Você está na página 1de 12
7 O PORTUGUES EM AFRICA Neste capitulo, éapresentado, em primeiro lugar, 0 quadro socioshistrieo em que se formaram as varedades africanas do portugués com particular destaque para [Angola e Mocambique. Em seguida, apresentam-seas principaiscaracteristicas que Aistinguer 38 varledader angolana e mogambicams do portuguts europe, a nivel f6nico, lexical, sintético e morfossintitico. 21, Condicionamentos socio-histéricos na formagio das variedades africanas do portugues (© portugu’s constitu atualmentea lingua oficial de todos o patses africans ante- rormentecolonizados por Portugal, a saber: Cabo Verde, Guiné-Bissau, Sio Tomé «Principe, Angola e Mogambique. A escolha do portugués como lingua ofcal por patses queso tipicamente multlingues prende-se basicamente com 3s suas poten- ialldades como lingua Yoperacional” (cf Ganhao 1979), que garante a unidade nacional, permite, de forma mais efcaz do que as linguas locals, acomunicagt0 {Internacional ea transmissd0 do conhecimento cientifco, Assim, em todos estes pals, alta que minortéto, o portugues consttul 0 principal veiculo de comu- nicagio usido na administeagzo pablica, no ensino formal e nos meios de comu- ‘cago socal, sendo ainda a lingua preferida pela quasetotalidade dos escritores. ‘Ainda que a chegada dos portugueses aos diversos paises afrcanas tena decor- Fido quase ntegralmente na segunda metade do séc. XV (1444, Cabo Verde e Guiné- Bissau; 1471, Sdo Tomé e Principe; 1482, Angola; e 1498, Mogambique), a colon!- _a¢20 dese teritdrios 6 teve inicio mult mals tard, fino st. XIK, Por esa 2220, na altura da ndependénciadestas colinias (1975), 0 portugués ere usado por uma balxa percentagem de falantes,tipamente como lingua segunda (L2). Embora into se disponha de dados quantitativos rigorosos, pode dia-se que o portugues Tinga ce poe govero ensues pasa comunato a el rac emaciona Ea ‘oounndesmutngcn com ¢ 9c Son pes senor nua ea” Pom ope. ‘Tirguo ome donna pane do dion # uss delgagi ngu seu” pat ar etn snus outa tt wm papel Inston Sta sons em cides mgs em cots com chads ings ee ‘as que sido aimee ings no mena 0 apenas was em ambiente sea Oe ‘sponte comune. es ads te a9 0 ronrucuts us semca tem uma relevancia menor nos pases em que emergiram lingua eriouls’ Cabo Verde, Guiné-Bissau e Sto Tomé e Principe -, onde estas constituem o prircipal ‘eiculo da comunicagSo oral para a grande maloria da populacdo. A titulo de exem- plo, segundo dados do censo populacional de 1979, a percentagem de falantes de portugués/L2 na Guiné-Bissau era de 11,1%, sendo 0 crioulo flado por 44,4% dos juineenses (cf. Henriques 1985:235). Em Angola e Mocambique, paises stuados 1a zona das linguas bantas, na auséncla de uma lingua materna(L1) comum, 0 Portugués é muito usado na comunicagao otal sobretudo no melo urbano, Assim, Mendes (1985:46) admite que um tergo da populae3o angolana fala portuguts, ‘como L1 ou L2, , de acordo com dados do Censo populacional de 2007, 0 nienero de falantes de portugués em Mogambique, como Li e L2, & de cerea de SOM. Neste capitulo, dedicado ao portugués em Attica, seré dada particular atenc30 0s fatores socio-histéricos que condicionam a situaglo da lingua portuguesa em ‘Angola e Mogambique assim como 3s propriedadesgramaticas que distnguem as variedades do portugués que estio a emergir nests dos pases. Os restantes pases africanos de lingua oficial portuguesa nZoserdo aqulincluldos:o objetivo €fomecer guns contributos para o conhecimento do portugués em Africa, endo apresentar um estudo exaustivo. ‘A colonizagio de Angola e Mocambique Durante virios séculos, as colénias de Angola e Mocambique ocuparam uma pos- {lo petiférca no conjunto dos terit6rios dominados por Portugal, cujo goremno tstava, nessa época, mals virado para o Brasil para a India, regioes economica- ‘mente mais atraentes. Assim, por exemplo, no que se refere a Angola, esta funcio- ‘now essencialmente como base para ofornecimento deescravos para o Bras durante ssécs. XVII, XVII e XIX, tendo chegadoa set caraterlzada como uma cola do Brasl, mals do que de Portugal (cf. Davidson 1972.97). Quanto a Mocambique, a sua posigdo periférica pode ser lustrada pelo facto de, até meados do séc. XVIIL (1752), esta colénia ter sido governada a partir da India, © ndo diretamente