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Ana Bettencourt
Síntese
De uma maneira geral, a maioria dos autores considera o Bronze Atlântico como um
fenómeno do final da Idade do Bronze e circunscrito ao Norte, Noroeste, Centro-Oeste e
Sudoeste. O conceito de Bronze Atlântico tem funcionado como uma identidade
cronotipológica e cronotecnológica com produções metalúrgicas de produção
preferencialmente atlântica (sem excluir influências mediterrânicas e continentais). Para
além das semelhanças artefactuais, estas regiões estariam ligadas pela posição oceânica,
pela riqueza em jazidas minerais, pela ausência de povoados e de contextos funerários.
A partir de datações calibradas, a autora apresenta vários quadros a partir dos quais faz alguns
comentários:
Muitos dos objetos que caracterizam a Idade do Bronze serem anteriores ao século X a.C.
O período de maior dinamismo e diversidade metalúrgica, situado, por grande parte dos
autores poderá não corresponder à realidade uma vez que período “áureo” parece ter ocorrido
entre os século XIII e o século X a.C., ou se quisermos, no último quartel do II milénio a.C. o
que não parece relacionar-se diretamente com a colonização fenícia, como também tem sido
sugerido.
Introdução de objetos de ferro em contextos dos finais da Idade do Bronze. Os dados indiciam
o seu aparecimento em momentos anteriores ao século X a.C., no Centro-Oeste no primeiro
quartel do I milénio a.C. no Noroeste.
Relação tecnologia/cronologia
Mais uma vez e a partir das datações absolutas, a autora refere que embora seja usual dizer
que os finais da Idade do Bronze Atlântico se caracterizam por ligas ternárias, os dados
indicam que elas seriam essencialmente binárias para o Sudoeste, o Noroeste e o Centro-Oeste
peninsulares até ao século X/IX a. C. A autora questiona-nos se deveremos considerar a
combinação ternária como um indicador de diacronia e evolução tecnológica ou como uma
particularidade regional. Usa o exemplo do Noroeste (com combinações binárias e ternárias
para as mesmas datações) para questionar ainda se a utilização de duas ou três ligas de metais
responderiam apenas a opções funcionais aplicadas a objetos específicos.
A autora defende que a situação geográfica e a riqueza mineira da PI poderão ter feito desta
região um ponto de encontro de variadíssimas influências e contribuído para uma grande
vitalidade e originalidade dos ateliers ibéricos desde – pelo menos – a 2ª metade do 2º milénio
a.C.
A importância dos contextos regionais e artefactuais face à lógica dos vários modelos
interpretativos
A pretensa unidade sócio-simbólica da metalurgia deve ser completada com uma investigação
regional e microrregional que parta de trabalhos de escavação e leituras renovadas sobre os
materiais já existentes.
Mapas de distribuição de objetos são – para a autora – mapas de recuperação de objetos que
revelam contextos opacos, incomparáveis e desadequados para se fazerem leituras
generalizantes de ordem social, simbólica ou ritual.
Historiografia
O Conceito de Bronze Atlântico foi criado por Santa Ollala (1938-1941) com base em
critérios tipológicos associados à produção metalúrgica e às filiações extra-peninsulares. Este
autor divide a Península em dois grandes períodos:
Cultura material: machados de talão com dois anéis; machados de aletas; punhais e espadas
de nervura central.
Cultura material: machados de alvado; foices; pontas de lança; navalhas de barbear; espadas
e pinhais em língua de carpa.
Numa perspetiva evolucionista linear, o Bronze Atlântico corresponderia ao Bronze III (1200
a 900 a.C.) e ao Bronze IV (900 a 650 a.C.) da PI.
As mudanças entre o Bronze Mediterrânico e o Bronze Atlântico foram explicadas (de acordo
com uma visão difusionista) pelas vagas migratórias oriundas da Europa central.
Savory (1951, 1974) adota a mesma área de MacWhite para o Bronze Atlântico (valorizando
também a diversidade cultural da PI) e apoia a sua perspetiva na diversidade metalúrgica mas
também na cerâmica, povoamento e mundo funerário. Inscreve o BA numa cronologia situada
entre o séc. VII e o séc III/II a. C. Admite também a existência de um grupo Sudoeste com
influências tanto mediterrânicas como atlânticas. Não exclui os fluxos migratórios (em
pequena escala) e em 1968 considera já o conceito pouco satisfatório face à realidade
arqueológica peninsular.
