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Notas de Aula “Álgebra 1”

Martino Garonzi

Universidade de Brası́lia

Segundo semestre 2018

1
2

D’ora in poi ripeterò solo ed esclusivamente quello che avrò già detto.
Conteúdo

Capı́tulo 1. Conjuntos 5
1. Elementos de Lógica 5
2. Conjuntos 7
3. Funções 10
4. Relações 13
5. Resolução listas de exercı́cios 17
5.1. Seção “Lógica” 17
5.2. Seção “Conjuntos” 19
5.3. Seção “Funções” 20
5.4. Seção “Relações” 23
6. Relações de equivalência 25
7. Congruências modulares 29
8. Inversos modulares 33
9. Resolução listas de exercı́cios 36
9.1. Seção “Relações de equivalência” 36
9.2. Seção “Congruências modulares” 40
9.3. Seção “Inversos modulares” 47

Capı́tulo 2. Grupos 51
1. Grupos 51
2. Grupos cı́clicos 54
3. Ordem de um grupo 57
4. Resolução listas de exercı́cios 61
4.1. Seção “Grupos” 61
4.2. Seção “Grupos cı́clicos” 63
4.3. Seção “Ordem de um grupo” 64
5. Mais exercı́cios 68
6. Subgrupos 69
7. Teorema de Lagrange 73
8. Resolução listas de exercı́cios 77
8.1. Seção “Mais exercı́cios” 77
8.2. Seção “Subgrupos” 80
8.3. Seção “Teorema de Lagrange” 87

Capı́tulo 3. Aneis 91
1. Indução 91
2. Polinômios 95
3
4 CONTEÚDO

3. Aneis comutativos unitários 99


4. Resolução listas de exercı́cios 103
4.1. Seção “indução” 103
4.2. Seção “Polinômios” 106
4.3. Seção “Aneis comutativos unitários” 109
5. Ideais 114
6. Fatoração 117
7. Resolução listas de exercı́cios 122
7.1. Seção “Ideais” 122
7.2. Seção “Fatoração” 126
CAPı́TULO 1

Conjuntos

1. Elementos de Lógica

Trabalharemos com uma lógica simplificada (chamada de lógica boole-


ana) em que toda proposição é verdadeira ou falsa. O “valor lógico” de
uma proposição P é então V (VERDADEIRO) ou F (FALSO). Por exemplo
2 + 2 = 4 é verdadeiro, 2 + 2 = 5 é falso.

Usando proposições “basicas” podemos construir proposições mais com-


plexas usando conectivos lógicos. Os conectivos lógicos principais são AND
(∧ “e”), OR (∨ “ou”) e NOT (¬ “não”). A tabela seguinte formaliza o valor
lógico de P ∧ Q, P ∨ Q e ¬P dados os valores lógicos de P e Q.

P Q P ∧ Q P ∨ Q ¬P
V V V V F
V F F V F
F V F V V
F F F F V
Em outras palavras P ∧ Q é verdadeiro apenas quando P é verdadeiro
e Q é verdadeiro, P ∨ Q é verdadeiro exatamente quando pelo menos um
entre P e Q é verdadeiro (observe: “pelo menos um”, e não “exatamente
um”), e ¬P é verdadeiro exatamente quando P é falso.

Proposição (De Morgan). Para toda proposição P, Q vale

¬((¬P ) ∨ (¬Q)) = P ∧ Q.

Demonstração. Para demonstrar o enunciado escrito temos que cal-


cular o valor lógico das duas proposições envolvidas.

P Q ¬P ¬Q (¬P ) ∨ (¬Q) ¬((¬P ) ∨ (¬Q)) P ∧ Q


V V F F F V V
V F F V V F F
F V V F V F F
F F V V V F F

O enunciado segue pois as últimas duas colunas da tabela são iguais. 


5
6 1. CONJUNTOS

No futuro, no lugar de “para todo P ” e “para todo P, Q” escreveremos


também ∀P e ∀P, Q. O simbolo ∀ é chamado de “quantificador” e significa
“para todo”. Um outro quantificador muito usado é ∃ (“existe”).

Um outro exemplo de tautologia é o seguinte: P ∨ (¬P ) (que formaliza


o fato que toda proposição é verdadeira ou falsa). De fato temos a tabela
seguinte.
P ¬P P ∨ (¬P )
V F V
F V V

Definição (Implicação lógica). Sejam P e Q duas proposições. Defi-


namos P ⇒ Q como sendo ¬(P ∧ (¬Q)).
Usando a definição podemos facilmente calcular o valor lógico da im-
plicação lógica:
P Q ¬Q P ∧ (¬Q) P ⇒ Q
V V F F V
V F V V F
F V F F V
F F V F V
A ideia atràs dessa definição é formalizar o fato que P “implica” Q. A
definição diz que P “implica” Q quando não acontece que P é verdadeiro
e Q é falso. Ou seja, a única condição para que P ⇒ Q seja verdadeiro é
que “se P é verdadeiro então Q é verdadeiro”. Isso pode parecer natural
mas as vezes vai contra a nossa intuição. Por exemplo “se sou italiano então
não sou brasileiro” é verdadeiro e parece natural, mas “se sou italiano então
2 + 2 = 4” é também verdadeiro (pois 2 + 2 = 4 independentemente de eu
ser ou não ser italiano) mas vai contra a nossa intuição que a implicação
lógica tenha que ter uma interpretação de causa-efeito (de fato, o conceito
de causa-efeito é uma construção mais filosofica que matemática).

Se P ⇒ Q digamos que P é condição suficiente para que valha Q e Q


é condição necessária para que valha P .
Proposição. Q ⇒ (P ⇒ Q).
Demonstração.
P Q P ⇒ Q Q ⇒ (P ⇒ Q)
V V V V
V F F V
F V V V
F F V V

2. CONJUNTOS 7

A proposição Q ⇒ (P ⇒ Q) é um exemplo de tautologia, ou seja pro-


posição, dependente das proposições “basicas” P e Q, que é verdadeira para
qualquer valor lógico possı́vel de P e de Q.

EX FALSO QUODLIBET (principio de explosão). O fato (as vezes


contra-intuitivo) que se P é falso então P implica Q para todo Q (o que
segue pela definição de implicação olhando a tabela) pode ser justificado da
seguinte forma: usando uma coisa falsa pode-se demonstrar tudo (verdadeiro
ou falso que seja). Por exemplo agora vou mostrar que se 2 + 2 = 5 então
o pato Donald existe. Suponha 2 + 2 = 5, aı́ subtraindo 4 aos dois lados
0 = 1. Tem dois casos: ou o pato Donald existe ou o pato Donald não existe
(lembra que na nossa lógica toda proposição é verdadeira ou falsa). Se o
pato Donald existe então a demonstração terminou, agora suponha de estar
no segundo caso, ou seja que o pato Donald não exista. Nesse segundo caso
posso me perguntar “quantos patos Donald existem?” a resposta é: zero.
Mas como 0 = 1, existe um pato Donald. A demonstração terminou.
Definição (Se e somente se). P ⇔ Q é definido por
(P ⇒ Q) ∧ (Q ⇒ P ).
Leia “P se e somente se Q”.
Podemos facilmente deduzir a tabela de ⇔.
P Q P ⇒Q Q⇒P P ⇔Q
V V V V V
V F F V F
F V V F F
F F V V V
A ideia intuitiva de P ⇔ Q é que P e Q são proposições equivalentes,
ou seja uma das duas vale exatamente quando a outra também vale.

Exercı́cios.
Demonstrar os fatos seguintes para toda proposição P , Q.
(1) (¬P ) ∨ (P ∨ Q).
(2) (P ∨ Q) ∨ ((¬P ) ∨ (¬Q)).
(3) P ⇒ P .
(4) P ⇒ (P ∨ Q).
(5) ((¬P ) ∧ (¬Q)) ⇒ (P ⇒ Q).
(6) (P ⇒ Q) = ((¬Q) ⇒ (¬P )).
(7) P ⇔ Q = (¬P ) ⇔ (¬Q).
(8) (P ⇔ Q) ⇔ ((P ∧ Q) ∨ ((¬P ) ∧ (¬Q))).

2. Conjuntos
Um “conjunto” é uma coleção de objetos. Exemplos de conjuntos são
{1, 2, 3}, {a, b, c, d, e}, {x, y, z, w}.
8 1. CONJUNTOS

Nessa notação a ordem não é levada em conta, assim por exemplo {1, 2, 3} =
{3, 2, 1} = {1, 3, 2}. Além disso, cada elemento é contado no máximo uma
vez, assim por exemplo {1, 1, 2, 2, 2} = {1, 2} (os conjuntos em que as re-
petições são permitidas são chamados de “multiconjuntos” - multiset). Os
objetos que pertencem ao conjunto A são chamados de “elementos” de A
e para dizer que a é um elemento de A escrevamos a ∈ A. Agora in-
troduziremos algumas construções que correspondem aos conectivos lógicos
introduzidos na seção anterior.
(1) União. A ∪ B := {x : x ∈ A ou x ∈ B} (em linguagem natu-
ral: os elementos x tais que x pertence a A ou x pertence a B).
Conectivo lógico correspondente: OR. Se trata do conjunto cujos
elementos são definidos pela propriedade de pertencer a A ou a B.
Por exemplo {1, 3} ∪ {1, a, b} = {1, 3, a, b}.
(2) Interseção. A∩B := {x : x ∈ A e x ∈ B} (em linguagem natural:
os elementos x tais que x pertence a A e x pertence a B). Conectivo
lógico correspondente: AND. Se trata do conjunto cujos elementos
são definidos pela propriedade de pertencer simultaneamente a A e
a B. Por exemplo {1, 3, a, x, 8} ∩ {4, 8, u, x, 2} = {x, 8}.
(3) Complementar. Ac := {x : x 6∈ A} (em linguagem natural:
os elementos x tais que x não pertence a A). Construção lógica
correspondente: NOT. Se trata do conjunto dos cujos elementos são
definidos pela propriedade de não pertencer a A. O complementar
é construido em relação a um conjunto “maior”, por exemplo o
complementar de {1, 2} em {1, 2, 3, 4, 5} é {3, 4, 5}.
(4) Inclusão. A ⊆ B significa que “se x ∈ A então x ∈ B”. Cons-
trução lógica correspondente: ⇒ (implicação lógica). Por exemplo
a frase verdadeira “se o número natural n é divisı́vel por 4 então é
divisı́vel por 2” corresponde à inclusão
{4, 8, 12, 16, 20, 24, . . .} ⊆ {2, 4, 6, 8, 10, 12, . . .}.
Assim por exemplo {1} ⊆ {1, 2} ⊆ {1, 2, 3} e se trata de inclusões
próprias (não são igualdades).

IGUALDADE ENTRE CONJUNTOS. Se A e B são dois conjun-


tos, A = B significa que A ⊆ B e B ⊆ A.

Alguns exemplos notáveis de conjuntos:


(1) N = {0, 1, 2, 3, . . .} (números naturais).
(2) Z = {. . . , −2, −1, 0, 1, 2, . . .} (números inteiros).
(3) Q = {a/b : a, b ∈ Z, b 6= 0} (números racionais).
(4) R é o conjunto dos números reais (racionais ∪ irracionais).

(5) C = {a + ib : a, b ∈ R} (números complexos), onde i = −1.
Temos a sequência de inclusões
N ⊆ Z ⊆ Q ⊆ R ⊆ C.
2. CONJUNTOS 9

Tais inclusões são estritas (próprias), ou seja não são igualdades. Para
mostrar isso basta construir um elemento que contradiz a igualdade em
cada caso. Assim N 6= Z pois −1 ∈ Z mas −1 6∈ N (especificamente isso
mostra que Z 6⊆ N), Z 6= Q pois 3/2 ∈ Q mas 3/2 6∈ Z (especificamente isso
mostra que Q 6⊆ Z), Q 6∈ R pois π ∈ R mas π 6∈ Q (especificamente isso
mostra que R 6⊆ Q), e R 6= C pois i ∈ C mas i 6∈ R (especificamente isso
mostra que C 6⊆ R).

Vamos fazer um exemplo de demonstração com conjuntos.


Proposição. Se A, B, C são conjuntos, A∩(B ∪C) = (A∩B)∪(A∩C).
Demonstração. Para mostrar a igualdade entre os conjuntos dados
precisamos mostrar as duas inclusões.
(1) Primeira inclusão: queremos mostrar que A ∩ (B ∪ C) ⊆ (A ∩ B) ∪
(A ∩ C). Seja então x ∈ A ∩ (B ∪ C). Queremos mostrar que
x ∈ (A ∩ B) ∪ (A ∩ C). A nossa hipótese é que x ∈ A ∩ (B ∪ C),
ou seja x ∈ A e x ∈ B ∪ C. Daı́ sabemos que x ∈ A e pelo fato que
x ∈ B ∪ C tem dois casos possı́veis:
• Primeiro caso: x ∈ B. Nesse caso como x ∈ A temos x ∈ A∩B.
• Segundo caso: x ∈ C. Nesse caso como x ∈ A temos x ∈ A∩C.
Isso mostra que x ∈ (A ∩ B) ∪ (A ∩ C) e conclui essa parte.
(2) Segunda inclusão: queremos mostrar que (A ∩ B) ∪ (A ∩ C) ⊆
A ∩ (B ∪ C). Seja então x ∈ (A ∩ B) ∪ (A ∩ C). Queremos mostrar
que x ∈ A ∩ (B ∪ C). Sabemos que x ∈ A ∩ B ou x ∈ A ∩ C. Logo
temos dois casos:
• Primeiro caso: x ∈ A ∩ B. Nesse caso x ∈ A e x ∈ B. Como
B ⊆ B ∪ C temos também x ∈ B ∪ C logo x ∈ A ∩ (B ∪ C).
• Segundo caso: x ∈ A ∩ C. Nesse caso x ∈ A e x ∈ C. Como
C ⊆ B ∪ C temos também x ∈ B ∪ C logo x ∈ A ∩ (B ∪ C).
Os dois casos levam ao resultado que queremos, logo a demostração
desse item é terminada.
A demonstração é terminada. 
O simbolo ⇔ é lido “se e somente se” e é definido por ⇐ ∧ ⇒ (ou seja,
se e somente se significa que as duas implicações valem simultaneamente).
Proposição. Sejam A e B dois conjuntos. Então A ⊆ B ⇔ A∪B = B.
Demonstração. Mostraremos as duas implicações.
(1) Primeira implicação: A ⊆ B ⇒ A ∪ B = B. Suponha então A ⊆ B.
Queremos mostrar que A ∪ B = B. Para mostrar essa igualdade
entre conjuntos precisamos mostrar as duas inclusões.
• Primeira inclusão: A ∪ B ⊆ B. Seja então x ∈ A ∪ B. Precisa-
mos mostrar que x ∈ B. Tem dois casos: x ∈ A ou x ∈ B. No
segundo caso x ∈ B e acabou, no primeiro caso x ∈ A e como
A ⊆ B (que é a nossa hipótese) segue x ∈ B e acabou.
10 1. CONJUNTOS

• Segunda inclusão: B ⊆ A ∪ B. Obvia (segue da definição de


união).
(2) Segunda implicação: A∪B = B ⇒ A ⊆ B. Suponha então A∪B =
B. Queremos mostrar que A ⊆ B. Para mostrar essa inclusão
precisamos mostrar que se x ∈ A então x ∈ B. Seja então x ∈ A,
em particular x ∈ A ∪ B (pois obviamente A ⊆ A ∪ B), mas por
hipótese A ∪ B = B logo x ∈ A ∪ B = B implica x ∈ B, como
queriamos.
A demonstração é terminada. 
Existe um conjunto, chamado de “conjunto vazio”, caracterizado pela
propriedade de não conter elementos (ou de conter “zero elementos”). É
indicado por ∅. O conjunto vazio representa o “falso” pois a proposição
x ∈ ∅ é sempre falsa.
Proposição. Se A é um conjunto qualquer ∅ ⊆ A.
Demonstração. Precisamos mostrar que se x ∈ ∅ então x ∈ A. Mas
essa implicação é verdadeira (logicamente) pois a premessa x ∈ ∅ é falsa
(veja a definição de implicação lógica). 
Exercı́cios.
Mostrar as proposições seguintes envolvendo os conjuntos A, B, C.
(1) A ∪ A = A.
(2) A ∩ B ⊆ A ∪ B.
(3) A ⊆ B se e somente se B c ⊆ Ac .
(4) Defina A − B = {a ∈ A : a 6∈ B} (os elementos de A que não
pertencem a B). Demonstre a versão de De Morgan em teoria de
conjuntos, ou seja A − (B ∩ C) = (A − B) ∪ (A − C).
(5) A − A = ∅.
(6) A ∪ (B ∩ C) = (A ∪ B) ∩ (A ∪ C).
(7) Diga (justificando) se a igualdade seguinte é verdadeira ou falsa (se
for falsa encontre um contra-exemplo):
A − (B − C) = A − (B ∪ C).
(8) Dado um conjunto X seja P (X) = {A : A ⊆ X} (o conjunto dos
subconjuntos de X). Calcule P (∅), P ({∅}) e P ({1, 2, 3}). Se X
contem exatamente n elementos quantos elementos contem P (X)?

3. Funções
Sejam X e Y dois conjuntos. Uma “função” entre X e Y é uma lei que
associa a todo elemento x ∈ X um único elemento f (x) ∈ Y - escrevamos
f : X → Y , x 7→ f (x). O elemento f (x) é chamado de “imagem” do
elemento x. O conjunto X é chamado de “domı́nio” da função f e o
conjunto Y é chamado de “contradomı́nio” (ou “codomı́nio”) da função
f . A “imagem” de f é o conjunto Im(f ) = f (X) = {f (x) : x ∈ X}.
3. FUNÇÕES 11

Por exemplo f : {1, 2} → {a, b}, f (1) = a e f (2) = b define uma


função. A imagem de f é {a, b}, é igual ao contradomı́nio. As outras funções
possı́veis entre {1, 2} e {a, b} são dadas pelas regras
• 1 7→ b, 2 7→ a: a imagem é {a, b};
• 1 7→ a, 2 7→ a: a imagem é {a};
• 1 7→ b, 2 7→ b: a imagem é {b}.
Observe que nos últimos dois casos os elementos 1 e 2 têm a mesma imagem
(a no primeiro caso, b no segundo). Em particular existem exatamente
quatro funções possı́veis {1, 2} → {a, b}. Observe que nas últimas duas a
imagem da função é diferente do contradomı́nio.

Se f : X → Y é uma função e A ⊆ X, B ⊆ Y , definimos


(1) a imagem direta (imagem) de A é
f (A) = {f (a) : a ∈ A};
(2) a imagem inversa (preimagem) de B é
f −1 (B) = {x ∈ X : f (x) ∈ B}.
Observe que a imagem direta de um conjunto não vazio é um conjunto
não vazio (pois se a ∈ A então com certeza f (a) ∈ f (A)) mas a imagem
inversa de um conjunto não vazio pode ser vazia (por exemplo f : R → R
definida por f (x) = x2 satisfaz f −1 ({−1}) = ∅). Por outro lado f (∅) = ∅ e
f −1 (∅) = ∅ para toda função f .

Digamos que a função f : X → Y é


(1) injetiva se f (a) = f (b) implica que a = b, para todo a, b ∈ X.
Em outras palavras elementos distintos têm imagens distintas: se
a, b ∈ X são tais que a 6= b então f (a) 6= f (b).
(2) sobrejetiva se para todo y ∈ Y existe x ∈ X tal que f (x) = y. Em
outras palavras as imagens inversas dos elementos são não vazias.
Em outras palavras a imagem de f é igual ao seu contradomı́nio.
(3) bijetiva se é injetiva e sobrejetiva. Observe que se X e Y são
conjuntos finitos e f : X → Y é uma função bijetiva então X e Y
têm o mesmo número de elementos (a mesma “cardinalidade”).

Exemplos.

(1) Seja f : R → R definida por f (x) = x2 . Se trata de uma função não


injetiva (pois f (−1) = 1 = f (1)) e não sobrejetiva (pois não existe
x ∈ R tal que f (x) = −1), e Im(f ) = f (R) = [0, +∞) = {y ∈ R :
y ≥ 0}. Indicamos com [a, b] o intervalo fechado {x ∈ R : a ≤ x ≤
b}. Temos f ([0, 1]) = [0, 1], f ([−1, 1]) = [0, 1], f ([−1, 0]) = [0, 1],
f ([1, 2]) = [1, 4], f −1 ([0, 1]) = [−1, 1], f −1 ([1, 4]) = [−2, −1] ∪ [1, 2],
f −1 ({1}) = {−1, 1}, f −1 ([−2, −1]) = ∅.
12 1. CONJUNTOS

(2) f : R → [0, +∞) definida por f (x) = x2 é sobrejetiva. De fato se


√ √
y ∈ [0, +∞) então y ∈ R e f ( y) = y.
(3) f : [0, +∞) → [0, +∞) definida por f (x) = x2 é bijetiva. É injetiva
pois se a2 = b2 com a, b ≥ 0 então a = b. É sobrejetiva pois se
√ √
y ∈ [0, +∞) então y ∈ [0, +∞) e f ( y) = y.
(4) Seja f : R → R definida por f (x) = 3 para todo x ∈ R. Se trata
de uma função não injetiva (pois f (0) = 3 = f (1)), não sobrejetiva
(pois por exemplo 0 ∈ R pertence ao contradomı́nio mas não existe
x ∈ R tal que f (x) = 0), a imagem de f é Im(f ) = f (R) = {3} e
se A é um qualquer subconjunto não vazio de R então f (A) = {3}.
(5) Lembre-se que Z = {. . . , −2, −1, 0, 1, 2, . . .}. Seja f : Z → Z defi-
nida por f (x) = x + 1. Se trata de uma função bijetiva: é injetiva
pois se f (a) = f (b) então a + 1 = b + 1 logo a = b; é sobrejetiva
pois se y ∈ Z então y − 1 ∈ Z (!) e f (y − 1) = (y − 1) + 1 = y.
(6) Lembre-se que N = {0, 1, 2, 3, . . .}. Seja f : N → N definida por
f (n) = n + 1. Se trata de uma função injetiva (pois se f (a) = f (b)
então a + 1 = b + 1 logo a = b) e não sobrejetiva (pois não existe
n ∈ N tal que f (n) = 0, um tal n seria −1 mas −1 6∈ N).
(7) Seja f : R → R definida por f (x) = 2x. Se trata de uma função
bijetiva: é injetiva pois se f (a) = f (b) então 2a = 2b e dividindo
por 2 obtemos a = b, e é sobrejetiva pois se y ∈ R então y/2 ∈ R
(!) e f (y/2) = 2(y/2) = y.
(8) Seja f : Z → Z definida por f (x) = 2x. Se trata de uma função
injetiva pois se f (a) = f (b) então 2a = 2b e dividindo por 2 obtemos
a = b, e não sobrejetiva pois não existe x ∈ Z tal que f (x) = 1: um
tal x teria que ser igual a 1/2 mas 1/2 6∈ Z.
(9) Não existe nenhuma função bijetiva {1, 2} → {1, 2, 3}. De fato
dada uma qualquer função injetiva {1, 2} → {1, 2, 3} as imagens de
1 e 2 serão exatamente dois elementos de {1, 2, 3} logo pelo menos
um elemento do contradomı́nio fica sem preimagem. Na verdade,
como já comentado, para que exista uma função bijetiva X → Y
os dois conjuntos X e Y devem ter o mesmo número de elementos
(a mesma “cardinalidade”).
Proposição. Seja f : X → Y uma função. Então f é injetiva se e
somente se para todo subconjunto A, B de X temos f (A∩B) = f (A)∩f (B).
Demonstração. Suponha f injetiva. Sejam A, B ⊆ X. Queremos
mostrar que f (A∩B) = f (A)∩f (B). A inclusão ⊆ é obvia, pois se x ∈ A∩B
então x ∈ A e x ∈ B logo f (x) ∈ f (A) e f (x) ∈ f (B) assim f (x) ∈
f (A) ∩ f (B). Mostraremos agora ⊇. Seja y ∈ f (A) ∩ f (B), assim existem
a ∈ A e b ∈ B tais que f (a) = y e f (b) = y, logo f (a) = y = f (b) implica
f (a) = f (b) e como f é injetiva (por hipótese) deduzimos a = b. Logo,
a ∈ B assim a ∈ A ∩ B e y = f (a) implica y ∈ f (A ∩ B).
Suponha que f (A∩B) = f (A)∩f (B) para todo A, B ⊆ X. Mostraremos
agora que f é injetiva. Sejam a, b ∈ X com a 6= b: mostraremos que
4. RELAÇÕES 13

f (a) 6= f (b). De fato sejam A = {a}, B = {b}. Temos A ∩ B = ∅.


Por hipótese f (A ∩ B) = f (A) ∩ f (B) (de fato por hipótese isso vale para
todo A, B, em particular vale para A = {a} e B = {b}), por outro lado
f (A ∩ B) = f (∅) = ∅ logo f (A) ∩ f (B) = ∅, o que implica que f (a) 6= f (b)
(se fosse f (a) = f (b) então seria f (A) = f (B) logo f (A)∩f (B) = f (A) 6= ∅).
Uma outra maneira de mostrar a segunda implicação era a seguinte:
mostraremos que se f (a) = f (b) então a = b. Por contradição, suponha
a 6= b. Definindo A = {a} e B = {b} temos f (A) = {f (a)} = {f (b)} = f (B)
logo f (A) ∩ f (B) = f (A) 6= ∅, por outro lado f (A ∩ B) = f (∅) = ∅ contradiz
o fato que f (A ∩ B) = f (A) ∩ f (B) (verdadeiro por hipótese). 

Exercı́cios.

(1) Conte as funções {1, 2} → {1, 2, 3}.


(2) Conte as funções injetivas, sobrejetivas e bijetivas de domı́nio {1, 2, 3}
e contradomı́nio {1, 2, 3, 4}.
(3) Suponha que X tenha exatamente n elementos e Y tenha exata-
mente m elementos. Conte as funções X → Y , mostre que existe
uma função injetiva X → Y se e somente se n ≤ m, e que existe
uma função sobrejetiva X → Y se e somente se n ≥ m.
(4) Mostre que se f : X → Y é uma função e A, B ⊆ Y então
f −1 (A ∩ B) = f −1 (A) ∩ f −1 (B),
f −1 (A ∪ B) = f −1 (A) ∪ f −1 (B).
(5) Faça um exemplo de função f : X → Y tal que existem A, B ⊆ X
tais que f (A − B) 6= f (A) − f (B).
(6) Mostre que f : X → Y é injetiva se e somente se para todo A, B ⊆
X temos f (A − B) = f (A) − f (B).
(7) Mostre que se f : X → Y é bijetiva então existe uma função g :
Y → X com a propriedade que g(f (x)) = x para todo x ∈ X e
f (g(y)) = y para todo y ∈ Y (a mesma função g satisfaz as duas
propriedades).

4. Relações
Sejam A, B dois conjuntos. Se a ∈ A e b ∈ B, o par ordenado (a, b) é o
conjunto {{a}, {a, b}} (Kuratowski). O elemento a é chamado de primeiro
elemento de (a, b) e b é chamado de segundo elemento de (a, b). O “produto
cartesiano” entre A e B é o conjunto dos pares ordenados A×B = {(a, b) :
a ∈ A, b ∈ B}. Uma relação entre A e B é um subconjunto R de
A×B. As funções são particulares relações, à função f : A → B corresponde
R = {(a, f (a)) : a ∈ A}.

Seja A um conjunto. Uma relação sobre A é uma relação entre A e


A, ou seja um subconjunto R do produto cartesiano A × A. Se (a, b) ∈ R
14 1. CONJUNTOS

digamos que a está em relação com b e escrevamos aRb. Por exemplo se A =


R então uma relação sobre A é um “desenho no plano R2 ”, e as propriedades
da relação as vezes podem ser enxergadas graficamente.

Uma relação R sobre A é dita


(1) Reflexiva se aRa para todo a ∈ A. Graficamente: R contem a
diagonal {(a, a) : a ∈ A}, ou seja a reta de equação y = x.
(2) Simétrica se aRb implica bRa para todo a, b ∈ A. Graficamente:
R é simétrica com respeito à diagonal.
(3) Transitiva se aRb e bRc implica aRc para todo a, b, c ∈ A.
(4) Antissimétrica se aRb e bRa implica a = b para todo a, b ∈
A. Graficamente: se um par (a, b) em R está fora da diagonal o
simétrico dele (com respeito à diagonal) não pertence a R.
(5) Total se para todo a, b ∈ A temos aRb ou bRa. Graficamente:
dado um qualquer par (a, b) ou ele pertence a R ou o simétrico dele
(com respeito à diagonal) pertence a R.

Exemplos.

(1) A relação = sobre N é reflexiva (pois a = a para todo a), simétrica


(pois se a = b então b = a), transitiva (pois se a = b e b = c então
a = c) e antissimétrica (pois se a = b e b = a então a = b). Na
verdade, se trata da única relação com essas quatro propriedades.
De fato, se ∼ é uma relação reflexiva, simétrica, transitiva e antis-
simétrica então se a, b ∈ A e a ∼ b então b ∼ a sendo ∼ simétrica
logo a = b sendo ∼ antissimétrica. Por outro lado a ∼ a para todo
a ∈ A sendo R reflexiva. Isso implica que R = {(a, a) : a ∈ A}.
É claro que = não é total (pois se a, b são dois elementos distintos
então a 6= b e b 6= a).
(2) A relação 6= sobre N não é reflexiva (pois a 6= a é sempre falso),
é simétrica (pois se a 6= b então b 6= a), não é transitiva (pois se
a 6= b então a 6= b e b 6= a mas a = a) e não é antissimétrica (pois se
a, b são distintos a 6= b e b 6= a). É claro que 6= não é total porque
a 6= a é sempre falso.
(3) A relação R = {(a, b) ∈ R × R : a2 + b2 = 1} (o cı́rculo unitário) é
uma relação sobre R. Ela não é reflexiva (pois por exemplo 12 +12 6=
1), é simétrica (pois se a2 + b2 = 1 então b2 + a2 = 1), não é
antissimétrica (pois 12 + 02 = 1 e 02 + 12 = 1), não é transitiva
(pois 1R0 e 0R1 mas 1 não é em relação com 1), não é total (pois
1 não é em relação com 2 e nem 2 com 1).
(4) ∅ é uma relação sobre um qualquer conjunto A (pois é um subcon-
junto de A × A). Ela é simétrica, transitiva, antissimétrica mas se
A não for vazio então ∅ não é reflexiva e não é total. Isso é porque
4. RELAÇÕES 15

as propriedades de simetria, transitividade e antissimetria são de-


finidas por meio de implicações (que são verdadeiras se a premissa
for falsa!) enquanto a reflexividade e a totalidade são definidas
“impondo a existência” de algum par na relação (logo não valem
se a relação for vazia!). Por exemplo isso implica que uma relação
(sobre um conjunto não vazio) total ou reflexiva com certeza é não
vazia. Mas uma relação simétrica, transitiva ou antissimétrica pode
ser vazia.
(5) ≤ (menor ou igual) é uma relação sobre N. Ela é reflexiva (pois
a ≤ a para todo a), transitiva (pois se a ≤ b e b ≤ c então a ≤ c),
antissimétrica (pois se a ≤ b e b ≤ a então a = b) e total (pois para
todo a, b ∈ N ou a ≤ b ou b ≤ a) mas não é simétrica (pois 1 ≤ 2
mas 2 6≤ 1).
(6) < (menor estrito: ou seja < é igual a ≤ ∧ = 6 ) é uma relação sobre N.
Ela é transitiva (pois se a < b e b < c então a < c) e antissimétrica
(pois se a < b e b < a então a = b - implicação com premissa falsa
é verdadeira) mas não é simétrica (pois 1 < 2 mas 2 não é menor
que 1), não é reflexiva (pois a < a é sempre falso) e não é total (por
exemplo 1 não é em relação com si mesmo).
(7) Digamos que duas pessoas a, b da turma são em relação (aRb) se
elas têm o mesmo nome. Essa relação (sobre o conjunto das pessoas
da turma) é reflexiva (pois cada pessoa tem o mesmo seu nome),
simétrica (pois se a pessoa a tem o mesmo nome da pessoa b então
a pessoa b tem o mesmo nome da pessoa a) e transitiva (pois se
a, b têm o mesmo nome e b, c têm o mesmo nome então a, c têm
o mesmo nome). Se existem duas pessoas na turma com o mesmo
nome então R não é antissimétrica. R é total se e somente se todas
as pessoas da turma têm o mesmo nome (o que normalmente é
muito raro).

Definição (Relação de equivalência). Uma relação de equivalência é


uma relação R sobre um conjunto A que é reflexiva, simétrica e transitiva.

A ideia é a seguinte: uma relação definida por meio de uma “qualidade


comum” (por exemplo: dois objetos são em relação se tiverem a mesma cor,
duas pessoas são em relação se tiverem o mesmo nome, ou a mesma idade)
é uma relação de equivalência. Isso é formalizado pela proposição seguinte.

Proposição. Seja f : X → Y uma função. A relação Rf definida sobre


X por aRf b se e somente se f (a) = f (b) é uma relação de equivalência sobre
X. Rf é a relação de igualdade se e somente se f é injetiva.

Demonstração. Rf é reflexiva porque f (a) = f (a) para todo a ∈ X, é


simétrica porque se f (a) = f (b) então é claro que f (b) = f (a), e é transitiva
porque se f (a) = f (b) e f (b) = f (c) então f (a) = f (c). Se Rf é a relação
de igualdade então f (a) = f (b) se e somente se a = b, logo f é injetiva. Se
16 1. CONJUNTOS

f é injetiva e aRf b então f (a) = f (b) logo a = b sendo f injetiva, assim Rf


é a relação de igualdade. 
Na verdade, todas as relações de equivalência são desse tipo. Para mos-
trar isso precisamos da noção de conjunto quociente.
Definição (Conjunto quociente). Seja R uma relação de equivalencia
sobre o conjunto A. A “classe de equivalencia” de a ∈ A é o conjunto
[a]R := {b ∈ A : a ∼ b}. O “conjunto quociente” de R é o conjunto
A/R := {[a]R : a ∈ A}.
Por exemplo as classes de equivalência da relação de igualdade (chamamo-
la R) são os conjuntos com um único elemento {a}, ou seja A/R = {{a} :
a ∈ A}. Mais em geral se f : X → Y é uma função, a classe de equivalência
de a ∈ X via Rf é [a]Rf = {b ∈ X : f (a) = f (b)} logo X/Rf consiste
das “fibras” f −1 (y) com y ∈ f (X) = Im(f ), por exemplo se f : R → R é
definida por f (x) = x2 então [a]Rf = {a, −a} e R/R = {{a, −a} : a ∈ R}.

Um exemplo importante: defina a relação R sobre Z como segue:


aRb se e somente se a + b é par. Se trata de uma relação de equivalência:
• Reflexiva: se a ∈ Z então a + a = 2a é par.
• Simétrica: se a + b é par então b + a é par pois b + a = a + b.
• Transitiva: se a+b é par e b+c é par então a+c = (a+b)+(b+c)−2b
é par pois é soma (algébrica) de números pares.
Todo número inteiro é par ou impar. Se a ∈ Z é par então a + 0 é par logo
aR0. Se a ∈ Z é impar então a + 1 é par logo aR1. Isso implica que existem
exatamente duas classes de equivalência, ou seja Z/R = {[0]R , [1]R }.

Se f : X → Y e g : Y → Z são duas funções, com o contradomı́nio de f


igual ao domı́nio de g, a composição de g com f é a função g ◦ f : X → Z
definida por (g ◦ f )(x) := g(f (x)).

Seja E uma relação de equivalência sobre o conjunto A. Existe uma


função canônica, chamada de “projeção canônica”, definida por
πE : A → A/E, πE (a) := [a]E .
É claro que E = RπE (pois aEb se e somente se [a]E = [b]E ). A projeção πE
é uma função sobrejetiva (pois se [a]E ∈ A/E então πE (a) = [a]E ) que na
verdade é o arquetipo de todas as funções sobrejetivas. Mais precisamente,
Teorema (Teorema de isomorfismo). Se f : X → Y é uma função
sobrejetiva então a função τ : X/Rf → Y definida por τ ([a]Rf ) := f (a) é
bem definida, bijetiva e f = τ ◦ πRf .
Demonstração. τ é bem definida pois se [a]Rf = [b]Rf então aRf b
ou seja f (a) = f (b), logo τ ([a]Rf ) = τ ([b]Rf ). É sobrejetiva pois se y ∈ Y
então dado x ∈ X com f (x) = y (que existe pois f é sobrejetiva) temos
5. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 17

τ ([x]Rf ) = f (x) = y, é injetiva pois se τ ([a]Rf ) = τ ([b]Rf ) então f (a) = f (b)


logo [a]Rf = [b]Rf . Isso mostra que τ é bijetiva. Além disso f = τ ◦ πRf pois
τ (πRf (a)) = τ ([a]Rf ) = f (a). 

Exercı́cios.
(1) Seja A = {0, 1, 2, 3, 4} e R = {(0, 1), (1, 2), (1, 4), (2, 2), (3, 4), (1, 1),
(2, 1), (4, 0), (3, 3), (4, 2), (4, 4), (1, 2), (4, 3), (0, 4)}; é uma relação so-
bre A. Diga se é reflexiva, simétrica, transitiva, antissimétrica,
total.
(2) Seja A = {1, 2, 3, 4} e seja R = {(1, 2), (2, 3), (3, 4), (4, 1)}, relação
sobre A. Encontre uma relação transitiva (sobre A) contendo R.
(3) Mostre que toda relação total é reflexiva.
(4) Encontre uma relação total que não seja transitiva.
(5) Considere a relação R sobre Z dada por aRb se e somente se a − b
é um múltiplo de 3. Mostre que R é uma relação de equivalência.
Quantas classes de equivalência tem?
(6) Seja R a relação Rf sobre o conjunto A = {−2, 0, 1, 2, −4} onde
f : A → R é definida por f (x) = (x + 1)2 . Calcule A/R.
(7) Para cada uma das relações seguintes (sobre R) diga se é reflexiva,
simétrica, transitiva, antissimétrica, total.
(a) xRy se e somente se xy ≥ 1.
(b) xRy se e somente se x2 ≥ y 2 .
(c) xRy se e somente se cos(xy) ≥ 0.
(d) xRy se e somente se y ≥ 2x.
(8) Seja R uma relação de equivalência sobre Y e seja f : X → Y uma
função. Mostre que a relação ∼ sobre X definida por “a ∼ b se e
somente se f (a)Rf (b)” é uma relação de equivalência sobre X.
(9) Seja R uma relação de equivalência sobre o conjunto A. Mostre que
A é a união das classes de equivalência (ou seja para todo a ∈ A
existe uma classe de equivalência que contem a) e que classes de
equivalência distintas têm interseção vazia (ou seja se a, b ∈ A são
tais que [a]R 6= [b]R então [a]R ∩ [b]R = ∅). A gente fala que as
classes de equivalência formam uma “partição” de A.
(10) Mostre que toda função é uma composição de uma função sobre-
jetiva com uma função injetiva (β ◦ α onde α é sobrejetiva e β é
injetiva).

5. Resolução listas de exercı́cios

5.1. Seção “Lógica”.


Demonstrar os fatos seguintes para toda proposição P , Q.
18 1. CONJUNTOS

(1) (¬P ) ∨ (P ∨ Q).

P Q ¬P P ∨ Q (¬P ) ∨ (P ∨ Q)
V V F V V
V F F V V
F V V V V
F F V F V

(2) (P ∨ Q) ∨ ((¬P ) ∨ (¬Q)).

P Q ¬P ¬Q P ∨ Q (¬P ) ∨ (¬Q)
V V F F V V
V F F V V V
F V V F V V
F F V V F V

(3) P ⇒ P .
P P P ⇒P
V V V
F F V

(4) P ⇒ (P ∨ Q).

P Q P ∨ Q P ⇒ (P ∨ Q)
V V V V
V F V V
F V V V
F F F V

(5) ((¬P ) ∧ (¬Q)) ⇒ (P ⇒ Q).

P Q ¬P ¬Q (¬P ) ∧ (¬Q) P ⇒ Q ((¬P ) ∧ (¬Q)) ⇒ (P ⇒ Q)


V V F F F V V
V F F V F F V
F V V F F V V
F F V V V V V

(6) (P ⇒ Q) = ((¬Q) ⇒ (¬P )).

P Q P ⇒ Q ¬P ¬Q (¬Q) ⇒ (¬P )
V V V F F V
V F F F V F
F V V V F V
F F V V V V
5. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 19

(7) P ⇔ Q = (¬P ) ⇔ (¬Q).


