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TRIBUNAL MARÍTIMO

AR/NCF PROCESSO Nº 32.241/18


ACÓRDÃO

Lancha a Motor “CAVALO MARINHO I”. Representação de Parte proposta


antes de o processo ter sido perfeitamente angularizado, com a contagem de
prazo para apresentação das contestações ainda em curso. Prazo para
propositura da Representação de Parte que somente terá início quando da
abertura da instrução por determinação expressa na parte final da alínea “b”,
do art. 41, inc. II, § 1º, da Lei nº 2.180/54. Impossibilidade de se fazer nesse
momento processual aferição do interesse processual das partes
representantes. Representação de Parte não recebida. Arquivamento.

Vistos e relatados os presentes autos.


Tratam os autos do naufrágio de uma embarcação usada no transporte de
passageiros entre a Ilha de Itaparica e a cidade de Salvador, BA, ocorrido por volta das
06h40min do dia 24 de agosto de 2017, que resultou em 19 mortes, em 59 passageiros
feridos e na perda total da embarcação.
A PEM ofereceu representação em face do MAC Osvaldo Coelho Barreto,
comandante da embarcação, de Henrique José Caribé Ribeiro, Engenheiro Naval
Responsável Técnico pelos planos da embarcação, de Lívio Garcia Galvão Júnior, sócio
administrador da empresa armadora e da armadora CL Empreendimentos EIRELI, com
fulcro no art. 14, alínea “a”, da Lei nº 2.180/54.
Depois de resumir os principais fatos narrados no IAFN, a PEM afirmou que
o MAC Osvaldo Coelho Barreto, primeiro Representado, teria contribuído de forma
negligente, imprudente e imperita para o naufrágio, na medida em que a despeito das
condições desfavoráveis empreendeu navegação com a embarcação em lugar de cancelar
a travessia, mesmo quando a embarcação passou a sofrer a influência mais intensa dos
ventos e das ondas, o que teria sido agravado pelo rumo tomado que favoreceu a
incidência das ondas por seu costado de boreste, causando o naufrágio com suas
consequências.
Disse a PEM, ademais, que o Engenheiro Naval Responsável Técnico
Henrique José Caribé Ribeiro teria sido imperito ao apresentar estudos de estabilidade à
CPBA no ano de 2012 que noticiavam que a embarcação estaria em condições regulares
de estabilidade quando não cumpria os requisitos mínimos para navegação interior Área

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1 previstos na NORMAM 02/DOC, fato este que teria contribuído para o naufrágio
quando a embarcação foi submetida a condições meteorológicas adversas e ao rumo
adotado que favoreceu a intensificação daquelas condições, fazendo com que a
embarcação adernasse.
Com relação ao terceiro representado, o sócio administrador da armadora,
disse a PEM que deve ser responsabilizado pelo acidente da navegação ao apresentar
comportamento negligente e imprudente ao instalar lastros de pedra na Praça de
Máquinas e ao fundo do salão de passageiros sem o conhecimento ou o aval da
Autoridade Marítima, tendo tais pesos se deslocado quando a embarcação adernou,
causando o naufrágio.
Por fim, a PEM responsabiliza também a armadora da lancha “CAVALO
MARINHO I” e Concessionária do Serviço Público de Transporte Intermunicipal de
Passageiros entre Salvador e Vera Cruz, a empresa CL Empreendimentos EIRELI - EPP,
por ter permitido que a embarcação seguisse operando a despeito da não comunicação à
Autoridade Marítima das alterações realizadas em 2017, tornando vulnerável a segurança
da navegação, contribuindo para o naufrágio.
A representação foi recebida na Sessão Ordinária do dia 30 de agosto de
2018, os representados foram citados pessoalmente e o prazo para contestação ainda
corre.
Em 04 de setembro de 2018 o segundo e o terceiro representados,
respectivamente o Engenheiro Henrique José Caribé Ribeiro e o Sócio Administrador da
Armadora Lívio Garcia Galvão Júnior ingressaram com Representação de Parte em face
da Capitania dos Portos da Bahia - CPBA, qualificada na Representação como Entidade
Certificadora, de Sabrina Fonseca, Vistoriadora Naval da CPBA e de Carlos Augusto de
Souza Junior, Chefe do Departamento de Segurança do Tráfego Aquaviário da CPBA,
por entendê-los responsáveis pelo Acidente da Navegação capitulado no art. 14, alínea
“a”, da Lei nº 2.180/54.
A Representação de Parte é iniciada com argumentos acerca da Jurisdição
Tribunal Marítima para apreciar e julgar a conduta dos representados à luz do art. 10, inc.
“l”, da Lei nº 2.180/54. Narra em seguida um breve histórico das modificações por que
passou a lancha “CAVALO MARINHO I”, afirmando que tais alterações teriam sido
aprovadas pela CPBA como Entidade Certificadora, tendo como vistoriadora a Sra.
Sabrina Fonseca e tendo como signatário dos certificados expedidos o Capitão de
Corveta Carlos Augusto de Souza Junior. Aduz, em seguida, que a CPBA, além de

