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DECISÃO: Trata-se de “habeas corpus”, com pedido de medida

liminar, impetrado contra decisão emanada do E. Superior Tribunal de


Justiça que, em julgamento colegiado, negou provimento a recurso
ordinário interposto pelo ora paciente.

Busca-se, nesta sede cautelar, “(…) a imediata expedição de ofício, ou


qualquer outro tipo de comunicação, ao MM. Juízo da 3ª Vara do Júri de São
Paulo no sentido de que sejam tomadas todas as providências necessárias
para se assegurar o recurso de videoconferência no dia do julgamento
popular” (grifei).

O exame dos fundamentos em que se apoia este “writ” constitucional


parece descaracterizar, ao menos em juízo de estrita delibação,
a plausibilidade jurídica da pretensão deduzida nesta sede processual,
especialmente se se considerar o próprio teor da decisão proferida pela
ilustre magistrada de primeira instância que indeferiu a pretendida
utilização de videoconferência no Plenário do Júri, na hipótese eventual
de as testemunhas e a vítima manifestarem temor ou constrangimento em
razão da presença do réu, ora paciente:

“Quanto ao requerimento da i. Defesa do acusado Elivelton


sobre a colheita de prova oral de testemunhas ou vítima com
utilização de videoconferência, informo que o 3º Tribunal do
Júri não reúne meios materiais e técnicos para tanto. Além do
mais, não se sabe de antemão se há testemunha que não queira prestar
seu depoimento na presença do acusado. Havendo tal hipótese,
privilegia-se que a testemunha fale sem constrangimento, o que não
ocorrerá caso seja vista por videoconferência. Por outro lado, não se
vislumbra qualquer prejuízo ao acusado, eis que seu defensor estará
presente ao recinto. Diante do exposto, indefiro o pedido.” (grifei)

O E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por sua vez, ao


denegar o “writ” constitucional, ratificou esse entendimento, fazendo-o
em decisão consubstanciada em acórdão assim ementado:

“‘Habeas Corpus’.
Realização de videoconferência – Desnecessidade –
Ausência de prejuízo – Inexistência de constrangimento ilegal –
Denegação da ordem.”
(HC nº 2186444-88.2015.8.26.0000 – Rel. Des. MACHADO
DE ANDRADE – grifei)

Cabe observar, ainda, que a legislação processual penal não torna


obrigatória a utilização do sistema de videoconferência nas hipóteses em
que a vítima ou as testemunhas demonstrem fundado receio em prestar
depoimento na presença do réu, pois, em não havendo possibilidade material
de emprego desse recurso tecnológico, justificar-se-á a retirada do réu do
recinto por ordem do magistrado.

É o que prescreve o art. 217 do CPP, na redação que lhe deu a


Lei nº 11.690/2008:

“Art. 217. Se o juiz verificar que a presença do réu poderá


causar humilhação, temor, ou sério constrangimento à testemunha ou
ao ofendido, de modo que prejudique a verdade do depoimento, fará a
inquirição por videoconferência e, somente na impossibilidade
dessa forma, determinará a retirada do réu, prosseguindo na
inquirição, com a presença do seu defensor.
Parágrafo único. A adoção de qualquer das medidas previstas
no ‘caput’ deste artigo deverá constar do termo, assim como os
motivos que a determinaram.” (grifei)

No caso ora em exame, a magistrada de primeira instância foi


bastante clara ao informar “(...) que o 3º Tribunal do Júri não reúne meios
materiais e técnicos para tanto” (grifei).

Diante dessa informação oficial, que se reveste da presunção de


veracidade, não há como reconhecer situação de ilegalidade no
indeferimento da pretendida utilização do sistema de videoconferência,
pois a decisão de primeiro grau foi proferida com inteiro acerto,
considerado o que estabelece a própria norma legal que venho de
mencionar.

Não constitui demasia assinalar, neste ponto, que a presunção de


veracidade que milita em favor de informações oficiais tem sido
reconhecida pela jurisprudência desta Suprema Corte (RTJ 86/212 –
RTJ 133/1235-1236 – RTJ 161/572-573, v.g.), com o inteiro beneplácito do
magistério doutrinário (CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO,
“Curso de Direito Administrativo”, p. 419, item n. 66, 28ª ed., 2010,
Malheiros; MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, “Direito
Administrativo”, p. 197/198, item n. 7.6.1, 22ª ed., 2009, Atlas; DIOGENES
GASPARINI, “Direito Administrativo”, p. 74/75, item n. 7.1, 2008,
Saraiva; JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, “Direito Administrativo Brasileiro”,
p. 54, item n. 43, 1999, Forense; JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO,
“Manual de Direito Administrativo”, p. 111/112, item n. 2, 19ª ed., 2008,
Lumen Juris, v.g.).

Disso tudo resulta não se revestir de plausibilidade jurídica a pretensão


cautelar deduzida pelos ora impetrantes.

Insuficiente, para efeito de provimento cautelar, a mera alegação de


“periculum in mora”, eis que, como se sabe, o deferimento da medida
liminar, resultante do concreto exercício do poder geral de cautela
outorgado aos juízes e Tribunais, somente se justifica em face de
situações que se ajustem, cumulativamente, aos seus específicos
pressupostos: a existência de plausibilidade jurídica (“fumus boni juris”),
de um lado, e a possibilidade de lesão irreparável ou de difícil reparação
(“periculum in mora”), de outro.

Sem que concorram esses dois requisitos – que são necessários,


essenciais e cumulativos –, não se legitima a concessão da medida liminar.

Sendo assim, e sem prejuízo de ulterior reapreciação da matéria no


julgamento final do presente “writ” constitucional, indefiro o pedido de
medida liminar.

Publique-se.

Brasília, 07 de março de 2016.

Ministro CELSO DE MELLO


Relator

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