P Q P ⇔ Q ¬P ¬Q (¬P ) ⇔ (¬Q)
V V V F F V
V F F F V F
F V F V F F
F F V V V V
(8) (P ⇔ Q) ⇔ ((P ∧ Q) ∨ ((¬P ) ∧ (¬Q))). Seja R essa proposição e
seja S a proposição (P ∧ Q) ∨ ((¬P ) ∧ (¬Q)).
P Q P ⇔ Q ¬P ¬Q P ∧ Q (¬P ) ∧ (¬Q) S R
V V V F F V F V V
V F F F V F F F V
F V F V F F F F V
F F V V V F V V V
5.2. Seção “Conjuntos”.
Mostrar as proposições seguintes envolvendo os conjuntos A, B, C.
(1) A ∪ A = A.
Primeira inclusão: A ∪ A ⊆ A, Se a ∈ A ∪ A então a ∈ A ou
a ∈ A, logo a ∈ A.
Segunda inclusão: A ⊆ A ∪ A. Se a ∈ A então a ∈ A ou a ∈ A,
logo a ∈ A ∪ A.
(2) A ∩ B ⊆ A ∪ B.
Seja x ∈ A ∩ B, precisamos mostrar que x ∈ A ∪ B. Como
x ∈ A ∩ B, com certeza x ∈ A logo x ∈ A ∪ B.
(3) A ⊆ B se e somente se B c ⊆ Ac .
Primeira implicação. Suponha A ⊆ B, quero mostrar que B c ⊆
A . Seja então x ∈ B c , assim x 6∈ B, quero mostrar que x ∈ Ac ,
c

ou seja x 6∈ A. Por contradição se fosse x ∈ A então x ∈ B (pois


A ⊆ B por hipótese) e isso contradiz o fato que x ∈ B c .
Segunda implicação. Suponha B c ⊆ Ac , quero mostrar que A ⊆
B. Seja então x ∈ A, quero mostrar que x ∈ B. Por contradição
se x 6∈ B então x ∈ B c logo x ∈ Ac (pois B c ⊆ Ac por hipótese) o
que contradiz a hipótese que x ∈ A.
(4) Defina A − B = {a ∈ A : a 6∈ B} (os elementos de A que não
pertencem a B). Demonstre a versão de De Morgan em teoria de
conjuntos, ou seja A − (B ∩ C) = (A − B) ∪ (A − C).
Primeira inclusão. Mostraremos que se x ∈ A − (B ∩ C) então
x ∈ (A − B) ∪ (A − C). Suponha então que x ∈ A − (B ∩ C), daı́
x ∈ A e x 6∈ B ∩ C. Para mostrar que x ∈ (A − B) ∪ (A − C)
precisamos então mostrar que x 6∈ B ou x 6∈ C. Se isso for falso
então x ∈ B e x ∈ C, daı́ x ∈ B ∩ C o que contradiz a hipótese.
Segunda inclusão. Mostraremos que se x ∈ (A − B) ∪ (A − C)
então x ∈ A − (B ∩ C). Suponha então que x ∈ (A − B) ∪ (A − C),
daı́ tem dois casos: x ∈ A − B ou x ∈ A − C. Em outras palavras
20 1. CONJUNTOS

x ∈ A e tem dois casos: x 6∈ B ou x 6∈ C. Nos dois casos x 6∈ B ∩ C.


Logo x ∈ A − (B ∩ C).
(5) A − A = ∅.
A inclusão ∅ ⊆ A − A é clara pois ∅ é subconjunto de todos os
conjuntos. Para mostrar a outra inclusão A − A = ∅ precisamos
mostrar que se x ∈ A − A então x ∈ ∅. Tal implicação é verdadeira
pois a premissa é falsa (x ∈ A − A significa que x ∈ A e x 6∈ A, o
que é falso).
(6) A ∪ (B ∩ C) = (A ∪ B) ∩ (A ∪ C).
Primeira inclusão. Mostraremos que se x ∈ A ∪ (B ∩ C) então
x ∈ (A ∪ B) ∩ (A ∪ C). Seja então x ∈ A ∪ (B ∩ C), daı́ x ∈ A ou
x ∈ B ∩ C. No primeiro caso x ∈ A logo x ∈ A ∪ B e x ∈ A ∪ C
assim x ∈ (A ∪ B) ∩ (A ∪ C). No segundo caso x ∈ B e x ∈ C, logo
x ∈ A ∪ B e x ∈ A ∪ C assim x ∈ (A ∪ B) ∩ (A ∪ C).
(7) Diga (justificando) se a igualdade seguinte é verdadeira ou falsa (se
for falsa encontre um contra-exemplo):
A − (B − C) = A − (B ∪ C).
É falsa, por exemplo sejam A = {1, 2, 3}, B = {1, 2}, C =
{2, 3}. Daı́ B − C = {1}, B ∪ C = A logo A − (B − C) = {2, 3} e
A − (B ∪ C) = A − A = ∅.
(8) Dado um conjunto X seja P (X) = {A : A ⊆ X} (o conjunto dos
subconjuntos de X). Calcule P (∅), P ({∅}) e P ({1, 2, 3}). Se X
contem exatamente n elementos quantos elementos contem P (X)?
O único subconjunto de ∅ é ∅, logo P (∅) = {∅}.
Os subconjuntos de {∅} são ∅ e {∅} logo P ({∅}) = {∅, {∅}}.
P ({1, 2, 3}) é dado por
P ({1, 2, 3}) = {∅, {1}, {2}, {3}, {1, 2}, {1, 3}, {2, 3}, {1, 2, 3}}.
Se X contem exatamente n elementos então para construir um
subconjunto de X temos que dizer, para todo x ∈ X, se x pertence
ou não pertence ao subconjunto. Logo temos duas escolhas para
cada elemento assim X tem exatamente 2n subconjuntos, ou seja
P (X) tem exatamente 2n elementos.

5.3. Seção “Funções”.


(1) Conte as funções {1, 2} → {1, 2, 3}.
Se f : {1, 2} → {1, 2, 3} então para todo a ∈ {1, 2} o valor de
f (a) pode ser 1, 2 ou 3. Em outras palavras tem 3 possibilidades
para cada elemento do domı́nio, logo tem exatamente 3 · 3 = 9
funções {1, 2} → {1, 2, 3}.
(2) Conte as funções injetivas, sobrejetivas e bijetivas de domı́nio {1, 2, 3}
e contradomı́nio {1, 2, 3, 4}.
A imagem de uma qualquer função f : {1, 2, 3} → {1, 2, 3, 4} é
{f (1), f (2), f (3)} logo a imagem contem no máximo 3 elementos,
em particular não pode ser igual ao contradomı́nio {1, 2, 3, 4}, assim
5. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 21

f não pode ser sobrejetiva, o que implica que não pode ser bijetiva.
Falta contar as funções injetivas f : {1, 2, 3} → {1, 2, 3, 4}.
Primeiramente observe que se f é injetiva então {f (1), f (2), f (3)}
tem exatamente 3 elementos, logo é um subconjunto de {1, 2, 3, 4}
com 3 elementos. O conjunto {1, 2, 3, 4} contem exatamente 4 sub-
conjuntos com 3 elementos, eles são {1, 2, 3}, {1, 2, 4}, {1, 3, 4} e
{2, 3, 4}, logo tem 4 possibilidades para Im(f ). Para cada uma des-
sas possibilidades temos que contar as funções injetivas {1, 2, 3} →
{a, b, c} onde {a, b, c} é um qualquer subconjunto de {1, 2, 3, 4} com
3 elementos. Temos 3 escolhas para f (1) (ele pode ser a, b ou c), 2
escolhas para f (2) (ele pode ser a, b ou c mas não pode ser igual a
f (1) pois f é injetiva) e 1 escolha para f (3) (ele pode ser a, b ou c
mas não pode ser igual a f (1) e nem a f (2) pois f é injetiva). Logo
temos 3·2·1 = 6 possibilidades. Resumindo, temos 4 possibilidades
para Im(f ) e 6 possibilidades para a função {1, 2, 3} → Im(f ) in-
duzida pela f , logo existem exatamente 4 · 6 = 24 funções injetivas
{1, 2, 3} → {1, 2, 3, 4}.
(3) Suponha que X tenha exatamente n elementos e Y tenha exata-
mente m elementos. Conte as funções X → Y , mostre que existe
uma função injetiva X → Y se e somente se n ≤ m, e que existe
uma função sobrejetiva X → Y se e somente se n ≥ m.
Para construir uma função f : X → Y precisamos escolher f (x)
para cada um dos n elementos de X, e tem m escolhas para cada
um deles. Logo tem exatamente mn funções X → Y .
Mostraremos agora que existe uma função injetiva X → Y se e
somente se n ≤ m.
Primeira implicação. Se existe uma função injetiva f : X → Y
então a imagem f (X) é um conjunto com n elementos (se X =
{x1 , . . . , xn } então f (X) = {f (x1 ), . . . , f (xn )} tem n elementos pois
os f (xi ) são dois a dois distintos, sendo f injetiva), logo como
f (X) ⊆ Y temos que n é no máximo o número de elementos de Y ,
ou seja m. Isso mostra que n ≤ m.
Segunda implicação. Se n ≤ m então escrevendo X = {x1 , . . . , xn }
e Y = {y1 , . . . , ym } a função f : X → Y definida por f (xi ) := yi é
bem definida (pois y1 , . . . , yn são elementos de Y sendo n ≤ m) e
injetiva (pois os yi são dois a dois distintos).
Mostraremos agora que existe uma função sobrejetiva X → Y
se e somente se n ≥ m
Primeira implicação. Se existe uma função sobrejetiva X → Y
então escrevendo X = {x1 , . . . , xn } temos que a imagem f (X) =
{f (x1 ), . . . , f (xn )} tem no máximo n elementos, por outro lado
Y = f (X) (pois f é sobrejetiva) e Y tem exatamente m elementos,
e isso mostra que m ≤ n.
Segunda implicação. Se n ≥ m então escrevendo X = {x1 , . . . , xn }
e Y = {y1 , . . . , ym } a função f : X → Y definida por f (xi ) := yi
22 1. CONJUNTOS

para todo i = 1, . . . , m e f (xi ) := y1 para todo i = m + 1, . . . , n


é bem definida pois n ≥ m e é sobrejetiva pois se yi ∈ Y então
f (xi ) = yi .
(4) Mostre que se f : X → Y é uma função e A, B ⊆ Y então
f −1 (A ∩ B) = f −1 (A) ∩ f −1 (B),
f −1 (A ∪ B) = f −1 (A) ∪ f −1 (B).
Mostraremos agora que f −1 (A ∩ B) = f −1 (A) ∩ f −1 (B). Em
vez de mostrar as duas inclusões (o que seria correto) mostraremos
que x ∈ f −1 (A ∩ B) se e somente se x ∈ f −1 (A) ∩ f −1 (B). Temos
que x ∈ f −1 (A ∩ B) se e somente se f (x) ∈ A ∩ B se e somente se
f (x) ∈ A e f (x) ∈ B se e somente se x ∈ f −1 (A) e x ∈ f −1 (B) se
e somente se x ∈ f −1 (A) ∩ f −1 (B).
Mostraremos agora que f −1 (A ∪ B) = f −1 (A) ∪ f −1 (B). Em
vez de mostrar as duas inclusões (o que seria correto) mostraremos
que x ∈ f −1 (A ∪ B) se e somente se x ∈ f −1 (A) ∪ f −1 (B). Temos
que x ∈ f −1 (A ∪ B) se e somente se f (x) ∈ A ∪ B se e somente se
f (x) ∈ A ou f (x) ∈ B se e somente se x ∈ f −1 (A) ou x ∈ f −1 (B)
se e somente se x ∈ f −1 (A) ∪ f −1 (B).
(5) Faça um exemplo de função f : X → Y tal que existem A, B ⊆ X
tais que f (A − B) 6= f (A) − f (B).
Considere a função f : R → R dada por f (x) := x2 . Sejam A =
[0, +∞) = {x ∈ R : x ≥ 0} e B = (−∞, 0] = {x ∈ R : x ≤ 0}.
Então é claro que f (A) = [0, +∞) = f (X) e f (B) = [0, +∞) =
f (X) logo f (A) = f (B) assim f (A) − f (B) = ∅. Por outro lado
A − B = {0} logo f (A − B) = f ({0}) = {f (0)} = {0} = 6 ∅.
(6) Mostre que f : X → Y é injetiva se e somente se para todo A, B ⊆
X temos f (A − B) = f (A) − f (B).
Primeira implicação. Suponha f : X → Y injetiva e sejam
A, B ⊆ X. Para mostrar que f (A−B) = f (A)−f (B) mostraremos
as duas inclusões. Primeira inclusão. Mostraremos que se x ∈
f (A − B) então x ∈ f (A) − f (B). Suponha então x ∈ f (A − B),
assim existe a ∈ A − B tal que f (a) = x. Isso mostra que x ∈ f (A).
Falta mostrar que x 6∈ f (B). Por contradição se x ∈ f (B) então
existe b ∈ B tal que x = f (b), assim f (a) = x = f (b) implica
f (a) = f (b) logo a = b sendo f injetiva. Mas então a = b ∈ B o que
contradiz a hipótese a ∈ A − B. Segunda inclusão. Mostraremos
que se x ∈ f (A) − f (B) então x ∈ f (A − B). Suponha então
x ∈ f (A) − f (B), em particular x ∈ f (A) logo existe a ∈ A tal que
f (a) = x. Para concluir que x ∈ f (A − B) basta então mostrar que
a ∈ A−B, ou seja que a 6∈ B. Por contradição, se fosse a ∈ B então
x = f (a) ∈ f (B), o que contradiz a hipótese x ∈ f (A) − f (B).
Segunda implicação. Suponha que f (A − B) = f (A) − f (B)
para todo A, B ⊆ X. Mostraremos agora que f é injetiva. Sejam
então a, b ∈ X tais que f (a) = f (b), mostraremos que a = b.
5. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 23

Por contradição, suponha a 6= b. Considere A = {a} e B = {b}.


Por hipótese f (A − B) = f (A) − f (B) (pois tal hipótese vale para
quaisquer A e B subconjuntos de X, em particular vale para A =
{a} e B = {b}) mas A − B = {a} (sendo a 6= b) e f (A) = {f (a)} =
{f (b)} = f (B) logo f (A) − f (B) = ∅, assim {f (a)} = f ({a}) =
f (A − B) não é igual a f (A) − f (B) = ∅, o que é uma contradição.
(7) Mostre que se f : X → Y é bijetiva então existe uma função g :
Y → X com a propriedade que g(f (x)) = x para todo x ∈ X e
f (g(y)) = y para todo y ∈ Y (a mesma função g satisfaz as duas
propriedades).
Suponha f : X → Y bijetiva. Queremos construir uma g :
Y → X como no enunciado. Se y ∈ Y então existe x ∈ X tal
que f (x) = y (pois f é sobrejetiva) e tal x é único pois se fosse
f (x) = y = f (z) então x = z sendo f injetiva. Logo faz sentido
definir g(y) := x, ou seja g(y) é o único elemento x ∈ X tal que
f (x) = y. Assim por construção temos g(f (x)) = x. Por outro lado
f (g(y)) = f (x) onde x é o único elemento de X tal que f (x) = y,
logo f (g(y)) = f (x) = y.

5.4. Seção “Relações”.


(1) Seja A = {0, 1, 2, 3, 4} e R = {(0, 1), (1, 2), (1, 4), (2, 2), (3, 4), (1, 1),
(2, 1), (4, 0), (3, 3), (4, 2), (4, 4), (4, 3), (0, 4)}; é uma relação sobre A.
Diga se é reflexiva, simétrica, transitiva, antissimétrica, total.
R não é reflexiva pois (0, 0) 6∈ R, não é simétrica pois (0, 1) ∈ R
mas (1, 0) 6∈ R, não é transitiva pois (3, 4) ∈ R, (4, 0) ∈ R mas
(3, 0) 6∈ R, não é antissimétrica pois (1, 2) ∈ R e (2, 1) ∈ R, e não é
total pois (2, 3) 6∈ R e (3, 2) 6∈ R.
(2) Seja A = {1, 2, 3, 4} e seja R = {(1, 2), (2, 3), (3, 4), (4, 1)}, relação
sobre A. Encontre uma relação transitiva (sobre A) contendo R.
Uma resposta fácil (e correta) seria: a relação A×A é transitiva
e contem R. Mas tentamos encontrar a menor relação transitiva
que contem R.
Para construir uma relação transitiva S contendo R precisamos
adicionar os pares que vêm da transitividade. Por exemplo como
(1, 2) ∈ R e (2, 3) ∈ R temos que ter (1, 3) ∈ S. Pela estrutura
cı́clica de R temos que os pares aSa para todo a ∈ A, por exemplo
1S1 pois 1R2R3R4R1, 2S2 pois 2R3R4R1R2, etc. Pela mesma
razão todos os pares (a, b) pertencem a S, por exemplo 4S2 pois
4R1R2, 4S3 pois 4R1R2R3, etc. Isso mostra que a menor relação
transitiva que contem R é A × A.
(3) Mostre que toda relação total é reflexiva.
Uma relação R sobre A é dita total se para todo a, b ∈ A temos
aRb ou bRa. Escolhendo a = b obtemos que para todo a ∈ A temos
aRa ou aRa, ou seja aRa é verdadeiro para todo a ∈ A, ou seja R
é reflexiva.
24 1. CONJUNTOS

(4) Encontre uma relação total que não seja transitiva.


Sejam A = {1, 2, 3} e R = {(1, 1), (2, 2), (3, 3), (1, 2), (2, 3), (3, 1)}.
Se trata de uma relação total mas não é transitiva pois 1R2 e 2R3
mas 1 não é em relação com 3.
(5) Considere a relação R sobre Z dada por aRb se e somente se a − b
é um múltiplo de 3. Mostre que R é uma relação de equivalência.
Quantas classes de equivalência tem?
R é reflexiva pois se a ∈ Z então a − a = 0 é um múltiplo de 3.
R é simétrica pois se a−b é um múltiplo de 3 então b−a = −(a−b)
também é um múltiplo de 3. R é transitiva pois se a − b e b − c são
múltiplos de 3 então existem inteiros r, s com a−b = 3r e b−c = 3s
assim a − c = (a − b) + (b − c) = 3r + 3s = 3(r + s) é um múltiplo
de 3. Se a ∈ Z então tem três possibilidades: a é um múltiplo de
3, a − 1 é um múltiplo de 3 ou a − 2 é um múltiplo de 3. Logo
aR0, aR1 ou aR2. Isso mostra que Z/R = {[0]R , [1]R , [2]R }. Assim
existem exatamente três classes de equivalência.
(6) Seja R a relação Rf sobre o conjunto A = {−2, 0, 1, 2, −4} onde
f : A → R é definida por f (x) = (x + 1)2 . Calcule A/R.
Temos f (−2) = f (0) = 1, f (1) = 4 e f (2) = f (−4) = 9, logo
A/R = {{−2, 0}, {1}, {−4, 2}} = {[0]R , [1]R , [2]R }.
(7) Para cada uma das relações seguintes (sobre R) diga se é reflexiva,
simétrica, transitiva, antissimétrica, total.
(a) xRy se e somente se xy ≥ 1. Não é reflexiva pois (1/2)(1/2) 6≥
1, é simétrica pois xy ≥ 1 se e somente se yx ≥ 1 (sendo
xy = yx), não é transitiva pois (1/2)R2, 2R(1/2) mas 1/2
não é em relação com 1/2, não é antissimétrica pois (1/2)R2
e 2R(1/2), não é total pois (1/2)(1/2) 6≥ 1.
(b) xRy se e somente se x2 ≥ y 2 . É reflexiva pois x2 ≥ x2 para
todo x, não é simétrica pois 22 ≥ 12 mas 12 6≥ 22 , é transitiva
pois se x2 ≥ y 2 e y 2 ≥ z 2 então x2 ≥ z 2 , não é antissimétrica
pois 12 ≥ (−1)2 , (−1)2 ≥ 12 mas 1 6= −1, é total pois se
x, y ∈ R então x2 ≥ y 2 ou y 2 ≥ x2 .
(c) xRy√se √ √ √≥ 0. Não é reflexiva pois
e somente se cos(xy)
cos( π π) = −1 logo ( π, π) 6∈ R, é simétrica pois cos(xy) ≥
0 se e√somente se √ cos(yx)√≥ 0 (pois xy = yx), não é√ transitiva
pois πR0, 0R π mas π não é em relação com π, não é
antissimétrica pois √ e 0R1 (sendo cos(0) = 1 ≥ 0), não é
√ 1R0
total porque cos( π π) = −1.
(d) xRy se e somente se y ≥ 2x. Não é reflexiva pois 1 6≥ 2 · 1
logo 1 não é em relação com 1, não é simétrica pois 1R2 mas
2 não é em relação com 1, não é transitiva pois (−2)R(−3) e
(−3)R(−5) mas é falso que (−2)R(−5), não é antissimétrica
pois (−1)R(−2) e (−2)R(−1), não é total pois 1 não é em
relação com 1.
6. RELAÇÕES DE EQUIVALÊNCIA 25

(8) Seja R uma relação de equivalência sobre Y e seja f : X → Y uma


função. Mostre que a relação ∼ sobre X definida por “a ∼ b se e
somente se f (a)Rf (b)” é uma relação de equivalência sobre X.
Reflexividade. Precisamos mostrar que se a ∈ X então a ∼ a,
ou seja f (a)Rf (a). Mas isso é verdade pois R é reflexiva.
Simetria. Precisamos mostrar que se a, b ∈ X e a ∼ b então
b ∼ a, ou seja se f (a)Rf (b) então f (b)Rf (a), mas isso é verdade
pois R é simétrica.
Transitividade. Precisamos mostrar que se a, b, c ∈ X e a ∼
b e b ∼ c então a ∼ c, ou seja se f (a)Rf (b) e f (b)Rf (c) então
f (a)Rf (c), mas isso é verdade pois R é transitiva.
(9) Seja R uma relação de equivalência sobre o conjunto A. Mostre que
A é a união das classes de equivalência (ou seja para todo a ∈ A
existe uma classe de equivalência que contem a) e que classes de
equivalência distintas têm interseção vazia (ou seja se a, b ∈ A são
tais que [a]R 6= [b]R então [a]R ∩ [b]R = ∅). A gente fala que as
classes de equivalência formam uma “partição” de A.
Se a ∈ A é claro que a ∈ [a]R pois aRa (sendo R reflexiva),
logo A é união das classes de equivalência. Agora sejam [a]R 6= [b]R
e vamos mostrar que [a]R ∩ [b]R = ∅. Se por contradição existe
x ∈ [a]R ∩ [b]R então aRx e bRx, daı́ xRb sendo R simétrica, logo
aRx e xRb implicam aRb ou seja [a]R = [b]R , contradição.
Segue uma demonstração do fato que aRb se e somente se [a]R =
[b]R . Primeira implicação. Se aRb então bRa sendo R simétrica logo
para mostrar [a]R = [b]R basta mostrar a inclusão [a]R ⊆ [b]R . Seja
então x ∈ [a]R , daı́ aRx, logo xRa sendo R simétrica, agora xRa
e aRb implicam xRb por transitividade logo bRx por simetria, daı́
x ∈ [b]R . Segunda implicação. Se [a]R = [b]R então b ∈ [a]R logo
aRb.
(10) Mostre que toda função é uma composição de uma função sobre-
jetiva com uma função injetiva (β ◦ α onde α é sobrejetiva e β é
injetiva).
Seja f : X → Y uma função e considere α : X → f (X) e
β : f (X) → Y definidas por α(x) := f (x) e β(y) := y. Daı́ é claro
que α é sobrejetiva, β é injetiva e β(α(x)) = β(f (x)) = f (x) logo
β ◦ α = f.

6. Relações de equivalência
Seja E uma relação sobre o conjunto X. E é dita “equivalência” (ou
“relação de equivalência”) se ela é reflexiva, simétrica e transitiva. Nesse caso
dois elementos em relação são ditos “equivalentes” e dado x ∈ X a “classe
de equivalência” de x via E é o conjunto [x]E := {a ∈ X : xEa}.
Proposição. Seja E uma equivalência sobre X. Se a, b ∈ X então
aEb se e somente se [a]E = [b]E . Além disso, as classes de equivalência
26 1. CONJUNTOS
S
formam uma partição de X, ou seja x∈X [x]E = X e se [a]E 6= [b]E então
[a]E ∩ [b]E = ∅.
Demonstração. Sejam a, b ∈ X. Mostraremos que se aEb então
[a]E = [b]E . Suponha então aEb, e vamos mostrar as duas inclusões. Pri-
meira inclusão. Se x ∈ [a]E então aEx logo xEa sendo E simétrica, por
outro lado aEb por hipótese logo xEb sendo E transitiva, daı́ bEx sendo E
simétrica logo x ∈ [b]E . Segunda inclusão. Se x ∈ [b]E então bEx então lem-
brando da hipótese aEb deduzimos aEx sendo E transitiva, logo x ∈ [a]E .
Mostraremos que se [a]E = [b]E então aEb. Suponha então [a]E = [b]E .
Como E é reflexiva, bEb logo b ∈ [b]E , por outro lado [a]E = [b]E , daı́
b ∈ [a]E logo aEb por S definição de classe de equivalência.
Mostraremos que x∈X [x]E = X, ou seja que todo elemento pertence a
uma das classes de equivalência. Isso é fácil: se x ∈ X temos xEx pois E é
reflexiva logo x ∈ [x]E .
Mostraremos que se [a]E 6= [b]E então [a]E ∩ [b]E = ∅. Suponha então
[a]E 6= [b]E e por contradição [a]E ∩ [b]E 6= ∅, seja então x ∈ [a]E ∩ [b]E .
Temos aEx e bEx, logo xEb por simetria, daı́ aEb por transitividade, logo
[a]E = [b]E pelo item acima, o que contradiz a hipótese [a]E 6= [b]E . 

Lembre-se que se f : X → Y é uma qualquer função então a relação Rf


sobre X definida por aRf b se e somente se f (a) = f (b) é uma relação de
equivalência (a relação de equivalência induzida pela f ).

Seja E uma relação de equivalência sobre o conjunto X. Existe uma


função canônica, chamada de “projeção canônica”, definida por
πE : X → X/E, πE (x) := [x]E .
É claro que E = RπE (pois, como provado acima, aEb se e somente se
[a]E = [b]E , ou seja πE (a) = πE (b)). Isso mostra que toda relação de
equivalência tem a forma Rf para alguma função f (especificamente, toda
relação de equivalência é induzida - no sentido acima - pela sua projeção
canônica) A projeção πE é uma função sobrejetiva (pois se [a]E ∈ X/E
então πE (a) = [a]E ) que na verdade é o arquetipo de todas as funções
sobrejetivas. Mais precisamente,
Teorema (Teorema de isomorfismo: representantes canônicos). Se
f : X → Y é uma função sobrejetiva então a função τ : X/Rf → Y definida
por τ ([a]Rf ) := f (a) é bem definida, bijetiva e f = τ ◦ πRf .
Demonstração. τ é bem definida pois se [a]Rf = [b]Rf então aRf b
ou seja f (a) = f (b), logo τ ([a]Rf ) = τ ([b]Rf ). É sobrejetiva pois se y ∈ Y
então dado x ∈ X com f (x) = y (que existe pois f é sobrejetiva) temos
τ ([x]Rf ) = f (x) = y, é injetiva pois se τ ([a]Rf ) = τ ([b]Rf ) então f (a) = f (b)
logo [a]Rf = [b]Rf . Isso mostra que τ é bijetiva. Além disso f = τ ◦ πRf pois
τ (πRf (a)) = τ ([a]Rf ) = f (a). 
6. RELAÇÕES DE EQUIVALÊNCIA 27

Observe que: uma função f : X → Y é “bem definida” se a = b im-


plica f (a) = f (b) (não confunda com “função injetiva”, que é definida pela
implicação contraria).

Seja E uma relação de equivalência. Quando escrevemos uma classe


como [x]E estamos escolhendo o representante x para escrever a classe. To-
dos os elementos de [x]E são representantes da classe [x]E (pois se y ∈ [x]E
então [y]E = [x]E ) mas as vezes é bom escolher representantes especiais
para simplificar o entendimento do conjunto quociente. Ou seja, é útil esco-
lher representantes canônicos. Escolhido um conjunto Y de representantes
canônicos, a função X → Y que associa a cada elemento x o representante
canônico da classe [x]E induz uma bijeção X/E → Y via o teorema de
isomorfismo.

Congruências modulares.

Agora examinaremos um exemplo muito importante de relação de equi-


valência. Seja X = Z o conjunto dos números inteiros. Se a, b ∈ Z digamos
que a “divide” b se existe c ∈ Z tal que ac = b. Assim por exemplo 3 divide
6 (pois 6 = 3 · 2), −14 divide 42 (pois 42 = (−14) · (−3)) e 1429 divide 0
(pois 0 = 1429 · 0). Seja n um inteiro positivo. Defina a relação ≡n sobre
Z (ou simplesmente ≡ se n for subentendido) por a ≡n b se e somente se n
divide a − b. Se a ≡n b digamos que a e b são “congruentes módulo n”. Se
trata de uma relação de equivalência:
(1) Reflexividade. Se a ∈ Z então n divide a − a = 0 pois 0 = 0 · n.
(2) Simetria. Se n divide a − b então existe d inteiro com a − b = nd
logo b − a = −(a − b) = −nd = n(−d) daı́ n divide b − a.
(3) Transitividade. Se n divide a − b e n divide b − c então escrevendo
a − b = ns e b − c = nt com s, t inteiros obtemos a − c = (a − b) +
(b − c) = ns + nt = n(s + t). Logo n divide a − c.

Proposição (Divisão com resto). Sejam m, d inteiros, com d 6= 0.


Existem únicos inteiros q, r com 0 ≤ r < |d| tais que m = qd + r.

Demonstração. Seja A o conjunto {m − qd : q ∈ Z}. Seja r o


menor inteiro não negativo pertencente a A (tal r existe pois existem inteiros
não negativos pertencentes a A, de fato escolhendo q = −|m|d obtemos
m + |m|d2 ≥ 0). Escreva r = m − qd. Observe que 0 ≤ r < |d|, de fato
r ≥ 0 por definição e se fosse r ≥ |d| então 0 ≤ r − |d| < r e r − |d| ∈ A (de
fato r − |d| = m − qd − |d| = m − (q ± 1)d) e isso contradiz a minimalidade
de r. Precisamos mostrar a unicidade de q e r. Se r0 e q 0 são inteiros com
0 ≤ r0 < |d| e m = q 0 d + r0 então qd + r = m = q 0 d + r0 logo d(q − q 0 ) = r0 − r,
mas −|d| < r0 − r < |d| (pois 0 ≤ r < |d| e 0 ≤ r0 < |d|), por outro lado d
divide r0 − r logo r0 = r. Daı́ qd + r = q 0 d + r logo qd = q 0 d e dividindo por
d obtemos q = q 0 . 
28 1. CONJUNTOS

O inteiro q é dito quociênte da divisão, o inteiro r é dito resto da divisão.


Por exemplo a divisão de 171 por 12 é 171 = 14 · 12 + 3, a divisão de 34
por −5 é 34 = (−6) · (−5) + 4, a divisão de −34 por 5 é −34 = (−7) · 5 + 1.
Usaremos a divisão com resto para estudar o quociente Z/ ≡n , que será
denotado também por Z/nZ.

Proposição. Z/nZ = Z/ ≡n = {[0]≡n , [1]≡n , [2]≡n , . . . , [n − 1]≡n }.

Demonstração. Precisamos mostrar que se m é um inteiro qualquer


então é equivalente a um inteiro em {0, 1, . . . , n − 1} e que dois inteiros
quaisquer em {0, 1, . . . , n − 1} não são equivalentes.
Seja m um inteiro qualquer. Efetuando a divisão com resto por n obte-
mos inteiros q, r com 0 ≤ r < n tais que m = nq + r logo n divide m − r,
daı́ m ≡n r. Assim [m]≡n = [r]≡n e r ∈ {0, 1, . . . , n − 1}.
Sejam a, b ∈ {0, 1, . . . , n − 1} equivalentes. Então n divide a − b e −n <
a − b < n logo a = b. 

Exemplo: todo inteiro é par ou impar (isso determina uma partição de


Z !). Se a é um inteiro par então a ≡2 0, se a é um inteiro impar então
a ≡2 1. Daı́ Z/2Z = {[0]≡2 , [1]≡2 }.

Resumindo, os representantes canônicos de ≡n são os restos da divisão


por n, ou seja definido Y = {0, 1, 2, . . . , n − 1} a função Z → Y que associa
a todo m ∈ Z o resto da divisão de m por n induz (pelo teorema de isomor-
fismo) uma bijeção Z/ ≡n → Y . Por isso, as classes de equivalência de ≡n
são chamadas de “classes resto”.

Exercı́cios.

(1) Defina a relação R sobre Z por aRb se e somente se a divide b. A


relação R é reflexiva? É simétrica? É transitiva? É antissimétrica?
É total?
(2) Seja X o conjunto de todos os subconjuntos de {1, 2, 3} e defina a
relação R em X dada por ARB se e somente se A ⊆ B. Mostre
que R é reflexiva, antissimétrica e transitiva. R é total?
(3) Seja X o conjunto de todos os subconjuntos de {1, 2, 3} e defina a
relação E em X dada por AEB se e somente se existe uma função
bijetiva A → B. Mostre que E é uma relação de equivalência e
conte as classes de equivalência.
(4) Seja X o conjunto das retas do plano e E a relação seguinte: duas
retas são em relação se são paralelas. Mostre que E é uma relação
de equivalência (basta um desenho). Mostre que toda reta do plano
é equivalente a uma reta do tipo {(cos(θ)t, sin(θ)t) : t ∈ R} onde
θ ∈ (0, π]. Use o teorema de isomorfismo para identificar X/E com
o intervalo (0, π].
7. CONGRUÊNCIAS MODULARES 29

(5) Seja f : R → R dada por f (x) = cos(x). Descreva R/Rf e escolhe


representantes canônicos das classes de equivalência.
(6) Seja E uma relação de equivalência sobre o conjunto X. Mostre
que se E é total então E = X × X.
(7) Seja X o conjunto dos circulos contidos no plano. Defina a relação
E dada por “dois circulos são em relação se os raios deles tive-
rem o mesmo comprimento”. Mostre que E é uma equivalência e
identifique o conjunto quociênte com o intervalo (0, +∞) usando o
teorema de isomorfismo.
(8) Seja X = Z e defina a relação E sobre X por “xEy se e somente
se x divide y e y divide x”. Mostre que E é uma equivalência e
descreva as classes de equivalência.
(9) Seja N = {0, 1, 2, 3, . . .} o conjunto dos números naturais. Defina
a relação E sobre X = N × N por (a, b)E(c, d) se e somente se
a + d = b + c. Mostre que E é uma equivalência. Mostre que a
função X/E → Z definida por
f ([(a, b)]E ) := a − b
é bem definida e bijetiva.
(10) Seja X um conjunto, f : X → X uma função e
R = {(x, f (x)) : x ∈ X}
o grafico da função f . Observe que R é uma relação sobre X (de
fato R ⊆ X × X). Mostre que se R é uma relação de equivalência
então f (x) = x para todo x ∈ X.

7. Congruências modulares
Temos então o conjunto quociênte
Z/nZ = Z/ ≡n = {[0]≡n , [1]≡n , [2]≡n , . . . , [n − 1]≡n }.
O representante canônico da classe [m]≡n é o resto r da divisão de m por n.
Tal resto pertence a {0, 1, 2, . . . , n − 1}. No que segue usamos de preferência
a notação m para indicar [m]≡n .

Por exemplo, os restos da divisão por 3 são 0, 1 e 2 (ou seja todo inteiro
tem a forma 3k, 3k+1 ou 3k+2 para algum inteiro k). Logo Z/3Z = {0, 1, 2}.

O que queremos fazer agora é definir umas operações binarias no con-


junto quociênte que acabamos de construir.
Definição (Operação binária). Seja A um conjunto. Uma operação
binaria sobre A é uma função A × A → A, (a, b) 7→ a ∗ b. Tal operação é
dita
(1) Associativa se (a ∗ b) ∗ c = a ∗ (b ∗ c) para todo a, b, c ∈ Z.
(2) Comutativa se a ∗ b = b ∗ a para todo a, b ∈ A.
30 1. CONJUNTOS

(3) Unitária se existe e ∈ A (elemento neutro) com a propriedade que


a∗e = a = e∗a para todo a ∈ A. [Observe que se existir, o elemento
neutro é único: se e, e0 são elementos neutros então e = e ∗ e0 = e0 .]
(4) Simétrica se é unitária e para todo a ∈ A existe b ∈ A tal que
a ∗ b = e = b ∗ a.

Por exemplo
(1) A operação + em Z é associativa (pois (a + b) + c = a + (b + c) para
todo a, b, c ∈ Z), comutativa (pois a + b = b + a para todo a, b ∈ Z),
unitária (pois a + 0 = a = 0 + a para todo a ∈ A) e simetrica (pois
a + (−a) = 0 = (−a) + a para todo a ∈ A).
(2) A operação + em N é associativa (pois (a + b) + c = a + (b + c)
para todo a, b, c ∈ N), comutativa (pois a + b = b + a para todo
a, b ∈ N), unitária (pois a + 0 = a = 0 + a para todo a ∈ N), mas
não é simétrica pois não existe nenhum b ∈ N tal que b + 1 = 0.
(3) A operação · em Z é associativa (pois (ab)c = a(bc) para todo
a, b, c ∈ Z), comutativa (pois ab = ba para todo a, b ∈ Z), unitária
(pois a · 1 = a = 1 · a para todo a ∈ Z) mas não é simétrica (pois
por exemplo não existe b ∈ Z tal que 0 · b = 1). Pela mesma razão
· não é simétrica em nenhum dos conjuntos numericos N, Z, Q, R,
C. Por outro lado · é simétrica em R − {0}.
(4) A operação de subtração Z×Z → Z, (a, b) 7→ a−b não é associativa
pois 5 − (3 − 5) 6= (5 − 3) − 5, não é comutativa pois 3 − 5 6= 5 − 3,
não é unitária (não existe e ∈ Z tal que a − e = a = e − a pois
a − e = e − a é falso se a 6= e), não é simétrica pois não é unitária.
(5) A subtração não é uma operação de N porque 1 ∈ N, 2 ∈ N mas
1 − 2 = −1 6= N.
(6) Seja P o conjunto das partes de um qualquer conjunto X. A união
P × P → P , (A, B) 7→ A ∪ B é uma operação associativa (pois
(A ∪ B) ∪ C = A ∪ (B ∪ C), comutativa (pois A ∪ B = B ∪ A),
unitária (pois A ∪ ∅ = A = ∅ ∪ A) e não simétrica (pois se A 6= ∅
não existe nenhum B tal que A ∪ B = ∅).
(7) Seja P o conjunto das partes de um qualquer conjunto X. A in-
terseção P × P → P , (A, B) 7→ A ∩ B é uma operação associativa
(pois (A ∩ B) ∩ C = A ∩ (B ∩ C), comutativa (pois A ∩ B = B ∩ A),
unitária (pois A ∩ X = A) e não simétrica (pois se A 6= X não
existe nenhum B tal que A ∩ B = X).
Podemos definir duas operações interessantes em Z/nZ.
(1) Soma de classes. Defina

a + b := a + b.

Se trata de uma operação bem definida. Para mostrar isso preci-


samos mostrar que se a = x e b = y então a + b = x + y, ou seja
que se n divide a − x e b − y então n divide a + b − (x + y). Mas
7. CONGRUÊNCIAS MODULARES 31

isso é claro pois a + b − (x + y) = (a − x) + (b − y). As proprie-


dades dessa operação são induzidas pelas mesmas propriedades de
soma em Z. Mais especificamente, a operação + é associativa pois
(a + b) + c = a + b + c = (a + b) + c = a + (b + c) = a + b + c =
a + (b + c), é comutativa pois a + b = a + b = b + a = b + a, é
unitária pois a + 0 = a + 0 = a e 0 + a = 0 + a = a, é simétrica
pois a + −a = a − a = 0 e −a + a = −a + a = 0.
(2) Produto de classes. Defina
a · b := a · b.
Se trata de uma operação bem definida. Para mostrar isso precisa-
mos mostrar que se a = x e b = y então ab = xy, ou seja que se n
divide a − x e b − y então n divide ab − xy. Mas isso é claro pois
ab − xy = (a − x)b + (b − y)x. As propriedades dessa operação são
induzidas pelas mesmas propriedades de soma em Z. Mais especifi-
camente, a operação + é associativa pois (a·b)·c = a · b·c = (ab)c =
a(bc) = a · bc = a · (b · c), é comutativa pois a · b = ab = ba = b · a,
é unitária pois a · 1 = a · 1 = a e 1 · a = 1 · a = a, não é simétrica
se n > 1 pois não existe nenhum inteiro m tal que m0 = 1 a menos
que n = 1. Observe que Z/1Z = {0}.
Daı́, usando os representantes canônicos, temos por exemplo
(1) em Z/2Z temos 0 · 1 = 0 e 1 · 1 = 1. Em outras palavras, o produto
de um par com um impar é par, e o produto de dois impares é
impar.
(2) Se n = 5, 12 + −34 = 12 − 34 = −22 e também 12 = 2, −34 = 1 e
2 + 1 = 3, de fato −22 = 3 pois 5 divide −22 − 3 = −25.
(3) Se n = 8, 13 · 41 = 13 · 41 = 533 e também sendo 13 = 5, 41 = 1
temos 5 · 1 = 5, de fato 533 = 5 sendo 533 − 5 = 528 um múltiplo
de 8: de fato 528 = 8 · 66.
(4) O resto da divisão de 313 por 7 é 3, de fato 313 = 3 · (34 )3 ≡7 3 · 43 =
12 · 16 ≡7 5 · 2 = 10 ≡7 3.
Por exemplo podemos ter equações também: encontre todos os x ∈
Z/7Z tais que
3 · x = 5.
A ideia é achar o “inverso” de 3, ou seja um m tal que 3 · m = 1. De fato
usando esse m multiplicando os dois membros da equação por m obtemos
m · 3 · x = m · 5 ou seja x = 5m, logo 5m é a (única!) solução da equação.
Para poder multiplicar os dois membro da equação por m. Examinando os
múltiplo de 3 (3 · 1 = 3, 3 · 2 = 6, 3 · 3 = 9, 3 · 4 = 12, 3 · 5 = 15) notamos que
3 · 5 = 15 ≡7 1 logo 3 é o inverso que estamos procurando, daı́ multiplicando
os dois lados da equação por 3 obtemos 5 · 3 · x = 5 · 5 ou seja x = 25 = 4.
A solução da equação é x = 4.
32 1. CONJUNTOS

Podemos ter um caso mais complicado: 8x = 4 em Z/14Z. Aqui antes


de procurar o inverso temos que simplificar o problema. Existe um inteiro
d tal que 14d = 8x − 4 se e somente se 7d = 4x − 2 ou seja a equação
dada é equivalente a 4x ≡7 2. A procura do inverso fornece 4 · 2 ≡7 1 logo
multiplicando por 2 obtemos x ≡7 4.