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representantes da Autoridade Marítima, seriam também entidades certificadoras,
atividade que seria exercida de forma remunerada. Afirmam os Representantes que o
acidente se deu por uma soma de causas, conforme constaria da inicial da Representação
Pública e que, nesse mesmo sentido, teriam tanto a Vistoriadora como o Oficial que
assinou as licenças errado ao não detectarem os supostos erros de cálculo que a PEM
inclui como uma das concausas para o acidente. Nesse sentido afirmam os
Representantes que: ou aqueles profissionais não teriam detectado os erros de cálculo,
aceitando-os e expedindo os Certificados ou os erros inexistem e errados estariam os
cálculos dos peritos da GVI/DPC que instruem o IAFN. Fazem os Representantes,
ademais, questionamentos acerca da conduta da segunda representada de parte ao longo
do IAFN e encerram a inicial pedindo que os Representados de Parte sejam incluídos no
pólo passivo da demanda na mesma medida que o Engenheiro Responsável Técnico foi
incluído na Representação Pública, uma vez que não teriam detectado os supostos erros
de cálculo cometidos por este, sendo, assim, corresponsáveis pelo acidente na mesma
medida. Pede, ademais, a inclusão da CPBA no pólo passivo, porquanto seria a entidade
certificadora da embarcação e, nessa função, teria sido negligente ao não impedir que a
embarcação entrasse em tráfego, emitindo, em nome do Governo Brasileiro, o
Certificado de Segurança da Navegação que não condiz com a verdade.
Instada a PEM para se manifestar sobre a Representação de Parte na forma
do art. 42, alínea “a”, da Lei nº 2.180/54, essa opinou por seu não recebimento. Em
primeiro lugar ante sua intempestividade, uma vez que o prazo para interposição de tal
peça somente se iniciará a partir da abertura da fase de instrução. Nesse sentido
argumenta a PEM que, ainda que no Regimento Interno do Tribunal Marítimo exista a
possibilidade de ser considerado tempestivo o ato praticado antes do termo inicial do
prazo, na forma do parágrafo único do art. 51, esse ato específico não poderia ser
aproveitado, uma vez que a contagem de prazo sequer tem previsão de seu termo inicial e
seria como se alguém apresentasse uma contestação antes mesmo de ser representado.
Por outro giro, a PEM afirma que tampouco a Capitania dos Portos da Bahia poderia ser
parte na demanda, pois essa não teria personalidade jurídica, sendo apenas um órgão da
União, essa sim entidade que guarda personalidade, faltando à CPBA, portanto,
capacidade para ser parte no processo.
É o relatório no essencial.
Decide-se:
A representação de parte não deve ser recebida nesse momento por ser