por Portugal. im sintse, como afrmam Oliver e Fage [1962] 1980:209), excetwando ‘inco ou ses clades, «a Angola eo Mocambique portugueses dificilmente se pode- iam considerarcoléntas no sentido modemno do termo, mas antes reserva comet- tlals mal definidas que se estendlam para o interlor do continente faficano}». ‘A posigto periférica de Angola e Morambique durante grande parte do peiodo colonial mplicou um atraso considerivel no controlo politico-militardestes ter trios e no pracesso da sua colonizacio em geral, Com efeto, a ocupacio eetiva Fr wma do de gu tt Cp. 7 “sgt hom part a angus dc de 1400 gus desig Nigga, ‘ue ora quae ods a tegiods Aiea sual celina Heine eure 200, bose ans ‘gona polemic sabato nod nga bas lnrom Angle Mogembqe ene ‘em Angst fas soe ngs ents est cn Neve xttam oe ote ECaatvnt 1994 Ming 200 pra Aol Stowe Nunes 300 ps Nac Nees pus 9 ‘Stoo tour peinet enepnn tara unc ne npn. intra ace ox eno dopo bre porated Cao Ve Cana S80 ‘omée nape van season manent tayo ~ sponte tpmaeta Dertugsesuem ma argmraeies octopus, puss por Mila Alea ta Crete. scent ea 2008), one om be em ca ap coma | ‘pron o pam etd comparativo, «ve do lsc ee grnten x acer oem _ fetus Ang, abo Ved, Gln Magaiqe Slo Tome « Pince. ‘ComDICIONAMENTOS SOCIO MSTORICOS A FORMACAD OAS VARIDADESAFLCANA 7.11 estas col6nias teve inicio apenas a partir da seguncia metade do sé. XIX, altura «em que sio desencadeadas.aschamadas campanhas de *pacificaglo". A colonizacin ‘maciga de Angola e Nogambique, por sua vez, ocort é em meatlos do se, XX. Por ‘exemplo, nos anos 52-60, chegam a Mogambique cerca de 140 000 colomos, ¢ nos ‘anos 60-65, chegam 270 000 colonos @ Angola. No final deste processo de colon 2zagio tarda, a percertagem de colonos continuava muito reduzida, nie ating nde (510% em Angola esendo inferior a 2% em Mogambique (cf Ribeiro 1981::90) A definigdo de una politica educacional para as coldnias portuguesas, através da qual pudesse ser desencadeada a diuso slstemética do portugues 6 ocerex em 1930, tendo sido fotado 0 modelo “assimilacionista” frances, segundo 0 ual 8 lingua colonfal deverlaser a inica lingua de contacto:ne ensino eo instrumento- que propiciaaasimilagfo cultural (ef. Barreto 1977). O portugués tomnou-se, asin, a nica lingua autorzada nas escola, ficando o uso das inguas bantasreservado para Instrusdoreligosa. Contudo, acrlagdo de escolas que assegurassem a difusto ‘da Lingua portuguesa s6 tem inicio muito mals tarde, pelo que em meados dos ‘anos 40 0 nimero de escolas era ainda insignifcante tanto em Angola come em “Mocambique. Sé na déceda de 60-70 se repistou um crescimento considerével nos ‘viros nives de ensino (primstio, secundrio e técnlco-profsional), © Quadko 1 permite avallar mais claramente este processo de expansio da rede escolar (l, Mateus 1999:212, Quadro 1v): aa sos | —_uo eco | socnimane [ss bs 108 | me | ss a Ler po 1 73 | 7 a vsposiaa |S 2 ara dos vos gras de ne fa (1945-73) ‘Nese quado nip sone nimero ok pot Mau (1598212), de 1190 ols pees, ‘uma vex qh cal dass oreo pls sus (209) neq eo 197273 Scoincron tees toms pl nn as tinea anche es ene, Diteos oma de 17495 seinen de 235 ext pale m2. 742 0 roms semen Em 1973, 0 total de alunos que frequentavam os diferentes graus de ensino representava cerca de 1% do total da populacio, quer em Angola quer em Mogam= bique (ef. Mateus 1999:217, Quadro 1) Sintetizando, em conseguéncia doatraso no procesto de colonizaglo de Angola «e Mogambique, na altura da independncia, a lingua portuguesa era pratieamente ‘desconhecida da maior part da populacdo destes paises, paticularmente nos meios rurals, onde a presenga portuguesa se fez sentir de forma muito tenue. © periodo poor ‘ire ndependnl, tev tum Important proceso de dst eval ‘go do portugal ano em Angola comotm Mogambigu, Associ desta lingua como presi x acento soc, a presente epoca cli, no 6 no dcparecoms independncl como, elo oni Seundo eine (002281) fesndose ao proces mogsbcano ale devesea0 fade portpuseieenvcro nam ove qutotelgc, que ope tmovaaotovcone us imponate sb decolinde aca come Kagoa dct consequen desta tuna, embem devia sua fre expnsio a ede ecoly, oo do popu slagovseconsdervemente em eros ce Contestor destino e duets, pasando gaamene a pene ns don rio cham “aoe” (pe, cones informal asia mea, As tows graye as cases mls ovortdas ds census no apenem Ings arty ano, nant u comunidad de nts qu no so cominicam ete sexcetvaments em pores ums 8 SL, como ecole et ign como anes tans snore fst algomento dos unger eds contests dela do potas ashe naunmene porum amentosiginiv do nimere dene ea lings no ques sere malatarmentea cto merambcano, odes thscensesoploatsde 181872007 most qu num prod de use wna ono» pecntage de lanes e porguts ome Lt quse cpu, ts flats dete ingon como 2 pssaram a representa pro de S0% da epulst megaman (Fino 201 sto Raton Sasi 2010, (re en ao ire a Sener a a Fraga como te (ui 2 Erol de peentagem tes peau em Meamblque (Oaumento do niimera de flantes de portugués em Angola como em Mogam- biquecriou condigdes para o desencadeamento do que pode chamar-seo processo de “nativizagto” (Kachru 1986) desta lingua, passando a evidenciarse de forma ‘mais regula sstematica as inovagGes relativamente ao padio europe. “Tmo propose por epson (1972) para quema aaa” de uma ting aque gue ronda um nao emamblet de amigor wdc context ema, 5 VAICOADE ANCOLANA >) & MOgAUEICANA om) BO FORTUGULS 724 72 As variedades angolana (PA) e mogambicana (PM) do portugués 721. mites e alcance dé caracterizacio Dados os condicionamentos scio-histricos que subjazem & formacio das vare- dads aticanas do pertuguts estas comegam a ganhar um formato mals cons. tente nos iltimos vite anos dost. XX. Em tragos muito gerals, pode dizer-se que vido ao facto de se tata de variedades nfo nativas,tipicamente adgulrdas como 12 num contexto em que quase no hi exposigto 8 norma-padéo europeia, se Sesencadela um conjunto de efeitos de relevo no processo de variagdo e mudanya ‘que as caracteriza. fo deve-se, em parte, a falta de aceso a dados robustos sobre 4 gramdtica do poruzués europeu padtio, que dificalta, em certos casos, 0 pro ‘cesso de reestruturacio gramatical que deveriaconduzir a uma convergénca com «sa norma, dando asim origem a estabilizagio de novas propriedades gramaticas Assim, para além de estas varledades mucarem de forma mals radical do queas linguas adquirides emcontextos monolingues, pode saentar-se, em peimelto liga, ‘que, como consequércia de este processo ocorter em situagdo de contacto ting, tico.com as inguasbantas, as inguas materas da maior parte da populagso, mules as inovacdesrelativarente & norma eutopeia resultam da intrferEnca, dicta on Ingireta, da graméticadestaslinguas Esta interferencia manifesta-se ndo tanto pela ‘tlagdo de novas palavras, mas sbretudo por alteragdes nos tragosfonéticos fone '6lc0s, morfogiose sintéticos do sistema gramatical do portugues europeu (PE), Em segundo lugar, éniecessélo assinalar que uma consequencla ni trivial da situagio de 2 do portugués ¢ uma variabilldade maior dos tragos gramateals q ‘caracterizam esta varisdade do que aquela que se verfica em lingua faladas em Ccontextos monolingues. Esta variablidade evidencia-se quer na manelra pouce ‘regular esistemdtica com que estes tragos se manifestam na produgzolinguisticn 60s falantes angolanose morambicanos, quer na frequente falta de coeréncia entre as producbes dos falantes, orals ou eseritas, eo juzos de gramaticalidade que estes «mite quando submetidos aprocedimentos experimental, nomeadamente testes de gramaticalidade, Assim, pode dizer que, no momento atual, 0 dlscurso dos falantes do PM e do PA gerado nto 36 porzegrasdestas“novas" gramticas, mas também da gramitice {do PE. Na descrigho qu se segue, serdo apreventadas as caracterstcas que distin ‘svem as variedades argolana e mogamblcana do PE, mesmo que elas nfo sejam tipicas do repertério ingustico de todos os falantes, tt mesmo que no ocoream «em todas as situagbes de comunicagdo. Serdo, assim, seleclonados os tragos grama. ticals que apresentam sariter mals estavele se distribuem de forma mals eegulat ela comunidade de locutores. Sempre que relevante (epossivel),destacarse-80 08 ‘casos em quea caracteizagio apresentada se refere am tipo particular de falantes (G.2y instruidos vs, nde instrufdos) ou de discurso (pe, formal vs. cozrente). cL Gonaives soe (199 ste wes pein do PL + Noqutse eee mis epactamente 0 den store arma ge apes angle epee alah, grin dees nbaeads popu ou eat nate dees tucados, mas pbs cro eropen et Fmine 2002, Dias 22) senna do gun ctoee

Você também pode gostar