Exercı́cios.
(1) Encontre o resto da divisão de m por n onde (1) m = 100, n = 12,
5
(2) m = 100100 , n = 12, (3) m = 414 , n = 7, (4) m = 55 , n = 13.
(2) Resolva as equações 5x ≡11 4, 9x ≡25 37, 112x ≡9 852.
(3) Resolva as equações 10x ≡22 8, 40x ≡15 465, 210 x ≡12 100, 6x ≡9
11.
(4) Defina a relação ∼ em N × N dada por (a, b) ∼ (c, d) se e somente
se a + d = b + c. Se trata de uma equivalência (cf. a lista anterior).
Mostre que as operações binárias
[(a, b)] + [(c, d)] := [(a + c, b + d)]
[(a, b)]∼ · [(c, d)]∼ := [(ac + bd, bc + ad)]
são bem definidas e que se f : N×N/ ∼→ Z é a função f ([(a, b)]∼ ) :=
a − b (bem definida pela lista anterior) então f (x + y) = f (x) + f (y)
e f (x · y) = f (x)f (y) para todo x, y ∈ N × N/ ∼ (onde + e · em Z
são as operações usuais). Deduza que + em N × N/ ∼ é associativa,
comutativa, unitária e simétrica, e que · em N × N/ ∼ é associativa,
comutativa e unitária.
(5) Seja f : A → B uma bijeção e seja ∗ uma operação binária de A.
A seguinte é uma operação binária de B:
x ◦ y := f (f −1 (x) ∗ f −1 (y)).
Mostre que se ∗ tem uma das propriedades estudadas (associativa,
comutativa, unitária, simétrica) então ◦ tem a mesma propriedade.
Mostre que se a, b ∈ A então f (a ∗ b) = f (a) ◦ f (b).
(6) Seja P o conjunto das partes de um qualquer conjunto X. Mostre
que A4B := (A−B)∪(B−A) (diferença simétrica) é uma operação
associativa, comutativa, unitária e simétrica.
(7) Lembre-se que Y X é o conjunto de todas as funções X → Y . Sejam
A e B dois conjuntos. Seja U = (A × {1}) ∪ (B × {2}). Mostre que
a função ϕ : C A × C B → C U dada pela posição

f (x) se y = 1
ϕ(f, g) : U → C, ϕ(f, g)((x, y)) :=
g(x) se y = 2
é bijetiva.
(8) Lembre-se que P (X) é o conjunto das partes de X, ou seja o con-
junto de todos os subconjuntos de X. Seja f : X → Y uma função
e defina as funções
f ∗ : P (X) → P (Y ), f ∗ (A) := f (A) = {f (a) : a ∈ A},
8. INVERSOS MODULARES 33

f∗ : P (Y ) → P (X), f∗ (B) := f −1 (B) = {a ∈ X : f (a) ∈ B}.

Mostre que:
(a) f é injetiva se e somente se f ∗ é injetiva.
(b) f é sobrejetiva se e somente se f ∗ é sobrejetiva.
(c) f é bijetiva se e somente se f ∗ é bijetiva.
(d) Se f é injetiva então f∗ é sobrejetiva. Vale o vice-versa?
(e) Se f é sobrejetiva então f∗ é injetiva. Vale o vice-versa?
(f) Se f é bijetiva então f∗ é bijetiva. Vale o vice-versa?

8. Inversos modulares
Dados dois inteiros n, m, é possı́vel considerar o maior divisor comum
M DC(n, m), se trata do maior inteiro positivo d que divide n e m. Por
exemplo M DC(15, 12) = 3, M DC(36, −60) = 12.

Identidade de Bezout. Se n, m ∈ Z e d = M DC(n, m) então existem


x, y ∈ Z tais que ax + by = d.

Demonstração. Seja A = {nx + my : x, y ∈ Z}. Para concluir basta


mostrar que d ∈ A. Mostraremos que o menor inteiro positivo pertencente
a A é d. Seja então h = nx0 + my0 o menor inteiro positivo pertencente a
A (onde x0 , y0 ∈ Z). Para concluir basta mostrar que h = d (porque daı́
d ∈ A). Efetuando a divisão com resto de n por h obtemos n = qh + r =
q(nx0 + my0 ) + r com q, r ∈ Z e 0 ≤ r < d. Daı́

r = n − qnx0 − qmy0 = n(1 − qx0 ) + m(−qy0 ) ∈ A

logo r = 0 por minimalidade de h (sendo r ∈ A e 0 ≤ r < h), isso implica


que n = qh logo h divide n. O mesmo argumento aplicado a m mostra
que h divide m. Como h divide n e m, h divide o maior divisor comum
M DC(n, m) = d. Em particular sendo h e d positivos obtemos h ≤ d. Por
outro lado d divide n e m logo divide h = nx0 + my0 e sendo h e d positivos,
d ≤ h. As duas desigualdades h ≤ d e d ≤ h implicam que d = h. 

Dados n, m inteiros positivos como encontrar inteiros x, y tais que nx +


my = d = M DC(n, m)? Para fazer isso aplicaremos o “algoritmo de Eucli-
des”, ou seja o algoritmo seguinte.
Dados inteiros n, m ∈ Z queremos encontrar inteiros x, y tais que nx +
my = M DC(n, m). Para fazer isso construimos uma tabela cujas primeiras
duas linhas são
n m
1 0 n
0 1 m
34 1. CONJUNTOS

Adicionamos linhas a essa tabela seguindo o processo seguinte.


n m
1 0 n
0 1 m
.. .. ..
. . .
a1 b1 c1
a2 b2 c2
a3 b3 c3
As linhas têm que ser lidas da maneira seguinte: ai n + bi m = ci para todo
i. Se a1 , a2 , b1 , b2 , c1 , c2 são dados, a3 , b3 , c3 são determinados da maneira
seguinte. Se faz a divisão com resto entre c1 e c2 obtendo c1 = c2 q + r, com
q, r ∈ Z e 0 ≤ r < c2 . Escolha a3 = a1 − qa2 , b3 = b1 − qb2 e c3 = r. Observe
que isso é coerente pois de fato
a3 n + b3 m = (a1 − qa2 )n + (b1 − qb2 )m
= (a1 n + b1 m) − q(a2 n + b2 m)
= c1 − qc2 = c3 .
O algoritmo termina quando se encontra um resto igual a zero, e o resto
anterior será igual a M DC(n, m). O algoritmo deve terminar pois os ci são
não negativos e c1 > c2 > c3 > . . ..

Por exemplo, encontramos x, y ∈ Z tais que 2013x+367y = M DC(2013, 367).


2013 367
1 0 2013
0 1 367
1 −5 178
−2 11 11
33 −181 2
−167 916 1
O algoritmo termina pois a divisão de 2 por 1 tem resto zero. Os quociêntes
são 5, 2, 16 e 5. Obtemos então que M DC(2013, 367) = 1 (em outras
palavras, 2013 e 367 são coprimos) e −167 · 2013 + 916 · 367 = 1.
Definição (Inverso modular). Sejam m um inteiro e n um inteiro po-
sitivo. O “inverso modular” de m ∈ Z/nZ (ou “inverso de m módulo n”) é
uma classe y ∈ Z/nZ tal que m · y = 1.
Observe que reduzindo a igualdade −167 · 2013 + 916 · 367 = 1 módulo
2013 e módulo 367 obtemos que −167 · 2013 ≡ 1 mod 367 e 916 · 367 ≡ 1
mod 2013. Em outras palavras o inverso de 2013 módulo 367 é −167 = 200
e o inverso de 367 módulo 2013 é 916.
8. INVERSOS MODULARES 35

Mais um exemplo: encontramos x, y ∈ Z tais que 2317x + 392y =


M DC(2013, 367).
2317 392
1 0 2317
0 1 392
1 −5 357
−1 6 35
11 −65 7
O algoritmo termina aqui pois a divisão de 35 por 7 tem resto zero. Os
quociêntes são 5, 1, 10 e 5. Obtemos então que M DC(2317, 392) = 7 e
11 · 2317 − 65 · 392 = 7. Logo neste caso não existem inversos modulares de
2317 módulo 392 e de 392 módulo 2317 (toda combinação 2317x + 392y é
divisı́vel por 7).

Lembre-se que dois inteiros n, m são chamados de “coprimos” quando


M DC(n, m) = 1.
Proposição. Seja m um inteiro e n um inteiro positivo. Existe o in-
verso modular de m módulo n se e somente se n e m são coprimos.
Demonstração. A menos de substituir m com o representante canônico
de m (ou seja o único inteiro em {0, 1, 2, . . . , n − 1} congruente a m módulo
n) podemos supor m positivo. Precisamos mostrar as duas implicações.
(⇒). Suponha que exista o inverso modular de m módulo n, seja ele y.
Daı́ m · y = 1, logo n divide my − 1, digamos my − 1 = nz para algum inteiro
z. Segue que 1 = my − nz. Seja d o maior divisor comum entre n e m, aı́ d
divide my − nz = 1 logo d = 1. Isso mostra que n e m são coprimos.
(⇐). Suponha que n e m são coprimos, ou seja M DC(n, m) = 1. Pelo
algoritmo de Euclide existem x, y inteiros tais que nx+my = 1, daı́ reduzindo
módulo n obtemos m · y = 1. 
Logo, no conjunto quociênte Z/nZ os elementos invertı́veis são exata-
mente os elementos m (com m ∈ {0, 1, . . . , n − 1}) tais que m e n são
coprimos. Por exemplo no conjunto quociente
Z/10Z = {0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9}
os elementos que admitem inverso são 1, 3, 7, 9. De fato 1, 3, 7, 9 são os
únicos inteiros em {0, 1, 2, . . . , 9} coprimos com 10. Por exemplo se p é
um número primo então todos os elementos de Z/pZ diferentes de zero são
invertı́veis. De fato como p é primo, p é coprimo com 1, 2, . . ., p − 1.
De fato, veremos que Z/pZ quando p é primo é um exemplo de “corpo”
(anel comutativo em que todo elemento não nulo admite inverso). Mais
especificamente Z/pZ é um corpo finito. Por exemplo Q, R, C são corpos
infinitos.

Exercı́cios.
36 1. CONJUNTOS

(1) Encontre inteiros x e y tais que 3234x+2123y = M DC(3234, 2123).


(2) Resolva as equações
41x ≡ 3 mod 412, 33x ≡ 1 mod 444, 999x ≡ −2 mod 1021.
(3) Resolva as equações
80x ≡ 6 mod 2002,
585x ≡ 90 mod 999,
2004x ≡ 4 mod 2464.
(4) Mostre que se a, b, n são inteiros positivos, d = M DC(a, n) divide b
e os inteiros a/d, n/d são coprimos então a equação ax ≡ b mod n
tem exatamente d soluções.

9. Resolução listas de exercı́cios


9.1. Seção “Relações de equivalência”.
(1) Defina a relação R sobre Z por aRb se e somente se a divide b. A
relação R é reflexiva? É simétrica? É transitiva? É antissimétrica?
É total?

R é reflexiva pois todo inteiro a divide a sendo a = a · 1. Não


é simétrica pois por exemplo 2 divide 6 mas 6 não divide 2. É
transitiva pois se a divide b e b divide c então podemos escrever b =
ax e c = by daı́ c = by = axy logo a divide c. Não é antissimétrica
pois por exemplo −2 divide 2 (sendo 2 = (−2) · (−1)) e 2 divide −2
(sendo −2 = 2 · (−1)). Não é total pois por exemplo 3 não divide
5 e 5 não divide 3.

(2) Seja X o conjunto de todos os subconjuntos de {1, 2, 3} e defina a


relação R em X dada por ARB se e somente se A ⊆ B. Mostre
que R é reflexiva, antissimétrica e transitiva. R é total?

R é reflexiva pois A ⊆ A para todo A (se a ∈ A então a ∈ A). É


antissimétrica pois se A ⊆ B e B ⊆ A então A = B (por definição
de igualdade entre conjuntos). É transitiva pois se A ⊆ B e B ⊆ C
então A ⊆ C (se a ∈ A então a ∈ B sendo A ⊆ B, logo a ∈ C
sendo B ⊆ C). R não é total pois por exemplo {1, 2} 6⊆ {2, 3} e
{2, 3} 6⊆ {1, 2}.

(3) Seja X o conjunto de todos os subconjuntos de {1, 2, 3} e defina a


relação E em X dada por AEB se e somente se existe uma função
bijetiva A → B. Mostre que E é uma relação de equivalência e
conte as classes de equivalência.
9. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 37

Para mostrar que E é uma equivalência precisamos mostrar que


é reflexiva, simétrica e transitiva.

E é reflexiva. De fato se A ∈ X então a identidade A → A (a


função definida por f (a) := a) é bijetiva.

E é simétrica. De fato se f : A → B é uma função bijetiva


então a função inversa f −1 : B → A (vista nas listas anteriores)
é tal que f −1 (f (a)) = a para todo a ∈ A e f (f −1 (b)) = b para
todo b ∈ B logo é bijetiva (é injetiva pois se f −1 (b) = f −1 (b0 ) então
aplicando f aos dois lados obtemos b = b0 , é sobrejetiva pois se
a ∈ A então a = f −1 (f (a))).

E é transitiva. De fato se f : A → B e g : B → C são bijetivas


então g ◦ f : A → C (a composição) definida por (g ◦ f )(a) :=
g(f (a)) é bijetiva, de fato é injetiva pois se g(f (a)) = g(f (a0 ))
então f (a) = f (a0 ) sendo g injetiva, logo a = a0 sendo f injetiva;
é sobrejetiva pois se c ∈ C existe b ∈ B tal que g(b) = c sendo g
sobrejetiva, e existe a ∈ A tal que f (a) = b sendo f sobrejetiva,
logo g(f (a)) = g(b) = c.

Como já observado se A e B são conjuntos finitos para que


exista uma função bijetiva A → B é necessario e suficiente que A
e B contenham a mesma quantidade de elementos (de fato, como
visto nas listas anteriores, existe uma função injetiva A → B se e
somente se |A| ≤ |B| e existe uma função sobrejetiva A → B se e
somente se |A| ≥ |B|, logo existe uma função bijetiva A → B se e
somente se |A| = |B|). Isso mostra que as classes de equivalência
de E são {∅}, {{1}, {2}, {3}}, {{1, 2}, {1, 3}, {2, 3}}, {{1, 2, 3}}.

(4) Seja X o conjunto das retas do plano e E a relação seguinte: duas


retas são em relação se são paralelas. Mostre que E é uma relação
de equivalência (basta um desenho). Mostre que toda reta do plano
é equivalente a uma reta do tipo {(cos(θ)t, sin(θ)t) : t ∈ R} onde
θ ∈ (0, π]. Use o teorema de isomorfismo para identificar X/E com
o intervalo (0, π].

Cada reta é paralela a si mesma, logo E é reflexiva. Se a reta r é


paralela a s então s é paralela a r logo E é simétrica. Se r é paralela
a s e s é paralela a t então r é paralela a t logo E é transitiva. (Para
isso basta um desenho). É claro que toda reta do plano é paralela a
uma reta que passa pela origem (por translação), ou seja uma reta
do tipo rθ = {(cos(θ)t, sin(θ)t) : t ∈ R} onde θ ∈ [0, 2π) (o angulo
que determina a pendência da reta). Por outro lado é claro que
rθ = rθ+π logo na verdade podemos nos restringir a θ ∈ [0, π). Por
38 1. CONJUNTOS

outro lado duas retas rθ1 , rθ2 com θ1 , θ2 ∈ [0, π) distintos não são
paralelas. Isso mostra que [0, π) é um conjunto de representantes
distintos das classes de equivalência (os que poderiamos escolher
como representantes canônicos). Dada uma reta r do plano (ou
seja r ∈ X) temos rErθ para um único (!) θ ∈ [0, π). Daı́ podemos
definir a função f : X → [0, π) definida por f (r) = θ onde rErθ .
Se trata de uma função sobrejetiva e E = Rf , daı́ pelo teorema de
isomorfismo τ : X/E → [0, π) definida por τ ([r]E ) := f (r) é uma
bijeção bem definida. Em outras palavras podemos “identificar”
X/E com [0, π).

(5) Seja f : R → R dada por f (x) = cos(x). Descreva R/Rf e escolhe


representantes canônicos das classes de equivalência.

Dois elementos a, b ∈ R são em relação se e somente se f (a) =


f (b), ou seja cos(a) = cos(b), logo a classe de equivalência de um
dado a ∈ R é
[a]Rf = {a + 2kπ : k ∈ Z} ∪ {−a + 2kπ : k ∈ Z}.
Segue que uma escolha de representantes canônicos é dada pelo
intervalo [0, π] (de fato cos restrito a [0, π] é injetivo).

(6) Seja E uma relação de equivalência sobre o conjunto X. Mostre


que se E é total então E = X × X.

A inclusão E ⊆ X × X é por definição de relação. Mostraremos


agora que X × X ⊆ E. Seja (a, b) ∈ X × X, queremos mostrar
que (a, b) ∈ E. Temos que aEb ou bEa sendo E total, no primeiro
caso (a, b) ∈ E, no segundo caso (b, a) ∈ E daı́ (a, b) ∈ E sendo E
simétrica.

(7) Seja X o conjunto dos circulos contidos no plano. Defina a relação


E dada por “dois circulos são em relação se os raios deles tive-
rem o mesmo comprimento”. Mostre que E é uma equivalência e
identifique o conjunto quociênte com o intervalo (0, +∞) usando o
teorema de isomorfismo.

E é uma equivalência pois E = Rf onde f : X → (0, ∞) é


definida por f (C) igual ao comprimento do raio do circulo C. Tal
função f é sobrejetiva (pois existem raios de todos os comprimen-
tos) logo o teorema de isomorfismo fornece uma bijeção (canônica)
X/E → (0, ∞). Em outras palavras uma escolha possı́vel dos repre-
sentantes canônicos é dada pelos circulos com centro (por exemplo)
na origem dos eixos e raios de comprimentos distintos.
9. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 39

(8) Seja X = Z e defina a relação E sobre X por “xEy se e somente


se x divide y e y divide x”. Mostre que E é uma equivalência e
descreva as classes de equivalência.

E é reflexiva pois todo inteiro x divide x sendo x = x · 1. É


simétrica pois se “x divide y e y divide x” então “y divide x e x
divide y”, é transitiva pois se xEy e yEz então por um lado x divide
y e y divide z logo x divide z, por outro lado z divide y e y divide
x logo z divide x. Agora queremos entender o conjunto quociente.
Se x ∈ Z então xEa se e somente se x divide a e a divide x, logo
existem inteiros s, t tais que a = xs e x = at, daı́ a = xs = ats logo
a(1 − ts) = 0. Se trata de uma igualdade entre inteiros. Se a 6= 0
então podemos dividir por a obtendo ts = 1. Mas os únicos inteiros
que dividem 1 são 1 e −1, logo t, s ∈ {1, −1}. Isso implica que
a ∈ {x, −x} e mostra que [x]E = {x, −x}. Logo todas as classes
contêm dois elementos exceto a classe de 0 sendo [0]E = {0}, e
podemos escolher como representante canonico o elemento positivo
de {x, −x} (se x 6= 0). Em outras palavras definindo f : Z → N por
f (x) := |x| (valor absoluto de x) então E = Rf e N é um conjunto
de representantes canônicos. (Lembre-se que N = {0, 1, 2, 3, . . .}).

(9) Seja N = {0, 1, 2, 3, . . .} o conjunto dos números naturais. Defina


a relação E sobre X = N × N por (a, b)E(c, d) se e somente se
a + d = b + c. Mostre que E é uma equivalência. Mostre que a
função f : X/E → Z definida por

f ([(a, b)]E ) := a − b

é bem definida e bijetiva.

E é reflexiva pois (a, b)E(a, b) sendo a + b = b + a. É simétrica


pois se (a, b)E(c, d) então a + d = b + c logo c + b = a + d daı́
(c, d)E(a, b). É transitiva pois se (a, b)E(c, d) e (c, d)E(e, f ) então
a + d = b + c e c + f = d + e daı́ a + f = (b + c − d) + (d + e −
c) = b + e. Logo E é uma equivalência. f é bem definida pois
se [(a, b)]E = [(x, y)]E então a + y = b + x logo a − b = x − y
daı́ f ([(a, b)]E ) = f ([(x, y)]E ). f é injetiva pois se f ([(a, b)]E ) =
f ([(x, y)]E ) então a − b = x − y logo a + y = b + x daı́ (a, b)E(x, y)
ou seja [(a, b)]E = [(x, y)]E . f é sobrejetiva pois se z ∈ Z então se
z ≥ 0, f ([(z, 0)]E ) = z, e se z < 0, f ([(0, −z)]E ) = z.

(10) Seja X um conjunto, f : X → X uma função e

R = {(x, f (x)) : x ∈ X}
40 1. CONJUNTOS

o grafico da função f . Observe que R é uma relação sobre X (de


fato R ⊆ X × X). Mostre que se R é uma relação de equivalência
então f (x) = x para todo x ∈ X.

Se R é uma equivalência então em particular é simétrica, logo


se x ∈ X então xRf (x) daı́ f (x)Rx, mas como R é transitiva segue
xRx ou seja (x, x) ∈ R daı́ f (x) = x.

9.2. Seção “Congruências modulares”.


(1) Encontre o resto da divisão de m por n onde (1) m = 100, n = 12,
5
(2) m = 100100 , n = 12, (3) m = 414 , n = 7, (4) m = 55 , n = 13.

A divisão de 100 por 12 é 100 = 12 · 8 + 4, o resto é 4. Para


calcular 100100 mod 12 aplicamos o produto de classes obtendo
100100 ≡12 4100 = 1650 ≡12 450 = 1625 ≡12 425
= 4 · 424 = 4 · 1612 ≡12 4 · 412 = 4 · 166 ≡12 4 · 46
= 4 · 163 ≡12 4 · 43 = 44 = 162 ≡12 42 = 16 ≡12 4.
Logo o resto da divisão de 100100 por 12 é 4. Segue o cálculo de
414 mod 7:
414 ≡7 167 ≡7 27 = 8 · 8 · 2 ≡7 1 · 1 · 2 = 2.
5
Logo o resto da divisão de 414 por 7 é 2. Segue o cálculo de 55
mod 13. Para simplificar o cálculo observe que
55 = 25 · 25 · 5 ≡13 (−1) · (−1) · 5 = 5.
No seguinte cálculo vamos então usar o fato que 55 ≡13 5.
5 4 4 3 3
55 = (55 )5 ≡13 55 = (55 )5 ≡13 55
2 2
= (55 )5 ≡13 55 = (55 )5 ≡13 55 ≡13 5.
5
Logo o resto da divisão de 55 por 13 é 5.

(2) Resolva as equações 5x ≡11 4, 9x ≡25 37, 112x ≡9 852.

Para resolver a primeira equaç ao procuramos o inverso de 5


módulo 11, olhando aos múltiplos de 5 vemos que 5 · 9 ≡ 1 mod 11
logo multiplicando os dois lados da equação por 9 obtemos 9·5·x ≡11
9 · 4 daı́ x ≡11 9 · 4 = 36 ≡11 3 é a única solução da equação.

Para resolver a segunda equação procuramos o inverso de 9


módulo 25, olhando os múltiplos de 9 vemos que 9 · 14 = 126 ≡ 1
mod 25 logo o inverso de 9 módulo 25 é 14, e multiplicando os dois
9. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 41

lados da equação por 14 obtemos 14 · 9 · x ≡25 14 · 37 ≡25 14 · 12 =


28 · 6 ≡25 3 · 6 = 18. Logo x ≡25 18 é a única solução da equação.

Para resolver a terceira equação primeiramente reduzimos os


coeficientes módulo 9, obtendo a equação equivalente 4x ≡9 6.
Como 4 · 7 = 28 ≡9 1 multiplicando os dois lado por 7 obtemos
7 · 4 · x ≡9 7 · 6 ≡9 6. Logo x ≡9 6 é a única solução da equação.

(3) Resolva as equações 10x ≡22 8, 40x ≡15 465, 210 x ≡12 100, 6x ≡9
11.

Para resolver a primeira equação primeiramente escrevamo-la


na forma seguinte: existe um inteiro s tal que 10x − 8 = 22s, daı́
dividindo por 2 obtemos 5x − 4 = 11s ou seja 5x ≡11 4. O inverso
de 5 módulo 11 é 9, logo multiplicando por 9 os dois lados obtemos
x ≡11 4 · 9 ≡11 3 daı́ as soluções da equação original são as classes
módulo 22 que são congruentes a 3 módulo 11, ou seja as duas
soluções da equação original são x ≡22 3 e x ≡22 3 + 11 = 14.

Para resolver a segunda equação primeiramente escrevamo-la


na forma seguinte: existe um inteiro s tal que 40x − 465 = 15s, daı́
dividindo por 5 obtemos 8x − 93 = 3s ou seja 8x ≡3 93. Para re-
solver essa equação podemos primeiramente reduzir os coeficientes
módulo 3 obtendo a equação equivalente 2x ≡3 0, daı́ multiplicando
os dois lados por 2 (que é o inverso de 2 módulo 3 pois 2 · 2 ≡3 1)
obtemos x ≡3 2 · 0 = 0. Segue que as soluções da equação original
são as classes módulo 15 que são congruentes a 0 módulo 3, ou seja
as cinco soluções da equação são x ≡15 0, x ≡15 3, x ≡15 6, x ≡15 9,
x ≡15 12.

Para resolver a terceira equação primeiramente escrevamo-la na


forma seguinte: existe um inteiro s tal que 210 x − 100 = 12s, daı́
dividindo por 4 obtemos 28 x − 25 = 3s ou seja 28 x ≡3 25. Para
resolver essa equação podemos primeiramente reduzir os coeficien-
tes módulo 3 (lembrando que 22 ≡ 1 mod 3) obtendo a equação
equivalente x ≡3 1, daı́ as soluções da equação original são as clas-
ses módulo 12 que são congruentes a 1 módulo 3, ou seja as qua-
tro soluções da equação original são x ≡12 1, x ≡12 1 + 3 = 4,
x ≡12 1 + 6 = 7, x ≡12 1 + 9 = 10.

Para resolver a quarta equação primeiramente escrevamo-la na


forma seguinte: existe um inteiro s tal que 6x−11 = 9s. Escrevendo
tal igualdade na forma 6x − 9s = 11 resulta claro que tal equação
não tem solução pois 3 divide 6x − 9s mas 3 não divide 11.
42 1. CONJUNTOS

(4) Defina a relação ∼ em N × N dada por (a, b) ∼ (c, d) se e somente


se a + d = b + c. Se trata de uma equivalência (cf. a lista anterior).
Mostre que as operações binárias
[(a, b)] + [(c, d)] := [(a + c, b + d)]
[(a, b)]∼ · [(c, d)]∼ := [(ac + bd, bc + ad)]
são bem definidas e que se f : N×N/ ∼→ Z é a função f ([(a, b)]∼ ) :=
a − b (bem definida pela lista anterior) então f (x + y) = f (x) + f (y)
e f (x · y) = f (x)f (y) para todo x, y ∈ N × N/ ∼ (onde + e · em Z
são as operações usuais).

Para mostrar que a operação de soma em N × N/ ∼ é bem


definida precisamos mostrar que se [(a, b)] = [(a0 , b0 )] e [(c, d)] =
[(c0 , d0 )] então [(a + c, b + d)] = [(a0 + c0 , b0 + d0 )], ou seja que se
a+b0 = b+a0 e c+d0 = d+c0 então (a+c)+(b0 +d0 ) = (b+d)+(a0 +c0 ).
Temos
(a + c) + (b0 + d0 ) = (a + b0 ) + (c + d0 )
= (b + a0 ) + (d + c0 )
= (b + d) + (a0 + c0 ).
Para mostrar que a operação de produto em N × N/ ∼ é bem
definida precisamos mostrar que se [(a, b)] = [(a0 , b0 )] e [(c, d)] =
[(c0 , d0 )] então [(ac + bd, bc + ad)] = [(a0 c0 + b0 d0 , b0 c0 + a0 d0 )], ou seja
que se a + b0 = b + a0 e c + d0 = d + c0 então ac + bd + b0 c0 + a0 d0 =
bc + ad + a0 c0 + b0 d0 . Equivalentemente, se trata de mostrar que
ac + bd − bc − ad = a0 c0 + b0 d0 − b0 c0 − a0 d0 . Temos
ac + bd − bc − ad = (a − b)c + (b − a)d = (a − b)(c − d)
= (a0 − b0 )(c0 − d0 ) = a0 c0 + b0 d0 − b0 c0 − a0 d0 .
Sejam x = [(a, b)], y = [(c, d)]. Então temos
f (x + y) = f ([(a, b)] + [(c, d)]) = f ([(a + c, b + d)])
= (a + c) − (b + d) = (a − b) + (c − d)
= f ([(a, b)]) + f ([(c, d)]) = f (x) + f (y).

f (x · y) = f ([(a, b)] · [(c, d)]) = f ([(ac + bd, bc + ad)])


= (ac + bd) − (bc + ad) = (a − b)(c − d)
= f ([(a, b)]) · f ([(c, d)]) = f (x) · f (y).

(5) Seja f : A → B uma bijeção e seja ∗ uma operação binária de A.


A seguinte é uma operação binária de B:
x ◦ y := f (f −1 (x) ∗ f −1 (y)).
9. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 43

Mostre que se ∗ tem uma das propriedades estudadas (associativa,


comutativa, unitária, simétrica) então ◦ tem a mesma propriedade.
Mostre que se a, b ∈ A então f (a ∗ b) = f (a) ◦ f (b).

Lembre-se que f −1 é a função inversa de f , ou seja a única


função f −1 : B → A tal que f −1 (f (a)) = a para todo a ∈ A e
f (f −1 (b)) = b para todo b ∈ B.
Se ∗ é associativa então ◦ também é pois
(x ◦ y) ◦ z = f (f −1 (x) ∗ f −1 (y)) ◦ z
= f (f −1 (f (f −1 (x) ∗ f −1 (y))) ∗ f −1 (z))
= f ((f −1 (x) ∗ f −1 (y)) ∗ f −1 (z))
= f (f −1 (x) ∗ (f −1 (y) ∗ f −1 (z)))
= f (f −1 (x) ∗ f −1 (f (f −1 (y) ∗ f −1 (z))))
= f (f −1 (x) ∗ f −1 (y ◦ z)) = x ◦ (y ◦ z).
Se ∗ é comutativa então ◦ também é pois
x ◦ y = f (f −1 (x) ∗ f −1 (y))
= f (f −1 (y) ∗ f −1 (x)) = y ◦ x.
Se ∗ é unitária existe e ∈ A (elemento neutro) tal que x ∗ e =
x = e ∗ x para todo x ∈ A, daı́ f (e) é o elemento neutro de ◦ pois
se x ∈ B então
x ◦ f (e) = f (f −1 (x) ∗ f −1 (f (e)))
= f (f −1 (x) ∗ e) = f (f −1 (x)) = x,

f (e) ◦ x = f (f −1 (f (e)) ∗ f −1 (x))


= f (e ∗ f −1 (x)) = f (f −1 (x)) = x.
Suponha ∗ simétrica. Para mostrar que ◦ é simétrica precisamos
mostrar que para todo x ∈ B existe y ∈ B tal que x ◦ y = f (e) =
y ◦ x (sendo f (e) o elemento neutro de B). Seja z ∈ A tal que
f −1 (x) ∗ z = e = z ∗ f −1 (x) (z existe pois ∗ é simétrica). Daı́
escolhendo y = f (z) temos
x ◦ y = f (f −1 (x) ∗ f −1 (y)) = f (f −1 (x) ∗ z) = f (e),

y ◦ x = f (f −1 (y) ∗ f −1 (x)) = f (z ∗ f −1 (x)) = f (e).


Mostraremos agora que f (a∗b) = f (a)◦f (b) para todo a, b ∈ A.
Temos
f (a) ◦ f (b) = f (f −1 (f (a)) ∗ f −1 (f (b))) = f (a ∗ b).
44 1. CONJUNTOS

(6) Seja P o conjunto das partes de um qualquer conjunto X. Mostre


que A4B := (A − B) ∪ (B − A) (diferençaa simétrica) é uma
operação associativa, comutativa, unitária e simétrica.

4 é uma operação binária de P . Observe que o complementar


de A4B é (A4B)c = (A ∩ B) ∪ (A ∪ B)c (isso pode ajudar a
intuição). O fato que 4 é comutativa é claro pois ∪ é comutativa.
4 é unitária pois A4∅ = A = ∅4A para todo A ∈ P (ou seja o
elemento neutro de 4 é ∅) e é simétrica pois A4A = ∅ para todo
A ∈ P (ou seja o inverso de A é A para todo A). 4 é associativa
porque para todo A, B, C ∈ P temos
(A4B)4C = A4(B4C).
Para mostrar essa igualdade precisamos mostrar as duas inclusões.
Mostraremos agora a inclusão (⊆).
Se x ∈ (A4B)4C tem dois casos:
• x ∈ (A4B)−C. Neste caso se x ∈ A−B então x ∈ A−(B4C),
se x ∈ B − A então x ∈ (B4C) − A.
• x ∈ C−(A4B). Neste caso se x 6∈ A∪B então x ∈ (B4C)−A,
se x ∈ A ∩ B então x ∈ A − (B4C).
Mostraremos agora a inclusão (⊇).
Se x ∈ A4(B4C) tem dois casos:
• x ∈ A−(B4C). Neste caso se x 6∈ B∪C então x ∈ (A4B)−C,
se x ∈ B ∩ C então x ∈ C − (A4B).
• x ∈ (B4C)−A. Neste caso se x ∈ B−C então x ∈ (A4B)−C,
se x ∈ C − B então x ∈ C − (A4B).

(7) Lembre-se que Y X é o conjunto de todas as funções X → Y . Sejam


A e B dois conjuntos. Seja U = (A × {1}) ∪ (B × {2}). Mostre que
a função ϕ : C A × C B → C U dada pela posição

f (x) se y = 1
ϕ(f, g) : U → C, ϕ(f, g)((x, y)) :=
g(x) se y = 2
é bijetiva.

Mostraremos agora que ϕ é injetiva. Suponha ϕ(f, g) = ϕ(h, k).


Queremos mostrar que (f, g) = (h, k), ou seja que f = h e g = k, ou
seja que f (x) = h(x) para todo x ∈ A e g(x) = k(x) para todo x ∈
B. Se x ∈ A temos f (x) = ϕ(f, g)((x, 1)) = ϕ(h, k)((x, 1)) = h(x),
isso mostra que f = h. Se x ∈ B temos g(x) = ϕ(f, g)((x, 2)) =
ϕ(h, k)((x, 2)) = k(x), isso mostra que g = k.
Mostraremos agora que ϕ é sobrejetiva. Seja w ∈ C U , ou seja
w é uma função U → C. Queremos encontrar (f, g) ∈ C A × C B
tais que ϕ(f, g) = w. Sejam f : A → C, g : B → C definidas
por f (x) := w((x, 1)), g(x) := w((x, 2)). Temos que se x ∈ A,
9. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 45

ϕ(f, g)((x, 1)) = f (x) = w((x, 1)) e se x ∈ B, ϕ(f, g)((x, 2)) =


g(x) = w((x, 2)). Isso mostra que ϕ(f, g) = w.

(8) Lembre-se que P (X) é o conjunto das partes de X, ou seja o con-


junto de todos os subconjuntos de X. Seja f : X → Y uma função
e defina as funções
f ∗ : P (X) → P (Y ), f ∗ (A) := f (A) = {f (a) : a ∈ A},
f∗ : P (Y ) → P (X), f∗ (B) := f −1 (B) = {a ∈ X : f (a) ∈ B}.
Mostre que:
(a) f é injetiva se e somente se f ∗ é injetiva.
(b) f é sobrejetiva se e somente se f ∗ é sobrejetiva.
(c) f é bijetiva se e somente se f ∗ é bijetiva.
(d) Se f é injetiva então f∗ é sobrejetiva. Vale o vice-versa?
(e) Se f é sobrejetiva então f∗ é injetiva. Vale o vice-versa?
(f) Se f é bijetiva então f∗ é bijetiva. Vale o vice-versa?

Item a.

Se f é injetiva então f ∗ é injetiva. Suponha f injetiva.


Queremos mostrar que f ∗ é injetiva. Sejam A, B ⊆ X tais que
f ∗ (A) = f ∗ (B), ou seja f (A) = f (B). Queremos mostrar que
A = B. Primeira inclusão. Se a ∈ A então f (a) ∈ f (A) = f (B)
logo existe b ∈ B tal que f (a) = f (b), daı́ a = b sendo f injetiva
logo a ∈ B. Segunda inclusão. Se b ∈ B então f (b) ∈ f (B) = f (A)
logo existe a ∈ A tal que f (b) = f (a), daı́ b = a sendo f injetiva
logo b ∈ A.
Se f ∗ é injetiva então f é injetiva. Suponha f ∗ injetiva.
Queremos mostrar que f é injetiva. Sejam x, y ∈ A e suponha
f (x) = f (y). Queremos mostrar que x = y. Sejam A = {x} ∈
P (X) e B = {y} ∈ P (X), temos
f ∗ (A) = f (A) = f ({x}) = {f (x)}
= {f (y)} = f ({y}) = f (B) = f ∗ (B)
logo A = B sendo f ∗ injetiva, daı́ {x} = {y} ou seja x = y.

Item b.

Se f é sobrejetiva então f ∗ é sobrejetiva. Suponha f


sobrejetiva. Queremos mostrar que f ∗ é sobrejetiva. Seja B ∈
P (Y ). Queremos encontrar A ∈ P (X) tal que f ∗ (A) = B, ou seja
f (A) = B. Seja A := f −1 (B) = {a ∈ A : f (a) ∈ B}. Mostraremos
que f (A) = B. Primeira inclusão. Seja a ∈ A, então f (a) ∈ B
por definição de A. Segunda inclusão. Seja b ∈ B. Queremos
mostrar que b ∈ f (A). Como f é sobrejetiva existe x ∈ A tal que
46 1. CONJUNTOS

f (x) = b, em particular f (x) ∈ B logo x ∈ f −1 (B) = A, logo


b = f (x) ∈ f (A).
Se f ∗ é sobrejetiva então f é sobrejetiva. Suponha f ∗
sobrejetiva. Queremos mostrar que f é sobrejetiva. Seja y ∈ Y .
Queremos encontrar x ∈ X tal que f (x) = y. Seja B := {y}. Como
f ∗ é sobrejetiva existe A ∈ P (X) tal que f ∗ (A) = B = {y} ou seja
f (A) = {y}. Em particular A 6= ∅ (pois f (∅) = ∅) logo existe
x ∈ A, daı́ f (x) ∈ {y} logo f (x) = y.

Item c.

f é bijetiva se e somente se f é injetiva e sobrejetiva, e pelos


itens acima isso acontece se e somente se f ∗ é injetiva e sobrejetiva,
ou seja f ∗ é bijetiva.

Item d.

Se f é injetiva então f∗ é sobrejetiva. Suponha f injetiva.


Queremos mostrar que f∗ é sobrejetiva. Seja A ∈ P (X). Queremos
encontrar B ∈ P (Y ) tal que f∗ (B) = A, ou seja f −1 (B) = A.
Seja B := f (A). Para concluir basta mostrar que f −1 (B) = A.
Primeira inclusão. Se x ∈ f −1 (B) então f (x) ∈ B = f (A) logo
existe a ∈ A tal que f (x) = f (a), daı́ sendo f injetiva x = a logo
x ∈ A. Segunda inclusão. Se x ∈ A então f (x) ∈ f (A) = B logo
x ∈ f −1 (B).
Se f∗ é sobrejetiva então f é injetiva. Suponha f∗ sobre-
jetiva. Queremos mostrar que f é injetiva. Sejam a, b ∈ X com
f (a) = f (b). Queremos mostrar que a = b. Como f∗ é sobrejetiva
existe C ∈ P (Y ) tal que {a} = f −1 (C), daı́ f (b) = f (a) ∈ C logo
b ∈ f −1 (C) = {a} e isso implica b = a.