Almagro-Gorbea (1977 e 1986) defende também “um círculo cultural de origem atlântica”
com cinco áreas distintas e fortes relações metalúrgicas com a fachada costeira atlântica:
Esta autora chama ainda a atenção para o facto de muitos achados metalúrgicos serem
provenientes de povoados.
Rui-Gálvez Priego (1984) inclui toda a fachada ocidental e Norte da PI num “mundo
atlântico” por não concordar com as expressões “Bronze Atlântico” ou “cultura atlântica”.
Explica assim a uniformidade da metalurgia/ourivesaria dentro das várias regiões que o
conceito abarca. Defende pela primeira vez a origem de contactos atlânticos no Bronze Inicial
com início em 1900/1800 a.C. mas só elabora uma periodização para o Bronze Final
subdividindo-os em três fases:
Bronze Final I (1200-1000 a.C.): machados de rebordo e de talão, sem ou com anéis,
Bronze Final II (1000-900 a.C.): espadas pistiliformes e de tipo “Ballintoper”, dos punhais de
lingueta, das pontas de lança em forma de chama, dos machados de apêndices e de talão, das
navalhas de barbear e dos braceletes lisos, abertos, de secção romboidal ou quadrangular;
Bronze Final IIIa (900-800 a.C.): “horizonte da ria de Huelva”, espadas em língua de carpa e
por todo o conjunto de objetos que compõem o depósito. As ligas seriam binárias.
Bronze Final IIIb (800-700 a.C.): espadas de tipo “Vénat”, dos machados de talão unifaciais,
dos machados de alvado, dos arreios de cavalos, dos espetos articulados, dos caldeiros, das
foices de tipo “Rocanes” e “Castropol”, das fíbulas, das navalhas de barbear, dos alfinetes de
cabeça, dos braceletes decorados com incisões.
Coffyn (1985) caracteriza o Bronze Atlântico como uma identidade geográfica personalizada
em regiões do extremo ocidental da Europa, com vocação marítima e riqueza em jazidas
minerais, nas quais integra o Noroeste, o Centro-Oeste e o Sudoeste peninsular. Coffyn sugere
que as relações comerciais entre o Atlântico Norte e Ocidental permitiram contactos
tecnológicos e que os grupos cerâmicos, estratégias de povoamento e mundo funerário devem
ser encaradas como complementares e subsidiários das produções metalúrgicas. Coffyn
sugere ainda que o conceito se deve alargar a toda a Idade do Bronze uma vez que existem
evidências de contactos desde 2000 a 1800 a.C. A sua periodização para a PI corresponde às
seguintes fases:
Bronze Antigo (2000 a 1800 a.C.) com objetos de cobre e de ouro; Bronze Médio, mal
individualizado, com uma produção arcaizante e estagnada;
Bronze Final I (1200-1050 a.C.): espadas derivadas das do tipo “Rosnoen”, pontas de
lança de alvado longo, machados de talão com ou sem anéis e machados de apêndice
Bronze Final II (1050-900 a.C.): espadas pistiliformes;
Bronze Final III (900-700 a.C.) período que caracteriza como um momento de
“europeização” das relações comerciais e culturais: espadas em língua de carpa (raras),
pontas de lança losângicas, as foliáceas e as de folha moldurada, os capacetes de aresta,
os cinzeis de alvado, os machados de talão unifaciais e bifaciais, os machados de
alvado, as foices, as fúrculas, os objetos de enfeite e os punhais de tipo “Porto de Mós”.
Coffyn cria o grupo “Lusitano”, com início na segunda metade do século IX a.C. e apogeu
no século VIII a.C. Localiza-o no Centro-Oeste de Portugal e considera-o um grupo
simultaneamente recetor e produtor de originalidades, assemelhando-o a outros “ateliers”
atlânticos. A zona seria privilegiada geograficamente pela facilidade de ligação com os
mundos atlântico, mediterrânico e, indiretamente, com o continental.
João Gomes,
11 de novembro de 2018