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evidente sua intempestividade. As Representações por iniciativa privada são aceitas nessa
Corte nas hipóteses das alíneas “a” e “b”, do § 1º, do art. 41, da Lei nº 2.180/54, sendo a
iniciativa da presente Representação de Parte baseada na parte final da alínea “b”.
Transcreve-se:
Art. 41. O processo perante o Tribunal Marítimo se inicia:
...
II - por iniciativa da parte interessada;
§ 1º O caso do número II dar-se-á:
a) por meio de representação, devidamente instruída, quando se tratar de
acidente ou fato da navegação, no decorrer dos trinta (30) dias subseqüentes ao prazo de
cento e oitenta (180) dias da sua ocorrência, se até o final deste, não houver entrado no
Tribunal o inquérito respectivo; e
b) Por meio de representação, nos autos de inquérito, dentro do prazo de dois
(2) meses, contado do dia em que os autos voltarem da Procuradoria, quando a promoção
for pelo arquivamento, ou ainda no curso do processo dentro do prazo de três (3)
meses, contado do dia da abertura da instrução, ou até a data de seu encerramento,
se menor for a sua duração.
O presente processo sequer se angularizou com perfeição, estando em curso,
ainda, o prazo para os representados apresentarem suas contestações. Depois dessa fase,
se não houver preliminares a julgar, é que será aberta a instrução, momento em que terá
início a contagem de prazo para proposição de Representações Privadas.
Conforme observou a PEM em sua promoção pelo não recebimento da
Representação de Parte, a hipótese regimental de ser considerado tempestivo o ato
praticado antes do termo inicial do prazo constante do art. 51, parágrafo único do RIPTM
não se aplica nesse caso, pois até que as defesas sejam apresentadas não se pode afirmar
sem margem de erros que há interesse dos representantes privados para proporem a
representação.
Desse modo, por ter sido proposta a Representação de Parte antes da abertura
da instrução do processo, antes mesmo da juntada de todas as defesas, não deve ser
conhecida, seguindo o processo, ao mesmo por hora, apenas com a Representação
Pública proposta pela PEM.
Na Sessão de Julgamento em que o Tribunal Marítimo reunido decidiu por
não receber a presente Representação de Parte o Exmo. Juiz Fernando Alves Ladeiras
concordou quanto ao não recebimento da representação, mas por outro fundamento:

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(Continuação do Acórdão referente ao Processo nº 32.241/2018........................................)
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Afirmou o Exmo. Juiz Ladeiras que tampouco a receberia por entender serem
manifestamente ilegítimos a figurar no pólo passivo as representadas.
Assim,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Marítimo, por unanimidade quanto ao não
recebimento da Representação, mas por maioria quanto à fundamentação: a) quanto à
natureza e extensão do acidente da navegação: x x x; b) quanto à causa determinante: x x
x; e c) decisão: não receber a Representação de Parte proposta por Lívio Garcia Galvão
Júnior e por Henrique José Caribé Ribeiro, mandando prosseguir o feito apenas com
relação à Representação Pública proposta pela PEM e já recebida pela Corte.
Publique-se. Comunique-se. Registre-se.
Rio de Janeiro, RJ, em 29 de novembro de 2018.

NELSON CAVALCANTE E SILVA FILHO


Juiz-Relator

Cumpra-se o Acórdão, após o trânsito em julgado.


Rio de Janeiro, RJ, em 11de dezembro de 2018.

WILSON PEREIRA DE LIMA FILHO


Vice-Almirante (RM1)
Juiz-Presidente
PEDRO COSTA MENEZES JUNIOR
Primeiro-Tenente (T)
Diretor da Divisão Judiciária
AUTENTICADO DIGITALMENTE

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Assinado de forma digital por COMANDO DA MARINHA
DN: c=BR, st=RJ, l=RIO DE JANEIRO, o=ICP-Brasil, ou=Pessoa Juridica A3, ou=ARSERPRO, ou=Autoridade Certificadora SERPROACF, cn=COMANDO DA MARINHA
Dados: 2018.12.19 15:31:22 -02'00'

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