Item e.

Se f é sobrejetiva então f∗ é injetiva. Suponha f sobreje-


tiva. Queremos mostrar que f∗ é injetiva. Sejam B, C ∈ P (Y ) com
f∗ (B) = f∗ (C). Queremos mostrar que B = C. Primeira inclusão.
Se b ∈ B então sendo f sobrejetiva existe x ∈ X tal que f (x) = b,
daı́ como b ∈ B temos x ∈ f −1 (B) = f∗ (B) = f∗ (C) = f −1 (C)
logo b = f (x) ∈ C. Segunda inclusão. Se c ∈ C então sendo f
sobrejetiva existe x ∈ X tal que f (x) = c, daı́ como c ∈ C temos
x ∈ f −1 (C) = f∗ (C) = f∗ (B) = f −1 (B) logo c = f (x) ∈ B.
Se f∗ é injetiva então f é sobrejetiva. Suponha f∗ injetiva.
Queremos mostrar que f é sobrejetiva. Seja y ∈ Y . Queremos
mostrar que existe x ∈ X tal que f (x) = y. Como f∗ é injetiva
e {y} 6= ∅ temos f −1 ({y}) = f∗ ({y}) 6= f∗ (∅) = f −1 (∅) = ∅ logo
9. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 47

f −1 ({y}) 6= ∅, ou seja existe x ∈ f −1 ({y}), daı́ f (x) ∈ {y} logo


f (x) = y.

Item f.

Se f é bijetiva então é injetiva e sobrejetiva, logo pelos itens


acima f∗ é sobrejetiva e injetiva, ou seja f∗ é bijetiva. Se f∗ é
bijetiva então é injetiva e sobrejetiva, logo pelos itens acima f é
sobrejetiva e injetiva, ou seja f é bijetiva.

9.3. Seção “Inversos modulares”.


(1) Encontre inteiros x e y tais que 3234x+2123y = M DC(3234, 2123).
É só aplicar o algoritmo de Euclides.

3234 2123
1 0 3234
0 1 2123
1−1·0=1 0 − 1 · 1 = −1 1111
0 − 1 · 1 = −1 1 − 1 · (−1) = 2 1012
1 − 1 · (−1) = 2 −1 − 1 · 2 = −3 99
−1 − 10 · 2 = −21 2 − 10 · (−3) = 32 22
2 − 4 · (−21) = 86 −3 − 4 · 32 = −131 11
O algoritmo termina aqui porque o próximo resto é zero. Temos
3234 · 86 + 2123 · (−131) = 11 = M DC(3234, 2123).

(2) Resolva as equações


41x ≡ 3 mod 412,
33x ≡ 1 mod 444,
999x ≡ −2 mod 1021.

Primeira equação. 41x ≡ 3 mod 412.


Aplicaremos o algoritmo de Euclides a 412 e 41.
412 41
1 0 412
0 1 41
1 − 10 · 0 = 1 0 − 10 · 1 = −10 2
0 − 20 · 1 = −20 1 − 20 · (−10) = 201 1
O algoritmo termina aqui porque o próximo resto é zero. Temos
412 · (−20) + 41 · 201 = 1 = M DC(412, 41).
48 1. CONJUNTOS

Em particular 412 e 41 são coprimos. Reduzindo módulo 412


obtemos que o inverso de 41 módulo 412 é 201. Multiplicando
os dois lados da equação por 201 obtemos então a única solução
x ≡ 201 · 3 ≡ 191 mod 412.

Segunda equação. 33x ≡ 1 mod 444.


Aplicaremos o algoritmo de Euclides a 444 e 33.
444 33
1 0 444
0 1 33
1 − 13 · 0 = 1 0 − 13 · 1 = −13 15
0 − 2 · 1 = −2 1 − 2 · (−13) = 27 3
O algoritmo termina aqui porque o próximo resto é zero. Temos
444 · (−2) + 33 · 27 = 3 = M DC(444, 33).
Reescrevendo a equação da forma seguinte: 444s = 33x − 1 (com s
inteiro) vemos que a equação não tem solução pois 1 = 33s − 444 =
3(11s − 148) mas 3 não divide 1.

Terceira equação. 999x ≡ −2 mod 1021.


Aplicaremos o algoritmo de Euclides a 1021 e 999.
1021 999
1 0 1021
0 1 999
1−1·0=1 0 − 1 · (−1) = −1 22
0 − 45 · 1 = −45 1 − 45 · (−1) = 46 9
1 − 2 · (−45) = 91 −1 − 2 · 46 = −93 4
−45 − 2 · 91 = −227 46 − 2 · (−93) = 232 1
O algoritmo termina aqui porque o próximo resto é zero. Temos
1021 · (−227) + 999 · 232 = 1 = M DC(1021, 999).
Em particular 1021 e 999 são coprimos. Reduzindo módulo 1021
obtemos que o inverso de 999 módulo 1021 é 232. Multiplicando
os dois lados da equação por 232 obtemos então a única solução
x ≡ 232 · (−2) ≡ 557 mod 1021.

(3) Resolva as equações


80x ≡ 6 mod 2002,
585x ≡ 90 mod 999,
2004x ≡ 4 mod 2464.
Primeira equação. 80x ≡ 6 mod 2002.
Dividindo por 2 obtemos 40x ≡ 3 mod 1001. A divisão com
resto de 1001 por 40 é 1001 = 40 · 25 + 1 logo 1001 · 1 + 40 ·
9. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 49

(−25) = 1, daı́ 1001 e 40 são coprimos e reduzindo módulo 1001


obtemos 40 · (−25) ≡ 1 mod 1001, logo o inverso de 40 módulo
1001 é −25 ≡ 976, daı́ multiplicando os dois lados por −25 obtemos
x ≡ (−25) · 3 = −75 ≡ 926 mod 1001. Logo as duas soluções da
equação original são x ≡ 926 mod 2002 e x ≡ 926 + 1001 = 1927
mod 2002.

Segunda equação. 585x ≡ 90 mod 999.


Dividindo por 9 obtemos 65x ≡ 10 mod 111. Aplicando o
algoritmo de Euclides a 111 e 65 obtemos

111 65
1 0 111
0 1 65
1−1·0=1 0 − 1 · 1 = −1 46
0 − 1 · 1 = −1 1 − 1 · (−1) = 2 19
1 − 2 · (−1) = 3 −1 − 2 · 2 = −5 8
−1 − 2 · 3 = −7 2 − 2 · (−5) = 12 3
3 − 2 · (−7) = 17 −5 − 2 · 12 = −29 2
−7 − 1 · 17 = −24 12 − 1 · (−29) = 41 1
O algoritmo termina aqui porque o próximo resto é zero. Temos
111 · (−24) + 65 · 41 = 1 = M DC(111, 65).
Em particular 111 e 65 são coprimos. Reduzindo módulo 111 ob-
temos que o inverso de 65 módulo 111 é 41. Multiplicando os dois
lados da equação por 41 obtemos x ≡ 410 ≡ 77 mod 111. Logo
as nove (!) soluções da equação original são x ≡ 77 mod 999,
x ≡ 77 + 1 · 111 = 188 mod 999, x ≡ 77 + 2 · 111 = 299 mod 999,
x ≡ 77 + 3 · 111 = 410 mod 999, x ≡ 77 + 4 · 111 = 521 mod 999,
x ≡ 77 + 5 · 111 = 632 mod 999, x ≡ 77 + 6 · 111 = 743 mod 999,
x ≡ 77 + 7 · 111 = 854 mod 999, x ≡ 77 + 8 · 965 = 188 mod 999.

Terceira equação. 2004x ≡ 4 mod 2464.


Dividindo por 4 obtemos 501x ≡ 1 mod 616. Aplicando o
algoritmo de Euclides a 616 e 501 obtemos

616 501
1 0 616
0 1 501
1−1·0=1 0 − 1 · 1 = −1 115
0 − 4 · 1 = −4 1 − 4 · (−1) = 5 41
1 − 2 · (−4) = 9 5 − 2 · 5 = −11 33
−4 − 1 · 9 = −13 5 − 1 · (−11) = 16 8
9 − 4 · (−13) = 61 −11 − 4 · 16 = −75 1
50 1. CONJUNTOS

O algoritmo termina aqui porque o próximo resto é zero. Temos


616 · 61 + 501 · (−75) = 1 = M DC(616, 501).
Em particular 616 e 501 são coprimos. Reduzindo módulo 616 ob-
temos que o inverso de 501 módulo 616 é −75 ≡ 541. Multiplicando
os dois lados da equação por 541 obtemos x ≡ 541 mod 616. Logo
as quatro (!) soluções da equação original são x ≡ 541 mod 2464,
x ≡ 541 + 1 · 616 = 1157 mod 2464, x ≡ 541 + 2 · 616 = 1773
mod 2464, x ≡ 541 + 3 · 616 = 2389 mod 2464.

(4) Mostre que se a, b, n são inteiros positivos, d = M DC(a, n) divide b


e os números a/d, n/d são coprimos então a equação ax ≡ b mod n
tem exatamente d soluções.

Dividindo por d obtemos (a/d)x ≡ b/d mod n/d. Como a/d e


n/d são coprimos, existe o inverso m de a/d módulo n/d e multi-
plicando os dois lados por m obtemos x ≡ m(b/d) mod n/d, logo
as soluções da equação original são
x ≡ m(b/d) mod n,
x ≡ m(b/d) + n/d mod n,
x ≡ m(b/d) + 2(n/d) mod n,
..
.
x ≡ m(b/d) + (d − 1)(n/d) mod n.
Se trata de d soluções distintas. De fato se i, j ∈ {0, 1, 2, . . . , d − 1}
são distintos então n não divide
(m(b/d) + i(n/d)) − (m(b/d) + j(n/d)) = (i − j)n/d
sendo |(i − j)n/d| < n.
CAPı́TULO 2

Grupos

1. Grupos
Definição. Um conjunto G com uma operação G×G → G, (a, b) 7→ a·b
é um grupo se satisfaz as propriedades seguintes.
(1) Associatividade: (a · b) · c = a · (b · c) para todo a, b, c ∈ G.
(2) Elemento neutro: existe e ∈ G tal que a · e = a = a · e para todo
a ∈ G.
(3) Inverso: para todo a ∈ G existe b ∈ G tal que a · b = e = b · a.
A notação formal de um grupo G com a sua operação · é (G, ·). As vezes
vou usar a notação ab em vez de a · b. Observe que se a, b, c ∈ G então o
produto abc está bem definido porque as duas interpretações possı́veis, (ab)c
e a(bc), são iguais pela propriedade associativa.

Algumas consequências fáceis:


• O elemento neutro é único: se e, e0 são dois elementos neutros então
e = e · e0 sendo e0 um elemento neutro e e · e0 = e0 sendo e um
elemento neutro. Logo e = e · e0 = e0 .
• O inverso é único: se b, b0 são inversos de a então a · b = e = b · a e
a · b0 = e = b0 · a logo b = b · e = b · (a · b0 ) = (b · a) · b0 = e · b0 = b0 .
Vamos denotar o (único) inverso de a por a−1 .

Alguns exemplos:
• (Z, +) é um grupo, onde Z denota o conjunto dos números inteiros,
Z = {. . . , −2, −1, 0, 1, 2, . . .}. A operação aqui é a soma, (a, b) 7→
a + b. O elemento neutro é 0 e o inverso de a é −a.
• (Z/nZ, +) é um grupo, onde Z/nZ é o conjunto das classes módulo
n, ou seja 0, 1, 2, . . ., n − 1, e a operação + é definida por a + b :=
a + b. O elemento neutro é 0 e o inverso de a é −a.
• (Q, +), (R, +) e (C, +) são grupos também.
• (Q − {0}, ·) é um grupo. Aqui o elemento neutro é 1/1 e o inverso
de a/b é b/a sendo (a/b)(b/a) = 1/1 (observe que b/a não faria
sentido se a = 0, é por isso que tiramos o 0 de Q).

Como vocês já perceberam, tem duas notações que vamos utilizar.
(1) Notação multiplicativa.
51
52 2. GRUPOS

(a, b) 7→ a · b = ab. Nesse tipo de notação o elemento neutro é


indicado por 1 e o inverso de a é indicado por a−1 e é normalmente
chamado de inverso multiplicativo.
(2) Notação aditiva
(a, b) 7→ a + b. Nesse tipo de notação (mais usada para grupos
abelianos) o elemento neutro é indicado por 0 e o inverso de a é
indicado por −a, e é normalmente chamado de “oposto” ou “inverso
aditivo”.

Ordem de um elemento

Dado G um grupo e g ∈ G, a “ordem” de g, indicada por o(g), é o


menor inteiro positivo n tal que g n = 1, onde por definição g n = gg · · · g (n
vezes) - essa escrita faz sentido graças à propriedade associativa. Observe
que em notação aditiva, a ordem de g é o menor inteiro positivo n tal que
g + g + . . . + g = 0 (onde g aparece n vezes). Se um tal inteiro n não existir
dizemos que g tem “ordem infinita”. Por exemplo a ordem multiplicativa do
número inteiro 2 é infinita pois não existe nenhum inteiro positivo n tal que
2n = 1. Observamos que podemos falar também de potências com expoente
negativo: se n é um inteiro negativo definamos g n := (g −1 )−n . Isso faz
sentido porque sabemos o que é g −1 e já definimos potências a expoente
positivo (observe que −n é um número inteiro positivo, pois n < 0). Além
disso, definamos g 0 = 1.
Proposição. Seja g um elemento de um grupo G com notação mul-
tiplicativa. Então para todo inteiro n, g −n é o inverso de g n , ou seja
g −n = (g n )−1 .
Demonstração. Se n = 0 então a igualdade g −n = (g n )−1 segue do
fato que g 0 = 1 e 1−1 = 1 sendo 1 · 1 = 1.
Suponha n positivo. Precisamos mostrar que g n (g −n ) = 1, ou seja que
g (g −1 )n = 1. Se trata de cancelar os termos gg −1 (ou seja, substituir
n

gg −1 com 1) na expressão g n (g −1 )n = gg · · · gg · g −1 g −1 · · · g −1 (aqui g e g −1


aparecem n vezes, o que faz sentido pois n é positivo).
Suponha n negativo, n = −m com m positivo. Precisamos mostrar
que g n (g −n ) = 1, ou seja que (g −1 )m (g −1 )−m = 1. Se trata de aplicar o
argumento acima substituindo g com g −1 e n com m. 

Observe que se a, b são inteiros positivos e g ∈ G então g a+b = g a g b


pois g aparece a + b vezes nas duas expressões. Segue que g a+b = g a g b vale
para a, b interos quaisquer, por exemplo se a + b > 0 com b negativo então
−b é positivo logo g a+b g −b = g a+b−b = g a (sendo a + b e −b positivos) e
multiplicando os dois lados por g b obtemos g a+b = g a g b .
Proposição. Seja g ∈ G um elemento de ordem finita n e sejam a, b
dois inteiros. Então g a = g b se e somente se a ≡ b mod n.
1. GRUPOS 53

Demonstração. (⇒). Suponha g a = g b . Queremos mostrar que a ≡ b


mod n. A menos de substituir a hipótese com a escrita equivalente g b = g a
podemos supor a ≥ b. Observe que g a−b = g a (g −1 )b = g a (g b )−1 = 1 sendo
g a = g b . Ou seja, definido m := a − b temos g m = 1. O que queremos
mostrar é que n divide m = a − b. Fazendo a divisão com resto de m por n
obtemos m = nq + r com q, r inteiros e 0 ≤ r < n. Temos 1 = g m = g nq+r =
g nq g r = (g n )q g r = 1q g r = g r logo g r = 1. Sendo 0 ≤ r < n por definição
de ordem de um elemento (lembrando que n é a ordem de g) obtemos que r
não pode ser positivo, logo r = 0. Daı́ m = nq ou seja n divide m = a − b.
(⇐). Suponha a ≡ b mod n. Daı́ podemos escrever a − b = nq com q
inteiro. Logo g a−b = g nq = (g n )q = 1q = 1 ou seja g a−b = 1. Por outro lado
g a−b = g a g −b = g a (g b )−1 logo g a (g b )−1 = 1 e multiplicando os dois lados
por g b obtemos g a = g b . 


Por exemplo considere i = −1 ∈ C, o número complexo conhecido
como “a raiz quadrada de −1”. Temos i2 = −1 6= 1, i3 = i2 i = (−1)i =
−i 6= 1 e i4 = i2 i2 = (−1)(−1) = 1 logo a ordem (multiplicativa!) de i é 4
(a ordem aditiva de i é infinita pois nenhuma soma i + i + i + . . . + i é igual
a zero). Sendo a ordem de i igual a 4 temos por exemplo i17 = i−11 pois
17 ≡ −11 mod 4.

Analogamente, em Z/4Z a ordem (aditiva!) de 1 é 4 pois 1 + 1 = 2 6= 0,


1 + 1 + 1 = 3 6= 0 e 1 + 1 + 1 + 1 = 4 = 0.

Um exemplo geral de elemento de ordem (multiplicativa) n é o número


complexo ei2π/n = cos(2π/n) + i sin(2π/n).

Até agora fizemos só exemplos de grupos comutativos (ou seja em que
a operação é comutativa). Observe que um grupo em geral não precisa ser
comutativo, ou seja se x, y são elementos de um grupo G então xy e yx em
geral são diferentes. Isso implica que em geral temos (xy)n 6= xn y n . Faremos
exemplos de grupos não comutativos.

Exercı́cios.

(1) Considere X = {1, 2, 3, 4, 5, 6} com a operação x ? y := min(x, y),


o mı́nimo entre x e y. Calcule 3 ? 5 e 6 ? 2. Existe um elemento
neutro? É único? Com essa operação X é um grupo?
(2) Seja X um conjunto e 4 a operação de P (X) definida por A4B :=
(A − B) ∪ (B − A) (diferença simétrica). P (X) com a operação 4
é um grupo? [Veja as listas anteriores.]
(3) Seja G = {x ∈ Z/5Z : x 6= 0} = {1, 2, 3, 4}. Mostre que a operação
x ? y := xy é bem definida em G (ou seja que se x, y ∈ G então
x ? y ∈ G). Com tal operação G é um grupo?
54 2. GRUPOS

(4) Seja i ∈ C a raiz quadrada



de −1. Calcule a ordem multiplicativa
i+1 1+i 3
dos elementos √2 , 2 .
(5) Seja a + ib um número complexo. Mostre que se a + ib tem ordem
multiplicativa finita então a2 + b2 = 1. Vale o vice-versa?
(6) Mostre que se G é um grupo e g ∈ G é um elemento de ordem 5
então g 8 tem ordem 5.
(7) Mostre que se G é um grupo e g ∈ G é um elemento de ordem 12
então g 10 tem ordem 6.

2. Grupos cı́clicos
Se G for um grupo finito a cardinalidade |G| é chamada de “ordem” de G.
Um grupo G é dito ser “cı́clico” se existe x ∈ G tal que G = {xm : m ∈ Z}
ou seja
G = {. . . , x−2 , x−1 , 1, x, x2 , . . .}.
Vamos escrever G = hxi, e x é dito um “gerador” de G (digamos também
que G é “gerado” por x). Em outras palavras G é o conjunto das potências
inteiras de x. Observe que de fato G = hxi é um grupo: se xa , xb ∈ G
então xa xb = xa+b ∈ G, a propriedade associativa é xa (xb xc ) = xa xb+c =
xa+b+c = xa+b xc = (xa xb )xc , o elemento neutro é 1 = x0 e o inverso de xa é
x−a (de fato xa x−a = xa−a = x0 = 1).

Lembre-se que a ordem de um elemento x ∈ G (notação multiplicativa)


é o menor inteiro positivo n tal que xn = 1. Ou seja,
x 6= 1, x2 6= 1, x3 6= 1, . . . , xn−1 6= 1, xn = 1.
• O grupo cı́clico de ordem n na notação multiplicativa será indicado
por Cn . Nesse sentido, existe x ∈ Cn tal que
Cn = {1, x, x2 , x3 , . . . , xn−1 }.
Observe que xn = 1 = x0 e na verdade n = o(x).
• Considere o número complexo i. O grupo {1, i, i2 , i3 } é um grupo
cı́clico gerado por i, ou seja é igual a hii. De fato i tem ordem 4
sendo i 6= 1, i2 = −1 6= 1, i3 = −i 6= 1 e i4 = (i2 )2 = (−1)2 = 1. O
inverso de i é i3 (ou seja i−1 = i3 , o que segue do fato que −1 ≡ 3
mod 4).
• (Z/nZ, +) é um grupo ciclico finito de ordem n. De fato, G =
Z/nZ = {0, 1, 2, . . . , n − 1} onde a operação é a soma de classes
(soma módulo n). G é ciclico porque todo elemento é uma soma
de uns: 2 = 1 + 1, 3 = 1 + 1 + 1, etc.
Por exemplo C6 = hxi = {1, x, x2 , x3 , x4 , x5 } onde o(x) = 6. Vamos
calcular as ordens dos elementos de C6 . É claro que o(1) = 1 e o(x) = 6.
• o(x2 ) = 3. De fato (x2 )2 = x4 6= 1 e (x2 )3 = x6 = 1.
• o(x3 ) = 2. De fato (x3 )2 = x6 = 1.
• o(x4 ) = 3. De fato (x4 )2 = x8 = x2 6= 1 e (x4 )3 = x12 = x0 = 1.
2. GRUPOS CÍCLICOS 55

• o(x5 ) = 6. De fato (x5 )2 = x10 = x4 6= 1, (x5 )3 = x15 = x3 6= 1,


(x5 )4 = x20 = x2 6= 1, (x5 )5 = x25 = x 6= 1, (x5 )6 = x30 = x0 = 1.

Logo C6 contem um elemento de ordem 1 (ou seja 1), um elemento de


ordem 2 (ou seja x3 ), dois elementos de ordem 3 (ou seja x2 e x4 ) e dois
elementos de ordem 6 (ou seja x e x5 ). O inverso de x é x5 (pois x−1 = x5
sendo −1 ≡ 5 mod 6), o inverso de x2 é x4 (pois x−2 = x4 sendo −2 ≡ 4
mod 6) e o inverso de x3 é x3 (pois x−3 = x3 sendo −3 ≡ 3 mod 6).

Um elemento y ∈ Cn tal que o(y) = n é chamado de “gerador” de Cn .


Neste caso, hyi = Cn . Por exemplo os geradores do grupo hii = {1, i, i2 , i3 }
são i e i3 (de fato hi3 i = {i3 , i6 , i9 , i12 } = {i3 , i2 , i, 1} porém hi2 i = {1, i2 } =
6
hii e h1i = {1} = 6 hii.

Lembre-se que se o elemento g tem ordem n e a, b são dois inteiros então


ga = g b se e somente se a ≡ b mod n. Em particular g a = 1 se e somente
se n divide a (pois 1 = g 0 e a ≡ 0 mod n significa que n divide a).

Proposição. Seja G = Cn = hxi. Seja k um inteiro positivo e seja


d = (n, k) o maior divisor comum entre n e k.

(1) o(xk ) = n/d.


(2) hxk i = hxd i.

Demonstração. Seja m = o(xk ). Sendo n/d e m inteiros positivos,


para mostrar que n/d = m basta mostrar que n/d divide m e que m divide
n/d.
Mostraremos agora que n/d divide m. Sendo o(xk ) = m, temos (xk )m =
1, isto é, xkm = 1 = xn . Daı́ km ≡ n mod o(x) = n, ou seja n divide km,
logo n/d divide (k/d)m logo divide m (pois sendo d = (n, k), o inteiro n/d
não tem fatores em comum com k/d).
Mostraremos agora que m divide n/d. Sendo xn = 1 temos (xk )n/d =
xkn/d = (xn )k/d = 1k/d = 1 sendo k/d um número inteiro, logo n/d ≡ m
mod o(xk ) = m logo m divide n/d.

Mostraremos agora que hxk i = hxd i. Observe que se r, s são elementos


de um grupo, e r ∈ hsi, então hri ⊆ hsi, ou seja se r é uma potência de s
então toda potência de r é uma potência de s (isso é claro pois se r = sm
então toda potência rk é igual a (sm )k = smk logo é uma potência de s).
Primeira inclusão. Para mostrar que hxd i ⊆ hxk i basta então mostrar
que xd ∈ hxk i. Pelo algoritmo de Euclides existem a, b ∈ Z tais que d =
(n, k) = na + kb, logo xd = xna+kb = (xn )a (xk )b = (xk )b ∈ hxk i.
Segunda inclusão. Para mostrar que hxk i ⊆ hxd i basta mostrar que
xk ∈ hxd i. Como d divide k, existe um inteiro t tal que k = dt logo xk =
xdt = (xd )t ∈ hxd i. 
56 2. GRUPOS

Observe que se G = Cn = hxi é um grupo cı́clico de ordem n então


G = {1, x, x2 , x3 , . . . , xn−1 },
logo G tem n elementos. Em outras palavras |hxi| = o(x). Em outras
palavras a ordem de um grupo cı́clico gerado por x é igual à ordem de x.
Proposição. Seja x um elemento de um grupo G (notação multiplica-
tiva) com o(x) = n. Então hxk i = hxi se e somente se (n, k) = 1 (ou seja,
n e k são coprimos).
Demonstração. (⇒). Suponha hxk i = hxi. Pela observação acima
esses dois conjuntos têm cardinalidades o(xk ) e o(x). Como eles são iguais,
o(xk ) = o(x). Por outro lado o(xk ) = n/(n, k) e o(x) = n logo n/(n, k) = n,
o que implica que (n, k) = 1.
(⇐). Suponha (n, k) = 1. Temos hxk i = hx(n,k) i = hx1 i = hxi. 
Por exemplo considere o grupo C12 gerado por um elemento x de ordem
12, ou seja
C12 = hxi = {1, x, x2 , x3 , x4 , x5 , x6 , x7 , x8 , x9 , x10 , x11 }.
Como 5, 7, e 11 são coprimos com 12 temos
C12 = hxi = hx5 i = hx7 i = hx11 i.
Se quisermos fazer a conta para verificar por exemplo que hxi = hx5 i, pode-
mos escrever
hx5 i = {1, x5 , x10 , x15 , x20 , x25 , x30 , x35 , x40 , x45 , x50 , x55 }.
Não escrevemos x60 pois seria igual a x0 = 1 (sendo 60 ≡ 0 mod 12).
Calculando as potências escritas (ou seja, reduzindo os expoentes módulo
12) obtemos
hx5 i = {1, x5 , x10 , x3 , x8 , x, x6 , x11 , x4 , x9 , x2 , x7 }
que é igual a hxi (veja acima). Por exemplo hxi = 6 hx8 i sendo (12, 8) = 4 6= 1.
De fato
hx8 i = {x8 , x16 , x24 } = {x8 , x4 , 1}.
Observe que hx8 i = hx(12,8) i = hx4 i e de fato hx4 i = {x4 , x8 , x12 = 1}.

Logo, o número de geradores de Cn é igual ao número dos inteiros k ∈


{1, 2, . . . , n − 1} tais que (n, k) = 1. Esse número é indicado por ϕ(n) e
ϕ é chamada “função de Eulero”. Por exemplo C6 = hxi tem ϕ(6) = 2
geradores, x e x5 . C12 = hxi tem ϕ(12) = 4 geradores, x, x5 , x7 , x11 . O
grupo aditivo Z/8Z tem ϕ(8) = 4 geradores, se trata das classes m onde m
é coprimo com 8, ou seja 1, 3, 5, 7. Por exemplo, observe que as potências
de 5 nesse contesto são obtidas iterando a operação +, ou seja
h5i = {5, 10, 15, 20, 25, 30, 35, 40}
3. ORDEM DE UM GRUPO 57

que é igual (escolhendo representantes canônicos) a


{5, 2, 7, 4, 1, 6, 3, 0}.
Observe que esse conjunto é de fato igual a
Z/8Z = h1i = {1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 0}.
Exercı́cios. Lembre-se que Cn indica um grupo cı́clico (em notação
multiplicativa) gerado por um elemento x de ordem n:
Cn = hxi = {1, x, x2 , . . . , xn−1 }.
(1) Seja x um elemento de ordem 24. Calcule a ordem de x22 , x201 ,
x402 , x611 e x1000 .
(2) Faça a lista dos elementos de C24 e calcule as ordens deles.
(3) Conte os elementos de ordem 15 em C30 .
(4) Conte os elementos de ordem 10 em C40 .
(5) Conte os elementos de ordem 15 em C15 .
(6) Conte os geradores de C32 .

3. Ordem de um grupo
Se G é um grupo finito com m elementos (ou seja |G| = m) digamos que
G tem “ordem m”. Por exemplo o grupo aditivo Z/3Z = {0, 1, 2} tem ordem
3. Até agora todos os grupos que temos visto são cı́clicos: por exemplo Z/nZ
(grupo aditivo) é cı́clico pois todo elemento é uma potência (aditiva, ou seja
múltiplo!) de 1: de fato 2 = 1 + 1, 3 = 1 + 1 + 1, etc. Daı́ Z/nZ é um grupo
aditivo, cı́clico, finito, de ordem n. O equivalente em notação multiplicativa
é o grupo cı́clico Cn = hgi = {1, g, g 2 , . . . , g n−1 } (um exemplo de elemento de
ordem multiplicativa n é o número complexo g = cos(2π/n) + i sin(2π/n)).
O grupo aditivo Z (o grupo aditivo dos inteiros) também é cı́clico, de fato
todo inteiro é um múltiplo inteiro (potência aditiva inteira) de 1: se a é um
inteiro então a = a · 1. Z é um grupo aditivo, cı́clico, infinito (ou seja, de
ordem infinita).
Proposição. Sejam G um grupo finito e x ∈ G. Então x|G| = 1. Em
outras palavras, a ordem de x divide |G|.
Demonstração. Seja n = o(x) a ordem de x, ou seja o menor inteiro
positivo tal que xn = 1. Seja m = |G| a ordem de G. Queremos mostrar
que xm = 1. Lembre-se que isso significa que n divide m (e mais em geral
xa = xb significa que a ≡ b mod n). Queremos então mostrar que n divide
m. Considere a relação R sobre G definida da maneira seguinte: gRh se g −1 h
for uma potência de x (ou seja g −1 h ∈ hxi). É uma relação de equivalência
sobre G.
• É reflexiva pois g −1 g = 1 = x0 é uma potência de x.
• É simétrica pois se gRh então g −1 h = xa então h−1 g = (g −1 h)−1 =
(xa )−1 = x−a logo hRg.
58 2. GRUPOS

– Aqui estou usando o fato que se r, s ∈ G então


(rs)−1 = s−1 r−1 .
Para mostrar esse fato precisamos mostrar que (rs)(s−1 r−1 ) =
1 e (s−1 r−1 )(rs) = 1 (lembre-se que por definição a−1 = b
significa que ab = 1 e ba = 1). Mas isso é claro pois pela
propriedade associativa (rs)(s−1 r−1 ) = r(ss−1 )r−1 = rr−1 =
1 e (s−1 r−1 )(rs) = s−1 (r−1 r)s = s−1 s = 1.
• É transitiva pois se g −1 h = xa e h−1 k = xb então g −1 k = g −1 1k =
g −1 (hh−1 )k = (g −1 h)(h−1 k) = xa xb = xa+b .
Qual a cardinalidade da classe de equivalência de g? Lembre-se que a
classe de equivalência de g ∈ G é [g] = {h ∈ G : g −1 h ∈ hxi}, o
conjunto dos elementos h em relação com g. Como g −1 h = xa é equiva-
lente (multiplicando os dois lado por g a esquerda) a h = gxa obtemos
[g] = {gxi : i = 0, 1, . . . , n − 1} = {g, gx, gx2 , . . . , gxn−1 }. Observe que as
potências 1, x, x2 , . . . , xn−1 são distintas (porque como já visto se trata de
todas as potências de x, e x tem exatamente n potências) logo os elemen-
tos g, gx, gx2 , . . . , gxn−1 também são distintos (se dois deles fossem iguais
então se teria gxi = gxj mas multiplicando a esquerda por g −1 obteriamos
xi = xj , absurdo) e isso implica que |[g]| = n, ou seja a classe de g contem
exatamente n elementos. Isso vale para todo g, logo todas as classes de equi-
valência têm n elementos. Chamando ` o número de classes de equivalências
(ou seja ` = |G/R|) temos então m = |G| = `n. Daı́ n divide |G|. 
No caso de Z/nZ (grupo aditivo) isso está dizendo simplesmente que
na = 0 para todo a ∈ Z/nZ (porque potência aditiva = múltiplo), e segue
simplesmente da definição de produto de classes. Se trata de um caso pouco
interessante.

Consideramos um caso mais interessante. Considere a operação de mul-


tiplicação de classes em Z/nZ, ou seja a operação x · y := xy. Lembre-se
que o inverso multiplicativo de a ∈ Z/nZ é um elemento b ∈ Z/nZ (se
existir) tal que ab = 1, ou seja ab ≡ 1 mod n. Lembre-se que o inverso
modular é calculado por meio do algoritmo de Euclides. Com essa operação
Z/nZ não é um grupo! De fato 0 não admite inverso multiplicativo (se b
é uma classe qualquer 0 · b = 0 é sempre diferente de 1). Já vimos que
os elementos de Z/nZ que admitem inverso multiplicativo são os elemen-
tos a com (a, n) = 1 (ou seja a é coprimo com n). Seja U = U (Z/nZ) o
conjunto de tais elementos. Em outras palavras U (Z/nZ) é por definição
o conjunto dos elementos a ∈ Z/nZ que admitem inverso em Z/nZ. Por
exemplo U (Z/8Z) = {1, 3, 5, 7}.
Observe que U é um grupo multiplicativo! De fato:
• Se x, y ∈ U então xy ∈ U . De fato x−1 ∈ U , y −1 ∈ U e (xy)−1 =
y −1 x−1 logo xy admite inverso, em outras palavras xy ∈ U .
• · é associativa, sendo associativa já em Z/nZ, como já visto.
3. ORDEM DE UM GRUPO 59

• Existe um elemento neutro, se trata de 1 ∈ U . Observe que 1


pertence a U porque 1 admite inverso: o inverso de 1 é 1.
• Se x ∈ U então x−1 ∈ U . De fato x−1 com certeza existe em Z/nZ
sendo x ∈ U , logo x−1 ∈ U pois x−1 admite inverso em Z/nZ (o
inverso de x−1 é x).
Exemplo. O grupo U (Z/7Z) = {1, 2, 3, 4, 5, 6} é um grupo de ordem 6
−1 −1 −1 −1
(ele tem 6 elementos). Os inversos são 1 = 1, 2 = 4, 3 = 5, 4 = 2,
−1 −1 1 2
5 = 3, 6 = 6. Qual a ordem do elemento 2? Temos 2 = 2, 2 = 4,
3
2 = 8 = 1 logo o(2) = 3. Observe que se trata da ordem multiplicativa de
2, não a confunda com a ordem aditiva.
• Observação: a ordem aditiva de 2 é 7, de fato as potências aditivas
de 2 são 2, 4, 6, 1, 3, 5, 0.
1 2
E qual a ordem (multiplicativa!) de 3? As potências de 3 são 3 = 3, 3 = 2,
3 4 5 6
3 = 6, 3 = 4, 3 = 5, 3 = 1. Logo a ordem de 3 é 6. Observe que então
0 2
todo elemento de U (Z/7Z) é uma potência de 3, sendo 1 = 3 , 2 = 3 ,
1 4 5 3
3 = 3 , 4 = 3 , 5 = 3 , 6 = 3 . Isso mostra exatamente que U (Z/7Z) é um
2 3 4 5
grupo cı́clico, e mais especificamente U (Z/7Z) = h3i = {1, 3, 3 , 3 , 3 , 3 }.

As vezes é bom lembrar o critério seguinte.


Proposição. Seja G um grupo de ordem n. Então G é cı́clico se e
somente se contem elementos de ordem n.
Demonstração. Primeira implicação. Suponha G cı́clico. Daı́ G =
hgi e como G tem ordem n temos |hgi| = n. Mas como já visto passada
|hgi| = o(g). Logo o(g) = n.
Segunda implicação. Suponha que G contenha um elemento g de ordem
n. É claro que todas as potências de g pertencem a G (sendo G fechado
pela sua operação) logo hgi ⊆ G. Por outro lado |hgi| = n e |G| = n, logo
hgi = G. 
Usando esse critério mostramos que U (Z/8Z) não é cı́clico. De fato
2
U (Z/8Z) = {1, 3, 5, 7}. A ordem de 1 é 1, a ordem de 3 é 2 (de fato 3 =
2 2
9 = 1), a ordem de 5 é 2 (de fato 5 = 25 = 1), a ordem de 7 é 2 (de fato 7 =
49 = 1). Logo U (Z/8Z) é um grupo de ordem 4 sem elementos de ordem 4
(os seus elementos têm ordens 1, 2, 2, 2). Pelo critério acima U (Z/8Z) não
é cı́clico. Por outro lado U (Z/8Z) (e na verdade todo U (Z/nZ)) é um grupo
comutativo (pois a multiplicação entre classes é comutativa).

Qual a ordem de U = U (Z/nZ)? A ordem de U é o número de classes


a com a ∈ {0, 1, 2, . . . , n − 1} coprimo com n, e sabemos que o número
de elementos de {1, 2, . . . , n} coprimos com n é indicado com ϕ(n) (função
de Eulero). Logo U tem ordem ϕ(n), ou seja |U | = ϕ(n). Aplicando a
proposição acima (“se x ∈ G então x|G| = 1”) ao grupo G = U , que tem
ordem ϕ(n), obtemos que se a ∈ U então aϕ(n) = 1. Em outras palavras
60 2. GRUPOS

Teorema (Eulero-Fermat). Se a é um inteiro coprimo com n então


aϕ(n) ≡ 1 mod n.

Demonstração. Foi feita acima. 

Corolario (Pequeno teorema de Fermat). Se p é um número primo


então ap ≡ a mod p para todo a ∈ Z.

Demonstração. Se p divide a então a ≡ 0 mod p e o resultado é


imediato. Se p não divide a então a é coprimo com p (pois p é um número
primo) e ϕ(p) = p−1 (pois 1, 2, . . . , p−1 são coprimos com p, sendo p primo),
logo pelo teorema de Eulero-Fermat ap−1 ≡ 1 mod p e multiplicando os dois
lados por a obtemos ap ≡ a mod p. 

Por exemplo se n = 20 e a = 15 temos que ϕ(20) = 8 logo 158 ≡ 1


mod 20. Por exemplo se n = p = 7 e a = 5 então 57 ≡ 5 mod 7.
Exercı́cios.
(1) Diga quais dos grupos multiplicativos seguintes são cı́clicos:

U (Z/5Z), U (Z/12Z), U (Z/16Z), U (Z/18Z), U (Z/22Z), U (Z/28Z).

(2) Calcule as ordens aditivas dos elementos de Z/28Z e a ordens mul-


tiplicativas dos elementos de U (Z/28Z).
(3) Calcule 4120 mod 7 e 71000 mod 13. [Pode usar o pequeno teorema
de Fermat.]
(4) Encontre as soluções de x2 = 1 em Z/13Z. [Basta calcular x2 para
todo x ∈ Z/13Z e ver quais quadrados são 1.]
(5) Encontre as soluções de x12 = x2 em Z/7Z.
(6) Seja G = hgi um grupo cı́clico. Mostre que G é comutativo, ou
seja xy = yx para todo x, y ∈ G. [Todo elemento é uma potência
inteira de g...]
(7) Seja p um número primo e seja G um grupo de ordem p. Mostre
que G é cı́clico. [Lembrando que x ∈ G implica que a ordem de x
divide |G|.]
(8) Seja G um grupo de ordem 4. Mostre que G é comutativo, ou seja
que xy = yx para todo x, y ∈ G. [Escreva G = {1, a, b, c}. Então
ab ∈ G. Pode ser ab = a? Pode ser ab = b? Se ab = 1 pode ser
a2 = 1? Pode ser a2 = a? Etc.]
(9) Seja G um grupo comutativo de ordem 15. Mostre que a função
f : G → G definida por f (x) := x2 é bijetiva. [Lembrando que
g ∈ G implica que a ordem de g divide |G|, ou seja g |G| = 1.]
(10) Seja X um conjunto qualquer e considere G = P (X) com a operação
A4B = (A−B)∪(B −A) (diferença simétrica). Já vimos nas listas
passadas que G é um grupo. Calcule as ordens dos elementos de
G. Se trata de um grupo cı́clico? [Lembrando que um grupo G é
cı́clico se e somente se admite um elemento de ordem |G|.]
4. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 61

4. Resolução listas de exercı́cios


4.1. Seção “Grupos”.

(1) Considere X = {1, 2, 3, 4, 5, 6} com a operação x ? y := min(x, y),


o mı́nimo entre x e y. Calcule 3 ? 5 e 6 ? 2. Existe um elemento
neutro? É único? Com essa operação X é um grupo?

Temos 3 ? 5 = min(3, 5) = 3 e 6 ? 2 = min(6, 2) = 2. Existe


um elemento neutro, é 6: de fato x ? 6 = 6 ? x = x para todo
x ∈ X, sendo 6 o máximo dos elementos de X. Se trata do único
elemento neutro pois se x é um elemento de X diferente de 6 então
x ? 6 = x 6= 6. Com essa operação X não é um grupo pois por
exemplo não existe nenhum x ∈ X tal que x ? 1 = 6 (em outras
palavras 1 não admite inverso). De fato x ? 1 = 1 para todo x ∈ X,
sendo 1 o mı́nimo dos elementos de X.

(2) Seja X um conjunto e 4 a operação de P (X) definida por A4B :=


(A − B) ∪ (B − A) (diferença simétrica). P (X) com a operação 4
é um grupo? [Veja as listas anteriores.]

Já vimos nas listas anteriores que 4 é uma operação associativa.


O elemento neutro é ∅, de fato A4∅ = A = ∅4A para todo A ∈
P (X). O inverso de A ∈ P (X) é o próprio A, de fato A4A = ∅.
Logo X com a operação 4 é um grupo.

(3) Seja G = {x ∈ Z/5Z : x 6= 0} = {1, 2, 3, 4}. Mostre que a operação


x ? y := xy é bem definida em G (ou seja que se x, y ∈ G então
x ? y ∈ G). Com tal operação G é um grupo?

Sejam x, y ∈ G, ou seja x, y são inteiros não divisı́veis por


5. Com certeza x ? y = xy ∈ Z/5Z. Para mostrar que xy ∈ G
precisamos mostrar que xy 6= 0, ou seja que 5 não divide xy. Se
5 dividisse xy então como 5 é primo, dividiria um entre x e y,
contradição.
A operação de multiplicação de classes é associativa (pois é
associativa já em Z/5Z, como já visto), o elemento neutro é 1 (pois
x1 = x = 1x para todo x ∈ G), e os inversos existem, se trata dos
−1 −1 −1 −1
inversos modulares: 1 = 1, 2 = 3, 3 = 2, 4 = 4.

(4) Seja i ∈ C a raiz quadrada



de −1. Calcule a ordem multiplicativa
i+1 1+i 3
dos elementos √2 , 2 .
i+1
Seja x := √ . Temos
2
1−1+2i
• x2 = 2 = i 6= 1,
62 2. GRUPOS

• x3 = x2 x = ix = i−1
√ 6= 1,
2
• 4 2 2 2
x = (x ) = i = −1 6= 1,
• x5 = x4 x = −x = −i−1

2
6= 1,
• x6 = x4 x2 = −i 6= 1,
• x7 = x6 x = −ix = 1−i
√ 6= 1,
2
• x8 = (x4 )2 = (−1)2 = 1.
Logo a ordem multiplicativa de x é 8: o(x) = 8.

1+i 3
Seja y := 2√ . Temos √
1−3+2i 3 −1+i 3
• y2 = 4 = 2 √6= 1,

(1+i 3)(−1+i 3)
• y3 = yy =2
4 = −3−14 = −1 6= 1,

• y4 = y 3 y = −y = − 1+i2 3 6= 1,

• y5= y 3 y 2 = −y 2 = − −1+i2
3
6= 1,
6
• y = 3 2
(y ) = (−1) = 1.2

Logo a ordem multiplicativa de y é 6: o(y) = 6.

(5) Seja a + ib um número complexo. Mostre que se a + ib tem ordem


multiplicativa finita então a2 + b2 = 1. Vale o vice-versa?

Seja z = a + ib onde a, b são números reais. Se z tem or-


dem multiplicativa finita igual a n então z n = 1. Lembre-se que
todo número complexo admite a representação
√ polar, ou seja z =
r(cos(α) + i sin(α)) onde r = |z| = a2 + b2 e α é o angulo for-
mado por z e o eixo real do plano complexo. Essa notação permite
calcular as potências de maneira imediata, pois
z n = (r(cos(α) + i sin(α)))n = rn (cos(nα) + i sin(nα)).
Logo “z n = 1” é equivalente a “rn = 1, cos(nα) = 1 e sin(nα) =
0”. Em particular rn = √ 1 implica r = 1, pois r é um número
real positivo. Logo r = a2 + b2 = 1, e elevando ao quadrado
a2 + b2 = 1. O vice-versa não vale. De fato como visto z n = 1
significa (usando a representação polar z = r(cos(α) + i sin(α)))
que rn = 1, cos(nα) = 1 e sin(nα) = 0, e isso só acontece quando
r = 1 e nα = 2kπ com k inteiro. Logo se α não tem a forma
(2kπ)/n (com n e k inteiros) então z n 6= 1. Por exemplo não
existem inteiros n e k tais que (2kπ)/n = 1, de fato se existissem
então seria π = n/(2k), absurdo (pois π é um número irracional).
Logo o elemento z := cos(1) + i sin(1) verifica a2 + b2 = 1 (onde
a = cos(1) e b = sin(1)) mas z n 6= 1 para todo inteiro positivo n.

(6) Mostre que se G é um grupo e g ∈ G é um elemento de ordem 5


então g 8 tem ordem 5.
4. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 63

Se trata de calcular as potências de x = g 8 . Como g tem ordem


5, g 6= 1, g 2 6= 1, g 3 6= 1, g 4 6= 1 e g 5 = 1, em particular x = g 8 = g 3 .
Temos x2 = (g 3 )2 = g 6 = g 6= 1, x3 = x2 x = gg 3 = g 4 6= 1,
x4 = x3 x = g 4 g 3 = g 7 = g 2 6= 1, x5 = x4 x = g 2 g 3 = g 5 = 1. Logo
o(x) = 5.

(7) Mostre que se G é um grupo e g ∈ G é um elemento de ordem 12


então g 10 tem ordem 6.

Como no exercı́cio anterior, se trata de calcular as potências de


x = g 10 . Como g tem ordem 12, g m 6= 1 para todo m = 1, 2, . . . , 11,
e g 12 = 1. Logo x2 = g 20 = g 8 6= 1, x3 = x2 x = g 8 g 10 = g 18 = g 6 6=
1, x4 = x3 x = g 6 g 10 = g 16 = g 4 6= 1, x5 = x4 x = g 4 g 10 = g 14 =
g 2 6= 1, x6 = x5 x = g 2 g 10 = g 12 = 1. Logo o(x) = 6.
Uma outra estratégia era escrever x = g 10 = g −2 (lembrando
que 10 ≡ −2 mod 12) e isso simplifica muito o cálculo das potências
de x pois x2 = g −4 , x3 = g −6 , x4 = g −8 , x5 = g −10 , x6 = g −12 = 1.

4.2. Seção “Grupos cı́clicos”.


(1) Seja x um elemento de ordem 24. Calcule a ordem de x22 , x201 ,
x402 , x611 e x1000 .

Temos n = o(x) = 24. Logo


• o(x22 ) = 24/(24, 22) = 24/2 = 12,
• o(x201 ) = 24/(24, 201) = 24/3 = 8,
• o(x402 ) = 24/(24, 402) = 24/6 = 4,
• o(x611 ) = 24/(24, 611) = 24/1 = 24,
• o(x1000 ) = 24/(24, 1000) = 24/8 = 3.

(2) Faça a lista dos elementos de C24 e calcule as ordens deles.

C24 = hgi onde o(g) = 24. Os elementos de C24 são


1, g, g 2 , g 3 , g 4 , g 5 , g 6 , g 7 , g 8 , g 9 , g 10 , g 11 , g 12 ,

g 13 , g 14 , g 15 , g 16 , g 17 , g 18 , g 19 , g 20 , g 21 , g 22 , g 23 .
Temos o(g k ) = 24/(24, k) logo
• Se (24, k) = 1, ou seja k é coprimo com 24, então o(g k ) = 24,
em outras palavras o(g) = 24, o(g 5 ) = 24, o(g 7 ) = 24, o(g 11 ) =
24, o(g 13 ) = 24, o(g 17 ) = 24, o(g 19 ) = 24, o(g 23 ) = 24.
• Se (24, k) = 2 então o(g k ) = 24/2 = 12, em outras palavras
o(g 2 ) = 12, o(g 10 ) = 12, o(g 14 ) = 12, o(g 22 ) = 12.
• Se (24, k) = 3 então o(g k ) = 24/3 = 8, em outras palavras
o(g 3 ) = 8, o(g 9 ) = 8, o(g 15 ) = 8, o(g 21 ) = 8.
64 2. GRUPOS

• Se (24, k) = 4 então o(g k ) = 24/4 = 6, em outras palavras


o(g 4 ) = 6, o(g 20 ) = 6.
• Se (24, k) = 6 então o(g k ) = 24/6 = 4, em outras palavras
o(g 6 ) = 4, o(g 18 ) = 4.
• Se (24, k) = 8 então o(g k ) = 24/8 = 3, em outras palavras
o(g 8 ) = 3, o(g 16 ) = 3.
• Se (24, k) = 12 então o(g k ) = 24/12 = 2, em outras palavras
o(g 12 ) = 2.
• Se (24, k) = 24 então o(g k ) = 24/24 = 1, em outras palavras
o(g 24 ) = 1 (de fato g 24 = 1).

(3) Conte os elementos de ordem 15 em C30 .

Escrevendo C30 = hgi = {1, g, g 2 , . . . , g 29 } temos que x = g k


tem ordem 15 se e somente se o(x) = 30/(30, k) = 15 ou seja
(30, k) = 2 ou seja k = 2, 4, 8, 14, 16, 22, 26, 28. Tem 8 elementos de
ordem 15.

(4) Conte os elementos de ordem 10 em C40 .

Escrevendo C40 = hgi = {1, g, g 2 , . . . , g 39 } temos que x = g k


tem ordem 10 se e somente se o(x) = 40/(40, k) = 10 ou seja
(40, k) = 4 ou seja k = 4, 12, 28, 36. Tem 4 elementos de ordem 10.

(5) Conte os elementos de ordem 15 em C15 .

Os elementos de C15 de ordem 15 são exatamente os geradores


de C15 (lembre-se que os geradores de hgi têm a forma g k com k
coprimo com n = o(g)), logo C15 contem exatamente ϕ(15) = 8
elementos de ordem 15.

(6) Conte os geradores de C32 .

C32 contem exatamente ϕ(32) = 16 geradores.

4.3. Seção “Ordem de um grupo”.


(1) Diga quais dos grupos multiplicativos seguintes são cı́clicos:
U (Z/5Z), U (Z/12Z), U (Z/16Z), U (Z/18Z), U (Z/22Z), U (Z/28Z).

Lembre-se que um grupo de ordem m é cı́clico se e somente


se contem um elemento de ordem m. Além disso, se G é um dos
grupos acima e x ∈ G então a ordem de x divide |G| logo podemos
4. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 65

nos restringir a verificar se xm = 1 apenas quando m é um divisor


de |G|.
• U5 = U (Z/5Z) = {1, 2, 3, 4} é um grupo de ordem 4. Temos
2 4
que 2 = 4 6= 1 e 2 = 1 logo o(2) = 4 = |U5 | daı́ U5 é cı́clico.
• U12 = U (Z/12Z) = {1, 5, 7, 11} é um grupo de ordem 4. Temos
2 2 2
que 5 = 1, 7 = 1, 11 = 1 logo U12 não é cı́clico, sendo
um grupo de ordem 4 sem elementos de ordem 4 (todos os
elementos diferentes de 1 têm ordem 2).
• U16 = U (Z/16Z) = {1, 3, 5, 7, 9, 11, 13, 15} é um grupo de or-
2 4
dem 8. Claramente o(1) = 1. Temos que 3 = 9 6= 1, 3 = 1
2 4 2
logo o(3) = 4, 5 = 9 6= 1 e 5 = 1 logo o(5) = 4, 7 = 1 logo
2 2 4 2
o(7) = 2, 9 = 1 logo o(9) = 2, 11 = 9 6= 1 e 11 = 9 = 1
2 2 4 2
logo o(11) = 4, 13 = −3 = 9 6= 1 e 13 = 9 = 1 logo
2 2
o(13) = 4, 15 = −1 = 1 logo o(15) = 2. Logo U16 não é
cı́clico, sendo um grupo de ordem 8 sem elementos de ordem
8 (todos os elementos de U16 têm ordem 1, 2 ou 4).
• U18 = U (Z/18Z) = {1, 5, 7, 11, 13, 17} é um grupo de ordem 6.
2 3 4 5
Temos 5 = 7 6= 1, 5 = 7 · 5 = 17 6= 1, 5 = 13 6= 1, 5 = 11,
6
5 = 1 logo o(5) = 6 daı́ U18 é cı́clico, sendo um grupo de
ordem 6 com um elemento de ordem 6.
• U22 = U (Z/22Z) = {1, 3, 5, 7, 9, 13, 15, 17, 19, 21} é um grupo
2 5
de ordem 10. Temos 3 = 9 6= 1, 3 = 1 logo o(3) = 5 (passei
de 2 a 5 direto porque estou considerando apenas os divisores
2 5 2 5
de |U22 | = 10), 5 = 3, 5 = 1 logo o(5) = 5, 7 = 5, 7 = 21
logo o(7) = 10, daı́ U22 é cı́clico porque é um grupo de ordem
10 com um elemento de ordem 10.
• U28 = U (Z/28Z) = {1, 3, 5, 9, 11, 13, 15, 17, 19, 23, 25, 27} é um
2
grupo de ordem 12. Claramente o(1) = 1. Temos 3 = 9 6= 1,
3 4 6 2
3 = 27, 3 = 25 6= 1, 3 = 1 logo o(3) = 6. Temos 5 = 25 6=
3 4 6
1, 5 = 13 6= 1, 5 = 9 6= 1, 5 = 1 logo o(5) = 6. Temos
2 3 2
9 = 25 6= 1, 9 = 1 logo o(9) = 3. Temos 11 = 9 6= 1,
3 4 6 2
11 = 15, 11 = 25, 11 = 1, logo o(11) = 6. Temos 13 = 1
logo o(13) = 2. Até agora mostramos que todos os elementos
1, 3, 5, 9, 11, 13 têm ordem 1, 2, 3 ou 6, em particular se a é
um qualquer deles então a6 = 1. Os outros elementos de U28
são 15 = −13, 17 = −11, 19 = −9, 23 = −5, 25 = −3,
27 = −1 logo eles são do tipo −a onde a é um dos elementos
já examinados. Como a6 = 1 temos (−a)6 = (−1)6 a6 = 1
também. Logo nenhum elemento de U28 tem ordem 12 = |U28 |,
o que implica que U28 não é cı́clico.
(2) Calcule as ordens aditivas dos elementos de Z/28Z e as ordens
multiplicativas dos elementos de U (Z/28Z).
66 2. GRUPOS

Ordens aditivas dos elementos de Z/28Z. Se trata de um grupo


cı́clico em notação aditiva, logo o(a) = 28/(a, 28). Segue que o(0) =
1, o(1) = 28, o(2) = 28/2 = 14, o(3) = 28, o(4) = 28/4 = 7,
o(5) = 28, o(6) = 28/2 = 14, o(7) = 28/7 = 4, o(8) = 28/4 = 7,
o(9) = 28, o(10) = 28/2 = 14, o(11) = 28, o(12) = 28/4 = 7,
o(13) = 28, o(14) = 28/14 = 2, o(15) = 28, o(16) = 28/4 = 7,
o(17) = 28, o(18) = 28/2 = 14, o(19) = 28, o(20) = 28/4 = 7,
o(21) = 28/7 = 4, o(22) = 28/2 = 14, o(23) = 28, o(24) = 28/4 =
7, o(25) = 28, o(26) = 28/2 = 14, o(27) = 28.

Ordens multiplicativas dos elementos de U (Z/28Z). É claro


que o(1) = 1. No exercı́cio anterior mostramos que o(3) = 6,
o(5) = 6, o(9) = 3, o(11) = 6, o(13) = 2. Temos (−a)2 = a2 logo
o(−a) = o(a) se o(a) for par, e o(−a) = 2o(a) se o(a) for impar.
Logo o(15) = o(−13) = 2, o(17) = o(−11) = 6, o(19) = o(−9) = 6,
o(23) = o(−5) = 6, o(25) = o(−3) = 6, o(27) = o(−1) = 2.

(3) Calcule 4120 mod 7 e 71000 mod 13. [Pode usar o pequeno teorema
de Fermat.]

Sabemos que ap−1 ≡ 1 mod p se o primo p não divide a. Logo


46 ≡ 1 mod 7 e 712 ≡ 1 mod 13. Sendo 120 = 6 · 20 temos
4 = (46 )20 = 120 ≡ 1 mod 7, e sendo 1000 = 12 · 83 + 4 obtemos
120

71000 = (712 )83 74 ≡ 74 = 492 ≡ 102 = 100 ≡ 9 mod 13.

(4) Encontre as soluções de x2 = 1 em Z/13Z. [Basta calcular x2 para


todo x ∈ Z/13Z e ver quais quadrados são 1.]
2 2
Os quadrados dos elementos de Z/13Z são 0 = 0, 1 = 1,
2 2 2 2 2 2 2 2
2 = 4, 3 = 9, 4 = 3, 5 = 12, 6 = 10, 7 = 10, 8 = 12, 9 = 3,
2 2 2
10 = 9, 11 = 4, 12 = 1. Logo as únicas soluções de x2 = 1 são 1
e 12.

(5) Encontre as soluções de x12 = x2 em Z/7Z.

É claro que x = 0 é uma solução, agora suponha x 6= 0. Pelo


pequeno teorema de Fermat x6 = 1 logo x12 = x6 · x6 = 1 · 1 = 1
daı́ a equação fica x2 = 1. Os quadrados dos elementos de Z/7Z
2 2 2 2 2 2
diferentes de 0 são 1 = 1, 2 = 4, 3 = 2, 4 = 2, 5 = 4, 6 = 1.
Logo as soluções da equação original são 0, 1, 6.
4. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 67

(6) Seja G = hgi um grupo cı́clico. Mostre que G é comutativo, ou


seja xy = yx para todo x, y ∈ G. [Todo elemento é uma potência
inteira de g...]

x e y são elementos de hgi = {g m : m ∈ Z} logo existem dois


inteiros a e b tais que x = g a e y = g b . Daı́ xy = g a g b = g a+b =
g b+a = g b g a = yx. O fato que a + b = b + a é simplesmente porque
a soma entre inteiros é comutativa.

(7) Seja p um número primo e seja G um grupo de ordem p. Mostre


que G é cı́clico. [Lembrando que x ∈ G implica que a ordem de x
divide |G|.]

Como G tem ordem p (ou seja, contem exatamente p elemen-


tos), e p é um número primo, p > 1, daı́ existe x ∈ G tal que x 6= 1.
Como o único elemento de ordem 1 é 1, temos então que o(x) 6= 1.
Por outro lado sabemos que o(x) divide |G| = p, que é um número
primo, logo a única possibilidade é que o(x) = p. Mas então G
contem um elemento de ordem |G| = p, logo G é cı́clico.

(8) Seja G um grupo de ordem 4. Mostre que G é comutativo, ou seja


que xy = yx para todo x, y ∈ G. [Escreva G = {1, a, b, c}. Então
ab ∈ G. Pode ser ab = a? Pode ser ab = b? Se ab = 1 pode ser
a2 = 1? Pode ser a2 = a? Etc.]

Como G tem quatro elementos e um deles é o elemento neutro,


podemos escrever G = {1, a, b, c} com 1, a, b, c dois a dois distintos
(notação multiplicativa). Se um dos elementos de G tem ordem
4 então G tem elementos de ordem 4 = |G| logo é cı́clico, em
particular comutativo (pelo exercı́cio acima). Logo podemos supor
o(x) 6= 4 para todo x ∈ G. Por outro lado se x ∈ G então o(x)
divide |G| = 4 logo as únicas possibilidades são o(x) = 1 e o(x) = 2,
em todo caso x2 = 1. Isso mostra que x2 = 1 para todo x ∈ G,
ou seja a2 = 1, b2 = 1, c2 = 1. Como 1 comuta com todos os
elementos, para mostrar que G é comutativo basta mostrar que
ab = ba, ac = ca e bc = cb. Vamos mostrar que ab = ba (a
demonstração de ac = ca e bc = cb é analoga). Para isso basta
mostrar que ab = c e ba = c. [No que segue usaremos que a2 = 1,
b2 = 1.] Se fosse ab = 1 então multiplicando a esquerda por a
obteriamos b = a absurdo; se fosse ab = a multiplicando a esquerda
por a obteriamos b = 1 absurdo; se fosse ab = b multiplicando a
direita por b obteriamos a = 1 absurdo. Logo a única possibilidade
é que ab = c. Se fosse ba = 1 então multiplicando a direita por
a obteriamos b = 1 absurdo; se fosse ba = a então multiplicando
a direita por a obteriamos b = 1 absurdo; se fosse ba = b então
68 2. GRUPOS

multiplicando a esquerda por b obteriamos a = 1 absurdo. Logo a


única possibilidade é que ba = c.

Uma estratégia mais simples era usar o fato que (se G não for
cı́clico) todo elemento x de G verifica x2 = 1 da forma seguinte: se
x, y são elementos de G então x2 = 1, y 2 = 1 e (xy)2 = 1, a última
relação pode ser escrita xyxy = 1. Multiplicando os dois lados
dessa igualdade a esquerda por x e a direita por y (e lembrando
que x2 = 1 e y 2 = 1) obtemos yx = xy.

(9) Seja G um grupo comutativo de ordem 15. Mostre que a função


f : G → G definida por f (x) := x2 é bijetiva. [Lembrando que
g ∈ G implica que a ordem de g divide |G|, ou seja g |G| = 1.]

Injetividade. Se f (x) = f (y) então x2 = y 2 e multiplicando


por y −2 a direita obtemos x2 y −2 = 1, como G é comutativo isso
significa (xy −1 )2 = 1. Logo xy −1 tem ordem 1 ou 2. Mas xy −1 não
pode ter ordem 2 pois o(xy −1 ) divide |G| = 15. Logo o(xy −1 ) = 1,
ou seja xy −1 = 1 e multiplicando a direita por y obtemos x = y.
Sobrejetividade. Se g é um elemento qualquer de G então
queremos encontrar x ∈ G tal que f (x) = g. Mas sabemos que
a ordem de g divide |G| = 15, logo g 15 = 1. Multiplicando por
g obtemos g 16 = g logo escolhendo x = g 8 obtemos f (x) = x2 =
(g 8 )2 = g 16 = g.

(10) Seja X um conjunto qualquer e considere G = P (X) com a operação


A4B = (A−B)∪(B −A) (diferença simétrica). Já vimos nas listas
passadas que G é um grupo. Calcule as ordens dos elementos de
G. Se trata de um grupo cı́clico? [Lembrando que um grupo G é
cı́clico se e somente se admite um elemento de ordem |G|.]

O elemento ∅ tem ordem 1 (é o elemento neutro). Se A 6= ∅


então A4A = ∅ logo A tem ordem 2. Isso mostra que todos os
elementos de G têm ordem 1 ou 2, logo G não é cı́clico se |G| >
2. Isso mostra que G é cı́clico se e somente se |G| = 2, e isso
acontece exatamente quando |X| = 1. De fato se X = {x} então
G = {∅, {x}} com a operação 4 é um grupo cı́clico de ordem 2.

5. Mais exercı́cios
Mais exercı́cios.
(1) Faça a lista dos elementos de C30 e calcule as ordens deles.
(2) Conte os elementos de ordem 13 em C45 .
(3) Conte os elementos de ordem 15 em C60 .
(4) Calcule as ordens dos elementos de C307 .
6. SUBGRUPOS 69

(5) Diga quais dos grupos multiplicativos seguintes são cı́clicos: U (Z/9Z),
U (Z/20Z), U (Z/40Z).
(6) Seja G um grupo cı́clico de ordem par, ou seja G = Cn com n par.
Mostre que G contem um único elemento de ordem 2. [Escreva
G = hgi, aı́ o(g k ) = 2 significa n/(n, k) = 2 ...]
(7) Seja G um grupo tal que x2 = 1 para todo x ∈ G. Mostre que G
é comutativo, ou seja que xy = yx para todo x, y ∈ G. [Considere
x, y ∈ G e observe que x2 = 1, y 2 = 1 e (xy)2 = 1.]
(8) Seja G um grupo comutativo de ordem m e seja n um inteiro po-
sitivo coprimo com m. Mostre que a função f : G → G dada por
f (x) = xn é bijetiva (veja a resolução da lista anterior, onde tem o
caso |G| = 15, n = 2).
[Injetiva: se f (x) = f (y) então xn = y n daı́ (xy −1 )n = 1 sendo
G comutativo, mas |G| = m é coprimo com n . . . Sobrejetiva: escre-
vendo am + bn = 1 com a, b inteiros, se g ∈ G temos g = g 1 = . . .]
(9) Sejam A e B dois grupos (notação multiplicativa). Defina uma
operação em G := A × B por
(a1 , b1 ) ? (a2 , b2 ) := (a1 a2 , b1 b2 )
Mostre que G com essa operação é um grupo de ordem |A| · |B|.
Mostre que C2 × C3 é um grupo cı́clico de ordem 6 e que C3 × C3
tem ordem 9 e não é cı́clico.

6. Subgrupos
Definição (Subgrupo). Um subconjunto H de um grupo G (notação
multiplicativa) é chamado de “subgrupo” de G se as seguintes condições
valem.
• 1 ∈ H;
• se h ∈ H então h−1 ∈ H;
• se h1 , h2 ∈ H então h1 h2 ∈ H.
Se H é um subgrupo de G escrevamos H ≤ G.
Observe que pela definição de subgrupo, se H ≤ G e h ∈ H então
hm ∈ H para todo inteiro m, de fato hm é um produto de alguns h (se m for
positivo) ou de alguns h−1 (se m for negativo), logo é obtido multiplicando
elementos de H.

Alguns exemplos.
• Se G é um grupo qualquer (notação multiplicativa) então
{1} ≤ G, G ≤ G.
• Se G é um grupo qualquer (notação multiplicativa) e g ∈ G então
hgi ≤ G.
70 2. GRUPOS

De fato 1 = g 0 ∈ hgi, se x = g k ∈ hgi então x−1 = g −k ∈ hgi, e se


x = g a ∈ hgi e y = g b ∈ hgi então xy = g a g b = g a+b ∈ hgi.
• Z ≤ Q ≤ R ≤ C (grupos aditivos). De fato se trata de uma cadeia
de grupos√ com a√mesma operação (a soma).
• H =√ {a 2 √+ b 3 : a,√ b ∈ Q} √ é um subgrupo
√ de √R. De fato
0=√ 0 2 +√0 3 ∈ √ H, −(a √2 + b 3) = (−a) 2 + (−b) 3 ∈ H e se
a1 2 + b1 3 e a2 2 + b2 3 são elementos de H então
√ √ √ √ √ √
(a1 2 + b1 3) + (a2 2 + b2 3) = (a1 + a2 ) 2 + (b1 + b2 ) 3 ∈ H.
• Se n é um inteiro qualquer então H = nZ = {nz : z ∈ Z} é
um subgrupo de Z (aditivo). De fato 0 (o elemento neutro de Z)
pertence a H sendo 0 = n · 0, se h = nz ∈ H então −h = −nz =
n(−z) ∈ H (logo os inversos dos elementos de H pertencem a H)
e se h = nz, k = nw são elementos de H (com z, w ∈ Z) então
h + k = nz + nw = n(z + w) ∈ H.
• N não é um subgrupo de Z, por exemplo 1 ∈ N mas −1 6∈ N (logo
N não contem os inversos dos seus elementos).
• A = {−2, −1, 0, 1, 2} não é um subgrupo de Z porque
1 ∈ A, 2 ∈ A mas 1 + 2 = 3 6∈ A.
• A = {−1, 0, 1} não é um subgrupo de Z porque
1 ∈ A mas 1 + 1 = 2 6∈ A.
O que queremos fazer agora é determinar todos os subgrupos do grupo
cı́clico Cn .
Proposição. Seja G = Cn (grupo cı́clico finito de ordem n, notação
multiplicativa). Os subgrupos de G são todos cı́clicos da forma hxd i onde
d é um inteiro que divide n, e hxd i tem ordem n/d. Além disso, para todo
divisor m de n, hxn/m i é o único subgrupo de G de ordem m.
Demonstração. Seja H um subgrupo de G = hxi = {1, x, x2 , . . . , xn−1 }.
Queremos mostrar que H = hxd i onde d divide n. Se H = {1} isso é claro,
basta escolher d = n, de fato H = {1} = h1i = hxn i. Suponha H 6= {1}.
Seja d o menor inteiro positivo tal que xd pertence a H. Para mostrar que
H = hxd i mostraremos as duas inclusões.
Primeira inclusão. Seja y = xk ∈ H um qualquer elemento de H. Quere-
mos mostrar que y ∈ hxd i. Fazendo a divisão com resto de k por d obtemos
−q
k = dq + r com 0 ≤ r < d mas xr = xk−dq = xk (xd ) pertence a H (pois é
produto de elementos de H), e isso implica que r = 0 por minimalidade de
q
d, logo y = xk = xdq = (xd ) ∈ hxd i. Isso mostra que H ⊆ hxd i.
Segunda inclusão. Seja y ∈ hxd i, queremos mostrar que y ∈ H. Temos
t
que y é uma potência de xd , logo podemos escrever y = (xd ) para algum in-
t
teiro t, mas xd ∈ H por definição logo (xd ) , obtido multiplicando elementos
de H, também pertence a H.
6. SUBGRUPOS 71

Isso mostra que H = hxd i. Como já visto, H = hxd i = hx(n,d) i logo
d = (n, d) (por minimalidade de d, pois 0 < (n, d) ≤ d), em outras palavras
d divide n (!) e |H| = |hxd i| = o(xd ) = n/(n, d) = n/d.
Se m divide n e H é um subgrupo de G de ordem m então podemos
escrever H = hxd i com d um divisor de n e m = |H| = |hxd i| = n/d logo
H = hxn/m i. Isso mostra que se H é um subgrupo de G de ordem m então
H = hxn/m i. Logo hxn/m i é o único subgrupo de G de ordem m. 

Alguns exemplos de subgrupos de grupos cı́clicos Cn , nos casos n = 12,


n = 7, n = 25, n = 27, n = 36 (aqui x indica um gerador do grupo Cn ).

C12 E C7 C25 C27


yy EE
yy EE
yy EE
yy E
hx2 i hx3 i {1} hx5 i hx3 i
z DD z
zz DD zz
zz DD zz
z DD z
zz zz
hx4 i hx6 i {1} hx9 i
DD
DD zz
DD zzz
DD z
zz
{1} {1}

C36 F
x FF
xx FF
xxx FF
xx F
hx2 i hx3 i
EE EE
yy EE yy EE
yyy EE yyy EE
y EE y EE
yy yy
hx4 i hx6 i hx9 i
EE y EE y
EE yy EE yy
EE yy EE yy
EE y EE y
yy yy
hx12 i hx18 i
EE
EE yy
EE yyy
EE y
yy
{1}

Lembre-se que o grupo multiplicativo G = U (Z/8Z) = {1, 3, 5, 7} (a


operação é o produto de classes) não é cı́clico (pois |G| = 4 mas G não tem
72 2. GRUPOS

elementos de ordem 4). Os subgrupos dele são:


GC
{{ CC
{{ CC
{{ CC
{{ C
h3i h5i h7i
AA
AA }}
AA }}}
AA }
}}
{1}
G tem ordem 4, {1} tem ordem 1, e h3i, h5i, h7i têm ordem 2 (sendo o(3) =
o(5) = o(7) = 2). Observe que G contem 3 subgrupos de ordem 2. Logo não
tem unicidade do subgrupo de uma dada ordem. Isso mostra que em geral
a proposição acima não vale para grupos não cı́clicos.
Corolario. Seja m um divisor de n. O grupo cı́clico G = Cn = hxi
contem exatamente ϕ(m) elementos de ordem m. Se trata dos geradores
de hxn/m i, ou seja dos elementos da forma xkn/m onde k ∈ {1, 2, . . . , m} é
coprimo com m.
Demonstração. Pela proposição acima H = hxn/m i é o único sub-
grupo de G de ordem m. Se y ∈ G tem ordem m então hyi é um subgrupo
de G de ordem m, daı́ hyi = H pela unicidade de H. Isso implica que y ∈ H.
Logo todos os elementos de G de ordem m pertencem a H. Por outro lado
H contem exatamente ϕ(m) elementos de ordem m (pois H é um grupo
cı́clico de ordem m). Logo G contem exatamente ϕ(m) elementos de ordem
m: se trata dos geradores de H. Como H = hxn/m i, os geradores de H têm
a forma xkn/m onde k ∈ {1, 2, . . . , m} é coprimo com m. 

Exercı́cios.
(1) Conte os subgrupos de C30 e de C105 .
[Dica: 30 = 2 · 3 · 5 e 105 = 3 · 5 · 7.]
(2) Conte os subgrupos de Z/48Z e de Z/405Z (grupos aditivos cı́clicos).
[Dica: 48 = 24 · 3 e 405 = 34 · 5.]
(3) Conte os subgrupos de U (Z/14Z) e de U (Z/30Z).
(4) Sejam p, q dois primos distintos. Conte os subgrupos de Cp2 q3 .
(5) Seja G um grupo abeliano (ou seja comutativo) e sejam x, y ∈ G.
Mostre que {xn y m : n, m ∈ Z} é um subgrupo de G.
(6) Sejam H, K dois subgrupos de um grupo G. Mostre que H ∩ K é
um subgrupo de G.
(7) Sejam H, K dois subgrupos de um grupo G. Mostre que H ∪K ≤ G
se e somente se H ⊆ K ou K ⊆ H.
(8) Seja G um grupo e seja g ∈ G. Mostre que H = {x ∈ G : xg = gx}
é um subgrupo de G.
(9) Seja H um subgrupo de Z (aditivo). Mostre que existe n ∈ Z tal
que H = nZ = {nz : z ∈ Z}. [Dica: no caso H 6= {0} seja n
7. TEOREMA DE LAGRANGE 73

o menor inteiro positivo pertencente a H. Mostre que n existe e


mostre as duas inclusões nZ ⊆ H e H ⊆ nZ.]
(10) Sejam hxa i, hxb i subgrupos de hxi = Cn onde a e b dividem n.
Mostre que hxa i ∩ hxb i = hxm i onde m é o menor múltiplo comum
entre a e b. [Dica: mostre as duas inclusões observando que y ∈
hxa i ∩ hxb i se e somente se y = xk onde k é um múltiplo tanto de
a quanto de b.] P
(11) Seja n um inteiro positivo. Mostre que d|n ϕ(d) = n (onde d|n
significa que d divide n, ou seja no somatório d varia no conjunto
de todos os divisores (positivos) de n). [Dica: no grupo cı́clico Cn
todo elemento tem uma (única) ordem, que é um divisor de n, e se
d é um divisor de n então Cn contem exatamente ϕ(d) elementos
de ordem d.]

7. Teorema de Lagrange
Teorema (Lagrange). Seja G um grupo finito e seja H ≤ G. Então
|H| divide |G|.
Demonstração. Considere a relação sobre G seguinte: x ∼ y se e
somente se x−1 y ∈ H. Se trata de uma relação de equivalência.
• Reflexiva: x ∼ x para todo x ∈ G sendo x−1 x = 1 ∈ H (sendo H
um subgrupo de G).
• Simétrica: se x ∼ y então x−1 y ∈ H logo H 3 (x−1 y)−1 = y −1 x
(sendo H um subgrupo de G) ou seja y ∼ x.
• Transitiva: se x ∼ y e y ∼ z então x−1 y ∈ H e y −1 z ∈ H logo
x−1 z = (x−1 y)(y −1 z) ∈ H (sendo H um subgrupo de G).
A classe de equivalência de x ∈ G é [x] = {y ∈ G : x ∼ y} = {y ∈
G : x−1 y ∈ H}. Mas x−1 y ∈ H significa que existe h ∈ H tal que
x−1 y = h, ou seja y = xh logo podemos escrever [x] = {xh : h ∈ H}
(um tal conjunto é chamado de “classe lateral de H”). Observe que se
h1 , h2 são elementos distintos de H então xh1 6= xh2 (pois se fossem iguais
multiplicando a esquerda por x−1 obteriamos h1 = h2 ) logo |[x]| = |H| para
todo x ∈ G, ou seja todas as classes de equivaência contêm |H| elementos.
Como as classes de equivalência formam uma partição de G segue que |H| (a
cardinalidade das classes de equivalência) divide |G|, mais especificamente
|G| = `|H| onde ` é o número de classes de equivalência. 

Um exemplo de aplicação do teorema de Lagrange é o caso do grupo


cı́clico: se Cn = hxi os subgrupos de Cn têm a forma hxd i onde d é um divisor
de n, e a ordem de hxd i é n/d, um divisor de n. Um outro exemplo visto é
U (Z/8Z) = {1, 3, 5, 7}, um grupo não cı́clico de ordem 4. Os subgrupos dele
são h1i, h3i, h5i, h7i, eles têm ordem 1, 2, 2 e 2. O teorema de Lagrange
nesse caso é simplesmente o fato que as ordens dos subgrupos dividem 4,
que é a ordem do grupo.
74 2. GRUPOS

Agora veremos um exemplo mais interessante.

Grupo simétrico.

Seja X um conjunto. Uma “permutação” de X é uma função bijetiva


f : X → X. Seja G o conjunto das permutações de X. Por exemplo se X =
{1, 2, 3} um elemento de G é uma função bijetiva f : {1, 2, 3} → {1, 2, 3}.
Usaremos a notação seguinte para indicar a função f nesse caso:
 
1 2 3
f (1) f (2) f (3)
Por exemplo
 a função
 f tal que f (1) = 2, f (2) = 1 e f (3) = 3 será indicada
1 2 3
por . O fato que f é bijetiva é traduzida no fato que a se-
2 1 3
gunda linha da matriz contem todos oselementos1, 2, 3 (e cada um aparece
1 2 3
exatamente uma vez). Por exemplo não é uma permutação
1 2 2
porque neste caso f (2) = 2 = f (3) logo f não é injetiva (2 e 3 têm a mesma
imagem), logo f não é bijetiva. Uma outra maneira de ver que essa f não
é bijetiva é observar que não existe nenhum x ∈ {1, 2, 3} tal que f (x) = 3,
logo f não é sobrejetiva.

Lembre-se que a composição de duas funções f, g : X →X é a função


1 2 3
f · g definida por (f · g)(x) := f (g(x)). Por exemplo se f = e
2 3 1
 
1 2 3
g= então f (g(1)) = f (2) = 3, f (g(2)) = f (1) = 2, f (g(3)) =
2 1 3
    
1 2 3 1 2 3 1 2 3
f (3) = 1, logo f g = = .
2 3 1 2 1 3 3 2 1
Proposição. Seja X um conjunto. Com a operação de composição de
funções, o conjunto G = Sym(X) é um grupo, o elemento neutro de G é a
função identidade id : X → X, ou seja a função definida por id(x) = x para
todo x ∈ X.
Demonstração. Duas funções α : X → X, β : X → X são iguais
exatamente quando α(x) = β(x) para todo x ∈ X. Logo para mostrar que
id · f = f e f · id = f para todo f ∈ G (ou seja que id é o elemento neutro
da operação de composição) precisamos mostrar que (id · f )(x) = f (x) para
todo x ∈ X e (f · id)(x) = f (x) para todo x ∈ X. Mas isso segue por
definição, pois (id · f )(x) = id(f (x)) = f (x) e (f · id)(x) = f (id(x)) = f (x).
Já vimos que a composição de funções bijetivas é bijetiva, isso mostra
que a composição é realmente uma operação binária do conjunto Sym(X).
A associatividade (f · g) · h = f · (g · h) segue calculando
((f · g) · h)(x) = (f · g)(h(x)) = f (g(h(x))),
7. TEOREMA DE LAGRANGE 75

(f · (g · h))(x) = f ((g · h)(x)) = f (g(h(x))).


Toda função bijetiva f : X → X tem uma função inversa, a função g = f −1 :
X → X definida por g(x) igual ao único elemento y ∈ X tal que f (y) = x
(função inversa). É claro que f −1 (f (x)) = x e f (f −1 (x)) = x para todo
x ∈ X, logo f · f −1 = id = f −1 · f . 

 
1 2 3
Uma maneira de visualizar o elemento de Sym({1, 2, 3})
2 3 1
é como rotação de 120 graus de um triângulo equilátero, por exemplo apli-
cando tal rotação duas vezes obtemos:

3> → 2> → 1>


>> >> >>
>> >> >>
>> >> >>
> > >
1 2 3 1 2 3

A rotaçãode 120 graus


 aplicada três vezes dá a identidade. Por isso, o
1 2 3
elemento tem ordem 3.
2 3 1
     
1 2 3 1 2 3 1 2 3
Defina 1 = , a = , b = , c =
1 2 3 1 3 2 3 2 1
     
1 2 3 1 2 3 1 2 3
,d= , aı́ = dd = d2 . Observe que
2 1 3 2 3 1 3 1 2

Sym({1, 2, 3}) = {1, a, b, c, d, d2 }.

Além disso, o(1) = 1, o(a) = 2, o(b) = 2, o(c) = 2, o(d) = 3, o(d2 ) = 3. Para


ver isso basta calcular as potências dos elementos, por exemplo
     
3 1 2 3 1 2 3 1 2 3 1 2 3
d = = = 1.
2 3 1 2 3 1 2 3 1 1 2 3

Os inversos são 1−1 = 1, a−1 = a, b−1 = b, c−1 = c, d−1 = d2 , (d2 )−1 = d.


Observe que Sym({1, 2, 3}) não é comutativo. De fato
   
1 2 3 1 2 3
ab = = d, ba = = d2
2 3 1 3 1 2

são diferentes.

Quais são os subgrupos de G = Sym({1, 2, 3})? Pelo teorema de La-


grange se H ≤ G então |H| divide |G| = 6 logo |H| = 1, 2, 3 ou 6. O único
subgrupo de ordem 1 é {1}, o único subgrupo de ordem 6 é G. Os outros
subgrupos têm ordem 2 ou 3, que em particular é um número primo, logo
eles são cı́clicos (lembre-se que já vimos que todo grupo de ordem prima é
76 2. GRUPOS

cı́clico). Isso implica que o diagrama dos subgrupos de G é o seguinte.

G BQQQ
{{ BB QQQ
{{ BB QQQ
{{ BB QQQ
{{ B QQQ
Q
hai hbi hci hdi
AA nn
AA }}} nnnnn
AA } n
AA }} nn
}n}nnnn
h1i

Observe que hd2 i não aparece pois hd2 i = hdi (sendo 2 coprimo com o(d) =
3). O grupo Sym({1, 2, 3}) tem ordem 6, ele admite um subgrupo de ordem
1 (ou seja h1i = {1}), três subgrupos de ordem 2 (ou seja hai = {1, a},
hbi = {1, b}, hci = {1, c}), um subgrupo de ordem 3 (ou seja hdi = {1, d, d2 })
e um subgrupo de ordem 6 (ou seja Sym({1, 2, 3})). Em total Sym({1, 2, 3})
contem 6 subgrupos. Eles têm ordens 1, 2, 2, 2, 3 e 6.

Em geral se X = {1, 2, . . . , n} então a ordem do grupo G = Sym(X) é


n · (n − 1) · (n − 2) · · · · · 3 · 2 · 1, que é indicado por n! e chamado de “n
fatorial”. Se trata do produto de todos os inteiros entre 1 e n, por exemplo
3! = 6, 4! = 24, 5! = 120. De fato, para construir uma permutação f de
{1, 2, . . . , n} temos n escolhas para f (1), n − 1 escolhas para f (2) (sendo
f (2) 6= f (1), sendo f injetiva), n − 2 escolhas para f (3) (sendo f (3) 6= f (1)
e f (3) 6= f (2), sendo f injetiva), etc.

Exercı́cios.
 
1 2 3 4
(1) Calcule a ordem de ∈ Sym({1, 2, 3, 4}).
2 3 4 1
 
1 2 3 4 5
(2) Calcule a ordem de ∈ Sym({1, 2, 3, 4, 5}).
2 3 1 5 4
(3) Faça um exemplo de elementos x, y de um grupo com x·y ·x−1 6= y.
(4) Sejam x e y elementos de um grupo. Mostre que o(y) = 3 se e
somente se o(xyx−1 ) = 3.
(5) Sejam x e y elementos de um grupo. Mostre que o(xy) = 3 se e
somente se o(yx) = 3.
(6) Seja H um subgrupo de um grupo G e seja g ∈ G.
Mostre que {ghg −1 : h ∈ H} é um subgrupo de G.
(7) Seja X um conjunto e seja G = Sym(X). Seja a ∈ X um elemento
fixado. Mostre que H = {f ∈ G : f (a) = a} é um subgrupo de
G. Mostre que se |X| = 3 então |H| = 2.
(8) Seja G = Sym({1, 2, 3, 4}) e H = {g ∈ G : g(3) = 3}. Mostre que
H é um subgrupo de G e que |H| = 6.
(9) Mostre que Sym({1, 2, 3, 4}) não contem subgrupos de ordem 16.
(10) Seja X um conjunto qualquer com |X| ≥ 3. Mostre que Sym(X)
não é comutativo.
8. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 77

8. Resolução listas de exercı́cios


8.1. Seção “Mais exercı́cios”.
(1) Faça a lista dos elementos de C30 e calcule as ordens deles.

Os elementos de C30 = hxi são


1, x, x2 , x3 , x4 , x5 , x6 , x7 , x8 , x9 , x10 ,
x11 , x12 , x13 , x14 , x15 , x16 , x17 , x18 , x19 , x20 ,
x21 , x22 , x23 , x24 , x25 , x26 , x27 , x28 , x29 .
A ordem de xk é 30/(30, k) logo o(xk ) = 30 para os k tais que
(30, k) = 1 ou seja k = 1, k = 7, k = 11, k = 13, k = 17, k = 19,
k = 23, k = 29; o(xk ) = 15 para os k tais que (30, k) = 2 ou seja
k = 2, k = 4, k = 8, k = 14, k = 16, k = 22, k = 26, k = 28;
o(xk ) = 10 para os k tais que (30, k) = 3 ou seja k = 3, k = 9,
k = 21, k = 27; o(xk ) = 6 para os k tais que (30, k) = 5 ou seja
k = 5, k = 25; o(xk ) = 10 para os k tais que (30, k) = 3 ou seja
k = 3, k = 9, k = 21, k = 27; o(xk ) = 5 para os k tais que
(30, k) = 6 ou seja k = 6, k = 12, k = 18, k = 24; o(xk ) = 3 para
os k tais que (30, k) = 10 ou seja k = 10, k = 20; o(xk ) = 2 para os
k tais que (30, k) = 15 ou seja k = 15, e o(xk ) = 1 para os k tais
que (30, k) = 30 ou seja k = 30 (que corresponde a x30 = 1).

(2) Conte os elementos de ordem 13 em C45 .

C45 não contem elementos de ordem 13 porque 13 não divide 45.


De fato, lembre-se que (em geral) se x ∈ G então o(x) é igual à
cardinalidade de H = hxi ≤ G e pelo teorema de Lagrange |H|
divide |G|.

(3) Conte os elementos de ordem 15 em C60 .

Escrevendo C60 = hxi, um elemento xk de C60 tem ordem 15


se e somente se 60/(60, k) = 15 ou seja (60, k) = 4, ou seja k = 4,
k = 8, k = 16, k = 28, k = 32, k = 44, k = 52, k = 56.

(4) Calcule as ordens dos elementos de C307 .

C307 = hxi é um grupo cı́clico de ordem 307. A ordem de um


elemento xk vale o(xk ) = 307/(307, k). Como 307 é um número
primo, (307, k) = 1 se k ∈ {1, . . . , 306}. Isso significa que o(1) = 1
e o(xk ) = 307 para todo xk 6= 1.

(5) Diga quais dos grupos multiplicativos seguintes são cı́clicos: U (Z/9Z),
U (Z/20Z), U (Z/40Z).
78 2. GRUPOS

Na resolução seguinte se a ∈ Z/nZ escreverei a no lugar de a


por abuso de notação.

• U9 = U (Z/9Z) = {1, 2, 4, 5, 7, 8} tem ordem 6. As potências


de 2 são 22 = 4, 23 = 8, 24 = 7, 25 = 5, 26 = 1 logo 2 tem
ordem 6, que é igual à ordem de U9 , logo U9 é cı́clico.
• U20 = U (Z/20Z) = {1, 3, 7, 9, 11, 13, 17, 19} tem ordem 8. Se
trata de um grupo de ordem 8 logo (pelo teorema de Lagrange)
as ordens possı́veis dos elementos dele são 1, 2, 4 ou 8. Temos
32 = 9, 34 = 1 logo o(3) = 4; 72 = 9, 74 = 1 logo o(7) = 4;
92 = 1 logo o(9) = 2; agora podemos observar que 114 =
(−9)4 = 94 = 1, 134 = (−7)4 = 74 = 1, 174 = (−3)4 = 34 = 1,
e 194 = (−1)4 = 14 = 1. Logo nenhum elemento de U20 tem
ordem |U20 | = 8. Isso mostra que U20 não é cı́clico.
• U40 = U (Z/40Z) é igual a

{1, 3, 7, 9, 11, 13, 17, 19, 21, 23, 27, 29, 31, 33, 37, 39},

ele tem ordem 16. Logo os elementos dele têm ordem 1, 2,


4, 8 ou 16. Temos o(1) = 1; 32 = 9, 34 = 92 = 1; 72 = 9,
74 = 92 = 1; 92 = 81 = 1; 112 = 121 = 1; 132 = 9, 134 =
92 = 1; 172 = 289 = 9, 174 = 92 = 1; 192 = 361 = 1. Até
agora todos os elementos examinados a verificam a4 = 1. Os
demais elementos têm a forma −a onde a é um dos elementos
já examinados, logo para eles vale (−a)4 = a4 = 1. Isso mostra
que as ordens dos elementos de U40 são 1, 2 e 4, em particular
U40 é um grupo de ordem 16 sem elementos de ordem 16, logo
não é cı́clico.

(6) Seja G um grupo cı́clico de ordem par, ou seja G = Cn com n par.


Mostre que G contem um único elemento de ordem 2. [Escreva
G = hgi, aı́ o(g k ) = 2 significa n/(n, k) = 2 ...]

Temos G = {1, g, g 2 , . . . , g n−1 }. Se um elemento g k ∈ G (com


k ∈ {0, 1, . . . , n−1}) tem ordem 2 então o(g k ) = 2 logo n/(n, k) = 2
daı́ (n, k) = n/2. Por outro lado (n, k) divide k logo n/2 divide k.
Os únicos inteiros k ∈ {0, 1, . . . , n − 1} divisı́veis por n/2 são 0
e n/2. Logo g k = 1 ou g k = g n/2 . Desses dois elementos 1 tem
ordem 1 e g n/2 tem ordem 2. Logo o único elemento de G de
ordem 2 é g n/2 . Uma maneira mais rápida para resolver o exercı́cio
era observar que como 2 divide n (sendo n par), o grupo cı́clico Cn
contem exatamente ϕ(2) elementos de ordem 2, e ϕ(2) = 1.
8. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 79

(7) Seja G um grupo tal que x2 = 1 para todo x ∈ G. Mostre que G


é comutativo, ou seja que xy = yx para todo x, y ∈ G. [Considere
x, y ∈ G e observe que x2 = 1, y 2 = 1 e (xy)2 = 1.]

Sejam x, y ∈ G. Queremos mostrar que xy = yx. Por hipótese


x2 = 1, y 2 = 1 e (xy)2 = 1. A terceira condição é equivalente a
xyxy = 1. Multiplicando os dois lados de tal igualdade a esquerda
por x e a direita por y obtemos xxyxyy = xy e lembrando que
x2 = xx = 1 e y 2 = yy = 1 obtemos yx = xy.

(8) Seja G um grupo comutativo de ordem m e seja n um inteiro po-


sitivo coprimo com m. Mostre que a função f : G → G dada por
f (x) = xn é bijetiva (veja a resolução da lista anterior, onde tem o
caso |G| = 15, n = 2).
[Injetiva: se f (x) = f (y) então xn = y n daı́ (xy −1 )n = 1 sendo
G comutativo, mas |G| = m é coprimo com n . . . Sobrejetiva: escre-
vendo am + bn = 1 com a, b inteiros, se g ∈ G temos g = g 1 = . . .]

Mostraremos que f é injetiva. Suponha f (x) = f (y). Então


xn = y n , daı́ multiplicando a direita por y −n obtemos xn y −n =
1, e como G é comutativo xn y −n = (xy −1 )n , logo (xy −1 )n = 1.
Isso implica que o(xy −1 ) divide n. Por outro lado xy −1 ∈ G logo
o(xy −1 ) divide |G| = m também. Logo o(xy −1 ) divide n e m, logo
divide (n, m). Mas como n e m são coprimos, (n, m) = 1, daı́
o(xy −1 ) divide 1, ou seja o(xy −1 ) = 1. O único elemento de ordem
1 é o elemento neutro, logo xy −1 = 1, e multiplicando a direita por
y obtemos x = y.
Mostraremos que f é sobrejetiva. Seja g ∈ G, queremos en-
contrar x ∈ G tal que f (x) = g. Como n e m são coprimos, pelo
algoritmo de Euclides existem inteiros a, b tais que am + bn = 1.
Se g ∈ G é um elemento qualquer então g = g 1 = g am+bn =
(g a )m (g b )n = (g b )n sendo (g a )m = 1 porque m = |G| e g a ∈ G.
Logo escolhendo x = g b temos f (x) = (g b )n = g.

(9) Sejam A e B dois grupos (notação multiplicativa). Defina uma


operação em G := A × B por

(a1 , b1 ) ? (a2 , b2 ) := (a1 a2 , b1 b2 )

Mostre que G com essa operação é um grupo de ordem |A| · |B|.


Mostre que C2 × C3 é um grupo cı́clico de ordem 6 e que C3 × C3
tem ordem 9 e não é cı́clico.
80 2. GRUPOS

A associatividade segue da associatividade da operação em A e


B, de fato
(a1 , b1 ) ? ((a2 , b2 ) ? (a3 , b3 )) = (a1 , b1 ) ? (a2 a3 , b2 b3 )
= (a1 (a2 a3 ), b1 (b2 b3 ))
= ((a1 a2 )a3 , (b1 b2 )b3 )
= (a1 a2 , b1 b2 ) ? (a3 , b3 )
= ((a1 , b1 ) ? (a2 , b2 )) ? (a3 , b3 ).
Chamados de 1A o elemento neutro de A e de 1B o elemento neu-
tro de B, o elemento neutro de A × B é (1A , 1B ), de fato (a, b) ?
(1A , 1B ) = (a1A , b1B ) = (a, b) e (1A , 1B ) ? (a, b) = (1A a, 1B b) =
(a, b) para todo (a, b) ∈ A × B.
O inverso de (a, b) é (a−1 , b−1 ), de fato (a, b) ? (a−1 , b−1 ) =
(aa , bb−1 ) = (1A , 1B ) e (a−1 , b−1 )(a, b) = (a−1 a, b−1 b) = (1A , 1B ).
−1

Isso mostra que A×B é um grupo. Para construir um elemento


(a, b) de A × B tem |A| escolhas para a e |B| escolhas para b logo
|A × B| = |A| · |B|. Logo |C2 × C3 | = 2 · 3 = 6 e |C3 × C3 | = 3 · 3 = 9.
Para mostrar que C2 × C3 é cı́clico precisamos mostrar que ele
contem elementos de ordem 6. Escrevendo C2 = hxi e C3 = hyi,
os elementos de C2 × C3 são (1, 1), (1, y), (1, y 2 ), (x, 1), (x, y),
(x, y 2 ). Vamos mostrar que (x, y) tem ordem 6. As potências dele
são (x, y)1 = (x, y) 6= (1, 1); (x, y)2 = (x2 , y 2 ) = (1, y 2 ) 6= (1, 1);
(x, y)3 = (x3 , y 3 ) = (x, 1) 6= (1, 1); (x, y)4 = (x4 , y 4 ) = (1, y) 6=
(1, 1); (x, y)5 = (x5 , y 5 ) = (x, y 2 ) 6= (1, 1); (x, y)6 = (x6 , y 6 ) =
(1, 1). Logo (x, y) tem ordem 6.
O grupo C3 × C3 tem ordem 9. Escrevendo C3 = hyi os ele-
mentos de C3 × C3 são (y a , y b ) onde a, b ∈ {0, 1, 2}. As ordens
possı́veis de um elemento (y a , y b ) são os divisores de 9, ou seja 1,
3 e 9. Para mostrar que C3 × C3 não é cı́clico basta então mostrar
que (y a , y b )3 = (1, 1) para todo a, b. Lembrando que y 3 = 1 temos
(y a , y b )3 = (y 3a , y 3b ) = ((y 3 )a , (y 3 )b ) = (1a , 1b ) = (1, 1).

8.2. Seção “Subgrupos”.


(1) Conte os subgrupos de C30 e de C105 .
[Dica: 30 = 2 · 3 · 5 e 105 = 3 · 5 · 7.]

Os divisores de 30 são do tipo 2a 3b 5c onde a, b, c ∈ {0, 1} logo


30 tem 8 divisores, especificamente os divisores de 30 são 1, 2, 3,
5, 2 · 3 = 6, 2 · 5 = 10, 3 · 5 = 15, 2 · 3 · 5 = 30. Sabemos que C30
contem exatamente um subgrupo de ordem d para todo divisor d
de 30. Logo C30 contem exatamente 8 subgrupos.
Os divisores de 105 são do tipo 3a 5b 7c onde a, b, c ∈ {0, 1} logo
105 tem 8 divisores, especificamente os divisores de 105 são 1, 3, 5,
8. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 81

7, 3 · 5 = 15, 3 · 7 = 21, 5 · 7 = 35, 3 · 5 · 7 = 105. Sabemos que C105


contem exatamente um subgrupo de ordem d para todo divisor d
de 105. Logo C105 contem exatamente 8 subgrupos. O diagrama
dos subgrupos é parecido com o de C30 .
Segue o diagrama dos subgrupos de C30 = hxi.

hxi
DD
{{ DD
{{{ DD
{{ DD
{{ DD
{ DD
{{ DD
{{{ DD
{{ D
hx2 i hx3 i hx5 i
CC DD
CC {{ DD {{
CC {{{ DD {{{
CC {{ DD {{
C{C{ D{D{
{{{ CCC {{{ DDD
{ CC { DD
{{ CC {{ DD
{{ {{
hx6 i hx10 i hx15 i
CC
CC zz
CC zzz
CC zz
CC zz
CC z
CC zz
CC zzz
C zz
h1i

(2) Conte os subgrupos de Z/48Z e de Z/405Z (grupos aditivos cı́clicos).


[Dica: 48 = 24 · 3 e 405 = 34 · 5.]

Os divisores de 48 são do tipo 2a 3b com a ∈ {0, 1, 2, 3, 4} e


b ∈ {0, 1} logo 48 tem 10 divisores (tendo 5 escolhas para a e 2
escolhas para b), especificamente os divisores de 48 são 1, 2, 3,
22 = 4, 23 = 8, 24 = 16, 2 · 3 = 6, 22 · 3 = 12, 23 · 3 = 24, 24 · 3 = 48.
Sabemos que o grupo aditivo cı́clico Z/48Z = h1i = {0, 1, 2, . . . , 47}
contem exatamente um subgrupo de ordem d para todo divisor d
de 48. Logo Z/48Z contem exatamente 10 subgrupos. Segue o
82 2. GRUPOS

diagrama dos subgrupos de Z/48Z.


h1i
{ AA
{{ AA
{{ AA
{ AA
{{
h2i h3i
CC
zz CC }}
zzz CC }}}
z CC }
zz }}
h4i h6i
DD
{{ DD {{
{{{ DD {{{
{ DD {
{{ {{
h8i h12i
CC
{{
{ CC zz
{{ CC zzz
{ CC z
{{ zz
h16i h24i
CC
CC {{
CC {{{
CC {
{{
h0i

Os divisores de 405 são do tipo 3a 5b com a ∈ {0, 1, 2, 3, 4} e b ∈


{0, 1} logo 405 tem 10 divisores (tendo 5 escolhas para a e 2 esco-
lhas para b), especificamente os divisores de 405 são 1, 3, 5, 32 = 9,
33 = 27, 34 = 81, 3 · 5 = 15, 32 · 5 = 45, 33 · 5 = 135, 34 · 5 = 405. Sa-
bemos que o grupo aditivo cı́clico Z/405Z = h1i = {0, 1, 2, . . . , 404}
contem exatamente um subgrupo de ordem d para todo divisor d de
405. Logo Z/405Z contem exatamente 10 subgrupos. O diagrama
dos subgrupos é parecido com o de Z/48Z.

(3) Conte os subgrupos de U (Z/14Z) e de U (Z/30Z).

Temos que U (Z/14Z) = {1, 3, 5, 9, 11, 13} é um grupo de ordem


6, ele é cı́clico porque 32 = 9 6= 1 e 33 = 27 = 13 6= 1 logo
o(3) = 6 (pois a ordem de 3 divide 6). O grupo cı́clico de ordem
6 contem exatamente um subgrupo de ordem cada divisor de 6,
e sendo 6 = 2 · 3, 6 admite 4 divisores (ou seja 1, 2, 3, 6) logo
U (Z/14Z) contem exatamente 4 subgrupos (se trata dos únicos
subgrupos de ordens 1, 2, 3, 6, ou seja h1i, h13i, h9i, h3i).

[Exercı́cio mais difı́cil] Contaremos agora os subgrupos de


U (Z/30Z). Temos que
G = U (Z/30Z) = {1, 7, 11, 13, 17, 19, 23, 29}
é um grupo de ordem 8, o(1) = 1, o(7) = 4, o(11) = 2, o(13) = 4,
o(17) = 4, o(19) = 2, o(23) = 4, o(29) = 2. Observe que isso
implica que G não é cı́clico (porque |G| = 8 mas G não contem
8. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 83

elementos de ordem 8). Em particular não podemos dizer que o


número de subgrupos de G é igual ao número de divisores de |G|
(porque isso valeria só se G fosse cı́clico). A tabela da multiplicação
de G é a seguinte.

∗ 1 7 11 13 17 19 23 29
1 1 7 11 13 17 19 23 29
7 7 19 17 1 29 13 11 23
11 11 17 1 23 7 29 13 19
13 13 1 23 19 11 7 29 17
17 17 29 7 11 19 23 1 13
19 19 13 29 7 23 1 17 11
23 23 11 13 29 1 17 19 7
29 29 23 19 17 13 11 7 1

Seja H um subgrupo qualquer de G. Sabemos que |H| divide


|G| = 8 pelo teorema de Lagrange, logo |H| é igual a 1, 2, 4 ou 8.
Se |H| = 1 então H = {1}, se |H| = 8 então H = G (se trata dos
subgrupos “triviais”). Se |H| = 2 então H tem a forma {1, a} com
o(a) = 2 (H é cı́clico de ordem 2), logo o número de subgrupos
de ordem 2 é igual ao número de elementos de ordem 2, ou seja
G contem 3 subgrupos de ordem 2. Agora suponha |H| = 4. Se
H contem um elemento de ordem 4 então é cı́clico, gerado por um
elemento de ordem 4, logo tem duas possibilidades: H = h7i = h13i
e H = h17i = h23i. Agora suponha H não cı́clico. As ordens
dos elementos de H dividem |H| = 4 logo os elementos de H têm
ordem 1, 2 ou 4, por outro lado como H não é cı́clico H não contem
elementos de ordem 4, logo todos os elementos não triviais de H
têm ordem 2. Mas G contem exatamente 3 elementos de ordem 2,
que são 11, 19 e 29, logo a única possibilidade é H = {1, 11, 19, 29}.
Se trata de um subgrupo de G, a tabela da multiplicação é

∗ 1 11 19 29
1 1 11 19 29
11 11 1 29 19
19 19 29 1 11
29 29 19 11 1
84 2. GRUPOS

Logo G contem exatamente 1 + 1 + 3 + 2 + 1 = 8 subgrupos. O


diagrama dos subgrupos é o seguinte.

GF
x FF
xx FF
xxx FF
x F
xx
h7i HD h17i
DD z DD
DD zzz DD zzz
zDD zD
z
z DD zz DDD
zz zz
h11i h19i h29i
DD z
DD zz
DD zz
DD z
zz
h1i

(4) Sejam p, q dois primos distintos. Conte os subgrupos de Cp2 q3 .

p2 q 3 admite 3 · 4 = 12 divisores, os números da forma pa q b onde


a ∈ {0, 1, 2} e b ∈ {0, 1, 2, 3}. Logo Cp2 q3 admite exatamente 12
subgrupos. Segue o diagrama dos subgrupos de Cp2 q3 = hxi.

hxi I
u II
uu II
uuu II
u II
uu
hxp i hxq i
w HH v HH
ww HH vv HH
ww HH vv HH
w HH vv HH
ww H vv
2 2
hxp i hxpq i hxq i
FF HH FF
FF vv HH ww FF
FF vvv HH
HH www FF
FF vv w FF
vv H ww
2 2 3
hxp q i hxpq i hxq i
HH v GG
HH vv GG xx
HH
HH vvv GG xxx
v GG x
H vv xx
2 q2 3
hxp i hxpq i
HH
HH vv
HH
HH vvv
HH vv
vv
h1i

(5) Seja G um grupo abeliano (ou seja comutativo) e sejam x, y ∈ G.


Mostre que {xn y m : n, m ∈ Z} é um subgrupo de G.

Seja H = {xn y m : n, m ∈ Z}. 1 ∈ H pois 1 = x0 y 0 . Se xn y m ∈


H então sendo G abeliano, (xn y m )−1 = y −m x−n = x−n y −m ∈ H.
8. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 85

Se xn y m ∈ H e xh y k ∈ H então sendo G abeliano, (xn y m )(xh y k ) =


xn+h y m+k ∈ H.

(6) Sejam H, K dois subgrupos de um grupo G. Mostre que H ∩ K é


um subgrupo de G.

Usaremos a notação multiplicativa. 1 ∈ H ∩ K porque 1 ∈ H


e 1 ∈ K (sendo H e K subgrupos), se x ∈ H ∩ K então x ∈ H
logo x−1 ∈ H sendo H subgrupo, e x ∈ K logo x−1 ∈ K sendo K
subgrupo, isso implica que x−1 ∈ H ∩ K. Se x, y ∈ H ∩ K então
x, y ∈ H logo xy ∈ H sendo H subgrupo, e x, y ∈ K logo xy ∈ K
sendo K subgrupo, logo xy ∈ H ∩ K.

(7) Sejam H, K dois subgrupos de um grupo G. Mostre que H ∪K ≤ G


se e somente se H ⊆ K ou K ⊆ H.

Primeira implicação (⇒). Suponha H ∪ K ≤ G e por con-


tradição H 6⊆ K e K 6⊆ H. Então existem h ∈ H − K e k ∈ K − H.
Temos h ∈ H ∪ K, k ∈ H ∪ K e H ∪ K é um subgrupo (por
hipótese) logo hk ∈ H ∪ K. Isso significa que hk ∈ H ou hk ∈ K.
No primeiro caso hk ∈ H, logo sendo h−1 ∈ H (pois h ∈ H) te-
mos h−1 (hk) ∈ H, ou seja k ∈ H, contradição. No segundo caso
hk ∈ K, logo sendo k −1 ∈ K (pois k ∈ K) temos (hk)k −1 ∈ K, ou
seja h ∈ K, contradição.
Segunda implicação (⇐). Se H ⊆ K então H ∪ K = K, e se
K ⊆ H então H ∪K = H, logo nos dois casos H ∪K é um subgrupo
de G (é igual a K no primeiro caso, a H no segundo).

(8) Seja G um grupo e seja g ∈ G. Mostre que H = {x ∈ G : xg = gx}


é um subgrupo de G.

1 ∈ H pois 1g = g = g1. Se x ∈ G então x−1 g = x−1 gxx−1 =


x−1 xgx−1 = gx−1 logo x−1 ∈ H. Se x, y ∈ H então xg = gx e
yg = gy logo xyg = xgy = gxy logo xy ∈ H.

(9) Seja H um subgrupo de Z (aditivo). Mostre que existe n ∈ Z tal


que H = nZ = {nz : z ∈ Z}. [Dica: no caso H 6= {0} seja n
o menor inteiro positivo pertencente a H. Mostre que n existe e
mostre as duas inclusões nZ ⊆ H e H ⊆ nZ.]

Se H = {0} então H = 0Z e o resultado vale. Suponha agora


H 6= {0}. Com certeza H contem inteiros positivos, porque se
m ∈ H diferente de zero for negativo então −m ∈ H (pois H é
subgrupo de Z) e −m > 0. Logo existe o menor inteiro positivo
86 2. GRUPOS

pertencente a H, indicamos ele por n. Para mostrar que H = nZ


mostraremos as duas inclusões.
Primeira inclusão: H ⊆ nZ. Seja h ∈ H, queremos mostrar
que h ∈ nZ, ou seja que n divide h. Efetuando a divisão com resto
de h por n obtemos h = nq + r com q, r inteiros e 0 ≤ r < n. Mas
é claro que h ∈ H e −nq ∈ H (sendo n ∈ H e H um subgrupo de
Z) logo r = h − nq ∈ H, e isso implica r = 0 por minimalidade de
n (sendo 0 ≤ r < n). Logo h = nq, ou seja n divide h.
Segunda inclusão: nZ ⊆ H. Seja nz ∈ nZ. Como n ∈ H e nz é
uma potência (aditiva) de n, nz ∈ H pois H é um subgrupo de Z.

(10) Sejam hxa i, hxb i subgrupos de hxi = Cn onde a e b dividem n.


Mostre que hxa i ∩ hxb i = hxm i onde m é o menor múltiplo comum
entre a e b. [Dica: mostre as duas inclusões observando que y ∈
hxa i ∩ hxb i se e somente se y = xk onde k é um múltiplo tanto de
a quanto de b.]

Para mostrar que hxa i ∩ hxb i = hxm i mostraremos as duas in-


clusões hxa i ∩ hxb i ⊆ hxm i e hxm i ⊆ hxa i ∩ hxb i.
Primeira inclusão. Seja y ∈ hxa i ∩ hxb i. Queremos mostrar que
y ∈ hxm i. Sabemos que y pode ser escrito como xah e também
como xbk com h e k inteiros. Para mostrar que y é uma potência
de xm basta então mostrar que a divide bk (pois nesse caso a e b
dividem bk logo m também divide bk logo y = xbk é uma potência
de xm ). Pelo fato que xah = y = xbk obtemos que ah ≡ bk mod n
onde n = o(x), e sabemos que a divide n, logo a divide n, que
divide ah − bk logo a divide bk.
Segunda inclusão. Seja y ∈ hxm i ou seja y = xmt com t inteiro.
Queremos mostrar que y ∈ hxa i ∩ hxb i. Isso é claro pois m é um
múltiplo de a e de b logo podemos escrever m = ah e também m =
bk com h e k inteiros oportunos, daı́ y = xmt = xaht = (xa )ht ∈ hxa i
e y = xmt = xbkt = (xb )kt ∈ hxb i.
P
(11) Seja n um inteiro positivo. Mostre que d|n ϕ(d) = n (onde d|n
significa que d divide n, ou seja no somatório d varia no conjunto
de todos os divisores (positivos) de n). [Dica: no grupo cı́clico Cn
todo elemento tem uma (única) ordem, que é um divisor de n, e se
d é um divisor de n então Cn contem exatamente ϕ(d) elementos
de ordem d.]
S
O grupo Cn admite uma partição Cn = d|n Xd onde Xd é o
conjunto dos elementos de Cn de ordem d (se trata de uma
Ppartição
pois todo elemento tem uma única ordem!). Logo |Cn | = d|n |Xd |.
P
Mas sabemos que |Cn | = n e |Xd | = ϕ(d). Logo n = d|n ϕ(d).
8. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 87

8.3. Seção “Teorema de Lagrange”.


 
1 2 3 4
(1) Calcule a ordem de ∈ Sym({1, 2, 3, 4}).
2 3 4 1
   
1 2 3 4 1 2 3 4
Seja x = . Temos x2 = , x3 =
2 3 4 1 3 4 1 2
   
2 1 2 3 4 4 3 1 2 3 4
x x = , x = x x = = 1. Logo
4 1 2 3 1 2 3 4
o(x) = 4.
 
1 2 3 4 5
(2) Calcule a ordem de ∈ Sym({1, 2, 3, 4, 5}).
2 3 1 5 4
   
1 2 3 4 5 2 1 2 3 4 5
Seja x = . Temos x = ,
2 3 1 5 4 3 1 2 4 5
   
1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
x3 = x2 x = , x4 = x3 x = ,
1 2 3 5 4 2 3 1 4 5
   
1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
x5 = x4 x = , x6 = x5 x = =
3 1 2 5 4 1 2 3 4 5
1. Logo o(x) = 6.

(3) Faça um exemplo de elementos x, y de um grupo com x·y ·x−1 6= y.

Observe que xyx−1 6= y é equivalente a xy 6= yx (basta multi-



1 2 3
plicar à direita por x). Tomando os elementos x = ,
1 3 2
 
1 2 3
y= no grupo simétrico Sym({1, 2, 3}) temos x−1 = x
3 2 1
(sendo o(x) = 2) e xyx−1 = xyx é igual a
     
1 2 3 1 2 3 1 2 3 1 2 3
= ,
1 3 2 3 2 1 1 3 2 2 1 3
é diferente de y.

(4) Sejam x e y elementos de um grupo. Mostre que o(y) = 3 se e


somente se o(xyx−1 ) = 3.

Primeira implicação. Suponha o(y) = 3, queremos mostrar


que o(xyx−1 ) = 3. Sendo 3 primo, para isso basta mostrar que
xyx−1 6= 1 e (xyx−1 )3 = 1. Se fosse xyx−1 = 1 então multiplicando
a esquerda por x−1 e a direita por x obteriamos y = x−1 x = 1 e
isso contradiz a hipótese o(y) = 3. Sendo o(y) = 3 temos y 3 = 1
logo
(xyx−1 )3 = xyx−1 xyx−1 xyx−1 = xyyyx−1 = xy 3 x−1 = xx−1 = 1.
88 2. GRUPOS

Segunda implicação. Suponha o(xyx−1 ) = 3, queremos mostrar


que o(y) = 3. Sendo 3 primo, para isso basta mostrar que y 6= 1
e y 3 = 1. Se y = 1 então xyx−1 = xx−1 = 1 o que contradiz
o(xyx−1 ) = 3, logo y 6= 1. Como (xyx−1 )3 = 1 temos
y 3 = x−1 (xyx−1 )(xyx−1 )(xyx−1 )x = x−1 (xyx−1 )3 x = x−1 x = 1.

(5) Sejam x e y elementos de um grupo. Mostre que o(xy) = 3 se e


somente se o(yx) = 3.

As duas implicações são analogas (é só trocar x e y), logo mos-
traremos apenas a primeira implicação. Suponha o(xy) = 3. Que-
remos mostrar que o(yx) = 3, ou seja (sendo 3 primo) que yx 6= 1
e (yx)3 = 1. Se yx = 1 então y = x−1 logo xy = 1 e isso contradiz
o fato que o(xy) = 3. Sendo (xy)3 = 1 temos
(yx)3 = yxyxyx = x−1 (xyxyxy)x = x−1 (xy)3 x = x−1 x = 1.
Uma outra maneira para resolver o exercı́cio era usar o exercı́cio
anterior observando que yx = x−1 (xy)x.

(6) Seja H um subgrupo de um grupo G e seja g ∈ G.


Mostre que {ghg −1 : h ∈ H} é um subgrupo de G.

Seja K = {ghg −1 : h ∈ H}. Queremos mostrar que K ≤


G. Temos 1 ∈ K pois 1 = g1g −1 e 1 ∈ H (sendo H ≤ G). Se
ghg −1 ∈ K então (ghg −1 )−1 = gh−1 g −1 ∈ K pois h−1 ∈ H (sendo
H ≤ G). Se gh1 g −1 ∈ K e gh2 g −1 ∈ K com h1 , h2 ∈ H então
(gh1 g −1 )(gh2 g −1 ) = gh1 h2 g −1 ∈ K pois h1 h2 ∈ H (sendo H ≤ G).

(7) Seja X um conjunto e seja G = Sym(X). Seja a ∈ X um elemento


fixado. Mostre que H = {f ∈ G : f (a) = a} é um subgrupo de
G. Mostre que se |X| = 3 então |H| = 2.

Precisamos verificar os três axiomas de subgrupo. Temos id ∈


H pois id(a) = a. Se f ∈ H então f (a) = a logo aplicando a
função inversa (que existe porque f é bijetiva) obtemos f −1 (f (a)) =
f −1 (a) ou seja f −1 (a) = a logo f −1 ∈ H. Se f, g ∈ H então
f (a) = a, g(a) = a logo (f g)(a) = f (g(a)) = f (a) = a, e isso mostra
que f g ∈ H. Se |X| = 3 então X = {a, b, c} com a6= b 6= c 6= a logo

a b c a b c
H = {f ∈ Sym(X) : f (a) = a} = { , }
a b c a c b
logo |H| = 2 (H é um grupo cı́clico de ordem 2).

(8) Seja G = Sym({1, 2, 3, 4}) e H = {g ∈ G : g(3) = 3}. Mostre que


H é um subgrupo de G e que |H| = 6.
8. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 89

O fato que H ≤ G é simplesmente o exercı́cio acima. H pode


ser visto como o grupo das permutações de {1, 2, 4}, que é um
conjunto de três elementos, logo |H| = 3! = 6.

(9) Mostre que Sym({1, 2, 3, 4}) não contem subgrupos de ordem 16.

É uma aplicação imediata do teorema de Lagrange: todo sub-


grupo de G = Sym({1, 2, 3, 4}) tem ordem que divide |G| = 4! =
24, logo G não admite subgrupos de ordem 16, pois 16 não divide
24.

(10) Seja X um conjunto qualquer com |X| ≥ 3. Mostre que Sym(X)


não é comutativo.

Sendo |X| ≥ 3 existem três elementos distintos a 6= b 6= c 6= a


no conjunto X. A ideia é mutuar a ideia acima que mostra que
Sym({1, 2, 3}) não é comutativo. Sejam f, g ∈ Sym(X) definidas
da forma seguinte: f (a) = a, f (b) = c, f (c) = b, f (x) = x para todo
x ∈ X diferente de a, b, c, e g(a) = c, g(b) = b, g(c) = a, e g(x) = x
para todo x ∈ X diferente de a, b, c. Se trata de funções bijetivas
(pois as restrições a {a, b, c} e a X − {a, b, c} são bijetivas). Temos
(f g)(a) = f (g(a)) = f (c) = b e (gf )(a) = g(f (a)) = g(a) = c, logo
(f g)(a) 6= (gf )(a) e isso é suficiente para deduzir que f g 6= gf .
CAPı́TULO 3

Aneis

1. Indução
O conjunto N é o conjunto dos números naturais:
N = {0, 1, 2, 3, . . .}.
Ele tem uma propriedade importante (princı́pio do boa ordenação): todo
subconjunto não vazio S de N admite mı́nimo, ou seja existe x ∈ S tal que
x ≤ s para todo s ∈ S. Observe que Z não tem essa propriedade, pois ele
mesmo não admite mı́nimo.

O que faremos agora é reformular o princı́pio da boa ordenação para as


aplicações práticas.
Proposição (Princı́pio de indução). Seja m ∈ N e seja M um subcon-
junto de N com as propriedades seguintes.
(1) m ∈ M ,
(2) se n ∈ M então n + 1 ∈ M .
Então M contem todos os n ≥ m.
Seja (An )n uma famı́lia de enunciados que dependem de n. Suponha que
(1) Am é verdadeiro,
(2) se An é verdadeiro para algum n ≥ m então An+1 é verdadeiro.
Então An é verdadeiro para todo n ≥ m.
Demonstração. A segunda asserção segue da primeira escolhendo M
igual ao conjunto dos n tais que An é verdadeira. Para mostrar a primeira
suponha por absurdo que seja falsa, ou seja os fatos (1) e (2) são verdadeiros
mas M não contem todos os n ≥ m, e seja X = {n ∈ N : n ≥ m}. Seja
Y = X − M . Daı́ temos Y 6= ∅ (pois X não está contido em M por
hipótese), seja h o mı́nimo dos elementos de Y (que existe pelo princı́pio da
boa ordenação porque Y é um subconjunto não vazio de N). Não pode ser
h = m pois h ∈ Y = X − M e m ∈ M (por hipótese). Daı́ h 6= m e sendo
h ≥ m obtemos h > m. Mas h e m são números naturais, logo h ≥ m + 1
ou seja h − 1 ≥ m. Logo h − 1 ∈ X (por definição de X) e a minimalidade
de h (como elemento de Y = X − M ) implica que h − 1 ∈ M (pois se fosse
h − 1 6∈ M seria h − 1 ∈ Y , mas daı́ h − 1 < h contradiz a minimalidade de
h). Isso implica que (h − 1) + 1 ∈ M pela hipótese (2), ou seja h ∈ M , daı́
h 6∈ Y , absurdo. 
91
92 3. ANEIS

Em outras palavras sabendo (1) e (2) podemos deduzir An para todo


n ≥ m por meio da cadeia de implicações
Am ⇒ Am+1 ⇒ Am+2 ⇒ Am+3 ⇒ . . .

Exemplos.

• Mostraremos que 2 divide n(n + 1) para todo n ≥ 1. Seja An a


frase “2 divide n(n + 1)”. A1 é “2 divide 1(1 + 1)” que é claramente
verdadeira pois 1(1 + 1) = 2. O que precisamos mostrar agora é
que An implica An+1 para todo n ≥ 1. Suponha então que An
seja verdadeira, ou seja 2 divide n(n + 1), daı́ existe um inteiro d
com n(n + 1) = 2d. Queremos mostrar An+1 , ou seja que 2 divide
(n + 1)(n + 2). Temos
(n + 1)(n + 2) = n(n + 1) + 2(n + 1)
= 2d + 2(n + 1) = 2(d + n + 1)
logo 2 divide (n + 1)(n + 2). Isso mostra An+1 .

• Mostraremos que 3 divide 4n − 1 para todo n ≥ 1. Seja An a frase


“3 divide 4n − 1”. A base da indução é n = 1 e vale pois 3 divide
41 − 1 = 3 (ou seja A1 é verdadeira). Precisamos mostrar que An
implica An+1 para todo n ≥ 1. Suponha que 3 divida 4n −1 (ou seja
An ), e mostraremos que 3 divide 4n+1 − 1 (ou seja An+1 ). Temos
4n − 1 = 3d com d inteiro logo 4n = 3d + 1 daı́
4n+1 − 1 = 4 · 4n − 1 = 4(3d + 1) − 1
= 12d + 3 = 3(4d + 1)
logo 3 divide 4n+1 − 1.

• Seja a ≥ 2 um inteiro. Mostraremos que a − 1 divide an − 1 para


todo n ≥ 1. A base da indução é clara pois a−1 divide a1 −1 = a−1.
Suponha que a−1 divida an −1, daı́ an −1 = d(a−1) com d inteiro.
Temos
an+1 − 1 = aan − 1 = a(an − 1) + a − 1
= ad(a − 1) + a − 1 = (ad + 1)(a − 1).
Logo a − 1 divide an+1 − 1.

• Seja
n
X
S(n) = i = 1 + 2 + 3 + 4 + . . . + n.
i=1
Mostraremos que S(n) = n(n + 1)/2 para todo n ≥ 1. A base da
indução é clara pois S(1) = 1 = 1(1 + 1)/2. Mostraremos agora que
1. INDUÇÃO 93

se S(n) = n(n + 1)/2 então S(n + 1) = (n + 1)(n + 2)/2. Suponha


S(n) = n(n + 1)/2. Temos
n+1 n
!
X X
S(n + 1) = i= i + (n + 1)
i=1 i=1
= S(n) + (n + 1) = n(n + 1)/2 + (n + 1)
= (n/2 + 1)(n + 1) = (n + 1)(n + 2)/2.

• Seja
n
X
R(n) = 2i = 20 + 21 + 22 + . . . + 2n .
i=0

Mostraremos que R(n) = 2n+1 − 1 para todo n ≥ 0. A base da


indução é R(0) = 20+1 −1 = 1 que é verdadeiro pois R(0) = 20 = 1.
Precisamos mostrar que se R(n) = 2n+1 − 1 então R(n + 1) =
2n+2 − 1. Suponha então R(n) = 2n+1 − 1. Temos que
n+1 n
!
X X
i
R(n + 1) = 2 = 2 + 2n+1
i

i=0 i=0
= R(n) + 2n+1 = 2n+1 − 1 + 2n+1
= 2 · 2n+1 − 1 = 2n+2 − 1.

• Defina 1! = 1 e (n + 1)! = (n + 1)n! para todo n ≥ 0. n! é lido


“n fatorial” (é a ordem do grupo simétrico Sym({1, 2, . . . , n})).
Mostraremos que 2n < n! para todo n ≥ 4. A base da indução
é 24 < 4! que é verdadeiro pois 24 = 16 e 4! = 24. Suponha
2n < n! para um n ≥ 4, mostraremos que 2n+1 < (n + 1)!. Temos
2n+1 = 2 · 2n < 2 · n! e observando que 2 ≤ n + 1 (sendo n ≥ 4)
temos 2 · n! ≤ (n + 1)n! = (n + 1)! logo 2n+1 < (n + 1)!.

• Mostraremos que ni=1 √1i > n para todo n ≥ 2. O caso n = 2 é
P
√ √
1 + 1/
√ 2 >√ 2 que é verdadeiro pois é equivalente (multiplicando
por 2) a √ 2 + 1 > 2, que é verdadeiro pois é equivalente (sub-

traindo 1) a 2 > 1. Suponha ni=1 √1i > n, queremos mostrar
P

que n+1 1
P
i=1

i
> n + 1. Temos
n+1 n
X 1 X 1 1 √ 1
√ = √ +√ > n+ √
i=1
i i=1
i n + 1 n +1
√ √ √
mostrar que pn+1/ n + 1 ≥ n + 1, ou seja
logo basta √ p (multipli-
cando por n + 1) que n(n + 1)+1 ≥ n+1, ou seja n(n + 1) ≥
94 3. ANEIS

n ou seja (elevando ao quadrado) que n(n + 1) ≥ n2 ou seja (divi-


dindo por n) que n + 1 ≥ n que é claramente verdadeiro.

Exercı́cios.

(1) Mostre que 3 divide n(n2 + 2) para todo n ≥ 1.


(2) Mostre que 3 divide n(n + 1)(n + 2) para todo n ≥ 1.
(3) Mostre que 21 divide 4n+1 + 52n−1 para todo n ≥ 1.
an
(4) Suponha de ter a1 = 1 e an+1 = 1+a n
para todo n ≥ 1. Mostre que
an = 1/n para todo n ≥ 1.
(5) Mostre que
Xn
(2i + 1) = (n + 1)2
i=0

para todo n ≥ 0.
(6) Mostre que
n
X 1
i2 = n(n + 1)(2n + 1)
6
i=1

para todo n ≥ 1.
(7) Mostre que
n
X 1
i3 = n2 (n + 1)2
4
i=1

para todo n ≥ 1.
(8) Seja a ≥ 2 um inteiro. Mostre que
n
X an+1 − 1
ai =
a−1
i=0

para todo n ≥ 1.
(9) Mostre por indução que 2n > n para todo n ≥ 1.
(10) Mostre que
n
X 1 1
≤2−
i2 n
i=1

para todo n ≥ 1.
(11) (Mais difı́cil) Mostre que
2n
X 1 n
≥1+
i 2
i=1

para todo n ≥ 1.
2. POLINÔMIOS 95

2. Polinômios
Um “polinômio com coeficientes racionais” é uma escrita formal
n
X
P (X) = ai X i = a0 + a1 X + a2 X 2 + . . . + an X n
i=0

onde ai ∈ Q para todo i ∈ {0, 1, . . . , n}. Isso nos dá uma função f : N → Q
definida por f (i) = ai onde f (i) = 0 se i ≥ n + 1. Observe que o conjunto
C = {i ∈ N : f (i) 6= 0} é finito, de fato f (i) = ai = 0 se i > n, ou
seja C ⊆ {0, 1, . . . , n}. Os números racionais a0 , a1 , . . . , an são chamados de
“coeficientes” do polinômio P (X). Observe que C pode ser vazio, neste
caso o polinômio P (X) éPo polinômio nulo: P (X) = 0. Se C não for
vazio na escrita P (X) = ni=0 ai X i supomos por coerência de notação que
o coeficiente de X n seja não nulo: an 6= 0. Em outras palavras n = max(C).
Se C não for vazio (ou seja se P (X) não for o polinômio nulo), o máximo
elemento de C (que existe pois C é finito) é chamado de grau do polinômio.
Por exemplo o polinômio 6X 3 +2X 2 +1 tem grau 3, e C neste caso é {0, 2, 3}
(que está contido propriamente em {0, 1, 2, 3}). Observe que a0 = 1, a1 = 0,
a2 = 2, a3 = 6, e ai = 0 para todo i ≥ 4. Ou seja os ai que não aparecem
são iguais a zero. Se C for vazio então P (X) = 0 é o polinômio nulo e
normalmente digamos que o grau do polinômio nulo é −∞, um número
menor de todos os números. Os polinômios de grau zero são da forma a
com 0 6= a ∈ Q (polinômios “constantes”), os polinômios de grau 1 são
aX + b com a, b ∈ Q e a 6= 0, os polinômios de grau 2 são aX 2 + bX + c com
a, b, c ∈ Q e a 6= 0, etc.
Pn i
Pn i
Dois polinômios P1 (X) = i=0 ai X , P2 (X) = i=0 bi X são iguais
exatamente quando são iguais as funções correspondentes f (i) = ai , g(i) =
bi , ou seja exatamente quando ai = bi para todo i ∈ N. Esse fato é as
vezes chamado de “principio de identidade dos polinômios”, se trata de uma
consequência imediata da definição de polinômio.

Podemos introduzir duas operações entre polinômios.


• Soma.
Xn m
X Xn
ai X i + bi X i = (ai + bi )X i
i=0 i=0 i=0

onde max{n, m} = n.
• Produto. Se trata da regra X i X j = X i+j extendida por distribu-
tividade, ou seja
 
n m n+m
! !
X X X X
ai X i · bi X i :=  ai bj  X k .
i=0 i=0 k=0 i+j=k

Por exemplo
96 3. ANEIS

(X 3 + 2X 2 − X + 1)(X 2 + X + 3) =
(1)X 5 + (1 · 1 + 2 · 1)X 4 + (1 · 3 + 2 · 1 − 1 · 1)X 3 +
+(2 · 3 − 1 · 1 + 1 · 1)X 2 + (−1 · 3 + 1 · 1)X + (3)1
= X 5 + 3X 4 + 4X 3 + 6X 2 − 2X + 3.

Observe que se P (X) e Q(X) são dois polinômios não nulos dePngraus ni
e m, o grau de
Pm P (X)Q(X) é n + m. De fato escrevendo P (X) = i=0 ai X
e Q(X) = b X i com a 6
= 0, b 6
= 0 temos que P (X)Q(X) =
i=0 i n m
an bm X n+m + J(X) com J(X) de grau menor que n + m, logo o grau de
P (X)Q(X) é n + m (observe que an bm 6= 0 sendo an , bn ∈ Q, an 6= 0 e
bm 6= 0).

O conjunto de todos os polinômios com coeficientes racionais é indicado


por Q[X]. Se trata de um grupo comutativo com a operação de soma. Existe
um elemento neutro do produto, o polinômio 1, mas em geral os elementos
não admitem inverso multiplicativo, por exemplo consideramos o polinômio
X. Não existe nenhum polinômio P (X) tal que XP (X) = 1, sendo o grau
de XP (X) igual a 1 + n onde n é o grau de P (X), e 1 + n ≥ 1. Em outras
palavras, o inverso de X seria 1/X mas 1/X não pertence a Q[X] porque
não é um polinômio. Logo Q[X] com a operação de produto não é um grupo.

Temos então uma analogia entre Z e Q[X]: eles têm duas operações
associativas e comutativas (soma e produto), são grupos aditivos (ou seja,
são grupos com a operação de soma), eles têm elemento neutro do produto
(1 nos dois casos), e não todo elemento admite inverso multiplicativo (por
exemplo X não admite inverso multiplicativo em Q[X] pois 1/X não é um
polinômio, e 2 não admite inverso multiplicativo em Z pois 1/2 não é um
inteiro). Além disso, Q[X] e Z têm a propriedade distributiva, ou seja
se a, b, c são inteiros quaisquer, ou polinômios quaisquer, então

a(b + c) = ab + ac.

Nas próximas seções daremos o nome de “anel comutativo” às estruturas


algébricas com essas propriedades.

O que queremos fazer agora é extender tal analogia até o algoritmo de


Euclides.

Teorema (Divisão com resto para polinômios.). Sejam A(X), B(X) ∈


Q[X] dois polinômios não nulos. Existem Q(X), R(X) em Q[X] (quociente
e resto) polinômios com R(X) nulo ou de grau menor que o grau de B(X),
tais que
A(X) = Q(X)B(X) + R(X).
2. POLINÔMIOS 97

Por exemplo se A(X) = X 2 + X + 2 e B(X) = X o problema da divisão


com resto é reduzida a “colocar X em evidência”: A(X) = X(X + 1) + 2 =
(X + 1)B(X) + 2 logo Q(X) = X + 1 e R(X) = 2. Observe que R(X) tem
grau zero, e B(X) tem grau 1, o que faz sentido pois 0 < 1.

Um outro exemplo fácil é A(X) = X 2 + 1, B(X) = X + 1, neste caso


X2 + 1 = (X − 1)(X + 1) + 2 logo Q(X) = X − 1 e R(X) = 2.

Para resolver exemplos mais complicados precisamos de um algoritmo


de divisão.

O algoritmo para fazer a divisão com resto entre A(X) e B(X) é o


seguinte. Sejam n o grau de A(X), m o grau de B(X), daı́ existem po-
linômios H(X) (de grau menor que n) e J(X) (de grau menor que m) tais
que A(X) = an X n + H(X) e B(X) = bm X m + J(X).
A(X) = an X n + H(X) B(X) = bm X m + J(X)
an n−m
Q1 (X)B(X) Q1 (X) = bm X

A(X) − Q1 (X)B(X)
Feito isso, o algoritmo continua com A(X) − Q1 (X)B(X) no lugar de A(X).
Isso nos dá um “segundo quociente” Q2 (X), etc. No final teremos que o
resto da divisão é o último polinômio da primeira coluna e o quociente é
Q1 (X) + Q2 (X) + . . .

Observe que o polinômio bamn X n−m é um elemento de Q[X], e isso explica


porque escolhemos Q como conjunto dos coeficientes e não Z por exemplo:
porque se an , bm ∈ Q com bm 6= 0 então an /bm ∈ Q (o que não seria verdade
se tivesse Z no lugar de Q). O conjunto dos polinômios com coeficientes
inteiros, Z[X], não admite divisão com resto.

Exemplo. Sejam A(X) = X 4 + X 2 + 1, B(X) = X 2 + X em Q[X].


Faremos a divisão com resto entre A(X) e B(X).
X4 + X2 + 1 X2 + X
4
X +X 3 X2 − X + 2
−X 3 + X 2 + 1
−X 3 − X 2
2X 2 + 1
2X 2 + 2X
−2X + 1
Obtemos que A(X) = B(X)Q(X) + R(X) onde Q(X) = X 2 − X + 2 (quo-
ciente) e R(X) = −2X + 1 (resto).
98 3. ANEIS

Exemplo. Sejam A(X) = X 5 + 10, B(X) = X 3 + X − 1 em Q[X].


Faremos a divisão com resto entre A(X) e B(X).

X 5 + 10 X3 + X − 1
X5 + X3 − X2 X2 − 1
3 2
−X + X + 10
−X 3 − X + 1
X2 + X + 9
Obtemos que A(X) = B(X)Q(X) + R(X) onde Q(X) = X 2 − 1 e
R(X) = X 2 + X + 9.

Exemplo. Sejam A(X) = X 4 − 2X 3 + X 2 − X − 1 e B(X) = 3X 2 + X.


Faremos a divisão com resto entre A(X) e B(X).
X 4 − 2X 3 + X 2 − X − 1 3X 2 + X
X 4 + 13 X 3 1 2
3X − 79 X + 16
27
− 73 X 3 + X 2 − X − 1
− 73 X 3 − 97 X 2
16 2
9 X −X −1
16 2 16
9 X + 27 X
43
− 27 X − 1
Obtemos que A(X) = B(X)Q(X) + R(X) onde Q(X) = 13 X 2 − 97 X + 16
27
43
(quociente) e R(X) = − 27 X − 1 (resto).

Tendo divisão com resto, podemos aplicar o algoritmo de Euclides exa-


tamente como o aplicamos no conjunto Z. Por exemplo aplicaremos o al-
goritmo de Euclides a A(X) = X 5 − 3 e B(X) = X 2 + 2 mostrando em
particular que eles são coprimos. Encontraremos dois polinômios G(X),
H(X) em Q[X] tais que A(X)G(X) + B(X)H(X) = 1.
X5 − 3 X2 + 2
1 0 X5 − 3
0 1 X2 + 2
1 3
−X + 2X 4X − 3
3
−(X/4 + 3/16) 1 + (X/4 + 3/16)(X − 2X) 41/16
Os quocientes são X 3 − 2X e X/4 + 3/16. Logo escolhendo
G0 (X) = −(X/4 + 3/16), H0 (X) = 1 + (X/4 + 3/16)(X 3 − 2X)
temos
A(X)G0 (X) + B(X)H0 (X) = 41/16,
daı́ escolhendo G(X) = (16/41)G0 (X) e H(X) = (16/41)H0 (X) obtemos
A(X)G(X) + B(X)H(X) = 1.

Exercı́cios.
3. ANEIS COMUTATIVOS UNITÁRIOS 99

(1) Faça a divisão com resto entre X 6 − X e 2X 2 + X + 1.


(2) Faça a divisão com resto entre X 12 − 1 e X 3 − 1.
(3) Encontre dois polinômios G(X), H(X) ∈ Q[X] tais que
G(X)(X 3 + 2) + H(X)(X 2 + X + 1) = 1.
(4) Encontre dois polinômios G(X), H(X) ∈ Q[X] tais que
G(X)(X 2 − 5X + 6) + H(X)(X 3 − 4X) = X − 2.
(5) Mostre por indução que se n ∈ N existe An (X) ∈ Q[X] tal que
X n − 1 = (X − 1)An (X).
(6) Existe uma formula para o grau de A(X) + B(X) que depende só
dos graus de A(X) e B(X)?
(7) Seja P (X) um polinômio de Q[X] e seja a ∈ Q. Mostre que se
P (a) = 0 então X − a divide P (X). [Dica: faça a divisão com resto
de P (X) por X − a.]

3. Aneis comutativos unitários


Definição (Anel unitário). Um anel unitário é um conjunto A que
tem duas operações binarias + e · (soma e produto) tais que
(1) A com a operação + é um grupo comutativo com elemento neutro
0 e o inverso (aditivo) de a é −a.
(2) A com a operação · é um monoide, isto é, · é associativa e existe
um elemento neutro 1.
(3) Propriedade distributiva (compatibilidade entre soma e produto):
a(b + c) = ab + ac e (a + b)c = ac + bc para todo a, b, c ∈ A.
A palavra “unitário” refere-se à existência do elemento 1 (elemento neu-
tro do produto). Observe que em geral um anel não é um grupo com a
multiplicação. Quando falamos “anel” queremos sempre dizer anel unitário.
Um anel A é dito comutativo se a sua operação de multiplicação é comu-
tativa, isto é, se ab = ba para todo a, b ∈ A.

Multiplicação por zero. Se A é um anel e a ∈ A então a · 0 = 0. De


fato a · 0 = a · (1 − 1) = a − a = 0. Observe que a igualdade a · 0 = 0 é uma
consequência da propriedade distributiva. Isso implica em particular que 0
admite inverso multiplicativo se e somente se 0 = 1, e neste caso A = {0}.

Por exemplo Z, Q, R, C são aneis comutativos com as operações usuais.


Um outro exemplo importante de anel comutativo é o seguinte: o anel dos
polinômios A[X] com soma e produto usuais, onde A é um anel comutativo.
Um elemento generico de A[X] é um polinômio a0 +a1 X +a2 X 2 +. . .+ak X k
onde a0 , a1 , . . . , ak ∈ A (por exemplo Q[X] e Z[X]).
100 3. ANEIS

Um exemplo importante de anel é Z/nZ com soma e produto modula-


res. A propriedade distributiva neste caso é uma consequência imediata da
propriedade distributiva em Z: se a, b, c ∈ Z então
a · (b + c) = a · b + c = a(b + c)
= ab + ac = ab + ac = a · b + a · c
Nessa parte do curso falaremos só de aneis comutativos. Além disso,
todos os aneis considerados serão unitários.

Definição (Corpo). Um anel comutativo A é dito corpo se todo ele-


mento a ∈ A diferente de zero admite inverso multiplicativo a−1 .

Por exemplo Z não é um corpo (pois por exemplo 2 ∈ Z mas 2a 6= 1


para todo a ∈ Z) mas Q, R e C são corpos.
Proposição. O anel comutativo A = Z/nZ é um corpo se e somente
se n é um número primo.
Demonstração. A é um corpo se e somente se todo elemento a 6= 0
admite inverso multiplicativo, ou seja todo a ∈ {1, 2, . . . , n − 1} é coprimo
com n, ou seja n é um número primo. 
Se A é um anel comutativo considere U (A), o conjunto dos elementos de
A que admitem inverso multiplicativo. U (A) é um grupo multiplicativo (um
grupo com a operação de multiplicação) chamado de “grupo das unida-
des” de A (grupo dos elementos inversı́veis de A). Por exemplo já estudamos
o grupo U (Z/nZ). Observe que U (Z) = {1, −1} (pois os únicos inteiros que
admitem inverso multiplicativo inteiro são 1 e −1), logo U (Z) é um grupo
cı́clico de ordem 2 (gerado por −1). U (Q[X]) é o conjunto dos polinômios de
grau zero (vimos que um polinômio em Q[X] admite inverso em Q[X] se e
somente se tem grau zero). Em outras palavras U (Q[X]) = U (Q) = Q−{0}.

Observe que o anel comutativo A é um corpo se e somente se U (A) =


A − {0}. Por exemplo Z/6Z não é um corpo pois U (Z/6Z) = {1, 5} = 6
{1, 2, 3, 4, 5} = Z/6Z−{0}, e Z/5Z é um corpo pois U (Z/5Z) = {1, 2, 3, 4} =
Z/5Z − {0}. Observe que no anel Z/6Z temos 2 6= 0, 3 6= 0 mas 2 · 3 = 6 = 0.
Isso mostra que em um anel pode acontecer que o produto de dois elementos
não nulos é igual a zero. Isso não acontece em um corpo:
Proposição. Seja K um corpo, e sejam a, b ∈ K. Então ab = 0 se e
somente se a = 0 ou b = 0. Em outras palavras se a 6= 0 e b 6= 0 então
ab 6= 0.
Demonstração. Sendo a segunda implicação imediata, mostraremos
somente a primeira implicação. Suponha ab = 0. Se a 6= 0 existe a−1 ∈ K
(sendo K um corpo) logo multiplicando os dois lados da igualdade ab = 0
3. ANEIS COMUTATIVOS UNITÁRIOS 101

por a−1 obtemos b = 0. Se b 6= 0 existe b−1 ∈ K (sendo K um corpo) logo


multiplicando os dois lados da igualdade ab = 0 por b−1 obtemos a = 0. 

Seja K um corpo. Podemos considerar o anel K[X] dos polinômios


com coeficientes em K (por exemplo já vimos o caso K = Q). A analogia
entre Q[X] e Z descrita nas seções acima vale também para K[X]. Ou
seja a divisão com resto e o algoritmo de Euclides funcionam para K[X]
exatamente como para Q[X].

Um exemplo importante é dado por K = Z/pZ. Por exemplo suponha


K = Z/7Z. As somas e as multiplicações têm que ser feitas módulo 7, assim
por exemplo (2X 3 + 5X)(6X 2 + 4) = 5X 5 + X 3 + 2X 3 + 6X. Faremos a
divisão com resto entre X 5 + X + 1 e 2X + 1. Observe que 1−1 = 1, 2−1 = 4,
3−1 = 5, 4−1 = 2, 5−1 = 3, 6−1 = 6. Temos

X5 + X + 1 2X + 1
X 5 + 4X 4 4X 4 + 5X 3 + X 2 + 3X + 6
3X 4 + X + 1
3X 4 + 5X 3
2X 3 + X + 1
2X 3 + X 2
6X 2 + X + 1
6X 2 + 3X
5X + 1
5X + 6
2
De fato lembrando de reduzir módulo 7 temos que
(4X 4 + 5X 3 + X 2 + 3X + 6)(2X + 1) + 2 =

= X 5 + 4X 4 + 3X 4 + 5X 3 + 2X 3 + X 2 + 6X 2 + 3X + 5X + 6 + 2
e somando e reduzindo módulo 7 obtemos exatamente X 5 + X + 1.

Uma “raiz” de P (X) ∈ K[X] é um elemento a ∈ K tal que P (a) = 0.


Proposição. Seja K um corpo e seja P (X) ∈ K[X] de grau n ≥ 1.
Então P (X) tem no máximo n raizes em K.
Demonstração. Por indução sobre n. Se n = 1 então P (X) = aX + b
tem exatamente uma raiz, −b/a = −b · a−1 (observe que a−1 existe porque
K é um corpo e a 6= 0 tendo P (X) grau 1). Suponha o resultado verdadeiro
para n e seja P (X) um polinômio de grau n + 1. Se P (X) não tiver raizes
em K então P (X) tem no máximo n + 1 raizes (pois 0 ≤ n + 1) e o resultado
é demonstrado, então suponha que P (X) tenha uma raiz a ∈ K. Fazendo a
divisão com resto entre P (X) e X −a obtemos P (X) = (X −a)Q(X)+R(X)
102 3. ANEIS

com R(X) nulo ou de grau menor que o grau de X −a, ou seja R(X) = r ∈ K
é uma constante (que pode ser nula). Sendo P (a) = 0 obtemos
0 = P (a) = (a − a)Q(a) + r = r
daı́ r = 0 logo P (X) = (X − a)Q(X), logo Q(X) tem grau n (pois P (X)
tem grau n + 1 e X − a tem grau 1). Uma raiz de P (X) diferente de a tem
que ser uma raiz de Q(X) (pois se P (b) = 0 então (b − a)Q(b) = 0 logo
Q(b) = 0 se b 6= a, sendo K um corpo), por hipótese Q(X) tem no máximo
n raizes em K (pois o resultado é verdadeiro para n) logo P (X) tem no
máximo n + 1 raizes em K. 

Exercı́cios.

(1) Faça a divisão com resto entre X 4 + X 2 + 3 e 3X 2 + X em Q[X].

(2) Faça a divisão com resto entre X 4 + X e 3X 2 + 1 em Z/5Z[X].

(3) Faça a divisão com resto entre X 3 + 2X 2 + 2X + 1 e X + 2 em


Z/3Z[X].

(4) Calcule X(X − 1)(X − 2)(X − 3)(X − 4) em Z/5Z[X].

(5) Encontre todos os x ∈ Z/5Z tais que x2 = 4.

(6) Encontre todos os x ∈ Z/11Z tais que x2 − x + 2 = 0.

(7) Encontre todos os x ∈ Z/8Z tais que x2 = 1.

(8) Encontre todos os x ∈ Z/16Z tais que x4 = 0.

(9) Sejam A e B dois aneis (comutativos, unitários).


Seja R = A × B o produto cartesiano entre A e B.
Mostre que R é um anel (comutativo, unitário) com as operações
(a1 , b1 ) + (a2 , b2 ) = (a1 + a2 , b1 + b2 ),
(a1 , b1 ) · (a2 , b2 ) = (a1 a2 , b1 b2 ).
Mostre que U (R) = U (A) × U (B). O anel Q × Q é um corpo?

(10) Seja A o conjunto das funções f : R → R. Mostre que A é um anel


comutativo unitário com as operações
(f + g)(x) := f (x) + g(x), (f · g)(x) := f (x)g(x).
Calcule U (A).
4. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 103

(11) Seja A o conjunto das funções fm : Z → Z definidas por fm (x) :=


mx onde m ∈ Z. Mostre que A é um anel comutativo unitário com
as operações
(fn + fm )(x) := fn (x) + fm (x), (fn · fm )(x) := fn (fm (x)).
Ou seja a soma é por componentes, o produto é a composição.
Calcule U (A).
Pn
(12) Mostre que i 2
i=1 (−1) i = 21 (−1)n n(n+1) para todo inteiro n ≥ 1.

(13) Mostre que n2 < 2n para todo inteiro n ≥ 5.

4. Resolução listas de exercı́cios


4.1. Seção “indução”.
(1) Mostre que 3 divide n(n2 + 2) para todo n ≥ 1.

Caso base: n = 1, neste caso 3 divide n(n2 + 2) = 3. Suponha


que 3 divida n(n2 + 2), daı́ n(n2 + 2) = 3d com d inteiro. Temos
(n + 1)((n + 1)2 + 2) = (n + 1)(n2 + 2n + 3)
= n3 + 2n2 + 3n + n2 + 2n + 3
= n(n2 + 2) + 3n2 + 3n + 3
= 3d + 3(n2 + n + 1) = 3(d + n2 + n + 1).
(2) Mostre que 3 divide n(n + 1)(n + 2) para todo n ≥ 1.

Caso base: n = 1, neste caso 3 divide n(n + 1)(n + 2) = 6.


Suponha que 3 divida n(n + 1)(n + 2), daı́ n(n + 1)(n + 2) = 3d
com d inteiro. Temos
(n + 1)(n + 2)(n + 3) = n(n + 1)(n + 2) + 3(n + 1)(n + 2)
= 3d + 3(n + 1)(n + 2)
= 3(d + (n + 1)(n + 2)).

(3) Mostre que 21 divide 4n+1 + 52n−1 para todo n ≥ 1.

Caso base: n = 1, neste caso 21 divide 4n+1 + 52n−1 = 21.


Suponha que 21 divida 4n+1 + 52n−1 , daı́ 4n+1 + 52n−1 = 21d com
d inteiro. Temos
4(n+1)+1 + 52(n+1)−1 = 4 · 4n+1 + 52n+1 = 4(21d − 52n−1 ) + 52n+1
= 84d + 52n−1 (−4 + 52 ) = 21(4d + 52n−1 ).
104 3. ANEIS

an
(4) Suponha de ter a1 = 1 e an+1 = 1+an para todo n ≥ 1. Mostre que
an = 1/n para todo n ≥ 1.

A base da indução é clara pois a1 = 1 = 1/1. Suponha an = 1/n


e vamos mostrar que an+1 = 1/(n + 1). Temos que
an 1/n 1/n 1
an+1 = = = = .
an + 1 1/n + 1 (n + 1)/n n+1

(5) Mostre que


n
X
(2i + 1) = (n + 1)2
i=0
para todo n ≥ 0.

A base da indução é 1 = (0 + 1)2 que é verdadeiro. Suponha


Pn 2
Pn+1 2
i=0 (2i+1) = (n+1) e mostraremos que i=0 (2i+1) = (n+2) .
Temos

n+1
X n
X
(2i + 1) = (2i + 1) + (2(n + 1) + 1) = (n + 1)2 + (2n + 3)
i=0 i=0
= n + 4n + 4 = (n + 2)2 .
2

(6) Mostre que


n
X 1
i2 = n(n + 1)(2n + 1)
6
i=1

para todo n ≥ 1.

A base da indução é 1 = 16 1(1 + 1)(2 + 1) que é verdadeiro.


Suponha ni=1 i2 = 16 n(n + 1)(2n + 1), mostraremos que n+1 2
P P
i=1 i =
1
6 (n + 1)(n + 2)(2(n + 1) + 1). Temos
n+1
X n
X
2
i = i2 + (n + 1)2
i=1 i=1
1
= n(n + 1)(2n + 1) + (n + 1)2
6
1
= (n + 1)(n(2n + 1) + 6(n + 1))
6
1
= (n + 1)(n + 2)(2(n + 1) + 1).
6
4. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 105

(7) Mostre que


n
X 1
i3 = n2 (n + 1)2
4
i=1

para todo n ≥ 1.

A base da indução é 1 = 14 1(1 + 1)2 que é verdadeiro.


Suponha ni=1 i3 = 41 n2 (n + 1)2 , mostraremos que n+1 3
P P
i=1 i =
1 2 2
4 (n + 1) (n + 2) . Temos

n+1 n
X X 1
i3 = i3 + (n + 1)3 = n2 (n + 1)2 + (n + 1)3
4
i=1 i=1
1 1
= (n + 1)2 (n2 + 4n + 4) = (n + 1)2 (n + 2)2 .
4 4

(8) Seja a ≥ 2 um inteiro. Mostre que


n
X an+1 − 1
ai =
a−1
i=0

para todo n ≥ 1.
a2 −1
A base da indução é 1 + a = que é verdadeiro. Suponha
a−1
Pn i an+1 −1 Pn+1 i an+2 −1
i=0 a = a−1 , mostraremos que i=0 a = a−1 . Temos

n+1 n
X an+1 − 1 X i an+1 − 1
ai = = a + an+1 = + an+1
a−1 a−1
i=0 i=0
an+1 − 1 + (a − 1)an+1 an+2 − 1
= = .
a−1 a−1

(9) Mostre por indução que 2n > n para todo n ≥ 1.

A base da indução é 20 = 1 > 0. Suponha 2n > n, temos


2n+1 = 2 · 2n > 2n ≥ n + 1 sendo n ≥ 1, logo 2n+1 > n + 1.

(10) Mostre que


n
X 1 1
≤2−
i2 n
i=1

para todo n ≥ 1.
106 3. ANEIS

Pn A base da indução é 1 ≤ 2 − 1 =
P1n+1
que é verdadeiro. Suponha
1 1 1 1
i=1 i2 ≤ 2 − n , mostraremos que i=1 i2 ≤ 2 − n+1 . Temos

n+1 n
X 1 X 1 1 1 1
2
= 2
+ 2
≤2− +
i i (n + 1) n (n + 1)2
i=1 i=1

logo basta mostrar que 2 − n1 + (n+1)


1 1
2 ≤ 2 − n+1 ou seja (multi-

plicando por n(n + 1)2 ) que −(n + 1)2 + n ≤ −n(n + 1) ou seja


(reformulando) que −n2 − n − 1 ≤ −n2 − n que é verdadeiro pois
−1 ≤ 0.

(11) (Mais difı́cil) Mostre que

2n
X 1 n
≥1+
i 2
i=1

para todo n ≥ 1.

A base da indução é 1+1/2 ≥ 1+1/2 que é verdadeiro. Suponha


P2n 1 n P2n+1 1 n+1
i=1 i ≥ 1 + 2 , mostraremos que i=1 i ≥ 1 + 2 . Temos

n+1
2X 2 n 2X n+1
1 X1 1
= + .
i i n
i
i=1 i=1 i=2 +1

Os termos do segundo somatório são 2n termos de uma sequência


decrescente, logo eles são todos maiores ou iguais ao último, que é
1/2n+1 , logo

n+1
2X 2 n 2X n+1
1 X1 1 n 2n
= + ≥ 1 + + n+1
i i n
i 2 2
i=1 i=1 i=2 +1
n 1 n+1
=1+ + =1+ .
2 2 2

4.2. Seção “Polinômios”.


(1) Faça a divisão com resto entre X 6 − X e 2X 2 + X + 1.
4. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 107

X6 − X 2X 2 + X + 1
X6 + 12 X 5 + 21 X 4 1 4
2X − 1 3
4X − 81 X 2 + 16
3
X− 1
32
− 2 X − 12 X 4 − X
1 5

− 12 X 5 − 14 X 4 − 41 X 3
− 41 X 4 + 14 X 3 − X
− 14 X 4 − 18 X 3 − 81 X 2
3 3 1 2
8X + 8X − X
3 3 3 2 3
8 X + 16 X + 16 X
1 19
− 16 X 2 − 16 X
1 1 1
− 16 X 2 − 32 X − 32
37 1
− 32 X + 32

Logo X 6 − X = (2X 2 + X + 1)Q(X) + R(X) onde


Q(X) = 12 X 4 − 14 X 3 − 81 X 2 + 16
3 1
X − 32 ,
37 1
R(X) = − 32 X + 32 .

(2) Faça a divisão com resto entre X 12 − 1 e X 3 − 1.

X 12 − 1 X3 − 1
X − X X + X6 + X3 + 1
12 9 9

X9 − 1
X9 − X6
X6 − 1
X6 − X3
X3 − 1
X3 − 1
0
Logo X 12 − 1 = (X 3 − 1)(X 9 + X 6 + X 3 + 1), o resto é zero.
Ou seja X 3 − 1 divide X 12 − 1.

(3) Encontre dois polinômios G(X), H(X) ∈ Q[X] tais que


G(X)(X 3 + 2) + H(X)(X 2 + X + 1) = 1.

Pode-se aplicar o algoritmo de Euclides, mas neste caso o pro-


blema é reduzido a uma simples divisão com resto.
X3 + 2 X2 + X + 1
X3+X +X 2 X −1
−X 2 − X + 2
−X 2 − X − 1
3
108 3. ANEIS

Logo X 3 + 2 = (X 2 + X + 1)(X − 1) + 3 e dividindo por 3 obtemos


1 3 1
(X + 2) + (− (X − 1))(X 2 + X + 1) = 1.
3 3

(4) Encontre dois polinômios G(X), H(X) ∈ Q[X] tais que


G(X)(X 2 − 5X + 6) + H(X)(X 3 − 4X) = X − 2.

Pode-se aplicar o algoritmo de Euclides, mas neste caso o pro-


blema é reduzido a uma simples divisão com resto.
X 3 − 4X X 2 − 5X + 6
X3 2
− 5X + 6X X +5
2
5X − 10X
5X 2 − 25X + 30
15X − 30
Logo X 3 − 4X = (X 2 − 5X + 6)(X + 5) + 15X − 30 e dividindo por
15 obtemos
1 1
(X 3 − 4X) − (X + 5)(X 2 − 5X + 6) = X − 2.
15 15

(5) Mostre por indução que se n ∈ N existe An (X) ∈ Q[X] tal que
X n − 1 = (X − 1)An (X).

A base da indução é n = 0 que dá X 0 −1 = 1−1 = 0 = (X −1)0


logo basta escolher A0 (X) = 0. Suponha X n − 1 = (X − 1)An (X)
ou seja X n = 1 + (X − 1)An (X), mostraremos que existe An+1 (X)
tal que X n+1 − 1 = (X − 1)An+1 (X). Temos
X n+1 − 1 = XX n − 1 = X(1 + (X − 1)An (X)) − 1
= X − 1 + X(X − 1)An (X) = (1 + XAn (X))(X − 1)
logo basta escolher An+1 (X) = 1 + XAn (X).

Calculando os An (X) obtemos que A0 (X) = 0, A1 (X) = 1 +


X · 0 = 1, A2 (X) = 1 + X · 1 = 1 + X, A2 (X) = 1 + X(1 + X) =
1 + X + X 2 , etc.

(6) Existe uma formula para o grau de A(X) + B(X) que depende só
dos graus de A(X) e B(X)?

Não existe, pois por exemplo considerando os dois casos B(X) =


A(X) e B(X) = −A(X)+1 temos que A(X)+A(X) tem grau igual
ao grau de A(X) entretanto A(X) + (−A(X) + 1) = 1 tem grau
zero (independentemente do grau de A(X)).
4. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 109

(7) Seja P (X) um polinômio de Q[X] e seja a ∈ Q. Mostre que se


P (a) = 0 então X − a divide P (X). [Dica: faça a divisão com resto
de P (X) por X − a.]

A divisão com resto entre P (X) e X − a dá dois polinômios


Q(X), R(X) com R(X) nulo ou de grau zero (menor que o grau
de X − a, que é 1), tais que P (X) = (X − a)Q(X) + R(X). Como
R(X) é nulo ou de grau zero, podemos escrever R(X) = r ∈ Q, daı́
P (X) = (X − a)Q(X) + r e substituindo X = a e lembrando que
P (a) = 0 temos 0 = P (a) = (a − a)Q(a) + r = r logo r = 0, daı́
P (X) = (X − a)Q(X).

4.3. Seção “Aneis comutativos unitários”.


(1) Faça a divisão com resto entre X 4 + X 2 + 3 e 3X 2 + X em Q[X].

X4 + X2 + 3 3X 2 + X
X 4 + 31 X 3 1 2
3X − 19 X + 10
27
1 3
− 3 X + X2 + 3
− 13 X 3 − 91 X 2
10 2
9 X +3
10 2 10
9 X + 27 X
10
− 27 X + 3
O quociente é 13 X 2 − 19 X + 10
27 , o resto é − 10
27 X + 3.

(2) Faça a divisão com resto entre X 4 + X e 3X 2 + 1 em Z/5Z[X].

X 4 + X 3X 2 + 1
X 4 + 2X 2 2X 2 + 1
3X 2 + X
3X 2 + 1
X +4
O quociente é 2X 2 + 1, o resto é X + 4.

(3) Faça a divisão com resto entre X 3 + 2X 2 + 2X + 1 e X + 2 em


Z/3Z[X].

X 3 + 2X 2 + 2X + 1 X + 2
X 3 + 2X 2 X2 + 2
2X + 1
2X + 1
0
110 3. ANEIS

O quociente é X 2 + 2, o resto é 0.

(4) Calcule X(X − 1)(X − 2)(X − 3)(X − 4) em Z/5Z[X].

Temos
X(X − 1)(X − 2)(X − 3)(X − 4) = X(X 2 − 3X + 2)(X 2 − 7X + 12)
= X(X 2 + 2X + 2)(X 2 + 3X + 2)
= X(X 4 + 3X 3 + 2X 2 + 2X 3 + X 2 + 4X + 2X 2 + X + 4)
= X(X 4 + 4) = X 5 + 4X.

(5) Encontre todos os x ∈ Z/5Z tais que x2 = 4.

x2 = 4 significa x2 − 4 = 0 ou seja (x − 2)(x + 2) = 0 ou seja


(x − 2)(x − 3) = 0. Como Z/5Z é um corpo, (x − 2)(x − 3) = 0 se e
somente se x = 2 ou x = 3. Logo as soluções da equação são x = 2
e x = 3.

(6) Encontre todos os x ∈ Z/11Z tais que x2 − x + 2 = 0.

Uma estratégia é substituir todos os x ∈ Z/11Z para ver quais


verificam a equação. Uma maneira mais rápida é aplicar a formula
para resolver equações de segundo grau.
Alternativamente podemos observar que x2 − x = (x − 1/2)2 −
1/4 = (x − 6)2 − 3 logo a equação x2 − x + 2 = 0 é equivalente a
(x − 6)2 − 3 + 2 = 0 ou seja (x − 6)2 = 1, ou seja (x − 6)2 − 1 = 0
ou seja (x − 6 − 1)(x − 6 + 1) = 0 ou seja (x − 7)(x − 5) = 0. Como
Z/11Z é um corpo, as única soluções são x = 7 e x = 5.

(7) Encontre todos os x ∈ Z/8Z tais que x2 = 1.

Uma reformulação equivalente é (x − 1)(x + 1) = 0. Queriamos


dizer que as únicas soluções são 1 e −1 = 7 mas infelizmente Z/8Z
não é um corpo, logo (x − 1)(x + 1) = 0 não implica que um dos
fatores é zero. Calculando os quadrados dos elementos de Z/8Z
temos 02 = 0, 12 = 1, 22 = 4, 32 = 1, 42 = 0, 52 = 1, 62 = 4,
72 = 1. Logo as soluções da equação x2 = 1 são 1, 3, 5, 7. Observe
que X 2 − 1 ∈ Z/8Z[X] é um polinômio de grau 2 com 4 raizes.

(8) Encontre todos os x ∈ Z/16Z tais que x4 = 0.

Se x é impar então x4 é impar logo não é zero módulo 16. Por


outro lado se x é par então x4 é divisı́vel por 16 logo é zero módulo
16. Isso implica que as soluções da equação são 0, 2, 4, 6, 8, 10, 12,
4. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 111

14. Observe que X 4 ∈ Z/16Z[X] é um polinômio de grau 4 com 8


raizes.

(9) Sejam A e B dois aneis (comutativos, unitários).


Seja R = A × B o produto cartesiano entre A e B.
Mostre que R é um anel (comutativo, unitário) com as operações
(a1 , b1 ) + (a2 , b2 ) = (a1 + a2 , b1 + b2 ),
(a1 , b1 ) · (a2 , b2 ) = (a1 a2 , b1 b2 ).
Mostre que U (R) = U (A) × U (B). O anel Q × Q é um corpo?

As operações são associativa pois são associativas em A e B:


(a, b) + ((c, d) + (e, f )) = (a, b) + (c + e, d + f ) = (a + (c + e), b + (d +
f )) = ((a + c) + e, (b + d) + f ) = (a + c, b + d) + (e, f ) = ((a, b) +
(c, d))+(e, f ), e (a, b)((c, d)(e, f )) = (a, b)(ce, df ) = (a(ce), b(df )) =
((ac)e, (bd)f ) = (ac, bd)(e, f ) = ((a, b)(c, d))(e, f ). As operações
são comutativas pois elas são comutativas em A e B: (a, b)+(c, d) =
(a+c, b+d) = (c+a, d+b) = (c, d)+(a, b) e (a, b)(c, d) = (ac, bd) =
(ca, db) = (c, d)(a, b). O elemento neutro da soma é (0, 0), de fato
(a, b) + (0, 0) = (a, b) para todo (a, b) ∈ R. O inverso aditivo
(oposto) de (a, b) é (−a, −b) pois (a, b) + (−a, −b) = (a − a, b − b) =
(0, 0). O elemento neutro do produto é (1, 1), de fato (a, b)(1, 1) =
(a, b) para todo (a, b) ∈ R. Propriedade distributiva:
(a, b)((c, d) + (e, f )) = (a, b)(c + e, d + f ) = (a(c + e), b(d + f ))
= (ac + ae, bd + bf ) = (ac, bd) + (ae, bf )
= (a, b)(c, d) + (a, b)(e, f ).
Um elemento (a, b) ∈ R admite inverso exatamente quando existe
(x, y) ∈ R tal que (a, b)(x, y) = (1, 1) ou seja (ax, by) = (1, 1) ou
seja ax = 1 e by = 1 ou seja a admite inverso em A e b admite
inverso em B. Isso mostra que U (A × B) = U (A) × U (B). O
anel Q × Q não é um corpo pois U (Q × Q) = U (Q) × U (Q) =
(Q − {0}) × (Q − {0}) 6= (Q × Q) − {(0, 0)}. Explicitamente por
exemplo o elemento (1, 0) não admite inverso porque 0 não admite
inverso, por outro lado (1, 0) 6= (0, 0). Ainda mais explicitamente,
não tem como (1, 0) ter inverso porque (1, 0)(0, 1) = (0, 0).

(10) Seja A o conjunto das funções f : R → R. Mostre que A é um anel


comutativo unitário com as operações
(f + g)(x) := f (x) + g(x), (f · g)(x) := f (x)g(x).
Calcule U (A).

Observe que a igualdade entre duas funções f = g significa que


f (x) = g(x) para todo x ∈ R (!). A ideia é que as propriedades de A
112 3. ANEIS

seguem das propriedades do anel R. A soma é associativa pois ((f +


g)+h)(x) = (f +g)(x)+h(x) = (f (x)+g(x))+h(x) = f (x)+(g(x)+
h(x)) = f (x)+(g+h)(x) = (f +(g+h))(x) logo (f +g)+h = f +(g+
h) para todo f, g, h ∈ A, o elemento neutro da soma é a função nula
0 definida por 0(x) = 0, o inverso aditivo (oposto) da função f ∈ A
é −f , definida por (−f )(x) := −f (x). A soma é comutativa pois
(f + g)(x) = f (x) + g(x) = g(x) + f (x) = (g + f )(x). O produto
é associativo pois ((f g)h)(x) = (f g)(x)h(x) = (f (x)g(x))h(x) =
f (x)(g(x)h(x)) = f (x)(gh)(x) = (f (gh))(x) logo (f g)h = f (gh)
para todo f, g, h ∈ A, o elemento neutro do produto é a função
1 definida por 1(x) = 1. O produto é comutativo pois (f g)(x) =
f (x)g(x) = g(x)f (x) = (gf )(x). Propriedade distributiva:

(f (g + h))(x) = f (x)((g + h)(x)) = f (x)(g(x) + h(x))


= f (x)g(x) + f (x)h(x) = (f g)(x) + (f h)(x)
= (f g + f h)(x)
logo f (g + h) = f g + f h para todo f, g, h ∈ A. Um elemento
f ∈ A admite inverso g ∈ A exatamente quando f g = 1 ou seja
f (x)g(x) = 1 para todo x ∈ R. Isso implica em particular que
f (x) 6= 0 para todo x ∈ R, e neste caso g(x) = 1/f (x) define o
inverso de f . Logo U (A) = {f ∈ A : f (x) 6= 0 ∀x ∈ R}.

(11) Seja A o conjunto das funções fm : Z → Z definidas por fm (x) :=


mx onde m ∈ Z. Mostre que A é um anel comutativo unitário com
as operações
(fn + fm )(x) := fn (x) + fm (x), (fn · fm )(x) := fn (fm (x)).
Ou seja a soma é por componentes, o produto é a composição.
Calcule U (A).

Observe que a igualdade entre duas funções fn = fm significa


que fn (x) = fm (x) para todo x ∈ Z (!). A ideia é que as proprieda-
des de A seguem das propriedades do anel Z. Observe que a soma
é bem definida pois (fn + fm )(x) = fn (x) + fm (x) = nx + mx =
(n + m)x = fn+m (x) e fn+m ∈ A, logo fn+m = fn + fm . A soma é
associativa pois
(fn + fm ) + fk = fn+m + fk = f(n+m)+k = fn+(m+k)
= fn + fm+k = fn + (fm + fk ).
A soma é comutativa pois
fn + fm = fn+m = fm+n = fm + fn .
O elemento neutro da soma é a função f0 pois
f0 + fm = f0+m = fm = fm+0 = fm + f0 .
4. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 113

O inverso aditivo (oposto) de fm é f−m pois


fm + f−m = fm−m = f0 = f−m+m = f−m + fm .
O produto (a composição) é bem definido pois (fn fm )(x) = fn (fm (x)) =
fn (mx) = n(mx) = (nm)x = fnm (x) logo fn fm = fnm . O produto
é associativo pois
(fn fm )fk = fnm fk = f(nm)k = fn(mk)
= fn fmk = fn (fm fk ).
O produto é comutativo pois
fn fm = fnm = fmn = fm fn .
O elemento neutro do produto é a função f1 , de fato
fm f1 = fm1 = fm = f1m = f1 fm .
Propriedade distributiva:
fn (fm + fk ) = fn fm+k fn(m+k) = fnm+nk
= fnm + fnk = fn fm + fn fk .
Um elementofm ∈ A admite inverso fn ∈ A se e somente se fn fm =
f1 ou seja fn (fm (x)) = f1 (x) para todo x ∈ Z ou seja nmx = x
para todo x ∈ Z ou seja (considerando o caso x = 1) nm = 1.
Daı́ m admite inverso em Z logo m = 1 ou −1, em outras palavras
U (A) = {f1 , f−1 } (grupo cı́clico de ordem 2 gerado por f−1 ).
Pn
(12) Mostre que i 2
i=1 (−1) i = 21 (−1)n n(n + 1) para todo n ≥ 1.

A base da indução é n = 1 que dá


1
X 1
(−1)i i2 = (−1)1 1(1 + 1)
2
i=1
Pn i 2
ou seja −1 = −1 que é verdadeiro. Suponha i=1 (−1) i =
1 n
Pn+1 i 2 1 n+1
2 (−1) n(n + 1). Mostraremos que i=1 (−1) i = 2 (−1) (n +
1)(n + 2). Temos

n+1
X n
X
(−1)i i2 = (−1)i i2 + (−1)n+1 (n + 1)2
i=1 i=1
1
= (−1)n n(n + 1) + (−1)n+1 (n + 1)2
2
1
= (−1)n (n + 1)( n − (n + 1))
2
1 n+1
= (−1) (n + 1)(n + 2).
2
114 3. ANEIS

(13) Mostre que n2 < 2n para todo n ≥ 5.

A base da indução é 52 < 25 ou seja 25 < 32 que é verdadeiro.


Suponha n2 < 2n . Mostraremos que (n + 1)2 < 2n+1 . Temos
(n + 1)2 = n2 + 2n + 1 < 2n + 2n + 1, logo o que queremos mostrar
é que 2n + 2n + 1 ≤ 2n+1 ou seja 2n + 1 ≤ 2n , para todo n ≥
5. Mostraremos isso por indução. O caso base é n = 5 que dá
2·5+1 ≤ 25 ou seja 11 ≤ 32 que é verdadeiro. Suponha 2n+1 ≤ 2n ,
mostraremos que 2(n + 1) + 1 ≤ 2n+1 . Temos 2(n + 1) + 1 =
(2n + 1) + 2 ≤ 2n + 2 logo basta mostrar que 2n + 2 ≤ 2n+1 ou seja
2 ≤ 2n que é verdadeiro pois n ≥ 5.

5. Ideais
A complexidade de um anel é medida usando a noção de “ideal”.
Definição (Ideal). Seja A um anel comutativo unitário. Um ideal de
A é um subconjunto I ⊆ A tal que
(1) I é um subgrupo aditivo de A (ou seja I é um subgrupo de A com
respeito à soma),
(2) se a ∈ A e x ∈ I então ax ∈ I.
Por exemplo {0} e A são (obviamente) ideais de A (para qualquer anel
comutativo unitário A).

Por exemplo se n é um inteiro então nZ = {nz : z ∈ Z} é um ideal do


anel Z. De fato já sabemos que nZ é um subgrupo aditivo de Z e se a ∈ Z
e nz ∈ nZ então ax = anz = n(az) ∈ nZ.

Por exemplo se A = Q[X] então o conjunto S = {nX : n ∈ Z} não é


um ideal pois X ∈ S mas X 2 = X · X 6∈ S (todos os polinômios em S têm
grau 1 enquanto X 2 tem grau 2). Logo não vale o axioma 2 da definição de
ideal neste caso.

Por exemplo Z ⊆ Q[X] mas Z não é um ideal de Q[X], de fato 1 ∈ Z,


X ∈ Q[X] mas 1 · X = X 6∈ Z.

Exemplo importante: seja k um corpo e seja a ∈ k. O conjunto


I := {P (X) ∈ k[X] : P (a) = 0}
é um ideal de k[X]. De fato é um subgrupo aditivo pois 0(a) = 0, se
P (X), Q(X) ∈ I então (−P )(a) = −P (a) = 0 e (P +Q)(a) = P (a) +Q(a) =
0 + 0 = 0, e verifica o axioma 2 pois se P (X) ∈ I e Q(X) ∈ k[X] então
(P Q)(a) = P (a)Q(a) = 0Q(a) = 0.
Definição (Ideal principal). Seja A um anel comutativo unitário. Seja
r ∈ A. O “ideal principal gerado por r” é o conjunto (r) := {rx : x ∈ A}.
Se trata de um ideal de A.
5. IDEAIS 115

Vamos mostrar que (r) é realmente um ideal de A.


Axioma 1. (r) é um subgrupo aditivo de A, de fato 0 ∈ (r) sendo 0 = r0
e se rx, ry ∈ (r) então rx + ry = r(x + y) ∈ (r), −(rx) = r(−x) ∈ (r).
Axioma 2. Se a ∈ A e rx ∈ (r) então a(rx) = r(ax) ∈ (r).

Por exemplo {0} e A são ideais principais de A sendo {0} = (0) e A = (1).

Por exemplo se A = Z e r ∈ A então (r) = rZ.

Por exemplo se k é um corpo o ideal (X) de k[X] é o ideal


(X) = {XP (X) : P (X) ∈ k[X]}.

Exemplo importante: ideal gerado por dois elementos. Seja A um


anel comutativo unitário e sejam a, b ∈ A. Considere (a, b) := {ax + by :
x, y ∈ A}. Se trata de um ideal de A. De fato 0 ∈ (a, b) sendo 0 = a0 + b0,
e se ax1 + by1 , ax2 + by2 ∈ (a, b) então
(ax1 + by1 ) + (ax2 + by2 ) = a(x1 + x2 ) + b(y1 + y2 ) ∈ (a, b).
Axioma 2: se ax+by ∈ (a, b) e z ∈ A então z(ax+by) = a(zx)+b(zy) ∈ (a, b).

Todos os ideais de Z são principais. De fato um ideal I de Z tem que ser


em particular um subgrupo aditivo (por definição de ideal) logo tem a forma
nZ para algum n ∈ Z e já observamos que nZ é o ideal principal gerado por
n, ou seja nZ = (n).

Mostraremos que a mesma coisa vale para k[X] quando k é um corpo.


Proposição. Seja k um corpo. Todos os ideais de k[X] são principais.
Demonstração. Seja I um ideal de k[X]. Se I = {0} então I =
(0) é principal, suponha I 6= {0}. Seja P (X) um polinômio de I de grau
mı́nimo (que existe pelo principio da boa ordenação). Mostraremos que
I = (P (X)). A inclusão (P (X)) ⊆ I é obvia pois se F (X) ∈ k[X] então
P (X)F (X) ∈ I por definição de ideal, sendo P (X) ∈ I. Mostraremos a
inclusão I ⊆ (P (X)). Seja G(X) ∈ I qualquer. Fazendo a divisão com resto
entre G(X) e P (X) obtemos Q(X), R(X) ∈ k[X] (quociente e resto) tais
que G(X) = P (X)Q(X) + R(X) e R(X) é nulo ou de grau menor que o
grau de P (X). Sendo P (X) ∈ I e I um ideal, P (X)Q(X) ∈ I, logo sendo I
um subgrupo aditivo de A, e G(X) ∈ I, temos
R(X) = G(X) − P (X)Q(X) ∈ I
e isso mostra que R(X) = 0 (pela minimalidade do grau de P (X)). Logo
G(X) = P (X)Q(X) ∈ (P (X)). 
Lembre-se da definição de (a, b) acima (ideal gerado por dois elementos).
Sabemos que se a, b ∈ Z então (a, b) é principal (pois é um ideal de Z, e todos
116 3. ANEIS

os ideais de Z são principais). Logo existe d ∈ Z tal que (a, b) = (d). Tal d
é exatamente o maior divisor comum entre a e b (e a mesma coisa vale para
k[X]). Ou seja:
Proposição. Se a, b ∈ Z e d é o maior divisor comum entre a e b então
(a, b) = (d).
Demonstração. Mostraremos as duas inclusões.
Mostraremos que (a, b) ⊆ (d). d divide a e b logo existem z, w inteiros
com dz = a e dw = b daı́ a = dz ∈ (d) e b = dw ∈ (d). Um elemento
qualquer de (a, b) é ax + by = dzx + dwy = d(zx + wy) ∈ (d). Isso mostra
que (a, b) ⊆ (d).
Mostraremos que (d) ⊆ (a, b). Pelo algoritmo de Euclides existem u, v
inteiros com au+bv = d logo d ∈ (a, b), logo se t ∈ Z então dt = (au+bv)t =
a(ut) + b(vt) ∈ (a, b). Isso mostra que (d) ⊆ (a, b). 
Por exemplo no anel Z temos (4, 15) = (1) = Z ou seja todo inteiro é
uma combinação de 4 e 15, de fato 4 · 4 − 15 = 1 logo dato n ∈ Z qualquer,
4 · 4n − 15 · n = n.

Por exemplo uma simples divisão com resto mostra que X +1 e X −1 são
coprimos, ou seja (X +1, X −1) = (1) = Q[X] de fato 21 (X +1)+ 12 (X −1) = 1
logo se P (X) ∈ Q[X] então
1 1
(X + 1) · P (X) + (X − 1) · P (X) = P (X),
2 2
logo todo polinômio é “combinação” de X + 1 e X − 1.

Maior divisor comum entre polinômios.

No anel Q[X] temos (X 2 − 1, X 2 − X) = (X − 1) sendo X − 1 um maior


divisor comum entre X 2 − 1 = (X − 1)(X + 1) e X 2 − X = X(X − 1).
Observe que 2(X − 1) também é um maior divisor comum entre X 2 − 1 e
X 2 − X sendo
1 1
X 2 − 1 = 2(X − 1) · (X + 1), X 2 − X = 2(X − 1) · X.
2 2
Mais em geral se 0 6= c ∈ Q então c(X − 1) é um maior divisor comum entre
X 2 − 1 e X 2 − X sendo
1 1
X 2 − 1 = c(X − 1) · (X + 1), X 2 − X = c(X − 1) · X.
c c
Mais em geral se P (X) é um maior divisor comum entre G(X) e H(X) então
cP (X) é um maior divisor comum entre G(X) e H(X) para todo 0 6= c ∈ Q,
ou seja “o maior divisor comum entre polinômios é definido a menos de
multiplicar por uma constante não nula”. Por outro lado (cP (X)) = (P (X))
se 0 6= c ∈ Q (veja a lista de exercı́cios).
6. FATORAÇÃO 117

Exercı́cios.

(1) Mostre que no anel Z temos (100) ⊆ (50) ⊆ (5).


(2) Mostre que no anel Q[X] temos (X 3 − 2X 2 ) ⊆ (X 2 ) ⊆ (X).
(3) No anel Z encontre d ∈ Z tal que (12, 26) = (d).
(4) Seja A um anel comutativo unitário e sejam a, b ∈ A. Mostre que
a ∈ (b) se e somente se (a) ⊆ (b).
(5) No anel Q[X] encontre P (X) ∈ Q[X] tal que (X 2 − 4, X 3 − 8) =
(P (X)).
(6) Seja A = Q[X]. Mostre que {P (X) ∈ A : P (1) = 0} = (X − 1).
(7) Seja A um anel comutativo unitário, sejam a ∈ A e u ∈ U (A).
Mostre que (a) = (ua).
(8) Aplique o exercı́cio anterior para mostrar que se k é um corpo,
0 6= c ∈ k e P (X) ∈ k[X] então (P (X)) = (cP (X)). [Dica: Como
já visto, U (k[X]) = k − {0}.]
(9) Conte os ideais I de Z tais que I ⊇ (12).
(10) Conte os ideais I de Q[X] tais que I ⊇ (X 3 − X).
(11) Seja A um anel comutativo unitário. Mostre que se I e J são ideais
de A então I ∩ J é um ideal de A.
(12) Seja A um anel comutativo unitário. Mostre que se I e J são ideais
de A então I + J = {i + j : i ∈ I, j ∈ J} é um ideal de A. Mostre
que se a, b ∈ A então (a) + (b) = (a, b).
(13) Seja A um anel comutativo unitário, seja I um ideal de A e seja
u ∈ U (A). Mostre que u ∈ I se e somente se I = A. O conjunto
A − U (A) é sempre um ideal?
(14) Conte os ideais do anel comutativo unitário A = Z/10Z.
[Dica: são subgrupos aditivos de A, que é um grupo aditivo
cı́clico de ordem 10.]
(15) Seja k um corpo, e seja F o conjunto das funções k → k. Seja
g : k[X] → F a função definida por g(P (X))(a) := P (a). Mostre
que g é injetiva se e somente se k é infinito.
(16) Encontre todos os x ∈ Z/17Z tais que x2 + 8x + 14 = 0.
(17) Conte os polinômios de grau 5 em Z/2Z[X].
(18) Mostre por indução que se A é um anel comutativo unitário e x ∈ A,
x2 = x então xn = x para todo n ≥ 1.

6. Fatoração
Seja A um anel comutativo unitário. Se I é ideal de A quais são os ideais
J de A tais que J ⊇ I?

Se I e J são principais se trata de uma questão de divisibilidade. Se a


e b são elementos de um anel comutativo unitário A, “a divide b” significa
que existe x ∈ A tal que ax = b.
118 3. ANEIS

Proposição. Seja A um anel comutativo unitário e sejam a, b elemen-


tos de A. Então (a) ⊆ (b) se e somente se b divide a, e (a) = (b) se e
somente se b divide a e a divide b.

Demonstração. A segunda frase é consequência da primeira (lem-


brando que (a) = (b) significa (a) ⊆ (b) e (b) ⊆ (a)). Mostraremos a
primeira. Se (a) ⊆ (b) então a = a · 1 ∈ (a) ⊆ (b) logo a ∈ (b) ou seja
existe x ∈ A tal que bx = a ou seja b divide a. Se b divide a então a = bx
com x ∈ A e se ar é um elemento qualquer de (a) (onde r ∈ A) então
ar = bxr ∈ (b). Isso mostra que (a) ⊆ (b). 

Por exemplo quais são os ideais de Z contendo (10)? Se I é um ideal


de Z que contem (10) então I é principal (porque todos os ideais de Z são
principais) e escrevendo I = (b), I = (b) ⊇ (10) significa que b divide 10,
logo b tem que ser 1, −1, 2, −2, 5, −5, 10, −10. Logo os ideais de Z que
contêm (10) são (1), (−1), (2), (−2), (5), (−5), (10), (−10). Por outro lado
se a é um inteiro a divide −a (sendo −a = (−1)a) e −a divide a (sendo
a = (−1)(−a)) logo os ideais principais (a) e (−a) são iguais: (a) = (−a).
Isso mostra que (1) = (−1), (2) = (−2), (5) = (−5) e (10) = (−10) logo
existem exatamente quatro ideais contendo (10), eles são (1), (2), (5), (10).

Se P (X), Q(X) são polinômios não nulos em k[X] (onde k é um corpo)


(P (X)) = (Q(X)) significa que P (X) = cQ(X) com c um elemento não
nulo de k. De fato se (P (X)) = (Q(X)) então P (X) divide Q(X) e Q(X)
divide P (X), logo existem F (X), Q(X) ∈ k[X] tais que P (X) = F (X)Q(X)
e Q(X) = G(X)P (X) daı́ P (X) = F (X)G(X)P (X) logo podemos escrever
P (X)(1 − F (X)G(X)) = 0 daı́ 1 − F (X)G(X) = 0 (pois se um produto
de polinômios é zero então um deles é zero: basta olhar aos graus) logo
F (X) e G(X) são costantes não nulas (o produto F (X)G(X) tendo grau
zero), F (X) = c, G(X) = c−1 . Por outro lado P (X) divide cP (X) (claro) e
cP (X) divide P (X) (sendo P (X) = c−1 · cP (X)) logo (P (X)) = (cP (X)).

Por exemplo sendo X 2 − X = X(X − 1), os ideais de Q[X] que contêm


X2 − X são (1), (X), (X − 1) e (X 2 − X). Observe que 2X também divide
X − X sendo X 2 − X = 2X · 21 (X − 1) mas não aparece na lista pois
2

(2X) = (X) (pois X divide 2X e 2X divide X, sendo X = 2X · 21 X).

Por exemplo seja P (X) = X 2 + 2X + 6 ∈ Z/7Z[X]. A formula de


resolução das equações de segundo grau mostra que as raizes de P (X) são
2 e 3 logo P (X) = (X − 2)(X − 3). Logo os ideais de Z/7Z[X] contendo
P (X) são (1), (X − 2), (X − 3) e (X 2 + 2X + 6).

Observe que por outro lado existem infinitos ideais de Q[X] contidos
em (X), por exemplo todos os ideais (X n ) (onde n ≥ 1) estão contidos em
(X) (e são todos distintos). Em geral um dado ideal de k[X] com k corpo
6. FATORAÇÃO 119

contem infinitos ideais e está contido apenas em um número finito de ideais


(e a mesma coisa vale para Z).

Algumas observações para lidar com fatoração de polinômios. Seja k um


corpo. Um polinômio P (X) de k[X] é chamado de “redutı́vel” se existem
dois polinômios P1 (X), P2 (X) ∈ k[X] de grau positivo tais que P (X) =
P1 (X)P2 (X). Um polinômio não redutı́vel é chamado de irredutı́vel (os
polinômios irredutı́veis são analogos aos números primos em Z).
• Seja k um corpo e seja P (X) ∈ k[X] de grau 2 ou 3. Se P (X)
é redutı́vel então admite um fator de grau 1. De fato escrevendo
P (X) = P1 (X)P2 (X) temos que o grau de P (X) é a soma n1 + n2
onde ni é o grau de Pi (X) para i = 1, 2. Logo um entre n1 e n2
tem que ser 1 (eles são inteiros não negativos cuja soma é 2 ou 3).
• Seja k um corpo e seja P (X) ∈ k[X]. Então P (X) admite uma
raiz em k se e somente se P (X) admite um fator de grau 1. De
fato se P (X) admite uma raiz c ∈ k então P (c) = 0 logo X − c
divide P (X) em k[X], daı́ X − c é um fator de P (X) de grau 1.
Por outro lado se aX + b ∈ k[X] é um fator de P (X) de grau 1
então a 6= 0 (pois o grau é 1) e P (−b/a) = a(−b/a) + b = 0 (onde
1/a = a−1 ∈ k sendo k corpo e a ∈ k diferente de zero). Logo −b/a
é raiz de P (X).
• Seja
Pn P (X)i ∈ Q[X] um polinômio com coeficientes inteiros, P (X) =
i=0 ai X com ai ∈ Z para todo i = 0, 1, . . . , n. Suponha an = 1
(ou seja, P (X) é “mônico”). Se a é uma raiz racional de P (X)
então a ∈ Z.
De fato escreva a = r/s com r, s inteiros coprimos (todo número
racional pode ser escrito dessa forma). Temos P (X) = X n +
Pn−1 i
i=0 ai X sendo an = 1. A igualdade P P (r/s) = 0 pode ser es-
n−1
crita assim (multiplicando por sn ): rn + i=0 ai ri sn−i = 0 logo
n−1
X n−1
X
n i n−i
r =− ai r s = −s · ai ri sn−i−1 = −st
i=0 i=0
Pn−1
onde t = i=0 ai ri sn−i−1 é um inteiro! (De fato ai é um inteiro
para todo i por hipótese, e r, s são inteiros). Logo rn = −st
daı́ s divide rn , e sendo r e s coprimos isso implica s = ±1 logo
r/s = ±r ∈ Z.
• Se P (X) tem coeficientes inteiros e c é um inteiro tal que P (c) = 0
então c divide P (0). De fato P (X) tem a forma XQ(X)+P (0) onde
Q(X) ∈ Q[X] tem coeficientes inteiros (coloquei X em evidência)
e a igualdade P (c) = 0 pode ser escrita cQ(c) + P (0) = 0 ou seja
P (0) = −cQ(c) logo c divide P (0) (sendo Q(c) ∈ Z, tendo Q(X)
coeficientes inteiros).
120 3. ANEIS

Por exemplo as possı́veis raizes inteiras de P (X) = X 3 + 3X 2 + 3X + 2


são os divisores do coeficiente de grau zero, ou seja 1, −1, 2, −2, uma verifica
mostra que P (−2) = 0 e uma divisão com resto mostra que P (X) = (X +
2)(X 2 + X + 1). O polinômio Q(X) = X 2 + X + 1 ∈ Q[X] é irredutı́vel pois
é mônico, tem coeficientes inteiros e não admite raizes inteiras (as eventuais
raizes inteiras dividem Q(0) = 1 mas Q(1) = 3 6= 0 e Q(−1) = 1 6= 0).

O polinômio X 3 − 2 ∈ Q[X] é irredutı́vel. De fato é mônico de grau 3


e os seus coeficientes são inteiros, logo é redutı́vel se e somente se existe c
inteiro tal que c3 − 2 = 0, mas isso significa c3 = 2 que é sempre falso se c for
inteiro. Logo os únicos ideais de Q[X] que contêm (X 3 − 2) são (1) = Q[X]
e (X 3 − 2).

Observe que X 3 −2 não é mais irredutı́vel se considerado no anel Z/pZ[X]


com p primo. Por exemplo módulo 2 é X 3 , módulo 3 é (X + 1)3 , módulo 5 é
(X −3)(X 2 +3X +4) (e X 2 +3X +4 é irredutı́vel em Z/5Z[X] pois tem grau
2 e não tem raizes em Z/5Z), etc. Logo por exemplo os ideais de Z/3Z[X]
contendo (X 3 − 2) são (1), (X + 1), ((X + 1)2 ), ((X + 1)3 ). Os ideais de
Z/5Z[X] contendo (X 3 − 2) são (1), (X − 3), (X 2 + 3X + 4), (X 3 − 2).

Observe que se P (X) ∈ k[X] tem grau no máximo 3 então é irredutı́vel


se e somente se P (a) 6= 0 para todo a ∈ k. De fato para ser redutı́vel deve
admitir um fator de grau 1, ou seja uma raiz em k. Assim por exemplo os
polinômios irredutı́vel de grau 2 em Z/3Z[X] são X 2 + 2X + 1, X 2 + X + 2,
2X 2 + X + 2, 2X 2 + 2X + 1, X 2 + 1, 2X 2 + 2 (basta fazer a lista de todos
os polinômios de grau 2 e eliminar aqueles que admitem raizes em Z/3Z).

O próximo resultado dá uma ideia de como os ideais de um anel deter-


minam a estrutura dele.
Proposição. Seja A um anel comutativo unitário. Então A é um corpo
se e somente seus únicos ideais de A são {0} e A (ou seja (0) e (1)).
Demonstração. Primeira implicação. Se A é um corpo e I 6= {0} é
ideal de A seja u ∈ I com u 6= 0, daı́ u ∈ U (A) (porque A é um corpo) logo
existe v = u−1 ∈ A, daı́ 1 = uv ∈ I (por definição de ideal) logo se a ∈ A
então a = a · 1 ∈ I (por definição de ideal). Isso mostra que A ⊆ I logo
A = I sendo a inclusão I ⊆ A verdadeira por definição de ideal. Segunda
implicação. Se os únicos ideais de A são {0} e A então dado a ∈ A diferente
de zero (a) é ideal não nulo de A (pois (a) = {0} se e somente se a = 0) logo
(a) = A (porque os únicos ideais de A são {0} e A) daı́ 1 ∈ A = (a) ou seja
1 ∈ (a) logo existe b ∈ A tal que ab = 1 logo a ∈ U (A). 

A próxima tabela mostra as fatorações de X 3 + X 2 + X + 3 módulo p


para muitos primos p.
6. FATORAÇÃO 121

p X3 + X2 + X + 3 p X3 + X2 + X + 3
2 (X + 1)3 53 (X + 43)(X 2 + 11X + 5)
3 X(X + 2)2 59 (X + 12)(X 2 + 48X + 15)
5 X3 + X2 + X + 3 61 (X + 6)(X 2 + 56X + 31)
7 (X + 4)(X 2 + 4X + 6) 67 (X + 23)(X + 52)(X + 60)
11 X3 + X2 + X + 3 71 (X + 38)(X + 52)(X + 53)
13 X3 + X2 + X + 3 73 (X + 34)(X 2 + 40X + 28)
17 (X + 5)(X + 15)2 79 (X + 74)(X 2 + 6X + 31)
19 X3 + X2 + X + 3 83 (X + 45)(X 2 + 39X + 72)
23 X3 + X2 + X + 3 89 (X + 32)(X 2 + 58X + 14)
29 (X + 11)(X + 23)(X + 25) 97 (X + 59)(X 2 + 39X + 28)
31 (X + 15)(X 2 + 17X + 25) 101 (X + 75)(X 2 + 27X + 97)
37 (X + 25)(X 2 + 13X + 9) 103 X3 + X2 + X + 3
41 X3 + X2 + X + 3 107 X3 + X2 + X + 3
43 X3 + X2 + X + 3 113 X3 + X2 + X + 3
47 (X + 31)(X 2 + 17X + 38) 127 X3 + X2 + X + 3

BONUS. Exemplo de ideal não principal: o ideal (2, X) do anel


Z[X] não é principal porque se fosse (2, X) = (P (X)) então P (X) divide 2
e divide X logo P (X) = ±1 (lembre-se que 2 não é invertı́vel em Z[X]) mas
(2, X) 6= (1) = (−1), de fato se fosse 1 = XG(X) + 2H(X) substituindo
X = 0 obteriamos 1 = 2H(0) absurdo sendo H(0) ∈ Z (sendo os coeficientes
de H(X) inteiros).

Exercı́cios.

(1) Escreva a fatoração de X 2 + 5X + 1 e de X 3 + 5X + 1 em Z/pZ[X]


para todo primo p ≤ 11.
(2) Mostre que X 3 + X + 1, X 3 + X + 3 ∈ Q[X] são irredutı́veis.
(3) Quais são os ideais de Q[X] contendo (X 3 − 4X 2 + X + 6)?
(4) Quais são os ideais de k[X] contendo (X 3 + X − 3) onde k é um
dos corpos Q, Z/pZ com p = 2, p = 3, p = 5, p = 7?
(5) Quais são os ideais de k[X] contendo (X 3 + 2X − 3) onde k é um
dos corpos Q, Z/pZ com p = 2, p = 3, p = 5, p = 7?
(6) Encontre P (X) ∈ k[X] tal que (X 5 + 2X 3 + X 2 + 1, X 2 + X − 2) =
(P (X)) nos casos k = Q, k = Z/5Z.
(7) Conte os polinômios irredutı́veis de grau 3 em Z/2Z[X].
(8) Conte os polinômios irredutı́veis de grau 2 em Z/5Z[X].
(9) Calcule (10) ∩ (12) no anel Z (encontre um gerador).
(10) Calcule (X 2 − X) ∩ (X 2 + X) no anel Q[X] (encontre um gerador).
(11) Seja k um corpo e sejam 0 e 1 os elementos neutros da soma e do
produto em k. Mostre que se 1 + 1 + 1 + 1 = 0 então 1 + 1 = 0.
122 3. ANEIS

(12) Seja A um anel comutativo unitário finito com |A| = p um número


primo. Mostre que A é um corpo.
(13) Seja A um anel comutativo unitário e sejam a, b ∈ A. Mostre que
se a2 = 0 e b3 = 0 existe um número natural n tal que (a + b)n = 0.
(14) Seja k = Z/3Z. Mostre que no anel k[X] temos
n n
(X + 1)3 = X 3 + 1
para todo n ≥ 1.

7. Resolução listas de exercı́cios


7.1. Seção “Ideais”.
(1) Mostre que no anel Z temos (100) ⊆ (50) ⊆ (5).

Um elemento de (100) tem a forma 100x com x inteiro e 100x =


50 · 2x ∈ (50) logo (100) ⊆ (50), um elemento de (50) tem a forma
50x com x inteiro e 50x = 5 · 10x ∈ (5) logo (50) ⊆ (5).

(2) Mostre que no anel Q[X] temos (X 3 − 2X 2 ) ⊆ (X 2 ) ⊆ (X).

Um elemento de (X 3 − 2X 2 ) tem a forma (X 3 − 2X 2 )P (X)


com P (X) ∈ Q[X] e (X 3 − 2X 2 )P (X) = X 2 (X − 2)P (X) ∈ (X 2 )
logo (X 3 − 2X 2 ) ⊆ (X 2 ). Um elemento de (X 2 ) tem a forma
X 2 P (X) com P (X) ∈ Q[X] e X 2 P (X) = X · XP (X) ∈ (X) logo
(X 2 ) ⊆ (X).

(3) No anel Z encontre d ∈ Z tal que (12, 26) = (d).

Se trata do maior divisor comum, logo (12, 26) = (2).

(4) Seja A um anel comutativo unitário e sejam a, b ∈ A. Mostre que


a ∈ (b) se e somente se (a) ⊆ (b).

Se a ∈ (b) e x ∈ A então ax ∈ (b) pois (b) é um ideal, logo


(a) ⊆ (b). Se (a) ⊆ (b) então a = a · 1 ∈ (a) ⊆ (b) logo a ∈ (b).

(5) No anel Q[X] encontre P (X) ∈ Q[X] tal que (X 2 − 4, X 3 − 8) =


(P (X)).

Se trata do maior divisor comum, logo (X 2 − 4, X 3 − 8) =


(X − 2).

(6) Seja A = Q[X]. Mostre que {P (X) ∈ A : P (1) = 0} = (X − 1).

Seja I = {P (X) ∈ A : P (1) = 0}. A inclusão (X − 1) ⊆ I


é clara pois um elemento de (X − 1) tem a forma P (X) = (X −
7. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 123

1)G(X) com G(X) ∈ Q[X] e P (1) = (1 − 1)G(1) = 0G(1) = 0.


Mostraremos a inclusão I ⊆ (X − 1). Seja P (X) ∈ I, queremos
mostrar que P (X) ∈ (X − 1). Efetuando a divisão com resto de
P (X) por X −1 encontramos um Q(X) ∈ Q[X] e um r ∈ Q tais que
P (X) = (X −1)Q(X)+r, por outro lado P (1) = 0 (pois P (X) ∈ I)
logo 0 = P (1) = (1 − 1)Q(1) + r = r logo r = 0 e concluimos que
P (X) = (X − 1)Q(X) ∈ (X − 1).

(7) Seja A um anel comutativo unitário, sejam a ∈ A e u ∈ U (A).


Mostre que (a) = (ua).

Mostraremos as duas inclusões. Sendo u ∈ U (A) existe v ∈ A


tal que uv = 1. Se ax ∈ (a) então ax = uvax = vxua ∈ (ua) logo
(a) ⊆ (ua). Se uax ∈ (ua) então uax = uxa ∈ (a) logo (ua) ⊆ (a).

(8) Aplique o exercı́cio anterior para mostrar que se k é um corpo,


0 6= c ∈ k e P (X) ∈ k[X] então (P (X)) = (cP (X)). [Dica: Como
já visto, U (k[X]) = k − {0}.]

É imediato sendo c ∈ U (k[X]) = k − {0}.

(9) Conte os ideais I de Z tais que I ⊇ (12).

Seja I um ideal de Z contendo (12). Temos I = (d) com d ∈ Z


(porque todos os ideais de Z são principais) e (d) ⊇ (12) significa
12 ∈ (d) (veja um dos exercı́cios acima) ou seja d divide 12. Logo
as possibilidades para d são 1, −1, 2, −2, 3, −3, 4, −4, 6, −6, 12, −12.
Entretanto (a) = (−a) sendo −1 ∈ U (Z) (veja os exercı́cios anteri-
ores) logo os ideais de Z que contêm (12) são (1), (2), (3), (4), (6),
(12). Existem exatamente 6 ideais contendo (12).

(10) Conte os ideais I de Q[X] tais que I ⊇ (X 3 − X).

Seja I um ideal de Q[X] contendo (X 3 −X). Temos I = (P (X))


com P (X) ∈ Q[X] (porque todos os ideais de Q[X] são principais,
sendo Q um corpo) e (P (X)) ⊇ (X 3 − X) significa X 3 − X ∈ P (X)
(veja os exercı́cios acima) ou seja P (X) divide X 3 − X. Por outro
lado X 3 − X = X(X − 1)(X + 1) logo os divisores mônicos (ou
seja o coeficiente de grau máximo é 1) de X 3 − X são 1, X, X − 1,
X +1, X(X −1), X(X +1), (X −1)(X +1) e X(X −1)(X +1), logo
existem exatamente 8 ideais contendo (X 3 − X) (os ideais gerados
pelos divisores mônicos).

(11) Seja A um anel comutativo unitário. Mostre que se I e J são ideais


de A então I ∩ J é um ideal de A.
124 3. ANEIS

0 ∈ I ∩ J pois 0 ∈ I e 0 ∈ J (sendo I e J ideais). Se x, y ∈ I ∩ J


então x, y ∈ I logo x + y ∈ I, −x ∈ I (sendo I ideal) e x, y ∈ J logo
x + y ∈ J, −x ∈ J (sendo J ideal). Isso mostra que x + y ∈ I ∩ J
e −x ∈ I ∩ J. Logo I ∩ J é um subgrupo aditivo de A. Se a ∈ A
e x ∈ I ∩ J então x ∈ I logo ax ∈ I (sendo I ideal), e x ∈ J logo
ax ∈ J (sendo J ideal), daı́ ax ∈ I ∩ J.

(12) Seja A um anel comutativo unitário. Mostre que se I e J são ideais


de A então I + J = {i + j : i ∈ I, j ∈ J} é um ideal de A. Mostre
que se a, b ∈ A então (a) + (b) = (a, b).

Temos 0 = 0 + 0 ∈ I + J sendo 0 ∈ I e 0 ∈ J e sendo I e J


ideais. Se i ∈ I e j ∈ J então −(i + j) = −i + (−j) ