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Uma Curva de Peano Inédita

( No quadrado [ 0, 1 [ × [ 0, 1 [ )

χk : [0, 1[−→ [0, 1[×[0, 1[

1 1 (1,1)
r
χk
s

0
0 1

1
@ @
{0, 1}N
@ @
ξ @ @
η
η3
:
1⊤
B : q@
@ @@
Ψ (x, y, z)
:
q
q 0 1
η2 @
wq
{0, 1}N @
η1 @
0⊥
@@
1
{0, 1}N

- Curva de Peano no Cubo

3
4
rp rp

1
¬

5
2

12

1
12 ¬
1 1 7 11
0 4 2 12 12 1
  1
1 3
- Bola escalafobética: BD 4, 4 ; 3
3

Gentil Lopes da Silva


www.dmat.ufrr.br/∼ gentil
Uma Curva de Peano Inédita
( No quadrado [ 0, 1 [ × [ 0, 1 [ )

Gentil Lopes da Silva∗


17 de novembro de 2006

Resumo
Não temos conhecimento de que alguém já tenha construido uma curva
de Peano no quadrado [ 0, 1 [ × [ 0, 1 [. Construimos uma e mostramos que
a mesma resulta com propriedades topológicas “absurdamente” distintas
da curva usual, isto é, da curva no quadrado [ 0, 1 ] × [ 0, 1 ].

“Tudo isso, que à primeira


vista parece excesso de irrazão,
na verdade é o efeito da finura
e da extensão do espı́rito hu-
mano e o método para encon-
trar verdades até então desco-
nhecidas.”
Voltaire (17 a Carta)

1 Introdução
O século XIX se iniciou com a descoberta de que curvas e funções não
precisam ser do tipo bem comportado, o que até então se supunha. Peano†
em 1890 mostrou até que ponto a matemática podia insultar o senso comum
quando, tratando do aprofundamento dos conceitos de continuidade e dimensão,
publica a sua famosa curva, proposta como cobrindo totalmente a superfı́cie de
um quadrado:

1 1 (1,1)
χ
r
χ : [ 0, 1 ] −→ [ 0, 1 ] × [ 0, 1 ]

0 0 1

Aqui mostramos uma construção desta curva mais simples que as cons-
tantes na literatura (ver por exemplo [1]).
∗ www.dmat.ufrr.br/∼gentil ∴ gentil.silva@gmail.com
† Giuseppe
Peano (1858−1932), natural de Cuneo, Itália, foi professor da Academia Militar
de Turin, com grandes contribuições à Matemática. Seu nome é lembrado hoje em conexão
com os axiomas de Peano dos quais dependem tantas construções rigorosas da álgebra e da
análise.

1
Gentil 2

Faremos ainda mais: abriremos o intervalo unitário à direita, e construire-


mos a seguinte curva (de Peano):

1 1 (1,1)
χk
r
χk : [ 0, 1 [−→ [ 0, 1 [×[ 0, 1 [

0
0 1

e mostraremos que esta possui propriedades topológicas totalmente distintas da


primeira. Construiremos, ademais, uma outra patologia, a qual pode ser vista
como uma espécie de “inversa” da curva de Peano.
O que a curva de Peano tem de paradoxal
Antes de prosseguir vamos mostrar ao leitor − de uma outra perspectiva
− o que a curva de Peano tem de paradoxal.
Qual das duas tarefas a seguir o leitor acharia mais fácil de realizar?
1a ) Na figura abaixo temos 10 bolinhas à esquerda e à direita um quadrado
com 10 × 10 posições (escaninhos).











Desafio: Transferir as 10 bolinhas para o quadrado 10 × 10.
Esta seria uma tarefa extremamente fácil, se não fosse por uma condicão
adicional: no quadrado não devem sobrar posições (escaninhos) vazias!
2a ) Na figura a seguir as bolinhas (do desafio anterior) foram substituidas
por uma quantidade infinita de pontos; da mesma forma o quadrado agora
dispõe de infinitas posições pontuais.

Desafio: Transferir as infinitas bolinhas (podemos dizer, pontos do intervalo


[ 0, 1 ]) para o quadrado [ 0, 1 ] × [ 0, 1 ] à direita.
Esta seria uma tarefa extremamente fácil, se não fosse por uma condicão
adicional: no quadrado não devem sobrar posições vazias!
O milagre de Peano foi, precisamente, realizar esta segunda tarefa.
Nota: Óbviamente que a primeira tarefa é irrealizável (impossı́vel), assim
enunciamos apenas para efeito de contraste.
Façamos uma rápida simulação: Na figura seguinte transferimos alguns
pontos do intervalo para o quadrado, assim:
Gentil 3

1 r 1 r(1, 1)
0,8 r
r r
rr χ r
0,5
5/12
0,3 r
0
r r r
1

A idéia desta figura é mostrar que, ao transferirmos (através de χ) um ponto


(“bolinha”) do intervalo a sua posição fica vazia (resta um “buraco”) e este
ponto aparece no quadrado. A figura seguinte mostra a correspondência entre
os pontos do intervalo e do quadrado, na figura anterior:

1 r 1 rχ(1)
0,8 r χ(0,3) χ(0,8)
r r
rr χ r
0,5
5/12 5
r χ( 12 )
0,3

0
r r r
χ(0) χ(0,5) 1

Enfatizando, novamente, o “milagre” de Peano: χ (curva de Peano) consegue


transferir os pontos do intervalo para o quadrado de formas que todo o quadrado
fica preenchido; não sobra uma única posição vazia, e, “o que é pior”: em
infinitas posições do quadrado são guardados até três pontos do intervalo! (como
será visto oportunamente).
• Aproveitando o ensejo vamos adiantar, informalmente, a patologia por
nós construida:
A “inversa” da curva de Peano
No ano de 2006 realizamos o feito da construção da “inversa” da curva de
Peano. A qual pode ser apreciada assim:
Qual das duas tarefas a seguir o leitor acharia mais fácil de realizar?
3a ) Na figura a seguir temos 10×10 bolinhas à esquerda e à direita um escaninho
com 10 posições.

••
••
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• ••••••••••

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• ••••••••••

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• ••••••••••

••
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• ••••••••••
• ••
••
•• •••••••••••
••
Desafio: Transferir as 100 bolinhas à esquerda para o escaninho à direita.
Esta seria uma tarefa extremamente fácil, se não fosse por uma condição
adicional: não devemos, em nenhuma posição do escaninho, guardar mais que
uma bolinha! E, o que é pior, devem sobrar gavetas vazias!
4a ) Na figura a seguir as bolinhas (do desafio anterior) foram substituidas por
uma quantidade infinita de pontos; da mesma forma, agora o escaninho dispõe
de infinitas posições pontuais.
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Desafio: Transferir as infinitas bolinhas (podemos dizer, pontos do quadrado


[ 0, 1 ] × [ 0, 1 ]) para o escaninho [ 0, 1 ] à direita.
Esta seria uma tarefa extremamente fácil, se não fosse por uma condicão
adicional: não devemos, em nenhuma posição do escaninho, guardar mais que
um ponto do quadrado! E, o que é pior, devem sobrar lugares (posições) vazios
no intervalo!
O nosso feito foi, precisamente, realizar esta segunda tarefa.
Façamos uma rápida simulação: Na figura seguinte transferimos alguns
pontos do quadrado para o intervalo, assim:

1 r (1, 1) 1 r
r rr 43
r
r ϕ rr 12
r
r 15
r r r 0
r
1

A idéia desta figura é mostrar que, ao transferirmos (através de ϕ) um ponto


(“bolinha”) do quadrado a sua posição fica vazia (resta um “buraco”) e este
ponto aparece no intervalo. Ademais, assinalamos no intervalo dois pontos
(bolinhas azuis) que não serão ocupados por nenhum dos pontos do quadrado,
são buracos, digo, posições ociosas. Nunca é demais repetir: todos os pontos do
quadrado são transferidos para o intervalo, dois pontos nunca serão guardados
em uma mesma posição do intervalo (ϕ é injetiva) e ainda sobram infinitas
posições ociosas (buracos) no intervalo (ϕ não é sobrejetiva).
Definição 1 (Curva de Peano). Chama-se curva de Peano  num espaço métrico
(M, d) a uma aplicação contı́nua χ : I → M tal que χ I = M .
Isto é, uma aplicação de I (intervalo unitário) em M , contı́nua e sobrejetora.

2 A curva de Peano (simplificada)


Em [3]∗ mostramos que a seguinte aplicação
λ : B −→ [ 0, 1 ]
P∞ xn
(xn ) 7−→ n=1 2n
 N
é uma bijeção. B é o subconjunto de 0, 1 cujos elementos não têm todos os
termos iguais a 1, a partir de alguma posição (com a única exceção feita para a
seqüência (1 1 1 1. . . ) a qual foi incluı́da neste conjunto).
∗ Este trabalho, [3], constitui-se num pré-requisito para a leitura do presente trabalho.
Gentil 5

Por exemplo: 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 . . . ∈ B e 1 0 1 0 1 0 0 1 1 1 1 1 . . . 6∈ B.
Devido a existência desta bijeção é que podemos identificar os elementos
de ambos os conjuntos.
λ sendo uma bijeção possui inversa λ−1 : [0, 1] → B.
Definição 2 (Definição de representação binária). A imagem de um x ∈ [ 0, 1 ]
por λ−1 é o que chamamos de representação binária de x. Isto é, diremos, por
definição, que uma representação binária é um elemento de B.
Sendo assim, por exemplo, (101010 . . .) é uma representação binária, en-
quanto (0101111 . . .) não.
Dizemos que os números do intervalo [ 0, 1 ] são codificados pelos elementos
de B.
Pois bem, iniciando a construção da curva de Peano consideremos a aplicação,

B
1
Ψ
: q (xn )
Ψ : [0, 1] −→ B
xq
x 7−→ (xn )
0

Onde associamos a cada x ∈ [0, 1] sua representação na base binária.


Para mostrar que a aplicação (ver tabela de métricas, pág. 44):
 
Ψ: [0, 1], µ −→ B, ν
x 7−→ (xn )

é contı́nua, é suficiente (por R-4, pág. 44) mostrar que sua inversa:

Ψ−1 :
 
B, ν −→ [0, 1], µ
(xn ) 7−→ x

é contı́nua e que B, ν é compacto.
 A continuidade é dada por (por R-2, pág.
44) e a compacidade de B, ν mostramos no lema 2, pág. 45. Sendo assim Ψ
é mais que contı́nua, é um homeomorfismo.
• Agora vamos definir uma aplicação (η), assim:

B {0, 1}N
η

N N
:
η: B {0, 1} × {0, 1} q (η1 ,η2 )

(xn ) η1 (xn ), η2 (xn ) (xn ) q

{0, 1}N
Gentil 6

Onde ηi : B −→ {0, 1}N (i = 1, 2.) são dadas por



η1 (xn ) = η1 (x1 x2 x3 . . .) = (x1 x3 x5 . . .)


η2 (xn ) = η2 (x1 x2 x3 . . .) = (x2 x4 x6 . . .)

 Isto é, η1
toma de x n
sua subseqüência de ı́ndices ı́mpares e η2 toma de
xn sua subseqüência de ı́ndices pares:
η1 (x1 x3 x5 x7 . . .)
(x1 x2 x3 x4 x5 . . .)
η2
(x2 x4 x6 x8 . . .)

Dizemos que a aplicação η demultiplexa a seqüência xn .
A aplicação η é injetiva porquanto
 
η(xn ) = η(yn ) ⇒ η1 (xn ), η2 (xn ) = η1 (yn ), η2 (yn )
 
⇒ (x1 x3 x5 . . .), (x2 x4 x6 . . .) = (y1 y3 y5 . . .), (y2 y4 y6 . . .)
⇒ (x1 x3 x5 . . .) = (y1 y3 y5 . . .); (x2 x4 x6 . . .) = (y2 y4 y6 . . .)
⇒ (xn ) = (yn ).
A aplicação η não é sobrejetiva. De fato, por exemplo o ponto
N N
(0 1 1 1 1 . . . , 0 1 1 1 1 . . .) ∈ {0, 1} × {0, 1}
não é imagem de nenhum ponto do domı́nio (por que?).
Vamos agora envidar esforços para mostrar que η é contı́nua. Antes mos-
traremos que é contı́nua a seguinte restrição de η:
α : B′ −→ B′ × B′ (1)
onde B′ ⊂ B, é tal que:
(xn ) ∈ B′ ⇐⇒ suas subseqüências de ı́ndices ı́mpares e pares pertencem a B.
No apêndice (lema 3, pág. 46) mostramos que B′ é compacto e denso.
A aplicação α é uma bijeção. De fato, é injetiva porquanto
 
α(xn ) = α(yn ) ⇒ α1 (xn ), α2 (xn ) = α1 (yn ), α2 (yn )
 
⇒ (x1 x3 x5 . . .), (x2 x4 x6 . . .) = (y1 y3 y5 . . .), (y2 y4 y6 . . .)
⇒ (x1 x3 x5 . . .) = (y1 y3 y5 . . .); (x2 x4 x6 . . .) = (y2 y4 y6 . . .)
⇒ (xn ) = (yn ).

É sobrejetiva porquanto dado (x1 x2 x3 . . .), (y1 y2 y3 . . .) ∈ B′ × B′ este ponto é




imagem, por α, da seqüência (x1 y1 x2 y2 x3 y3 . . .), como é fácil verificar.


A inversa da aplicação α é:

α−1 : B′ × B′ B′

(x1 x2 x3 . . .), (y1 y2 y3 . . .) (x1 y1 x2 y2 x3 y3 . . .)

