - Cine Estação


Fonte: O autor

Neste entorno, podemos citar como um destes espaços, a Livraria


Prefácio, ao lado do Estação Botafogo e uma série de bares que surgiram
recentemente, aproveitando-se da dinâmica proporcionada pelos cinemas.
Percebe-se ainda a presença de pequenos bares, de características mais
simples, denominados popularmente de “pés sujos” que, mesmo não
atendendo diretamente o público frequentador dos cinemas serve-se,
indiretamente, da presença destes cinemas, atraindo consumidores que se
valem da atmosfera criada por estes espaços e que a faz ser chamada por
muitos, inclusive pela imprensa de “Baixo Botafogo”, em alusão à área no
entorno da Praça Santos Dumont, na Gávea que é chamada de “Baixo Gávea”.
Devemos lembrar ainda, que antigos “pés sujos” passaram
recentemente por reformas, adequando-se mais à nova dinâmica da área e
passaram a apresentar uma nova forma, a fim de atender a outros tipos de
clientes, mais sofisticados.
Esta ideia de bares/botequins voltados especialmente para um público
de classe média foi muito valorizada nos anos de 1980, quando foi instaurada
94

uma moda boêmia em Botafogo, a partir de bares como o Bar Sereia e o


conjunto de bares da Cobal e cercanias, numa área que ficou conhecida como
“Baixo Cobal” (HENRIQUE, 2004).
Apesar de não estar, oficialmente, no interior dos limites do bairro de
Botafogo, a Cobal e as ruas Marques, Capitão Salomão e parte da Visconde de
Caravelas serão contempladas neste trabalho porque, quando da criação oficial
do bairro do Humaitá, na década de 1980, já podíamos observar a dinâmica
destes espaços, os quais estavam localizados em Botafogo.
Esta área, no final do eixo da rua Voluntários da Pátria, constitui-se na
outra área de maior concentração de espaços de cultura e lazer em Botafogo.
Nesta área observa-se a predominância de bares e restaurantes, dos mais
variados tipos, desde os mais simples aos mais sofisticados, de tradicionais a
bares da moda. Os bares, assim como os cinemas, representam mais do que
um mero espaço de consumo, configuram-se como um ambiente de encontro,
ou seja, onde as sociabilidades se estabelecem (CAMARGO, 2006). Esta área
compreende quarteirões em trechos das ruas citadas no parágrafo acima.
Podemos citar como exemplos destes espaços o Botequim Informal,
inaugurado em 2005 na rua Visconde de Caravelas, esquina com a rua Capitão
Salomão, proporciona ao frequentador um clima de bar antigo, com mobiliário
de madeira e espaços interno e externo revestidos de tijolo. Tais
características, que mesclam simplicidade com sofisticação, proporcionam ao
bar um ar de “boteco pé limpo”, categoria criada pelos próprios frequentadores
para designar este novo estilo de bar tipicamente carioca.
Na mesma esquina, encontram os tradicionais restaurantes Aurora e
Caravelas do Visconde e o bar Plebeu. Ambos instalados em imóveis antigos,
são exemplos do processo de refuncionalização.
O autor afirma ainda que a forma, enquanto forma-conteúdo, é
constantemente alterada e que o conteúdo assume uma nova dimensão ao se
encaixar na forma. Em Botafogo, observa-se este fenômeno em bares que se
instalam em prédios antigos, o que possibilita ao consumidor um outro aspecto
a ser desfrutado em sua atividade de lazer.
A forma, segundo Santos (2008b, p. 69) “é o aspecto visível de uma
coisa. Refere-se, ademais, ao arranjo ordenado de objetos, a um padrão”. O
autor segue afirmando ainda que “as formas são governadas pelo presente, e
95

