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14/10/13 Viu a receita de Albert Fishlow para o Brasil crescer?

- Economia

Entrevista 28/09/2013 08:00

Viu a receita de Albert Fishlow para o Brasil


crescer?
Em entrevista exclusiva para EXAME.com, o diretor do Centro para o Estudo do
Brasil na Universidade de Columbia discute como acelerar o crescimento do país

São Paulo - Enquanto o mundo alterna surtos de entusiasmo e decepção com o Brasil, Albert
Fishlow pede serenidade e olhos no futuro.
João Pedro Caleiro, de

Estudioso do país há décadas, ele acredita que nossa economia não vai conseguir escapar
de aumentar investimentos e produtividade, ainda que ofereça oportunidades únicas.

Fishlow é diretor do Instituto de Estudos Latino-Americanos e do Centro para o Estudo do


Brasil na Universidade de Columbia. PhD pela Universidade de Harvard, foi condecorado em
1999 com a Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul pelo governo.

O professor falará no centro do Rio de Janeiro na próxima segunda-feira, dia 30. O evento faz
parte de uma série de palestras organizadas pelo grupo IBMEC com o tema "Metamorfoses
do Brasil Contemporâneo". Fishlow concedeu a seguinte entrevista exclusiva para
EXAME.com:

EXAME.com - A nova capa da The Economist resume o movimento da narrativa global


sobre o Brasil: da euforia à incerteza. O que mudou?

Albert Fishlow - Uma mudança tem sido o crescimento econômico mais baixo nos últimos
dois anos, com o ministro da economia sempre citando previsões iniciais muito mais altas, e
culpando os Estados Unidos e ocasionalmente políticas chinesas pelas perdas.

Outra tem sido a tendência de usar métodos questionáveis para inflar o superávit primário e a
balança comercial, e aumento da dívida bruta sem mexer na dívida líquida, o que levou a uma
política fiscal expansionária. E claro, o ritmo lento para lidar com infraestrutura e com o
desenvolvimento dos recursos do pré-sal.

EXAME.com -Os fundamentos econômicos do país são sólidos? O mundo está sendo
injusto conosco?

Fishlow - A visão de fora tem uma tendência de exagerar os problemas, porque os Estados
Unidos, a Comunidade Europeia e o Japão já estão lidando com uma desaceleração na Índia,
Rússia e Turquia, além de dúvidas sobre a China.

O Brasil é um caso praticamente único no mundo: tem um setor agrícola produtivo, recursos
minerais e de petróleo, e pode ser mais competitivo na indústria com uma política melhor
para a taxa de câmbio.

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EXAME.com - A inflaçãotem sido uma causa de preocupação importante, mas parece ter
se estabilizado, pelo menos por enquanto. É uma ameaça que está sendo subestimada
ou exagerada?

Fishlow - A inflação se estabilizou, mas isso aconteceu em parte porque os preços


administrados - da Petrobras, energia e transporte urbano - foram mantidos baixos.

O preço da comida, que estava em alta, caiu, mas os preços dos serviços - onde a
competição externa é limitada - continuam altos e com pouca tendência de queda.

É uma questão recorrente, e o aumento da Selic é uma consequência. Mas o governo


claramente quer evitar qualquer desemprego com a proximidade da eleição.

EXAME.com Qual você acredita que tem sido o principal fator limitando o
-
desenvolvimento brasileiro atual?

Fishlow - A taxa baixa de investimento. O boom das commodities escondeu esta realidade
por um tempo, mas agora ele acabou. O Brasil precisa de uma taxa de no mínimo 25%, dada
toda a necessidade de infraestrutura, e não chega nem perto disso.

EXAME.com - Ficamos presos na armadilha da renda média?

Fishlow - Não há armadilha, e sim uma taxa provável de não mais que 3% de crescimento. O
crescimento do consumo, mesmo que popular, não pode impulsionar a economia. Só uma
mudança de produtividade pode.

Você acredita que os protestos foram apenas um surto temporário ou


EXAME.com -
marcam uma nova fase na política brasileira?

Fishlow - As coisas parecem estar voltando para onde estavam. Os protestos de rua contam
apenas quando são capazes de influenciar as instituições políticas. Mas esta nova geração
não vai ficar parada: eles querem ver uma resposta, e haverá oportunidades com a Copa do
Mundo e as Olimpíadas.

EXAME.com - Como você avalia a política econômica do governo Dilma Rousseff?

Fishlow - A presidente Dilma mudou a política econômica: ela lidera todas as decisões
importantes. Ela sustentou e estendeu os avanços em política social da era Lula. Na política
econômica doméstica, através das Parcerias Público Privadas (PPP), ela se distanciou da
crença que o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) seria suficiente para engajar o
setor privado e o investimento estrangeiro.

Isso está funcionando apenas lentamente, e os termos originais foram modificados muitas
vezes. É aqui que a incerteza tem um papel importante: quem quer estabelecer um
compromisso de 25 anos com uma taxa baixa pré-fixada?

EXAME.com - Se você pudesse escolher uma única reforma importante que o Brasil
precisa fazer o quanto antes, qual seria?

Fishlow - O investimento precisa subir. Uma forma de fazer isso é assegurar que o setor
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público se torne um poupador ao invés de um consumidor. Isso significa cortar os altos


custos das pensões - acima de 12% do PIB atualmente - que respingam nos déficits do
governo.

Outra emenda constitucional será necessária eventualmente. É um bom lugar para começar
e para o setor público mostrar seu compromisso em fazer a taxa de crescimento crescer.

EXAME.com -Nossas taxas de industrialização como parcela da economia atingiram


recentemente níveis não vistos desde os anos 50. A desindustrialização é um
problema para o país?

Fishlow - Uma taxa mais baixa de atividade industrial na medida em que a renda cresce se
tornou uma característica comum na economia mundial. O Brasil oferecia um retorno alto
para manufatura através de altas taxas protecionistas - que continuaram - e investimento
externo. O setor automobilístico é um exemplo clássico.

Do outro lado está a Embraer, que exporta e importa substancialmente, e é altamente


produtiva e internacionalmente competitiva. Ironicamente, o Brasil precisa de tarifas mais
baixas para utilizar tecnologia doméstica e internacional e repetir aquela experiência em
outros ramos de atividade. Fazer as coisas da forma antiga não vai restaurar o setor
industrial.

EXAME.com - Vocêé otimista ou pessimista em relação às perspectivas para o Brasil no


médio e longo prazo?

Fishlow - Continuo otimista. Fazer as pessoas prestarem mais atenção para o médio e longo
prazo - e para políticas de continuidade da globalização e participação no comércio
internacional - é onde o futuro está.

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