De outro modo,
Gentil 7

x = (x1 x2 x3 x4 . . .)
α−1 (x1 y1 x2 y2 x3 y3 . . .)

y = (y1 y2 y3 y4 . . .)

Dizemos que a aplicação α faz uma multiplexagem das seqüências


−1
 
xn e yn .

• Para mostrar que a aplicação

α : B′ B′ × B′

(xn ) α1 (xn ), α2 (xn )

é contı́nua vamos mostrar que sua inversa é contı́nua:

α−1 : B′ × B′ B′

(x1 x2 x3 . . .), (y1 y2 y3 . . .) (x1 y1 x2 y2 x3 y3 . . .)

Prova: Utilizaremos no produto B′ × B′ a métrica D3 (pág. 44).


Pois bem, dados a ∈ B′ × B′ e ε > 0 devemos exibir δ > 0 de modo que, se
x ∈ BD3 a; δ =⇒ α−1 (x) ∈ Bν α−1 (a); ε
 

Ou, de modo equivalente


D3 (x, a) < δ =⇒ ν α−1 (x), α−1 (a) < ε


Observe que
α−1 (a) = (a1 b1 a2 b2 a3 b3 . . .)

a = (a1 a2 a3 . . .), (b1 b2 b3 . . .) ⇒
α−1 (x) = (x1 y1 x2 y2 x3 y3 . . .)

x = (x1 x2 x3 . . .), (y1 y2 y3 . . .) ⇒
Temos
∞ ∞
( )
X |xn − an | X |yn − bn |
D3 (x, a) < δ ⇐⇒ max n , <δ
n=1
2 n=1
2n

Também
∞ ∞
X |xn − an | X |yn − bn |
ν α−1 (x), α−1 (a) < ε ⇐⇒

+ <ε
n=1
2 2n−1
n=1
22n
Observe que
∞ ∞
X |xn − an | X |xn − an |
< <δ
n=1
22n−1 n=1
2n
e, de igual modo
∞ ∞
X |yn − bn | X |yn − bn |
< <δ
n=1
22n n=1
2n
Somando estas desigualdades vemos que é suficiente tomar 2 δ = ε, isto é, δ = 2ε .

Gentil 8

Sendo α : B′ −→ B′ ×B′ contı́nua, ou melhor ainda, um homeomorfismo


uniforme entre subespaços densos B′ ⊂ {0, 1}N e B′ × B′ ⊂ {0, 1}N × {0, 1}N ,
α se estende, de modo único, a um homeomorfismo uniforme (por R-10):

F : {0, 1}N −→ {0, 1}N × {0, 1}N

Portanto a restrição de F :
N N
η : B −→ {0, 1} × {0, 1}

é contı́nua.
• Agora vamos definir a aplicação ξ:
N N
ξ : {0, 1} × {0, 1} I×I

(xn ), (yn ) (x, y)

onde
∞ ∞
X xn X yn 
(x, y) = ,
n=1
2n n=1 2n

{0, 1}N ξ 6
1 (1,1)
q (x,y)

(yn ) q

-
(xn ) {0, 1}N 0 1

A aplicação ξ não é uma bijeção. De fato, ξ não é injetiva (por que?).


P xn P yn 
ξ é sobrejetiva porquanto dado (x, y) = 2n
, 2n
∈ I × I este ponto
 N N
é imagem, por ξ, do ponto (xn ), (yn ) ∈ {0, 1} × {0, 1} .
Para mostrar que a aplicação ξ é contı́nua, utilizaremos a métrica do
máximo em ambos os produtos cartesianos.
N N
Prova: Com efeito, dados a ∈ {0, 1} × {0, 1} e ε > 0, devemos exibir δ > 0
de modo que se 
D3 (x, a) < δ ⇒ D3 ξ(x), ξ(a) < ε
Observe que
 P an P bn 
a = (a1 a2 a3 . . .), (b1 b2 b3 . . .) ⇒ ξ(a) = 2n
, 2n
 P xn P yn 
x = (x1 x2 x3 . . .), (y1 y2 y3 . . .) ⇒ ξ(x) = 2n
, 2n

Então
 X 
 xn X an X yn X bn
D3 ξ(x), ξ(a) < ε ⇐⇒ max − − <ε

2n 2n 2n 2n
,
Gentil 9

Resumindo temos que determinar δ > 0 de modo que


nP
|xn −an | P |yn −bn |
o n P
xn P an P yn P bn o
max , < δ ⇒ max n − − <ε

n n
2 2 2 2n , 2n 2n

Observando que
X x X a X x − a X |x − a |
n n n n n n
n − = ≤ <δ

2 2n 2n 2n

X y X b X y − b X |y − b |
n n n n n n
− = ≤ <δ

2n 2n 2n 2n

vê-se que é suficiente tomar δ = ε. 


Compondo as aplicações anteriores, temos a seguinte curva de Peano:

1⊤
B {0, 1}N 1 (1,1)
Ψ η ξ
: q : : q(x, y)
z q η2 q

0⊥ 0 1
η1 {0, 1}N

Figura 1: Curva de Peano Simplificada

Resumindo, temos

1 1 (1,1)
χ
r
z

0 0 1

onde

χ : I −→ I × I
z 7−→ (x, y)
é tal que
  
χ = ξ ◦ η ◦ Ψ ⇒ χ(z) = ξ ◦ η ◦ Ψ (z) = ξ ◦ η Ψ(z)

= ξ η(Ψ(z))
Gentil 10

Exemplos:
(1) Calcule a imagem, por χ, de z = 0, 8.

Solução (acompanhe pela figura 1): Desenvolvendo 0, 8 na base 2 (em [3] damos
um algoritmo para o desenvolvimento em base 2), temos
0, 8 = (1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .)2
então Ψ(0, 8) = (1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .). Aplicamos η à seqüência anterior:

η1 (1 0 1 0 1 0 1 01 . . .)
(1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .)
η2
(1 0 1 0 1 0 1 0 1 . . .)
 
Temos η1 , η2 ∈ {0, 1}N × {0, 1}N . Agora aplicamos ξ ao ponto η1 , η2 :
ξ (η1 , η2 ) = (x, y), onde
1 0 1 0 2
x=y= 1 + 2 + 3 + 4 + ··· =
2 2 2 2 3
Portanto χ(0, 8) = 32 , 32 .


(2) Calcule a imagem, por χ, de z = 0, 3.

Solução: Desenvolvendo 0, 3 na base 2, temos


0, 3 = (0 1 0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .)2
Então Ψ(0, 3) = (0 1 0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .). Aplicamos η à seqüência anterior:

η1 (0 0 1 0 1 0 1 0 1 . . .)
(0 1 0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .)
η2
(1 0 1 0 1 0 1 0 1 . . .)
 
Agora aplicamos ξ ao ponto η1 , η2 : ξ (η1 , η2 ) = (x, y), onde
0 0 1 0 1 0 1
x= 1 + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + ··· =
2 2 2 2 2 2 6

1 0 1 0 1 0 2
y= 1 + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + ··· =
2 2 2 2 2 2 3
1 2

Portanto χ(0, 3) = 6 , 3 . A geometria da situação fica

6
χ
1 : 1 (1,1)
0,8 q
2

q q
1
2⊣
1
χ 3¬
0,3
:
q
0 0 ¬ ¬ -
1
1 1 2
6 3 3
Gentil 11

5
(3) Calcule a imagem, por χ, de z = 12 .

Solução: Desenvolvendo 5/12 na base 2, obtemos


5
= ( 0 1 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .)2
12
Então Ψ(5/12) = ( 0 1 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .). Aplicamos η à seqüência anterior:

η1 ( 0 1 1 1 1 1 1 1 1 . . .)
( 0 1 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .)
η2
( 1 0 0 0 0 0 0 0 0 . . .)
 
Agora aplicamos ξ ao ponto η1 , η2 : ξ (η1 , η2 ) = (x, y), onde
0 1 1 1 1 1 1
x= + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + ··· =
21 2 2 2 2 2 2

1 0 0 0 0 0 1
y= 1 + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + ··· =
2 2 2 2 2 2 2
5
= 12 , 12 .
 
Portanto χ 12

2.1 Os pontos de auto-interseção na curva de Peano


Agora mostraremos como encontrar os pontos de auto-interseção na curva
de Peano:

Iniciamos com uma dupla convergência tal como


0 1 1 0 0 0 3 0 1 0 1 1 1
1 + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + ··· = = 1 + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 +···
2 2 2 2 2 2 8 2 2 2 2 2 2
3

Na figura seguinte escolhemos para ponto duplo x, 8 , isto é, fixamos a orde-
nada (altura) enquanto a abscissa pode variar.

{0, 1}N
(xn , 011000...)
r
3
r r (x, 8 )
(xn , 010111...)

{0, 1}N x

Os dois ponto no diagrama à esquerda são imagens de pontos distintos em


B, assim:
Gentil 12

B {0, 1}N
(xn , 011000...)
q
(x1 0 x2 1 x3 1 x4 0 x5 0 x6 0 ··· ) r
q
(x1 0 x2 1 x3 0 x4 1 x5 1 x6 1 ··· ) r (xn , 010111...)

{0, 1}N

Devemos escolher a seqüência (xn ) de tal modo que (x1 0 x2 1 x3 0 x4 1 x5 1 x6 1 · · · ) ∈


B. Por exemplo, a a seqüência nula (0 0 0 0 . . .) satisfaz este requisito. Deste
modo os dois pontos seguintes
5
(0 0 0 1 0 1 0 0 0 0 0 . . .) =
32
13
(0 0 0 1 0 0 0 1 0 1 0 . . .) =
192
são tais que
5  13   3 
=Ψ Ψ = 0, .
32 192 8
Vejamos mais um exemplo:
Exemplo: Encontrar os pontos do intervalo que são levados no ponto 21 , 34 .


Solução: Usaremos de um artifı́cio: considere as seguintes alternativas:




 VV : (1 0 0 0 0 . . . , 1 1 0 0 0 . . .) −→ (1 1 0 1 0 0 0 0 0 . . .)


1 3 VF : (1 0 0 0 0 . . . , 1 0 1 1 1 . . .) −→ (1 1 0 0 0 1 0 1 0 . . .)

, →

2 4 
 FV : (0 1 1 1 1 . . . , 1 1 0 0 0 . . .) −→ (0 1 1 1 1 0 1 0 1 . . .)


FF : (0 1 1 1 1 . . . , 1 0 1 1 1 . . .) −→ (0 1 1 0 1 1 1 1 1 . . .) 6∈ B

Onde: V significa a verdadeira codificação (da fração) em binário e F a falsa.


Nota: Uma vez que optamos pela codificação λ, esta é a Verdadeira; a outra, λ̃,
torna-se a Falsa (ver artigo [3]).
Nota: O sı́mbolo: significa multiplexação; ou seja, as seqüências da esquerda

foram multiplexadas, resultando na seqüência da direita.


Sendo assim temos:
{ 0, 1 }N
1 B

(1 1 0 1 0 0 0 0 0...) ( 12 , 3
4)
39
ր
48
(1 0 0 0 0..., 1 1 0 0 0...)

0
Ψ η { 0, 1 }N ξ

39 1 3
 
concluimos que χ 48 = 2, 4 . Da alternativa seguinte
Gentil 13

{ 0, 1 }N
1 B

(1 1 0 0 0 1 0 1 0...) ( 12 , 3
4)
37
ր
48 (1 0 0 0 0..., 1 0 1 1 1...)

0
Ψ η { 0, 1 }N ξ

37 1 3
 
concluimos que χ 48 = 2, 4 . Da alternativa seguinte

{ 0, 1 }N
1 B

(0 1 1 1 1 0 1 0 1...) ( 12 , 3
4)

23 (0 1 1 1 1..., 1 1 0 0 0...)
48

0
Ψ η { 0, 1 }N ξ

23 1 3
 
Deste diagrama concluimos que χ 48 = 2, 4 .
A multiplexação na última alternativa ( FF ) não resulta em B, portanto
não é considerada. Resumindo, temos

(1, 3) r
2 4
39
χ( 48 )=χ( 23 37 1 3
48 )=χ( 48 )=( 2 , 4 )
χ

Seja (x, y) um ponto do quadrado. Com um pouco de reflexão o leitor


chegará às seguintes conclusões:
1a ) Se ambas as coordenadas, x e y, forem frações diádicas então, neste ponto
são colocados três pontos da aresta do quadrado. De outro modo: a curva passa
três vezes por pontos com ambas as coordenadas frações diádicas;
2a ) Se ambas as coordenadas, x e y, não forem frações diádicas então, neste
ponto é colocado apenas um ponto da aresta do quadrado. De outro modo: a
curva passa uma única vez em pontos com ambas as coordenadas não diádicas;
3a ) Se apenas uma das coordenadas, x ou y, é uma fração diádica então, neste
ponto é colocado dois pontos da aresta do quadrado. De outro modo: a curva
passa duas vezes em pontos com apenas uma coordenada fração diádica;
4a ) O conjunto dos pontos de auto-interseção da curva é infinito enumerável e
denso no quadrado.
Gentil 14

3 O quadrado hiper-mágico
A seguir construiremos um objeto matemático (tão patológico quanto a
curva de Peano) o qual, em conjunto com a curva de Peano, nos permitirá
transitar entre dimensões arbitrárias.
Definição 3 (Quadrado
 hiper-mágico). Chama-se quadrado hiper-mágico num
espaço métrico M, d , com M um quadrado (unitário), a uma aplicação contı́nua
ϕ : M → I injetiva e não sobrejetora. I é um intervalo unitário.
O que há de paradoxal no quadrado hiper-mágico é que conseguimos trans-
ferir todos os pontos do quadrado para sua aresta inferior (ou qualquer outra),
sem sobrepor um ponto a outro e ainda sobram infinitos buracos (lacunas) na
aresta!
O quadrado hiper-mágico resume-se na composição das aplicações mostra-
das na figura a seguir:
B
6 B
g
1
(1,1) q 1

h q f qz
y q

0
- 0
x 1 B

Figura 2: Quadrado hiper-mágico

Onde a aplicação
h : I × I −→ B × B
(x, y)7−→ (xn ), (yn )


é um homeomorfismo. A aplicação
g: B×B B

(xn ), (yn ) 7−→ (x1 y1 x2 y2 x3 y3 ...)

é contı́nua por ser a extensão contı́nua de α : B′ × B′ −→ B′ (ver (1), pág. 6).


Dizemos que a aplicação g executa uma multiplexagem das seqüências (xn )
e (yn ).
Vamos mostrar que g é injetiva mostrando que g(x) = g(y) ⇒ x = y. De
fato, sejam as seqüências: (xn ) = g(x) = g(y) = (yn ).
(xn ) e (yn ) são imagens, por g, dos pares de seqüências
g
x = (u1 u2 u3 . . . , v1 v2 v3 . . .) 7−→ (u1 v1 u2 v2 u3 v3 . . .) = (x1 x2 x3 . . .)
g
y = (z1 z2 z3 . . . , t1 t2 t3 . . .) 7−→ (z1 t1 z2 t2 z3 t3 . . .) = (y1 y2 y3 . . .)

Como (xn ) = (yn ) segue que


u1 = z1 , u2 = z2 , u3 = z3 , . . . ⇒ (un ) = (zn )
v1 = t1 , v2 = t2 , v3 = t3 , . . . ⇒ (vn ) = (tn )
portanto x = y.
Gentil 15

Esta aplicação não é sobrejetora, por exemplo o ponto ( 0 1 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .) ∈


B não é imagem, por g, de nenhum ponto de B × B. De fato, suponha,  ao
contrário, que isto aconteça;
 isto é que exista um ponto (xn ), (y n ) ∈ B × B
tal que g (xn ), (yn ) = ( 0 1 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .), sendo assim resulta

(x1 y1 x2 y2 x3 y3 . . .) = ( 0 1 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .)

então,

x1 = 0, x2 = 1, x3 = 1, x4 = 1, . . . ⇒ (xn ) = (0 1 1 1 1 . . .)
y1 = 1, y2 = 0, y3 = 0, y4 = 0, . . . ⇒ (yn ) = (1 0 0 0 0 . . .)

Logo,  
(xn ), (yn ) = (0 1 1 1 1 . . .), (1 0 0 0 0 . . .) ∈ B × B,
o que contradiz a construção (definição) de B.
Definimos a aplicação f como f = Ψ−1 (ver pág. 5), resultando assim que
f é um homeomorfismo. Resumindo, temos

1 (1,1) 1
ϕ
rz

0 1 0

onde

ϕ : I × I −→ I
(x, y) 7−→ z
é tal que

ϕ = f ◦ g ◦ h ⇒ ϕ(x, y) = f ◦ g ◦ h (x, y)

= (f ◦ g) h(x, y)

= f g h(x, y)

Exemplos:
1 1

(1) O centro do quadrado é levado em ponto de I ?. Isto é, calcule ϕ 2, 2 .
1
Solução (acompanhe pela figura 2, pág- 14): Temos (1 0 0 0 0 0 . . .)2 = 2 . Então
1 1
h , = (1 0 0 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 0 . . .)
2 2
Aplicando g a este ponto obtemos:
(1 0 0 0 0 0 . . .)
g (1 1 0 0 0 0 0 0 . . .)

(1 0 0 0 0 0 . . .)
Gentil 16

logo

g (1 0 0 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 0 . . .) = (1 1 0 0 0 0 0 0 . . .) ∈ B.

Neste ponto dizemos que houve uma multiplexação das seqüências (1 0 0 0 0 0 . . .)


e (1 0 0 0 0 0 . . .).
Agora entregamos a seqüência (1 1 0 0 0 0 0 0 . . .) a f , isto é
1 1 0 0 0 3
f (1 1 0 0 0 0 0 0 . . .) = + 2 + 3 + 4 + 5 + ··· =
21 2 2 2 2 4
1 1
= 43 . Geometricamente, temos

Finalmente, ϕ 2, 2

B
6 h- B (11000...)
1
(1,1) q 1
q g R q 3


(1000...) 4

y q1 1 f
(2,2)

0
- (1000...)
0
x 1 B

5
= 12 , 12 (exemplo (3), pág. 11)
 
Observe que χ 12
(2) Calcule ϕ 31 , 31 .


Solução: Temos (0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .)2 = 13 . Então


1 1
h , = (0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . . , 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .)
3 3
Aplicando g a este ponto obtemos:

(0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .)
g (0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .)

(0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .)

Logo,

g (0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . . , 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .) = (0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .)

Entregando esta última seqüência a f , temos


0 0 1 1 0 0 1 1
f (0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .) = 1 + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + 7 + + ···
2 2 2 2 2 2 2 28
   
1 1 1 1 1 1
= + 7 + 11 + · · · + + 8 + 12 + · · ·
23 2 2 24 2 2
2 1 1
= + =
15 15 5
1 1
= 15 . Geometricamente, temos

Portanto ϕ 3, 3
Gentil 17

B
6 B (00110011...)
h
:
(1,1) q 1
1
q g
(0101...)
 R
f
y q ( 13 , 13 )
q 1
5

0
- (0101...)
0
x 1 B

3.1 Como encontrar buracos na aresta do quadrado


Mostraremos agora como encontrar pontos na aresta [ 0, 1 ] × {0} que não são
imagens, por ϕ, de pontos do quadrado. Inicialmente observe que sendo f um
homeomorfismo as propriedades topológicas de B são transferidas para [ 0, 1 ].
Para construir um buraco no intervalo basta construir um em B, como por
∈ 5
exemplo, B (0 1 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .) = 12 ∈ [ 0, 1 ] (ver exemplo (3), pág. 11). O
diagrama a seguir sugere como construir uma quantidade infinita de buracos:

 (0 1 1 1 1 1 1 . . .)
(0 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .) ∈ B
 (0 0 0 0 0 0 0 . . .)


 (0 0 1 1 1 1 1 . . .)
(0 0 0 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .) ∈ B
 (0 0 0 0 0 0 0 . . .)


 (0 0 0 1 1 1 1 . . .)
(0 0 0 0 0 0 1 0 1 0 1 0 . . .) ∈ B
 (0 0 0 0 0 0 0 . . .)

Os pontos à direita não são imagens, por g, de pontos de B × B, por conse-


guinte suas imagens, por f , são vazios (buracos) em [ 0, 1 ].
De modo geral, para “gerar” um buraco na aresta tome no quadrado um
ponto (x, y) no qual apenas uma das cordenadas é fração diádica. Sendo assim
temos as seguintes possibilidades:
(
V : B×B
(x, y) :
F : B × {0, 1}N ou {0, 1}N × B

A verdadeira (V) codificação do par (x, y) está no conjunto B × B e a falsa (F)


em B × {0, 1}N se y for a fração diádica ou em {0, 1}N × B se x for a fração
diádica. Pois bem, a codificação verdadeira vai para um ponto da aresta (ou do
intervalo) e a falsa “vai” para um buraco.
Esclarecendo melhor: Dado (x, y) ∈ I2 no qual x ou (exclusivo) y é fração
diádica temos, para este ponto, uma codificação légitima (xn , yn ) e uma espúria
(x′n , yn′ ). Temos que (x′n ) ou (yn′ ) (dependendo de quem seja fração diádica se
x ou se y) tem todos os termos iguais a 1 a partir de alguma posição, enquanto
que a outra seqüência, não sendo oriunda de uma fração diádica, tem um 0
Gentil 18

e também um 1 em posições arbitrariamente grandes. Logo ao se multiplexar


(x′n , yn′ ) resulta um ponto em B e a este um buraco na aresta.
Se no par (x, y) tivermos duas cordenadas diádicas, teremos as seguintes
possibilidades:



 V V : B × B → gera ponto

 V F : B × {0, 1}N → gera buraco

(x, y) :
 F V : {0, 1}N × B → gera buraco



 F F : {0, 1}N × {0, 1}N ⇒ 6∈ B.

Seja (x, y) um ponto do quadrado. Com um pouco de reflexão o leitor


chegará às seguintes conclusões:
1a ) Se ambas as coordenadas, x e y, forem frações diádicas então este ponto vai
para um ponto da aresta e “gera” dois buracos;
2a ) Se ambas as coordenadas, x e y, não forem frações diádicas então este ponto
vai para um ponto do intervalo e não “gera”nenhum buraco;
3a ) Se apenas uma das coordenadas, x ou y, é uma fração diádica então este
ponto vai para um ponto do intervlo e “gera” um buraco;
4a ) o conjunto dos buracos é infinito enumerável, porquanto o conjunto dos
pontos (x, y) ∈ I2 com coordenadas diádicas é enumerável.
Exemplo: Tendo em conta o exemplo dado à pág. 12 o ponto 12 , 43 ) vai, por
ϕ, para o ponto 39 23 37
48 e gera os buracos 48 e 48 , assim:

(1, 3) r
2 4

Vamos agora provar que o conjunto destes buracos é denso na aresta


do quadrado (ou ainda, no intervalo [ 0, 1 ]).
Consideremos B′′ ⊂ B o complementar de B′ em B (ver B′ , pág. 6). Isto é,
(x1 x2 x3 x4 . . . ) ∈ B′′ se, e somente se, (x1 x3 x5 . . . ) 6∈ B ou (x2 x4 x6 . . . ) 6∈ B.
Provemos que B′′ é denso em B. De fato, seja ε > 0 e a ∈ B dados. Devemos
mostrar que existe p ∈ B′′ de modo que ν(p, a) < ε. Pois bem, escolhamos j tal
que 21j < ε e tomemos pn = an para n = 1, 2, . . . , j; e para n ≥ j + 1 tomemos
os termos com ı́ndices ı́mpares iguais a 1 e os termos com ı́ndices pares iguais a
0. Sendo assim p ∈ B′′ e ν(p, a) ≤ 21j < ε. Como é fácil inferir a cada ponto de
B′′ corresponde um “lugar ocioso” na aresta.
A “quase-inversa” da curva de Peano
A curva de Peano, não sendo injetora, não possui inversa, mas com uma
“pequena restrição” em seu contradomı́nio ganhamos uma “quase-inversa”.
Seja I ⊂ I = [ 0, 1 ] tal que x ∈ I se, e somente se, x não é uma fração diádica.
Portanto, no “quadrado” I × I temos os pontos (x, y) ∈ [ 0, 1 ]2 tais que x e y
não são frações diádicas, sendo assim resulta que

ϕ 2 = χ(−1)

I

Usaremos das seguintes notações: I = 0, 1 ; χ(−1) = quase-inversa.


Gentil 19

4 A curva de Peano no cubo


De modo inteiramente análogo, podemos construir uma curva de Peano χ
entre o intervalo unitário e o cubo unitário [0, 1]3 , assim:

1
@ @
{0, 1}N
@ @
ξ @ @
η
η3
:
1⊤
B : q@
@ @@ (1,1,1)
Ψ (x,y,z)
:
q
q 0 1
η2 @
wq
{0, 1}N @
η1 @
0⊥
@@
1
{0, 1}N

Figura 3: Curva de Peano no Cubo



Nesta figura η faz uma demultiplexagem
 de uma seqüência xn ∈ B.
Isto é, η toma uma seqüência xn e a separa em três subseqüências
 
η (xn ) = η1 (xn ), η2 (xn ), η3 (xn )

Então podemos tomar∗ :

η1 (x1 x2 x3 . . .) = (x1 x4 x7 x10 . . .)


η2 (x1 x2 x3 . . .) = (x2 x5 x8 x11 . . .)
η3 (x1 x2 x3 . . .) = (x3 x6 x9 x12 . . .)

η1 (x1 x4 x7 x10 . . .)
(x1 x2 x3 x4 x5 . . .) (x2 x5 x8 x11 . . .)
η3
(x3 x6 x9 x12 . . .)

Exemplos:
(1) Calcule a imagem, por χ, de w = 0, 5.
Solução: Desenvolvendo 0, 5 na base 2, temos (10000 . . .)2 = 21 .
Então Ψ(0, 5) = (1000000 . . .). Agora aplicamos η à seqüência anterior,
assim

η1 (1000000 . . .) = (1000000 . . .)
η2 (1000000 . . .) = (0000000 . . .)
η3 (1000000 . . .) = (0000000 . . .)
 
Agora aplicamos ξ ao ponto η1 , η2 , η3 : ξ (η1 , η2 , η3 ) = (x, y, z), obtendo
χ 12 = 21 , 0, 0 .
 

∗ No apêndice pág. 47, mostramos como retirar um número arbitrário de subseqüências de

uma dada seqüência.


Gentil 20

(2) Calcule a imagem, por χ, de w = 2/3.


Solução: Desenvolvendo 2/3 na base 2, obtemos 23 = (1010101010 . . .)2 . Então
Ψ(2/3) = (1010101010 . . .). Aplicamos η à seqüência anterior:

η1 (1010101010 . . .) = (1010101 . . .)
η2 (1010101010 . . .) = (0101010 . . .)
η3 (1010101010 . . .) = (1010101 . . .)
 
Agora aplicamos ξ ao ponto η1 , η2 , η3 : ξ (η1 , η2 , η3 ) = (x, y, z), obtendo
χ 32 = 32 , 13 , 32 . Graficamente, temos


-χ 6
1 1
@ @
2
→ q - @ @
χ
@ q3 3 3 @@
3
1 (2,1,2)

@
2
q
(1,1,1)

0 0 q2
-x
1
@
@
@
@
@1
R
@
y

(3) Encontre todos os pontos do intervalo que são transferidos, por χ, para
o centro do cubo. Isto é, resolva a equação χ(x) = 12 , 21 , 21 .


Solução: Temos as seguintes alternativas:




 VVV : (1 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 . . .) −→ (1 1 1 0 0 0 0 0 0 . . .)





 VVF : (1 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 . . . , 0 1 1 1 . . .) −→ (1 1 0 0 0 1 0 0 1 . . .)





 VFV : (1 0 0 0 . . . , 0 1 1 1 . . . , 1 0 0 0 . . .) −→ (1 0 1 0 1 0 0 1 0 . . .)

1 1 1 VFF : (1 0 0 0 . . . , 0 1 1 1 . . . , 0 1 1 1 . . .) −→ (1 0 0 0 1 1 0 1 1 . . .)

, , →
2 2 2 
 FVV : (0 1 1 1 . . . , 1 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 . . .) −→ (0 1 1 1 0 0 1 0 0 . . .)






 FVF : (0 1 1 1 . . . , 1 0 0 0 . . . , 0 1 1 1 . . .) −→ (0 1 0 1 0 1 1 0 1 . . .)

FFV : (0 1 1 1 . . . , 0 1 1 1 . . . , 1 0 0 0 . . .) −→ (0 0 1 1 1 0 1 1 0 . . .)






FFF : (0 1 1 1 . . . , 0 1 1 1 . . . , 0 1 1 1 . . .) −→ (0 0 0 1 1 1 1 1 1 . . .)

Nota: Os digitos na cor azul, em cada seqüência, representam o perı́odo; isto é,
são os três digitos que se repetem em seguida.
Para ilustrar a finalidade do diagrama acima consideremos, por exemplo,
a segunda das combinações (VVF), assim:
Gentil 21

1
@ @
{0, 1}N
@ @
ξ @ @
η
η3
:
1⊤
B : q@
@ @@ (1,1,1)
Ψ (1 1 1 , , )
:
q 2 2 2
q (1 0 0 0..., 1 0 0 0..., 0 1 1 1...) 0 1

43 (1 1 0 0 0 1 0 0 1...) η2 @
@
56
q
{0, 1}N
η1 @
0⊥
@@
1
{0, 1}N

Deste diagrama concluimos que, χ 43 1 1 1


 
56 = 2 , 2 , 2 . Das combinações an-
teriores apenas uma (FFF) não pertence a B, portanto não é oriunda da codi-
ficação de nenhum ponto do intervalo [ 0, 1 ], sendo assim temos:
 49   43   37   31   25   19   13  1 1 1
χ =χ =χ =χ =χ =χ =χ = , ,
56 56 56 56 56 56 56 2 2 2
Seja (x, y, z) um ponto do cubo. Com um pouco de reflexão o leitor chegará
às seguintes conclusões:
1a ) Se as três coordenadas, x, y e z, forem frações diádicas então, neste ponto são
colocados sete pontos da aresta do cubo (digo, do intervalo unitário). De outro
modo: a curva passa sete vezes por pontos com as três coordenadas diádicas;
2a ) Se apenas duas coordenadas forem frações diádicas então, neste ponto são
colocados quatro pontos da aresta do cubo. De outro modo: a curva passa
quatro vezes por pontos com duas coordenadas diádicas;
3a ) Se apenas uma coordenada for fração diádica então, neste ponto são colo-
cados dois pontos da aresta do cubo. De outro modo: a curva passa duas vezes
por pontos com uma coordenada diádicas;
4a ) Se nenhuma das coordenadas é diádica então, neste ponto é colocado um
único ponto da aresta do quadrado. De outro modo: a curva passa uma única
vez em pontos com nenhuma coordenada diádica;
5a ) O conjunto dos pontos de auto-interseção da curva é infinito enumerável e
denso no quadrado.
Gentil 22

5 O cubo hiper-mágico
A exemplo do que foi feito para o quadrado também podemos transferir
todos os pontos do cubo para uma de suas arestas. Sendo que esta transformação
cumpre as mesmas condições que a do quadrado: é contı́nua, injetiva e não
sobrejetiva.

1
@ @
B
@ @
η3 h @ @
1⊤
B g q@
@ @@ (1,1,1)
f q
0
(x,y,z)
1
q
η2 @
wq
B @
@
0⊥ B η1 @@
1

Figura 4: Cubo hiper-mágico

Exemplos:
(1) Calcule ϕ 0, 0, 12 .


Solução: Temos 21 = (1 0 0 0 0 0 0 0 . . .)2 . Logo


 
1
h 0, 0, = (0 0 0 0 0 0 . . . , 0 0 0 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 0 . . .)
2
- Agora aplicamos, ao ponto anterior, g.
  
Observação: Dadas três seqüências xn , yn e zn , g faz uma mul-
tiplexagem das mesmas, segundo a partição

N1 = {1, 4, 7, 10, . . .}; xn

N2 = {2, 5, 8, 11, . . .}; yn

N3 = {3, 6, 9, 12, . . .}; zn

Ou seja 
g (xn ), (yn ), (zn ) = (x1 y1 z1 x2 y2 z2 x3 y3 z3 x4 y4 z4 . . .)
portanto

g (0 0 0 0 0 0 . . . , 0 0 0 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 0 . . .) = (0 0 1 0 0 0 0 0 0 . . .)

- Agora aplicamos, à seqüência anterior, f . Então


 0 0 1 0 0 1
f (0 0 1 0 0 0 0 0 0 . . .) = 1 + 2 + 3 + 4 + 5 + · · · = .
2 2 2 2 2 8
Portanto, ϕ 0, 0, 21 = 18 .

Gentil 23

1 1 1

(2) Calcule ϕ 2, 2, 2 .
Solução: Temos 21 = (1 0 0 0 0 0 0 0 . . .)2 . Logo
 
1 1 1
h , , = (1 0 0 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 0 . . .)
2 2 2

- Agora aplicamos, ao ponto anterior, g. Portanto



g (1 0 0 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 0 . . .) = (1 1 1 0 0 0 0 0 0 . . .)

- Agora aplicamos, à seqüência anterior, f . Então


 1 1 1 0 0 1 1 1 7
f (1 1 1 0 0 0 0 0 0 . . .) = 1 + 2 + 3 + 4 + 5 + · · · = + + = .
2 2 2 2 2 2 4 8 8
Portanto, ϕ 21 , 12 , 12 = 87 .


Graficamente, temos

ϕ
z -
6 1
1
q 78

r
(1,1,1)
z
ϕ

r q 18
0
0

1
@
R
y

Deste exemplo e do exemplo (3) (pág. 20) concluimos que o centro do


cubo vai para o ponto 7/8 e gera seis buracos na aresta do cubo (ou no intervalo
unitário).

Observe que paradoxal: A exemplo do que ocorreu no quadrado hiper-


mágico aqui também conseguimos, por ϕ, transferir o cubo para uma de suas
arestas, com a “agravante” de que agora “mais” buracos serão gerados na
aresta. Por exemplo um ponto (x, y) ∈ I2 com ambas as coordenadas diádicas
gera dois buracos na aresta do quadrado; por outro lado um ponto (x, y, z) ∈ I3
com duas coordenadas diádicas gera quatro buracos na aresta do cubo e com
três coordenadas diádicas gera seis buracos. Resumindo: estamos transferindo
para a aresta um “volume” maior de pontos enquanto o número de lugares va-
zios na aresta aumenta.
Naturalmente que, o que foi feito para o quadrado e o cubo, se estende
sem dificuldade ao “hipercubo”.
Gentil 24

Cubo Hiper-Mágico

8 t t7 “Tudo isso, que à primeira vista


parece excesso de irrazão, na verdade
é o efeito da finura e da extensão do
espı́rito humano e o método para en-
contrar verdades até então desconheci-
4 t t3
das.” Voltaire (17 a Carta)

t9

5 t t6

ϕ : [0, 1]3 −→ [0, 1]

1 t t2

Gentil/2005
“O que a matemática pontua,
s s s s s s s9s s não raro a natureza corrobora.”
5 8 6 7 1 4 2 3
Gentil (1 o Bilhete)

Nota: Os seis buracos constantes na aresta foram abertos pelo centro do


cubo.

Cálculos do Cubo

1 : (1, 0, 0), 2 : (1, 1, 0), 3 : (1, 1, 1), 4 : (1, 0, 1)


1 1 1

5 : (0, 0, 0), 6 : (0, 1, 0), 7 : (0, 1, 1), 8 : (0, 0, 1), 9: 2, 2, 2 .
- Imagens dos vértices por ϕ

11111 ...
1 : (1, 0, 0) 00000 ... 100100100100100 ...
00000 ...

1 0 0 1 0 0 1 0 0
ϕ(1) = 1 + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + 7 + 8 + + ···
2 2 2 2 2 2 2 2 29
1
1 1 1 2 4
= + + + · · · = = ≃ 0, 5714
21 24 27 1 − 213 7
Gentil 25

11111 ...
2 : (1, 1, 0) 11111 ... 110110110110110 ...
00000 ...

1 1 0 1 1 0 1 1 0
ϕ(2) = 1 + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + 7 + 8 + + ···
2 2 2 2 2 2 2 2 29
1 1 1  1 1 1 
= 1 + 4 + 7 + ··· + 2 + 5 + 8 + ···
2 2 2 2 2 2
1 1
2 22 4 2 6
= 1 + 1 = + = ≃ 0, 8571
1− 23 1− 23
7 7 7

11111 ...
3 : (1, 1, 1) 11111 ... 111111111111111 ...
11111 ...
1 1 1
ϕ(3) = + 2 + 3 + ··· = 1
21 2 2

11111 ...
4 : (1, 0, 1) 00000 ... 101101101101101 ...
11111 ...

1 0 1 1 0 1 1 0 1
ϕ(4) = + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + 7 + 8 + 9 + ···
21 2 2 2 2 2 2 2 2
1 1 1  1 1 1 
= 1 + 4 + 7 + ··· + 3 + 6 + 9 + ···
2 2 2 2 2 2
1 1
2 23 4 1 5
= 1 + 1 = + = ≃ 0, 7143
1− 23 1− 23
7 7 7

00000 ...
5 : (0, 0, 0) 00000 ... 000000000000000 ...
00000 ...
0 0 0
ϕ(5) = + 2 + 3 + ··· = 0
21 2 2

00000 ...
6 : (0, 1, 0) 11111 ... 010010010010010 ...
00000 ...
Gentil 26

0 1 0 0 1 0 0 1 0
ϕ(6) = + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + 7 + 8 + 9 + ···
21 2 2 2 2 2 2 2 2
1
1 1 1 22 2
= 2 + 5 + 8 + ··· = 1 = 7 ≃ 0, 2857
2 2 2 1 − 23

00000 ...
7 : (0, 1, 1) 11111 ... 011011011011011 ...
11111 ...

0 1 1 0 1 1 0 1 1
ϕ(7) = + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + 7 + 8 + 9 + ···
21 2 2 2 2 2 2 2 2
1 1 1  1 1 1 
= 2 + 5 + 8 + ··· + 3 + 6 + 9 + ···
2 2 2 2 2 2
1 1
22 23 2 1 3
= 1 + 1 = + = ≃ 0, 4286
1− 23 1− 23
7 7 7

00000 ...
8 : (0, 0, 1) 00000 ... 001001001001001 ...
11111 ...

0 0 1 0 0 1 0 0 1
ϕ(8) = + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + 7 + 8 + 9 + ···
21 2 2 2 2 2 2 2 2
1
1 1 1 23 1
= 3 + 6 + 9 + ··· = 1 = 7 ≃ 0, 1429
2 2 2 1 − 23

10000 ...
1 1 1

9: 2, 2, 2 10000 ... 111000000000000 ...
10000 ...

1 1 1 0 0 0 0 0 0
ϕ(9) = + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + 7 + 8 + 9 + ···
21 2 2 2 2 2 2 2 2
1 1 1 7
= + 2 + 3 = ≃ 0, 8750
21 2 2 8
Gentil 27

Buracos:
- O centro do cubo vai, por ϕ, para o ponto 7/8 ∈ [ 0, 1 ] e “gera” (“reserva”) seis
buracos no intervalo (ver exemplo (2), pág. 23). Para esclarecer esta assertiva
observe o diagrama seguinte,



VVV : (1 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 . . .) −→ (1 1 1 0 0 0 0 0 0 . . .) = 49/56






 VVF : (1 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 . . . , 0 1 1 1 . . .) −→ (1 1 0 0 0 1 0 0 1 . . .) = 43/56

VFV : (1 0 0 0 . . . , 0 1 1 1 . . . , 1 0 0 0 . . .) −→ (1 0 1 0 1 0 0 1 0 . . .) = 37/56






1 1 1 VFF : (1 0 0 0 . . . , 0 1 1 1 . . . , 0 1 1 1 . . .) −→ (1 0 0 0 1 1 0 1 1 . . .) = 31/56

, , →
2 2 2 
 FVV : (0 1 1 1 . . . , 1 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 . . .) −→ (0 1 1 1 0 0 1 0 0 . . .) = 25/56






 FVF : (0 1 1 1 . . . , 1 0 0 0 . . . , 0 1 1 1 . . .) −→ (0 1 0 1 0 1 1 0 1 . . .) = 19/56

FFV : (0 1 1 1 . . . , 0 1 1 1 . . . , 1 0 0 0 . . .) −→ (0 0 1 1 1 0 1 1 0 . . .) = 13/56






FFF : (0 1 1 1 . . . , 0 1 1 1 . . . , 0 1 1 1 . . .) −→ (0 0 0 1 1 1 1 1 1 . . .) = 7/56

1
h @ @
B
× @ @
@ @
1
B
g (1000...,1000...,0111...) q@
@ @@
(1 1 1 , , )
× 0 2 2 2
1
f
@
43 B @
56
@
0 B
@@
1

Observe que a pseudo-codificação VVF, do centro, “gera” um buraco:


(1 0 0 0. . . , 1 0 0 0. . . , 0 1 1 1. . . ), no espaço B3 e este, por sua vez, gera um buraco
em B: (1 1 0 0 0 1 0 0 1. . . ), que, por sua vez, gera um outro buraco em [ 0, 1 ]:
43/56. Desta forma acontece com todas as pseudo-codificações (exceto a última:
FFF). Nos seis pontos seguintes

43/56 = 0, 7679; 37/56 = 0, 6607; 31/56 = 0, 5536; 25/56 = 0, 4464;


19/56 = 0, 3393; 13/56 = 0, 2321.

localizam-se os buracos na aresta do cubo (ou no intervalo unitário), ver fig.


pág. 24.
-Inserindo dimensões arbitrárias dentro de dimensões arbitrárias
As aplicações χ e ϕ, conjuntamente, nos permitem inserir dimensões ar-
bitrárias “dentro” de dimensões arbitrárias. Por exemplo para inserir um cubo
a dez dimensões em um cubo a três dimensões proceda assim:
ϕ χ
[ 0, 1 ]10 −→ [ 0, 1 ] −→ [ 0, 1 ]3

Para inserir um cubo a três dimensões em um cubo a 10 dimensões proceda


assim: χ ϕ
[ 0, 1 ]10 ←− [ 0, 1 ] ←− [ 0, 1 ]3
Gentil 28

6 Possı́veis aplicações na Teoria das Supercordas


Estivemos a imaginar possı́veis aplicações práticas para estas aplicações.
Tivemos duas idéias as quais deixamos aqui, a tı́tulo de sugestão, a quem inte-
ressar possa:
1a ) Na informática: Se tivermos um “volume” de informações (dados)
a transmitir, podemos compactar estes dados em uma dimensão, em seguida
transmitir e, no receptor, recuperá-los, assim [0, 1]3 −→ [0, 1] −→ [0, 1]3 .
2a ) Na Fı́sica: a Teoria das Supercordas é consistente em 10 dimensões. O
problema é saber como um Universo a dez dimensões pode ser reduzido a três
dimensões (espaciais). Nossa sugestão (conjectura) é que as dimensões extras
foram multiplexadas.
Com estas técnicas (multiplexação/demultiplexação) não apenas fazemos
uma transposição de dimensões (isto é, de um espaço em outro), como podemos
transferir uma corda (ou uma p-brana) de uma dimensão à outra. Vejamos um
exemplo do que estamos falando. Suponhamos que um ramo (pedaço) de uma
corda (uma-brana) seja dado pelo gráfico da função f : [0, 1] −→ [0, 1] dada
por f (x) = x2 . Vamos transferir  os cinco pontos seguintes desta curva, para a
terceira dimensão para [0, 1]3 , assim

0 0 0 0 0 . . . , x = 0
( 
 000000...
0, 0 : ⇒ 00000000... ⇒ 00000..., y = 0
000000... 
00000..., z = 0


0 0 0 0 0 . . . , x = 0
( 
1 1 010000...
0 0 1 0 0 . . . , y = 41

4 , 16 : ⇒ 001000010... ⇒
000100... 
1 0 0 0 0 . . . , z = 21

3

1 1 0 0 0 . . . , x = 4
( 
1 1
 1 0 0 0 0 0 . . .
2, 4 : ⇒ 10010000... ⇒ 00000..., y = 0
010000... 
00000..., z = 0

1

1 0 0 0 0 . . . , x = 2
( 
3 9
 110000... 5
4 , 16 : ⇒ 111000010... ⇒ 10100..., y = 8
100100... 
1 0 0 0 0 . . . , z = 21


1 1 1 1 1 . . . , x = 1
( 
 111111...
1, 1 : ⇒ 11111111... ⇒ 11111..., y = 1
111111... 
11111..., z = 1

z

1 s
6 s χ
1
¬

1
2
s s s(1,1,1)
9/16 s ϕ
p

s 0 s s s1 x
1/4 s 0 s
p p

1/16 s
p p p -
0 1 1 3 1
4 2 4
1
y
Gentil 29

Holografia
No livro “O UNIVERSO NUMA CASCA DE NOZ” (Stephen Hawking/pág.
198):
“A holografia codifica as informações de uma região do espaço em uma
superfı́cie com uma dimensão a menos. . . Em um modelo de mundo brana, a
holografia seria uma correspondência de um para um entre estados em nosso
mundo quadridimensional e estados em dimensões superiores.
Mais à frente: Entretanto, sob um ponto de vista positivista, não se pode
perguntar: qual é a realidade, brana ou bolha? Ambas são modelos matemáticos
que descrevem as observações. Cada um é livre para usar o modelo mais con-
veniente.”
Não podemos deixar de vislumbrar uma interseção entre estas declarações
e nossas construções.

7 A métrica Divina (ou quântica)


Agora trataremos do objetivo principal deste trabalho que é a construção
da curva de Peano na métrica Divina. Apresentamos:
A métrica Divina
Considere a seguinte aplicação

k : [0, 1[×[0, 1[−→ R

definida por 
k(x, y) = min |x − y|, 1 − |x − y|
No apêndice (pág. 48) provamos que k é uma métrica sobre M = [0, 1[.

Observe por que devemos excluir o extremo direito do intervalo unitário:


isto se deve a que, caso contrário,

k(1, 0) = min |1 − 0|, 1 − |1 − 0| = 0

o que estaria em flagrante desrespeito à exigência (M1 ) da definição de métrica,


digo:
d(x, y) = 0 ⇒ x = y.
Esta métrica é de fácil manipulação e funciona assim: dados dois pontos
x e y, ambos no intervalo [ 0, 1 [, entre chaves obteremos dois valores: escolhemos
o menor deles como sendo a distância entre os pontos x e y. Por exemplo,
 
k(0, 2; 0, 6) = min |0, 2 − 0, 6|, 1 − |0, 2 − 0, 6| = min 0, 4; 0, 6 = 0, 4
 
k(0, 2; 0, 8) = min |0, 2 − 0, 8|, 1 − |0, 2 − 0, 8| = min 0, 6; 0, 4 = 0, 4
 
k(0, 2; 0, 9) = min |0, 2 − 0, 9|, 1 − |0, 2 − 0, 9| = min 0, 7; 0, 3 = 0, 3

⊢ t ⊢ t t t
0 0, 2 1 0, 6 0, 8 0, 9 1
2

Por oportuno, observe que,

k ( 0, 2; 0, 6 ) = k ( 0, 2; 0, 8 ) > k ( 0, 2; 0, 9 ). (2)
Gentil 30

É isto mesmo que o leitor presencia!!: a distância entre o primeiro e o


segundo ponto − no diagrama acima − é igual à distância entre o primeiro e o
terceiro ponto que . . . pasmem!! é maior que a distância entre o primeiro e o
quarto ponto!
“Tudo isso, que à primeira vista parece excesso de irrazão, na verdade é o efeito da finura e da ex-
tensão do espı́rito humano e o método para encontrar verdades até então desconhecidas.” Voltaire
(17 a Carta)
A questão é que alguns matemáticos procedem como o pai que se detém
mais nas qualidades do “filho” e, obstinadamente, negligenciam seus “defeitos”.
Nós decididamente consideramos também os “defeitos”, pois somos dos que acre-
ditam que podemos tirar grandes lições dos mesmos. Uma vez que a criança foi
gerada devemos assumı́-la integralmente, mesmo correndo o “risco” de sermos
escarnecidos.
A exemplo do que ocorre nas fı́sicas quântica e relativistica, a ma-
temática também comporta seus paradoxos. Por exemplo a métrica k nos brinda
com alguns paradoxos interessantes (ver [2], [6]). Por exemplo: inicialmente va-
mos calcular a distância de um ponto arbitrário x ∈ [ 0, 1[ ao ponto 0, assim
 
k(x, 0) = min |x − 0|, 1 − |x − 0| = min |x|, 1 − |x|

Como 0 ≤ x < 1, temos |x| = x, logo,



k(x, 0) = min x, 1 − x

Temos,
1
x≤ 1−x ⇔ x≤
2
Sendo assim, podemos escrever:

  x, se 0 ≤ x ≤ 21 ;
k(x, 0) = min x, 1 − x = (3)
 1 − x, 1
se 2 ≤ x < 1.

A seguir esboçamos o gráfico da função dada por k(x, 0):


k(x, 0)
1
q

1
2 q

x s
0 q
1
2
1 0 q12 x 1

Este gráfico nos mostra como varia a distância de um ponto arbitrário x à


origem.
Na figura a seguir acrescentamos ao gráfico anterior (para efeito de
comparação) a distância usual, d(x, 0) = |x − 0|, de um ponto arbitrário x do
intervalo [ 0, 1 [ à origem:
Gentil 31

k(x, 0)
1
q

1
2 q

x
0 q
1
2
1


A partir do gráfico de k(x, 0) construı́mos a régua oficial do universo [0, 1[, k ,
assim:

00 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 1

INMETRO
Figura 5: Régua divina

Nota: Observamos que esta régua é tão legı́tima quanto a usual − vendida
em nossas livrarias, tanto é que já a homologamos junto ao Inmetro.
Esta régua nos será bastante útil para destrinchar alguns paradoxos.
Pois bem, o leitor imagine-se caminhando sempre para a direita, a partir
da origem (referencial) do intervalo [ 0, 1[, assim


0 q 21 1

Perguntamos: O leitor estará afastando-se ou aproximando-se da origem ?


Calma. . . a pergunta não é tão idiota quanto parece.
O gráfico de k(x, 0) nos ajuda a resolver a questão: até a metade do
caminho o leitor estará afastando-se da origem, a partir daı́ estará aproximando-
se !
A razão dos nomes da métrica
O gráfico de k(x, 0) mostra que quanto mais nos “afastamos” da origem
- a partir da metade - mais nos aproximamos. Precisamente por esta razão
decidimos chamar k de a métrica divina: mesmo tendo a impressão de estar
se afastando, na verdade você aproxima-se da origem. Digo, por mais que se
caminhe (evolua) estamos sempre, a cada passo, mais próximo da origem de
tudo. O alfa (α) e o ômega (ω) de Teilhard de Chardin se confundem!
Gentil 32

Métrica divina e Bhagavad Gĩtã

Existem asserções que, ao nos encontrar desprevenidos, nos dão a sensação,


por assim dizer, de “um estupro à razão”, tais como a afirmativa em destaque
no verso seguinte :
“Está dentro e fora de todos os seres; é movente e também imovente;
é t~
ao sutil que é imperceptı́vel; está perto e ao mesmo tempo distante".
( Bhagavad Gĩtã - XIII-16 )

Veremos que, em casos como estes, a métrica divina nos restitui a “virgin-
dade”. De fato, ao lê − pela primeira vez − a afirmativa: está perto e ao
mesmo tempo distante, confesso que senti um, por assim dizer, “desconforto
intelectual”. Como algo pode está perto e simultâneamente distante?
Devo admitir que minhas inquietações, a este respeito, foram total-
mente dirimidas (dissipadas) com o uso da métrica divina; senão vejamos:

00 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 1

INMETRO
Figura 6: Régua divina e Bhagavad Gĩtã

Considere o ponto, do intervalo [ 0, 1 [, em destaque na régua acima, observe


que ele está perto e ao mesmo tempo distante da origem:

k(0; 0, 9) = min |0, 9 − 0|, 1 − |0, 9 − 0|

Distante pela régua humana: |0, 9 − 0| = 0, 9 e próximo pela divina: 1 − |0, 9 −


0| = 0, 1.
Ainda podemos vislumbrar o paradoxo acima graficamente, assim:
k(x, 0)

1
q
0, 9

1
2 q

0, 1

0
• x
1
Para os que ficaram insatisfeitos com a interpretação mı́stica que demos
para a métrica k, vejamos uma outra, um tanto quanto mais − por assim dizer
− materialista (concreta): vamos curvar o intervalo [ 0, 1 [ segundo um relógio
de comprimento 1, ou ainda, de raio 2πr = 1, assim
Gentil 33

1 0 1 0
tx
3 1 3 1


p
4 4 4 4

ty
p1 p1
2 2

Pois bem, definindo a “distância angular” entre os ponteiros como


sendo o menor dos angulos θ e 360o − θ, isto é

d(x, y) = min{θ, 360o − θ}

teremos uma idéia de como funciona a métrica divina. É isto o que significa
dizer que a métrica curva o espaço.
Nas figuras seguintes ilustramos as relações dadas em (2) (pág. 29),
1 0 1 0 1 0

s
0, 9
s0, 2 0, 8 s s0, 2 s0, 2
3 r 1 3 r 1 3 r 1
p

p
4 4 4 4 4 4
s

0, 6 p1 p1 p1
2 2 2

Nota: No trabalho [6] justificamos o porque do nome alternativo: Métrica


quântica.

Bolas no Espaço [0, 1[, k

Vamos esboçar a bola de centro 0 e raio r no espaço [0, 1[, k . Isto é,
queremos caracterizar Bk (0; r). Pois bem,

Bk (0; r) = x ∈ [0, 1[ : k(x, 0) < r
 
= x ∈ [0, 1[ : min |x − 0|, 1 − |x − 0| < r
 
= x ∈ [0, 1[ : min |x|, 1 − |x| < r

Isto é, pertencem


à bola Bk (0; r) todos os 0 ≤ x < 1 tais que
min x, 1 − x < r. Observe que

 x, se 0 ≤ x ≤ 21 ;
k(x, 0) = min x, 1 − x =
1 − x, se 1 ≤ x < 1. 2

Temos ainda
1 1 1
≤ x < 1 ⇐⇒ 0 < 1 − x ≤ =⇒ k(x, 0) ≤ .
2 2 2
A seguir esboçamos o gráfico da função dada por k(x, 0):
Gentil 34

k(x, 0) k(x, 0)
6 6

1 1
q q

1 1
2 q 2 q
r
-x -x
0 q
1 q1 0 q
1 q1
2 ↑ 2 ↑
r 1−r

Com o objetivo de obter a bola Bk (0; r), fixamos na figura da direita


um valor para r. Uma análise deste gráfico nos permite concluir que

[0, r[ ∪ ]1 − r, 1[, se 0 < r ≤ 12 ;
Bk (0; r) =
[0, 1[, se r > 21 .
Observe
0 r 1−r 1 0 r 1 0 1

Bk (0; r< 21 ) Bk (0; r= 21 ) Bk (0; r> 21 )

Deixamos como desafio ao leitor a incubência do esboço da bola de


centro p e raio r no espaço [0, 1[, k . Isto é, caracterizar Bk (p; r) para r > 0 e
0 < p < 1.

Lema 1. Considere 0 ≤ p < 1 e r > 0, então Bµ p; r ⊂ Bk (p; r).

Prova: Seja x ∈ Bµ p; r então |x − p| < r. Temos duas possibilidades:

k(x, p) = min |x − p|, 1 − |x − p| = |x − p| < r

k(x, p) = min |x − p|, 1 − |x − p| = 1 − |x − p| ≤ |x − p| < r

Em qualquer dos casos x ∈ Bk (p; r). 


1
( i ) Considere a seqüência dada por xn = 1 − n ∈ [0, 1[, cujos termos estão
plotados na figura a seguir
xr1 xr2 xr3 r rrrr
¬1
0 2
1

O leitor diria que os termos desta seqüência aproximam-se de que número?



Vamos mostrar que para os habitantes do universo [0, 1[, k , os termos
da seqüência (xn ) aproximam-se arbitrariamente de 0. De outro modo: Toda
bola centrada em 0 contém todos os termos da seqüência, a partir de uma certa
ordem. Vamos mostrar que
 1
lim 1 − = 0. (4)
n→∞ n
Prova: De fato, dado ε > 0 devemos exibir um ı́ndice n0 (ε) de modo que

∀ n ≥ n0 ⇒ xn ∈ Bk 0; ε .
Gentil 35

Então

xn ∈ Bk 0; ε ⇐⇒ k(xn , 0) < ε

⇐⇒ min |xn − 0|, 1 − |xn − 0| < ε

⇐⇒ min xn , 1 − xn < ε
n 1 1 o
⇐⇒ min 1 − , 1 − 1 − <ε
n n
n 1 1o 1
⇐⇒ min 1 − , = <ε (5)
n n n
Observe que
1 1
≤1− ⇐⇒ n ≥ 2.
n n
Portanto, dado ε > 0 tomamos, de empréstimo a Arquimedes, um ı́ndice n0 tal
que n1 < ε (n0 > 1/ε) e teremos
0

1 1

∀ n ≥ n0 ⇒ < ε.
n n0

Agora, por (5), teremos (seguindo ⇐=) xn ∈ Bk 0; ε . 
1
Façamos duas simulações. Tomando, por exemplo, ε = 4, temos

1
n0 > 1 = 4 ⇒ n0 = 5.
4

Isto implica que, todos os termos da seqüência, a partir do quinto (inclusive),


caem dentro da bola Bk 0; 41 . Já para ε = 16 isto só acontece a partir do sétimo


termo. Veja ilustrações a seguir:


x1 x2 x3 x4 x1 x2 x3 x4

1
r r r r rrrr 1
r r r r rrrr
Bk (0; 4) Bk (0; 6)
0 1 3 1 0 1 5 1
4 4 6 6

Este exemplo é um caso especial do seguinte resultado.


Corolário 1. Toda seqüência (xn ) (0 ≤ xn < 1) que converge para o ponto
p (0 ≤ p < 1) no espaço [0, 1], µ , converge para o mesmo ponto no espaço
[0, 1[, k .
Prova: Decorre do lema 1, pág. 34. 
Espaço produto
Uma outra alternativa para se construir espaços métricos é via produto
cartesiano.
Sejam (M1 , d1 ) e (M2 , d2 ) espaços métricos. A partir destes vamos cons-
truir, por exemplo, três outros espaços, do seguinte modo: Tomemos dois pontos

x = (x1 , x2 ) ∈ M1 × M2 = M e y = (y1 , y2 ) ∈ M1 × M2 = M
Gentil 36

e vamos definir três funções

D1 , D2 , D3 : M × M −→ R

dadas por
q
D1 (x, y) = d21 (x1 , y1 ) + d22 (x2 , y2 )

D2 (x, y) = d1 (x1 , y1 ) + d2 (x2 , y2 )

D3 (x, y) = max {d1 (x1 , y1 ); d2 (x2 , y2 )}

Pode ser mostrado que (M, D1 ), (M, D2 ) e (M, D3 ) são também espaços
métricos.
Observe que x1 , y1 ∈ M1 e x2 , y2 ∈ M2 de modo que d1 (x1 , y1 ) é calculado
no espaço (M1 , d1 ) enquanto d2 (x2 , y2 ) é calculado no espaço (M2 , d2 ).

Exemplo: A partir do espaço métrico [0, 1[, k podemos obter outros três, no
conjunto [ 0, 1 [ × [ 0, 1 [:

1 1

s(x1 ,x2 )

s(y1 ,y2 )

0 1 0 1

assim:

q
D1 (x, y) = k2 (x1 , y1 ) + k2 (x2 , y2 )

D2 (x, y) = k(x1 , y1 ) + k(x2 , y2 ) (6)



D3 (x, y) = max k(x1 , y1 ); k(x2 , y2 )

Bolas no espaço produto


Citamos a seguinte
Proposição 1. Sejam (M1 , d1 ), (M2 , d2 ), . . ., (Mn , dn ) espaços métricos e
consideremos sobre M = M1 × M2 × · · · × Mn a métrica

D3 (x, y) = max d1 (x1 , y1 ), . . . , dn (xn , yn )

onde x = ( x1 , x2 , . . . , xn ) e y = ( y1 , y2 , . . . , yn ) são ponto de M .


Fixe um ponto p = ( p1 , p2 , . . . , pn ) ∈ M . Nestas condições a seguinte
identidade é válida

BD ( p; r) = Bd ( p1 ; r) × Bd ( p2 ; r) × · · · × Bdn( pn ; r)
3 1 2
Gentil 37

Exemplos:

Vejamos dois exemplos no espaço [0, 1[×[0, 1[, D3 .
( i ) Temos
 1 1 1
BD3 (0, 0); = Bk 0; × Bk 0;
4 4 4
 1   3   1   3 
= 0, ∪ , 1 × 0, ∪ ,1
4 4 4 4
Geometricamente esta bola fica assim:

3
4

1 =⇒
¬

1
4

¬
1 1 3
0 4 2 4 1

Seria bom o leitor rever o diagrama de bolas abertas à página 34.


( ii ) Temos
 1 3 1 1 1 3 1
BD , ; = Bk ; × Bk ;
3 4 4 3 4 3 4 3
 7   11   1   5 
= 0, ∪ , 1 × 0, ∪ ,1
12 12 12 12
Geometricamente esta bola fica assim (confirme!):

3
4
rp rp

1 =⇒
¬

2
5
12

1
12 ¬
1 1 7 11
0 4 2 12 12 1

Quadrados mágicos: As quatro seqüências dadas a seguir


Gentil 38

ss ss
1 1
 sx3 st 1 1

xn = n+1 , 1− n+1 → 3 ← tn = 1− n+1 , 1− n+1
sx2 st
2

1 1
 sz sy2 1 1

zn = n+1 , n+1 → sz 2 sy3 ← yn = 1− n+1 , n+1
ss 3 ss

0 1

pertencem todas  às diagonais do quadrado unitário [0, 1[×[0, 1[. O centro do
quadrado 21 , 21 é o primeiro termo de todas elas.
Deixamos como passatempo ao leitor mostrar que

D1 ((0, 0); xn ) = D1 ((0, 0); yn ) = D1 ((0, 0); zn ) = D1 ((0, 0); tn ) = 2/(n + 1),

D2 ((0, 0); xn ) = D2 ((0, 0); yn ) = D2 ((0, 0); zn ) = D2 ((0, 0); tn ) = 2/(n + 1),

D3 ((0, 0); xn ) = D3 ((0, 0); yn ) = D3 ((0, 0); zn ) = D3 ((0, 0); tn ) = 1/(n + 1).

Chamamos este quadrado de mágico porquanto ele possui algumas proprie-


dades interessantes. Por exemplo, todas as quatro seqüências dadas acima estão
aproximando-se, ao contrário do que parece, da origem do quadrado: 0 = (0, 0).
De fato, das equações acima concluimos (para qualquer das métricas) que,
 1 1   1 1 
lim , 1− = (0, 0), lim 1− , = (0, 0)
n→∞ n+1 n+1 n→∞ n+1 n+1
 1 1   1 1 
lim , = (0, 0), lim 1− , 1− = (0, 0)
n→∞ n+1 n+1 n→∞ n+1 n+1
A bola aberta cujo esboço encontra-se na pág. 37, nos ajuda a compreender
porque isto acontece.
Gentil 39

7.1 A curva de Peano e o quadrado hiper-mágico na métrica Divina

Desejamos agora construir a seguinte curva (de Peano):

χk : [ 0, 1 [−→ [ 0, 1 [×[ 0, 1 [

1 1 (1,1)
χk
r

0
0 1

Para tanto, a construção da curva de Peano nos permite inferir que é ne-
cessário que o espaço ([0, 1[, k) seja compacto. Vamos envidar esforços para
provar que assim é.
A seguir lembramos:
Definição 4 (Seqüências de Cauchy). Seja (xn ) uma seqüência num espaço
métrico (M, d). Diremos que (xn ) é uma seqüência de Cauchy se dado ε > 0
existir um ı́ndice n0 tal que

∀ m, n ≥ n0 ⇒ d(xm , xn ) < ε.

A seguir escrevemos em sı́mbolos a definição de seqüência de Cauchy e sua


negação:

∀ ∃ : ∀ (m, n ≥ n0 ) ⇒ d(xm , xn )< ε


ε>0 n0 ∈N m, n∈N
∃ : ∀ ∃ (m, n ≥ n0 ) ∧ d(xm , xn )≥ ε
ε>0 n0 ∈N m, n∈N

Mostraremos que ([0, 1[, k) é completo e totalmente limitado, portanto, com-


pacto.
Para provar a próxima proposição lançaremos mão do fato - conhecido -
de que o espaço [ 0, 1 ], µ ) é completo.
Do corolário 1 concluimos que toda seqüência, (xn ) (0 ≤ xn < 1),
de Cauchy no espaço [ 0, 1 ], µ ) também o é em [0, 1[, k ; mas a recı́proca é
falsa, como veremos.
Observe que, na métrica k, se 1 − |x − y| ≤ |x − y| (isto é |x − y| ≥ 1/2) sig-
nifica que x encontra-se na primeira quarta parte do intervalo [ 0, 1 [ enquanto y
encontra-se na última quarta parte deste intervalo (ou vice-versa, não importa).
Gentil 40


Proposição 2 (Gentil/01.07.05). O espaço métrico [ 0, 1 [, k é completo.

Prova: Seja (xn ) uma seqüência de Cauchy em [ 0, 1 [, k . Isto significa
que:

∀ ε > 0, ∃ n0 : ∀ m, n ≥ n0 ⇒ k(xm , xn ) = min |xm − xn |, 1−|xm − xn | < ε
(7)
Temos duas alternativas:
1a ) (xn ) é de Cauchy em [ 0, 1 ], µ . Neste caso, como este espaço é completo,


(xn ) converge:
µ k µ k
Se xn −→ 1, então xn −→ 0. Se xn −→ p 6= 1, então xn −→ p.
a

2 ) (xn ) não é de Cauchy em [ 0, 1 ], µ .
k
Neste caso afirmamos que a seqüência converge para 0, isto é: xn −→ 0.

De fato, se (xn ) não é de Cauchy em [ 0, 1 ], µ , então (pág. 39):

∃ : ∀ ∃ (m, n ≥ k) ∧ |xm − xn | ≥ ε0 (8)


ε0 >0 k∈N m, n∈N

Podemos acompanhar a prova pelo seguinte fluxograma:

∃ ε0 > 0 (fixo)
(8)
Tome k : 1/k < ε0

Tome (7)
1
ε< k

∃ n0 ∈ N, n0 = n0 (ε)

Tome (8)
( xm , xm , ... ) Tome um novo
1 2
k ≥ max{ n0 , k }
( xn , xn , ... ) k > max{ mi , ni }
1 2 ∃ mi , n i ≥ k
( 1−|xm −xn |< ε )
i i

Na primeira iteração ( i = 1 ) por (8) existe ε0 > 0 (este está fixo) em


seguida, pela propriedade arquimediana, escolhemos um ı́ndice k tal que k1 < ε0 .
Aı́ entramos na segunda caixa do fluxograma, tomando ε < k1 . Tome agora
k ≥ max{ n0 , k }; sendo assim, por (8), podemos escolher dois ı́ndices, digamos:
m1 , n1 ≥ k de modo que |xm − xn | ≥ ε0 . A desigualdade (7) é satisfeita por
1 1
todos os ı́ndices superiores a n0 , como este é o caso dos ı́ndices m1 e n1 , temos
que

k(xm , xn ) = min |xm − xn |, 1 − |xm − xn |
1 1 1 1 1 1

< ε < ε0 ≤ |xm − xn |


1 1

Esta desigualdade impõe que seja k(xm , xn ) = 1 − |xm − xn | < ε.


1 1 1 1
Gentil 41

Observe que, 1 − |xm − xn | < |xm − xn |, ou ainda, |xm − xn | > 1/2;


1 1 1 1 1 1
sendo assim os dois termos patrocinados por (8) resultam, forçosamente, em
lados opostos do intervalo: um no primeiro quarto, o outro, no último quarto
do intervalo.
Aqui termina a primeira iteração. Iniciemos a segunda (i = 2); agora
escolhemos um novo ı́ndice k satisfazendo k > max{ m1 , n1 } e retornamos a
(7).
Por razões análogas ao do caso precedente concluimos que:

k(xm , xn ) = 1 − |xm − xn | < ε


2 2 2 2

Geometricamente tudo se passa assim:


xm xn
2 2
xm xn
1 1

t t p p p t t
0 1 1 3 1
4 2 4

Nota: Não faz mal escolhermos os ı́ndices mj associados aos termos da esquerda
e os ı́ndices nj associados aos termos da direita.
Fazemos duas observações quanto ao fluxograma:
1a ) k ≥ max{ n0 , k } garante que os ı́ndices mi , ni ≥ k, patrocinados por
(8), também satisfazem (7) o que vai garantir que 1 − |xm − xn | < ε.
i i

2a ) k > max{ mi , ni } ≥ k garante que a cada nova iteração o novo k é


maior que o k da iteração anterior, o que garante sempre ε < k1 < ε0 e, ademais,
força (através de ∃ mi , ni ≥ k) que os ı́ndices mi , ni sejam sempre crescentes
(ver definição de subseqüência).
Pois bem, por indução, obtemos duas subseqüências (xm ), no primeiro
j
quarto do intervalo e (xn ), no último quarto do intervalo, tais que
j

k(xm , xn ) = 1 − |xm − xn | < ε (9)


j j j j

Como ε é arbitrariamente pequeno (tendo em conta que k é sempre cres-


cente a cada iteração) a desigualdade (9) impõe que a distância ( µ ): |xm − xn |
j j
aproxime-se arbitrariamente de 1; e isto força os termos de ambas as sub-
seqüências a aproximarem-se, arbitrariamente, das extremidades do intervalo
[ 0, 1 [. Lembrando da bola Bk (0; r):
Bk (0; r< 21 )
0 r 1−r 1

concluimos que ambas as subseqüências (xm ) e (xn ) convergem para 0. Por-


 j j
k
tanto, temos xn −→ 0 e [ 0, 1 [, k resulta completo. 
Observe que esta prova caracteriza (nos diz quem são e porque) todas as
seqüências (xn ) do intervalo [ 0, 1 [ que convergem neste, mas não convergem
no intervalo [ 0, 1 ]: são as seqüências que possuem uma subseqüência no pri-
meiro quarto do intervalo e outra no último quarto. E mais: estas subseqüências
aproximam-se indefinidamente das extremidades do intervalo, ou seja, uma con-
verge para 0 e a outra para 1, no intervalo [ 0, 1 ], daı́ a razão da seqüência (xn )
não convergir em [ 0, 1 ].
Gentil 42

Podemos observar um caso destes escolhendo a seqüência (xn ) dada por,


(1
, se n é par;
xn = n
1 − n1 , se n é ı́mpar.

cujos primeiros termos estão plotados a seguir:

x1 x6 x4 x2 x3 x5 x7

s ... s s s s s s. . .
0 1

Os termos de ı́ndices pares convergem para 0 e os de ı́ndices ı́mpares


também (na métrica k), portanto a seqüência converge para 0 e resulta de
Cauchy. O mesmo já não acontece com respeito à métrica µ.
Corolário 2. Os três quadrados ( [ 0, 1 [ × [ 0, 1 [ , Di ) são completos. (ver pág.
36).

Proposição 3 (Gentil/29.06.05). O espaço métrico [0, 1[, k é compacto.
Prova: De fato, sendo o mesmo completo, é suficiente mostrar que é total-
mente limitado. Sendo [0, 1[ totalmente limitado no espaço (R, µ), segue que,
dado ε > 0 arbitrário podemos, selecionar n pontos: x1 , x2 , x3 , . . . , xn em [0, 1[
de sorte que [ 0, 1 [⊂ Bµ( x1 ; ε) ∪ Bµ ( x2 ; ε) ∪ · · · ∪ Bµ ( xn ; ε). Pelo lema 1 (pág.
34) temos que Bµ xi ; ε ⊂ Bk (xi ; ε), (i = 1, 2, . . . , n). Portanto
n
[ n
[
 
[ 0, 1[ ⊂ Bµ xi ; ε ⊂ Bk xi ; ε
i=1 i=1

Sendo [0, 1[, k completo e totalmente limitado, resulta também com-
pacto. 
Após esta prova concebemos uma outra mais direta. De fato, sendo (xn )
uma seqüência arbitrária em [ 0, 1 [ podemos mostrar que esta possui uma sub-
seqüência convergente. Com efeito, (xn ) é também uma seqüência no espaço
compacto ([ 0, 1 ], µ) e, portanto, possui uma subseqüência (xn ) convergente.
 k
Sendo assim, (xn ) também converge no espaço [0, 1[, k .
k

Corolário 3. Os quadrados [0, 1[ × [0, 1[, Di são compactos.
Observamos que devido ao lema 1 (pág. 34) a aplicação

Ψ−1 :
 
B, ν −→ [0, 1[, k
(xn ) 7−→ x

permanece contı́nua (ver pág. 5). A mesma observação vale para a nova ξ.
Nota: Neste caso continuamos usando a mesma notação para as funções “inter-
mediárias”.
A construção desta curva segue os mesmos passos da anterior.
Gentil 43

Bem, a mudança radical de uma curva para a outra fica por conta dos as-
pectos topológicos, como não poderia deixar de ser. Vejamos alguns exemplos:
1o ) Lembramos que para uma função contı́nua f vale: lim f (xn ) = f (lim xn ).
Por exemplo, considere a seqüência de pontos xn = (1 − 1/n) do intervalo
unitário. Temos
k: lim xn = 0 =⇒ lim χk (xn ) = χk (0) = (0, 0), (origem do quadrado).
n

µ: lim xn = 1 =⇒ lim χ(xn ) = χ(1) = (1, 1).


n
o
2 ) As quatro seqüências dadas a seguir:

ss ss
1 1
 sx3 st 1 1

xn = n+1 , 1− n+1 → 3 ← tn = 1− n+1 , 1− n+1
sx2 st
2

1 1
 sz sy2 1 1

zn = n+1 , n+1 → sz 2 sy3 ← yn = 1− n+1 , n+1
s 3 ss
s

0 1

convergem todas, por ϕk , para a origem do intervalo:


   
lim ϕk xn = lim ϕk yn = lim ϕk zn = lim ϕk tn = 0 (origem do intervalo).
n n n n
o
3 ) Para a seqüência (xn ) dada por,
(1
, se n é par;
xn = n
1 − n1 , se n é ı́mpar.
cujos primeiros termos estão plotados a seguir:

x1 x6 x4 x2 x3 x5 x7

s ... s s s s s s. . .
0 1

Temos χk (xn ) → (0, 0), enquanto χ(xn ) diverge.


Toda seqüência (xn , yn ), com 0 ≤ xn , yn < 1 que converge em [0, 1]2
também converge em [0, 1[2 , mas a recı́proca não vale. Se (xn , yn ) → (p, q) em
[0, 1]2 ; no quadrado [0, 1[2 vai convergir para:
(xn , yn ) → (p, q) se p 6= 1, q 6= 1,
(xn , yn ) → (0, q) se p = 1, q 6= 1,
(xn , yn ) → (p, 0) se p 6= 1, q = 1,
(xn , yn ) → (0, 0) se p = 1, q = 1.
Gentil 44

Estes argumentos fundamentam-se na proposição em R − 7 (pág. 44) e no


corolário 1 (35). Existem seqüências que convergem no quadrado [0, 1[2 e não
convergem no quadrado [0, 1]2 , por exemplo a seqüência (xn , 0) onde xn é dada
como no exemplo 3o ), dado anteriormente.
Evidentemente que podemos construir uma curva de Peano (com a métrica
Divina) no cubo [0, 1[n , bem como um cubo [0, 1[n hiper-mágico.

8 Apêndice
8.1 Tabela de métricas
M 1) µ(x, y) = |x − y|, R

M 2) k(x, y) = min |x − y|, 1 − |x − y| , [ 0, 1 [
P∞ |x −y |
M 3) ν(x, y) = n=1 n2n n , { 0, 1}N
q
M 4) D1 (x, y) = d21 (x1 , y1 ) + d22 (x2 , y2 ), M = M1 × M2
M 5) D2 (x, y) = d1 (x1 , y1 ) + d2 (x2 , y2 ), M = M1 × M2
M 6) D3 (x, y) = max {d1 (x1 , y1 ); d2 (x2 , y2 )}, M = M1 × M2
Nota: x = (x1 , x2 ) ∈ M1 × M2 = M e y = (y1 , y2 ) ∈ M1 × M2 = M .

8.2 Resultados conhecidos


Aqui reuniremos alguns resultados que constam na literartura (ver, por
exemplo, [1])
R-1) Sejam x e y ∈ { 0, 1}N e suponha xn = yn para n = 1, 2, . . . , j. Então
ν(x, y) ≤ 21j . Reciprocamente, se ν(x, y) < 21j então xn = yn para n ≤ j.

   X |xn |
R-2) f : { 0, 1 }N , ν −→ [0, 1], µ , dada por f (xn ) = é contı́nua.
n=1
2n

R-3) A imagem de um conjunto compacto por uma aplicação contı́nua é com-


pacta.

R-4) Se (M, d) é compacto, toda bijeção contı́nua f : M → N é um homeo-


morfismo.

R-5) Sejam (M, d1 ) e (N, d2 ) espaços métricos. Se (M, d1 ) é compacto então


toda aplicação contı́nua f : M −→ N é uniformemente contı́nua.

R-6) Seja (xn ) uma seqüência de Cauchy em um espaço métrico (M, d). Se
existe uma subseqüência de (xn ) que converge para p ∈ M , então lim xn = p.

R-7) Uma seqüência
 (xn , yn ) de pontos no produto M = M1 × M2 converge
no espaço M, Di (i = 1, 2, 3.) para (a, b) ∈ M1 ×M2 se, e somente se, xn −→ a
em (M1 , d1 ) e yn −→ b em (M2 , d2 ).

R-8) Sejam (M1 , d1 ) e (M2 , d2 ) espaços métricos, então M1 × M2 é compacto


se, e somente se, M1 e M2 o forem.
Gentil 45

R-9) Sejam (M, d1 ) e (N, d2 ) espaços métricos, com (N, d2 ) completo. Se


X ⊂ M é denso toda aplicação f : X −→ N uniformemente contı́nua, pos-
sui uma única extensão contı́nua F : M −→ N . F é também uniformemente
contı́nua.
R-10) Sejam (M, d1 ) e (N, d2 ) espaços métricos completos e f : X −→ Y um
homeomorfismo uniforme entre subespaços densos X ⊂ M e Y ⊂ N , f se es-
tende, de modo único, a um homeomorfismo uniforme F : M −→ N .
O seguinte lema será de fundamental importância (decisivo) na construção
da curva de Peano:

Lema 2 (Gentil/03.02.05). O subespaço B, ν é compacto.

Prova:
 Vamos
mostrar inicialmente que B, ν Né fechado. Façamos B =
F ∪ (1111 . . .) , onde F é o subconjunto de {0, 1} cujos elementos não têm
todos os termos iguais a 1, a partir de determinada posição. Mostraremos que
F̄ ⊂ F. De fato, Considere p ∈ F̄ e tal que p 6∈ F. Então existe um ı́ndice k de
modo que p tem todos os termos iguais a 1 a partir de k, assim

p = (p1 , . . . , pk−2 , 0, 1, 1, 1, 1, . . .)

Como p ∈ F̄ existe uma seqüência (xn ) de pontos de F de modo que lim xn = p.


Observe que os termos de (xn ) são da forma:

x1 = (x11 , x12 , x13 , . . . , x1i , . . .)

x2 = (x21 , x22 , x23 , . . . , x2i , . . .)

x3 = (x31 , x32 , x33 , . . . , x3i , . . .)


.................................
xn = (xn1 , xn2 , xn3 , . . . , xni , . . .)
....................................

Como xn ∈ F existem ı́ndices i, arbitrariamente grandes, onde vamos encontrar


um 0 na posição i de xn , assim

xn = xn1 , xn2 , . . . , xn(i−1) , 0, xn(i+1) , . . .

Escolhamos um i > k. Tomando ε > i, teremos 21ε < 21i . Como lim xn = p,
significa que existe um ı́ndice n0 , a partir do qual se verifica ν(xn , p) < 21ε < 21i .
Isto significa, tendo em conta o resultado R-1, que xn deve coincidir com p
até a posição i (no mı́nimo) o que é absurdo. Sendo assim, F resulta fechado.
Por outro lado, sendo o conjunto { 0, 1 }N compacto, temos que, F, ν resulta
compacto,
 por ser um subconjunto fechado de um compacto. Também B =
F ∪ (1111 . . .) resulta compacto por ser a união de dois compactos. 


B , ν é compacto e denso (pág. 6)
Consideremos o subconjunto B′ ⊂ B, onde
(xn ) ∈ B′ ⇐⇒ suas subseqüências de ı́ndices ı́mpares e pares pertencem a B.
Gentil 46

Lema 3 (Gentil/03.05.05). O subespaço B′ , ν é compacto.




Prova: Vamos mostrar inicialmente que B′ , ν é fechado. Mostraremos




que B̄′ ⊂ B′ . De fato, Considere p ∈ B̄′ e tal que p 6∈ B′ . Então existe um ı́ndice
k de modo que p tem, em sua subseqüência de ı́ndices ı́mpares (ou pares- vamos
supor ı́mpares), todos os termos iguais a 1 a partir de 2k − 1, assim

( p1 , p3 , p5 , . . . , p2k−1 , 1, 1, 1, . . .) 6∈ B
p = ( p1 , p2 , p3 , . . . , pn , . . .)
( p2 , p4 , p6 , . . . , p2n , . . .)

Como p ∈ B̄′ existe uma seqüência (xn ) de pontos de B′ de modo que


lim xn = p. Observe que os termos de (xn ) são da forma:

x1 = (x11 , x12 , x13 , . . . , x1i , . . .)

x2 = (x21 , x22 , x23 , . . . , x2i , . . .)

x3 = (x31 , x32 , x33 , . . . , x3i , . . .)


.................................
xn = (xn1 , xn2 , xn3 , . . . , xni , . . .)
....................................

Como xn ∈ B′ existem ı́ndices i, arbitrariamente grandes, onde vamos encontrar


um 0 na posição 2i − 1 de xn , assim

( xn1 , . . . , xn(2i−3) , 0, xn(2i+1) , . . .)



xn = xn1 , xn2 , . . . , xn(2i−2) , 0, xn(2i) , . . .
( xn2 , xn4 , . . . , xn(2i−2) , . . .)

Escolhamos um ı́ndice i de modo que 2i − 1 > 2k − 1. Tomando ε > 2i − 1,


teremos 21ε < 22i−1
1
. Como lim xn = p, significa que existe um ı́ndice n0 , a
partir do qual se verifica ν(xn , p) < 21ε < 22i−1 1
. Isto significa que xn deve
coincidir com p até a posição 2i − 1 (no mı́nimo) o que é absurdo. Sendo assim,
B′ resulta fechado. Por outro, sendo o conjunto {0, 1}N compacto, temos que


B , ν resulta compacto, por ser um subconjunto fechado de um compacto. 
Podemos mostrar também que B′ é denso em B. De fato, seja ε > 0 e
a ∈ B dados. Devemos mostrar que existe p ∈ B′ de modo que ν(p, a) < ε.
Pois bem, escolhamos j tal que 21j < ε e tomemos pn = an para n = 1, 2, . . . , j;
façamos pn = 0 para n ≥ j + 1. Sendo assim p ∈ B′ e ν(p, a) ≤ 21j < ε.
Gentil 47

8.3 Como retirar um número arbitrário de subseqüências


de uma dada seqüência/Partição dos naturais
Vamos mostrar agora como
 retirar um número arbitrário de subseqüências
de uma dada seqüência xn .
Se quisermos retirar duas subseqüências de uma dada seqüência podemos
nos valer dos seguintes conjuntos de ı́ndices:

N1 = {1, 3, 5, 7, . . .}
N2 = {2, 4, 6, 8, . . .}

Assim,

(x1 x3 x5 x7 . . .)
(x1 x2 x3 x4 x5 . . .)
(x2 x4 x6 x8 . . .)

Se quisermos retirar três subseqüências de uma dada seqüência pode-


mos nos valer dos seguintes conjuntos de ı́ndices:

N1 = {1, 4, 7, 10, . . .}
N2 = {2, 5, 8, 11, . . .}
N3 = {3, 6, 9, 12, . . .}

Assim,

(x1 x4 x7 x10 . . .)
(x1 x2 x3 x4 x5 . . .) (x2 x5 x8 x11 . . .)
(x3 x6 x9 x12 . . .)

É fácil inferir a regra de construção destes conjuntos.


Gentil 48


8.4 [ 0, 1 [, k é um espaço métrico.
Teorema 1 (Métrica Divina/Gentil/23.05.08). A aplicação,

k : [ 0, 1 [ ×[ 0, 1 [−→ R

definida por 
k(x, y) = min |x − y|, 1 − |x − y|
é uma métrica sobre M = [ 0, 1 [.
Prova: (M1 ) k(x, y) ≥ 0 e k(x, y) = 0 ⇐⇒ x = y ;

Temos
( (
0≤x<1 0≤x<1
⇒ ⇒ −1 < x − y < 1 ⇒ |x − y| < 1.
0≤y<1 −1 < −y ≤ 0

Sendo assim mostramos que k(x, y) ≥ 0.

Agora suponhamos,

k(x, y) = min |x − y|, 1 − |x − y| = 0

Já vimos que |x − y| < 1, isto é, 1 − |x − y| > 0. Então se k(x, y) = 0 só
pode ser porque |x − y| = 0, isto é, x = y.
Reciprocamente, se x = y, resulta,
 
k(x, y) = min |x − y|, 1 − |x − y| = min |0|, 1 − |0| = 0.

(M2 ) k(x, y) = k(y, x) ;

Temos
 
k(x, y) = min |x − y|, 1 − |x − y| = min |y − x|, 1 − |y − x| = k(y, x).

(M3 ) k(x, y) ≤ k(x, z) + k(z, y).

Devemos mostrar que k(x, y) ≤ k(x, z) + k(z, y). Isto é,


  
min |x−y|, 1−|x−y| ≤ min |x−z|, 1−|x−z| +min |z−y|, 1−|z−y| (10)

Vamos separar o nosso problema em oito possibilidades, conforme tabela


a seguir,
Gentil 49

k(x, y) k(x,z) k(z,y)


Temos:
|x−y| |x−z| |z−y| (P1)
|x−y|≤1−|x−y| ⇔ |x−y|≤ 12
1−|x−y| |x−z| |z−y| (P2)
1−|x−y|≤|x−y| ⇔ |x−y|≥ 21
|x−y| 1−|x−z| |z−y| (P3)

1−|x−y| 1−|x−z| |z−y| (P4) |x−z|≤1−|x−z| ⇔ |x−z|≤ 12

1−|x−z|≤|x−z| ⇔ |x−z|≥ 21
|x−y| |x−z| 1−|z−y| (P5)

1−|x−y| |x−z| 1−|z−y| (P6)


|z−y|≤1−|z−y| ⇔ |z−y|≤ 12
|x−y| 1−|x−z| 1−|z−y| (P7) 1−|z−y|≤|z−y| ⇔ |z−y|≥ 21
1−|x−y| 1−|x−z| 1−|z−y| (P8)

Então:

(P1) Neste caso a desigualdade (10) reduz-se a

|x − y| ≤ |x − z| + |z − y|

a qual é trivialmente satisfeita por tratar-se da desigualdade triangular para


números reais.
(P2) Neste caso a desigualdade (10) reduz-se a

1 − |x − y| ≤ |x − z| + |z − y|

Vamos mostrar a desigualdade equivalente

|x − y| + |x − z| + |z − y| ≥ 1 (11)
1
Observe que na possibilidade (P2) se verifica |x − y| ≥ 2 (∗).

Inicialmente vamos mostrar que não podemos ter


1
|x − z| + |z − y| <
2
De fato, se isto fosse possı́vel teriamos (utilizando a desigualdade triangu-
lar)
1
|x − y| ≤ |x − z| + |z − y| <
2
1
contradizendo (∗). Sendo assim só pode ser |x−z|+|z−y| ≥ 2 o que, juntamente
com (∗), nos fornece a desigualdade (11).

(P3) Neste caso a desigualdade (10) reduz-se a

|x − y| ≤ 1 − |x − z| + |z − y|

Vamos mostrar a desigualdade equivalente

|x − y| + |x − z| − |z − y| ≤ 1 (12)
Gentil 50

Pois bem, pela desigualdade triangular podemos escrever

|x − z| ≤ |x − y| + |y − z| ⇐⇒ |x − z| − |z − y| ≤ |x − y|

somando |x − y| a ambos os membros desta última desigualdade, obtemos

|x−y|+|x−z|−|z−y| ≤ |x−y|+|x−y| ⇐⇒ |x−y|+|x−z|−|z−y| ≤ 2|x−y| ≤ 1.

Na última desigualdade usamos o fato de que na possibilidade (P3) se verifica


|x − y| ≤ 21 .

(P4) Neste caso a desigualdade (10) reduz-se a

1 − |x − y| ≤ 1 − |x − z| + |z − y|

Esta desigualdade é equivalente à seguinte

|x − z| ≤ |x − y| + |y − z|

a qual é sempre verdadeira por tratar-se da desigualdade triangular para números


reais.

(P5) Neste caso a desigualdade (10) reduz-se a

|x − y| ≤ |x − z| + 1 − |z − y|

Vamos mostrar a desigualdade equivalente

|x − y| + |z − y| − |x − z| ≤ 1 (13)

Pois bem, pela desigualdade triangular podemos escrever

|z − y| ≤ |z − x| + |x − y| ⇐⇒ |z − y| − |x − z| ≤ |x − y|

somando |x − y| a ambos os membros desta última desigualdade, obtemos

|x−y|+|z−y|−|x−z| ≤ |x−y|+|x−y| ⇐⇒ |x−y|+|z−y|−|x−z| ≤ 2|x−y| ≤ 1.

Na última desigualdade usamos o fato de que na possibilidade (P5) se verifica


|x − y| ≤ 12 .

(P6) Neste caso a desigualdade (10) reduz-se a

1 − |x − y| ≤ |x − z| + 1 − |z − y|

Esta desigualdade é equivalente à seguinte

|z − y| ≤ |z − x| + |x − y|

a qual é sempre verdadeira por tratar-se da desigualdade triangular para números


reais.

(P7) Neste caso a desigualdade (10) reduz-se a

|x − y| ≤ 1 − |x − z| + 1 − |z − y|
Gentil 51

Vamos mostrar a desigualdade equivalente

|x − y| + |x − z| + |z − y| ≤ 2 (14)

Na possibilidade (P7) se verifica:


1 1 1
(i) |x − y| ≤ (ii) |x − z| ≥ (iii) |z − y| ≥ .
2 2 2
Se dividirmos o intervalo [ 0, 1[ ao meio; por (ii) vemos que x e z não
podem figurar na mesma metade do intervalo. Por (iii) acontece o mesmo com
respeito a z e y. Devemos ter a seguinte configuração:
y x z
⊢ t t ⊢ t
0 1 1
2

A partir de (14) podemos escrever f (x, y, z) = |x − y| + |x − z| + |z − y|.


Vamos mostrar que o maior valor que esta função pode assumir não excede 2.
Tendo em conta a figura anterior temos que,

|x − y| = x − y, |x − z| = z − x, |z − y| = z − y

Não faz mal supor x à direita de y. Logo, f (x, y, z) = 2(z − y), então,
(
0 ≤ y ≤ 21 1
⇒ − ≤ −y ≤ 0 ⇒ 0 ≤ z − y < 1 ⇒ 0 ≤ 2(z − y) < 2.
1
≤ z < 1 2
2

Daqui inferimos que f (x, y, z) = |x − y| + |x − z| + |z − y| = 2(z − y) < 2,


donde concluimos que a desigualdade (14) será sempre verdadeira.
(P8) Neste caso a desigualdade (10) reduz-se a

1 − |x − y| ≤ 1 − |x − z| + 1 − |z − y| (15)

Esta alternativa (possibilidade) só pode ocorrer se tivermos simultâneamente,


1 1 1
(i) |x − y| ≥ (ii) |x − z| ≥ (iii) |z − y| ≥ .
2 2 2
Vamos mostrar que, dados três pontos x, y e z arbitrários, estas três possibili-
dades jamais ocorrem simultâneamente e, por conseguinte, a possibilidade (15)
não pode ocorrer (pode ser ignorada, descartada).
Com efeito, dados três pontos x, y e z arbitrários existem as seguintes pos-
sibilidades:
a) x = y = z b) x = y 6= z c) x = z 6= y d) y = z 6= x e) x 6= y 6= z.
As possibilidades a) e b) contradizem (i), a possibilidade c) contradiz (ii)
e a possibilidade d) contradiz (iii). Portanto, só nos resta considerar a possibi-
lidade e), em que os três pontos são distintos. Ora, como é impossı́vel situarmos
(ou escolhermos) três pontos distintos, no intervalo [ 0, 1 [, satisfazendo (i), (ii)
e (iii) simultâneamente∗ segue que (15) jamais ocorre. 

∗ Observe que estas três condições nos dizem que os três pontos devem estar − si-

multâneamente − em metades opostas do intervalo unitário o que é, evidentemente, impossı́vel.


Gentil 52

Referências
[1] Lima, Elon Lages. Espaços Métricos. Rio de Janeiro:IMPA - CNPq,1993.
[2] Silva, Gentil Lopes. A Métrica Divina. www.dmat.ufrr.br/∼ gentil, 2006.
[3] Silva, Gentil Lopes. O Mito das Ambigüidades nas Representações Decimais.
www.dmat.ufrr.br/∼ gentil, 2006.
[4] Silva, Gentil Lopes. Espaços Métricos (Comentado), 2006. Ainda inédito.
[5] Ubaldi, Pietro. As Noúres: Técnica e recepção das correntes de pensamento.
Tradução de Clóvis Tavares. 4. ed. Rio de Janeiro: FUNDÁPU, 1988.
[6] Silva, Gentil Lopes.Topologia quântica (Einstein×Tagore)(www.dmat.ufrr.br/∼
gentil)

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