conquanto se costume ignorar o seu passado, este continua a ser presente


integrante das formas”.
Assim, pode-se falar então, que muitos destes espaços configuram-se
no que o mesmo autor (SANTOS, 2008a) denomina rugosidades, que são
formas remanescentes de períodos anteriores que, devido ao seu caráter
duradouro, persistem na paisagem e se cristalizam, mesmo quando o avançar
do tempo histórico lhes atribui um caráter anacrônico. Estas formas, no
entanto, apesar de se tornarem obsoletas, muitas vezes não desaparecem e
são reutilizadas, assumindo novas funções, sob uma nova estrutura social.
Ainda nesta área, encontra-se a sofisticada Pizzaria Eccellenza. Esta
pizzaria também está instalada em um imóvel antigo, patrimônio do bairro
tradicional de Botafogo, de 2 pavimentos e é uma representante das chamadas
“pizzarias gourmet”, caracterizadas pelo uso de ingredientes finos e de alta
qualidade em suas pizzas. Atrai um público mais refinado, globalizado, o que
pode ser percebido pelos serviços que dispõe, como manobristas no local, com
estacionamento do sistema “vallet”. Devemos ressaltar que, no primeiro
capítulo, já abordamos esta utilização de imóveis antigos por diversas
atividades terciárias em Botafogo.
96

Figura 5 - Restaurante sofisticado na rua Visconde de Caravelas.


Fonte: O autor, Nov/2010.

A uma quadra de distância desta pizzaria, encontra-se a Cobal,


importante ponto nodal, em nosso recorte espacial. De acordo com Lynch
(1999, p.53) os pontos nodais:
podem ser meras concentrações que adquirem importância por
serem a condensação de algum uso ou de alguma característica
física, como um ponto de encontro numa esquina ou uma praça
fechada. Alguns desses pontos nodais de concentração são o foco e
a síntese de um bairro, sobre o qual sua influência se irradia e do
qual são um símbolo. Podem ser chamados de núcleos.

No período diurno, este ponto nodal é uma central de abastecimento de


alimentos, com barracas que vendem os mais variados produtos alimentícios e
que vão atender basicamente os moradores dos arredores. No entanto, à noite,
principalmente nos fins de semana, se torna um grande ponto de encontro de
97

pessoas de diversas áreas da cidade, em virtude de seus inúmeros bares.


Enquanto, durante o dia, circulam pessoas com suas sacolas recheadas de
legumes, verduras e frutas, à noite o espaço é ocupado por jovens, casais,
idosos, enfim, um grupo bem heterogêneo de pessoas em busca de momentos
de lazer.

Figura 6 - Bar Joaquina, localizado na Cobal.


Fonte: O autor, Nov/2010.

Assim, segundo Salgueiro (2003, p.99), “na cidade encontramos


coexistência de espaços apropriados para diferentes usos e funções e com
diferentes ritmos ou em diferentes tempos”. De fato, na Cobal, encontramos o
mesmo espaço “apropriado por diferentes grupos sociais na realização de
práticas de vida ao longo do dia” (SALGUEIRO, 2003, p.99). Neste sentido,
neste mesmo espaço, diferentes tempos são cruzados, como o das obrigações
domésticas cotidianas e o do lazer.
Pode-se dizer que o mesmo ocorre na outra área de concentração
indicada, onde os tempos do trabalho e do lazer se cruzam diariamente,
justamente por apresentar uma grande concentração de prédios de escritórios
e espaços de cultura e lazer.
98

Vale ressaltar que o espaço da Cobal é dotado, ainda, de


estacionamento interno, o que proporciona aos consumidores um maior
conforto durante seus momentos de lazer.
Neste caso, a Cobal possui uma grande vantagem em relação a outros
espaços. Este estacionamento se torna uma vantagem, uma vez que os
consumidores, segundo Cachinho e Salgueiro (2009) consideram a
acessibilidade, a possibilidade de circular e estacionar fatores mais importantes
do que a distância e a centralidade na hora de escolher um espaço de
consumo.

Verificam-se então, em Botafogo, duas áreas onde há uma maior


concentração de espaços de cultura e lazer, justamente nas extremidades no
bairro, no limite com bairros vizinhos. A primeira área encontra-se em um
trecho que compreende o início da rua Voluntários da Pátria, São Clemente,
Professor Álvaro Rodrigues e Praia de Botafogo, onde chama a atenção a
presença de cinemas e bares. A segunda se localiza no trecho final da rua
Voluntários da Pátria e compreende as ruas Marques, Capitão Salomão e um
trecho da rua Visconde de Caravelas. Nesta área, merece destaque a grande
presença de bares e restaurantes.
Devemos salientar que em outros logradouros do bairro também
observamos a presença de espaços de cultura e lazer. No entanto, não
apresentam um padrão de concentração e sim, encontram-se dispostos de
forma dispersa. A menor concentração de espaços de cultura e lazer nas ruas
do interior do bairro clarifica a situação exposta por Lordello (1981), que aponta
estas áreas do “meio” do bairro como estritamente residenciais.
Neste contexto, podemos citar ainda a presença de shoppings em
Botafogo, os quais também concentram um grande número de salas de
cinema. Estes empreendimentos surgiram como alternativa ao comércio de rua
e nas palavras de Pintaudi e Frugoli Jr. (1992, p.15) “shopping center significa
um empreendimento imobiliário de iniciativa privada que reúne, em um ou mais
edifícios contíguos, lojas alugadas para comércio varejista ou serviços”.

Desta forma, pode-se chamar estes equipamentos comerciais de


subcentro planejado, uma vez que seu desenvolvimento e administração são
planejados pela iniciativa privada. Estes têm sua localização definida a partir da
99

capacidade de consumo da população da área onde se instalam, ou seja,


localizam-se estrategicamente em relação ao seu mercado consumidor
(PINTAUDI; FRUGOLI JR., 1992) que, neste caso, é a população que reside
basicamente na zona sul da cidade, notadamente detentora de um alto poder
aquisitivo, que vêem no shopping uma possibilidade de desfrutarem de
momentos de lazer, visto que no interior destes empreendimentos há uma
grande quantidade de bares, restaurantes e cinemas.

A lógica de localização deste novo tipo de subcentro em Botafogo


aproveitou-se de sua centralidade, reforçada pela acessibilidade promovida
pelo metrô e por outras infra-estruturas e da possibilidade de atenderem a uma
demanda solvável, característica da região em que Botafogo se encontra.

Os shopping centers de Botafogo localizam-se em importantes vias do


bairro, o que reitera aquilo que foi exposto acima. Aproveitam-se da
centralidade de Botafogo para se transformarem em uma centralidade também.
Neste sentido, os dois principais shopping centers de Botafogo (o Rio Sul e o
Botafogo Praia Shopping) localizam-se no que delimitamos como início e fim do
“bairro de passagem”, ou seja, em duas das suas mais importantes vias de
acesso, a Av. Venceslau Brás e a Praia de Botafogo. Vale ressaltar que,
apesar do endereço do Rio Sul indicar que ele está na rua Lauro Muller, sua
entrada principal volta-se para a Av. Venceslau Brás. Por isso, consideraremos
que este shopping se localiza neste logradouro.

Os shopping centers assumem então, através de sua forma-conteúdo


(SANTOS, 2006) um papel de instrumento de acesso à globalização ao, por
exemplo, simular espaços de grandes cidades do mundo, o que dá uma
impressão de fuga do Rio de Janeiro. Ao mesmo tempo, atendem às
demandas de consumo e lazer, concentrando, por exemplo, um elevado
número de salas de cinema.
Desta forma, consideramos estas áreas de concentração de espaços de
cultura e lazer como lugares culturais, uma vez que são recortes privilegiados,
com forte atividade cultural e de lazer (VAZ; JACQUES, 2003). Segundo as
autoras, nestes espaços são observados determinadas dinâmicas que
resultam em uma convergência e uma aglomeração de equipamentos culturais
100

em áreas restritas, os quais se relacionam entre si, promovendo sociabilidades,


além de práticas de cultura e lazer.
De acordo com Mesquita (2007), percebe-se uma maior concentração
também de sedes de empresas nestes principais eixos viários, principalmente
na Praia de Botafogo e ao longo da rua Voluntários da Pátria. Também é uma
importante área de concentração de sedes de empresas o eixo formado pelas
ruas Professor Álvaro Rodrigues e Mena Barreto.

Mapa 2 - Serviços em Botafogo, 2008


Fonte: GETER, 2008

Podemos estabelecer então, que esta concentração nestes dois trechos


do principal logradouro do bairro coincide com a grande concentração de
serviços especializados existentes no bairro, como pudemos observar no
mapa. Segundo Santos (2008b) a acessibilidade a estes serviços contribui de
forma decisiva para esta concentração. O mesmo pode se aplicar aos espaços
de cultura e lazer, os quais também se valem da presença destes serviços.
101

Então, pode-se concluir que estes espaços estão concentrados em


áreas onde a acessibilidade é favorecida pela presença da estação do metrô
e/ou de grandes vias de circulação que ligam Botafogo a outras áreas da
cidade. Neste caso, a estação de metrô torna-se um fator preponderante para
Botafogo no sentido de facilitar a atração de usuários de seus espaços. A
presença desta estação junto à área de maior concentração destes espaços
proporciona uma vantagem para Botafogo perante outros bairros da cidade não
servidos pelo metrô, como o Leblon, por exemplo. Esta condição permite que
pessoas que habitam áreas mais distantes da cidade consumam os espaços
de cultura e lazer em Botafogo com maior facilidade.
Desta forma, podemos relacionar estes espaços aos elementos do
espaço propostos por Santos (2008c). Segundo o autor, estes elementos
seriam os homens, as firmas, as instituições, o meio ecológico e as
infraestruturas. Assim:

Cada lugar atribui a cada elemento constituinte do espaço um valor


particular. Em um mesmo lugar, cada elemento está sempre variando
de valor, porque, de uma forma ou de outra, cada elemento do
espaço – homens, firmas, instituições, meio – entra em relação com
os demais, e essas relações são em grande parte ditadas pelas
condições do lugar. Sua evolução conjunta num lugar ganha,
destarte, características próprias, ainda que subordinada ao
movimento do todo, isto é, do conjunto dos lugares (SANTOS, 2008b,
p. 21).

Então, no espaço de Botafogo, observa-se a participação dos referidos


elementos do espaço. Verifica-se a presença do Estado, enquanto instituição, à
medida que executa ações que vão dotar o bairro de infraestruturas
necessárias para o surgimento dos espaços de cultura e lazer, uma vez que
facilitam a circulação de seus consumidores e trabalhadores.

3.4 Os espaços de cultura e lazer e suas relações com a cidade

As atividades vinculadas ao ócio estão vinculadas ao papel das cidades


no âmbito da cultura e do lazer e são enfatizadas em termos de consumo, o
qual ganha mais importância no contexto das transformações pelas quais
102

passa a cidade atualmente. Percebe-se a relevância do consumo à medida que


a cidade assume a condição de produto que deve ser consumido, tanto por
seus moradores quanto por quem a visita a trabalho ou em busca de
momentos de lazer (PACHECO, 2000).
Segundo o modelo empreendedorista, a cidade, transformada pelo city
marketing em mercadoria a ser vendida e consumida, passa a fazer parte do
mercado como um lugar de consumo coletivo e individual, sendo seu espaço
interno transformado em um objeto de ação do planejamento estratégico, como
abordamos no capítulo anterior.
Assim, o consumo, ao atribuir à cidade uma lógica de troca simbólica e
de valor, faz dela um objeto de consumo, com atributos semelhantes a
qualquer outra mercadoria negociada no mercado. Desta forma, a cidade, além
de ser um espaço de compras, passa a ser também interpretada como um
objeto de consumo (CACHINHO; SALGUEIRO, 2009).
O papel do setor terciário (e nele, incluímos os espaços de cultura e
lazer), o qual passou por um processo de transformação, como vimos no
primeiro capítulo, se relaciona diretamente com o processo de reestruturação
urbana pela qual passa a cidade do Rio de Janeiro. Na esfera do consumo,
novos espaços de cultura e lazer surgem, promovidos por ações públicas e
privadas, com o intuito não apenas de satisfazer as necessidades básicas dos
consumidores, mas também, proporcionar a eles momentos de lazer,
geralmente vinculados ao uso do tempo livre.
Podemos afirmar que a abordagem da cidade sob a égide do consumo
suscita análises sobre as transformações na vida cotidiana do cidadão, o qual é
transformado em consumidor, por excelência. Em Botafogo, confundem-se os
espaços de trabalho, com os espaços de lazer, além do espaço residencial. A
participação social se circunscreve ao consumo, assim como a vida cotidiana
que, por sua vez, segundo Lefèbvre (1991, p. 39), se define como lugar social:

um lugar desdenhado e decisivo, que aparece sob um duplo aspecto:


é o resíduo (de todas as atividades determinadas e parcelares que
podemos considerar e abstrair da prática social) e o produto do
conjunto social. Lugar de equilíbrio é também o lugar em que se
manifestam os desequilíbrios ameaçadores.
103

Desta forma, é possível estabelecer a relação existente entre estes dois


aspectos. Neste sentido, os espaços de cultura e lazer assumem significados
distintos e permitem a observação de diferentes temporalidades (SALGUEIRO,
2003) para o morador, trabalhador ou simplesmente frequentador de Botafogo.
A presença destes equipamentos promove transformações no cotidiano do
bairro, uma vez que seu espaço é percebido e vivido de maneira diferente ao
longo dos dias e da semana.
Durante o dia nos meios de semana, Botafogo é percebido como local
de trabalho, decorrente do grande número de escritórios de grandes empresas
(MESQUITA, 2007), característico do espaço das firmas, como um local onde é
possível satisfazer as necessidades do cotidiano, como ir à escola ou ao
médico, ou simplesmente um local de passagem para outras áreas da cidade
(LORDELLO, 1981).
No entanto, nos fins-de-semana, principalmente durante o período
noturno, Botafogo já é percebido de uma maneira diferente, uma vez que a
efervescência provocada pela existência dos inúmeros espaços de cultura e
lazer se manifesta e Botafogo passa a ser visto como um espaço de consumo
do lazer.
Assim, um mesmo espaço pode assumir funções diferentes ao longo de
um mesmo dia. Já citamos o exemplo da Cobal e podemos acrescentar ainda
exemplos de uma série de restaurantes que, durante o dia, recebem
trabalhadores que os buscam para satisfação de suas necessidades básicas
e/ou servem como um espaço de negócios e que durante a noite são vistos
como espaços onde os consumidores podem desfrutar de momentos de lazer.
Então, podemos afirmar que a presença destes espaços de consumo,
aliados à presença dos serviços especializados, promove o surgimento de
novas centralidades no tecido consolidado (CAPEL, 2005), marcando assim, a
nova configuração do espaço do consumo na cidade, a qual passa por
processos de reestruturação urbana. Vale relembrar que a existência de
infraestruturas de circulação viabiliza e estimula a instalação e
desenvolvimento destes espaços e, consequentemente, de novas
centralidades no espaço interno da cidade.
Neste sentido, Salgueiro (1994) estabelece que:
104

A acessibilidade propiciada pelas infraestruturas viárias é reforçada


pelo estabelecimento de empresas prestigiadas que tornam o sítio
num lugar atractivo, isto é, num centro. A este processo de conversão
de áreas periféricas em centros atractivos chama-se no geral criação
de novas centralidades. Portanto, a centralidade deixou de se referir a
uma posição central para significar boa acessibilidade a transporte
automóvel combinada com a qualidade do espaço e das actividades
que o ocupam o que, por sua vez, reforça a capacidade de atracção
do sítio e contribui para o seu prestígio a nível simbólico.

Assim, podemos afirmar que o caso de Botafogo se aplica de forma


direta ao que foi exposto pela autora, uma vez que, atualmente, sua
centralidade está diretamente relacionada à acessibilidade promovida pelas
infraestruturas de transporte que o alimentam e a presença de espaços de
cultura e lazer e sedes de empresas em seus limites (MESQUITA, 2007).

Capel (2005) afirma que estas novas centralidades possuem um grande


valor simbólico e os espaços que atuam para que elas surjam atribuem aos
consumidores certo prestígio pessoal. Desta forma, percebe-se a associação
entre os serviços especializados e os espaços de cultura e lazer em Botafogo
na construção de uma nova centralidade na cidade do Rio de Janeiro.

Devemos lembrar ainda, neste processo de reestruturação pela qual


passa a cidade, o papel das políticas culturais e dos espaços de cultura e lazer
que, combinados, conferem a Botafogo o caráter de polo gastronômico,
definido pelo Plano Estratégico, e de lazer. Estes novos espaços de consumo
(CARRERAS, 1994) e suas funções trazem estabilidade, favorecendo a
reprodução do capital e promovem uma nova dinâmica ao bairro, gerando
impactos na economia urbana da cidade, ao promover o surgimento de uma
nova centralidade no tecido consolidado da cidade.
105

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O processo de terciarização da economia, que marca este período


histórico que estamos vivendo atualmente, se manifesta através de
transformações no uso do espaço urbano, determinadas a partir da dinâmica
urbana intrínseca à dinâmica social, o que gera novos processos, padrões,
morfologias e conteúdos na cidade do Rio de Janeiro.

A metrópole carioca possui, notoriamente o seu processo de


modernização e reestruturação urbana calcado na economia de serviços
avançados. Serviços estes que possuem diferentes dimensões espaciais e
diferentes níveis de crescimento devido às suas condições específicas. Mas
estas diferenciações não impedem que, muitas vezes, estes serviços estejam
interligados, mantendo uma relação de interdependência. É o caso da atividade
cultural e de lazer que, mesmo não estando no hall dos serviços avançados, é
um setor que se faz representativo da especificidade das transformações pelas
quais passa a cidade do Rio de Janeiro e está diretamente ligada ao fenômeno
da terciarização da economia carioca.

O conjunto de atividades ligadas à área da cultura e do lazer forma um


setor cada vez mais dinâmico e que assume uma importância crescente no
processo de reestruturação urbana da cidade do Rio de Janeiro, a qual ainda
pode ser considerada a capital cultural do país.

Historicamente, a área da cidade que detém uma maior concentração e,


portanto, maior centralidade no que diz respeito a espaços de cultura e lazer é
o Centro e a cidade do Rio de Janeiro não foge a esta tendência.

No entanto, Botafogo assume grande importância neste sentido, uma


vez que reúne uma grande quantidade de espaços de cultura e lazer dentro de
seus limites, adquirindo um destaque no contexto da cidade e transformando-
se em um espaço de consumo, caracterizando-se, portanto, como um lugar
dotado de centralidade. Botafogo, além de apresentar uma rotina de negócios
expressa pela presença de vários edifícios de escritórios que mantêm sedes de
empresas de diversos tipos de serviços avançados, se caracteriza também por
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possuir a função residencial, médica, educacional, além, é claro, a cultural e a


de lazer.

A presença concentrada destas atividades em Botafogo produz um novo


modo de localização das atividades terciárias, fora do já congestionado centro,
o que implica em transformações no padrão espacial da cidade. Denota-se
então, a relação entre estrutura urbana e serviços.

O terciário avançado produz bens de caráter cultural que assumem


posição de destaque na organização do território, influenciando na dotação de
recursos e no padrão de localização das atividades terciárias no espaço interno
da cidade. Neste contexto, se incluem os espaços de cultura e lazer, onde as
sociabilidades são estabelecidas, através do encontro, das trocas de
conhecimentos e experiências.

O espaço de Botafogo, então, passa a ser influenciado pela dinâmica


espacial das atividades terciárias, especialmente os serviços especializados às
empresas, e aquelas relacionadas à cultura e ao lazer. Por sua vez, estas se
aproveitaram da melhora na acessibilidade ao bairro, promovida pelo advento
do metrô, na década de 1980, e da grande quantidade de linhas de transporte
coletivo que cortam o bairro e geraram novos usos às antigas construções de
Botafogo, além de dinamizarem a construção de novos edifícios com
finalidades específicas, promovendo, neste sentido, um processo de
(re)qualificação e revalorização de seu espaço.

Neste contexto, Botafogo passa então a receber fluxos cada vez


maiores de pessoas de todas as áreas da cidade, que buscam esta nova
centralidade, atraídas pela variedade de serviços que nela se instala.

A presença destas atividades em Botafogo provoca a ampliação da


oferta de empregos na área em questão, o que faz com que também aumente
o fluxo de trabalhadores. Tal fato promove a intensificação da circulação de
pessoas no bairro, tanto como força de trabalho como consumidores. E como
pudemos observar, este deslocamento de pessoas desempenha um papel
fundamental na estruturação do espaço urbano.
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Desta forma, Botafogo destaca sua importância no processo de


estruturação do espaço urbano da cidade do Rio de Janeiro, à medida que, ao
concentrar atividades terciárias e se configurar em um espaço de consumo,
promove um aumento da circulação em seu interior, através dos constantes
deslocamentos, seja de trabalhadores ou de consumidores de seus inúmeros
serviços.

O modelo de urbanização atual, motivado pelo processo de terciarização


da economia implica em novos usos do espaço de Botafogo. Usos estes que
vão se sucedendo, e provocam, assim, transformações importantes em seu
padrão espacial.

Por fim, pode-se afirmar que, neste início de século XXI, Botafogo
insere-se neste contexto, tendo seu espaço transformado em virtude da
dinâmica das atividades terciárias e consolida-se como uma nova centralidade
no âmbito da cidade, participando de maneira marcante e afirmando um novo e
importante papel no atual processo de reestruturação urbana do Rio de
Janeiro.
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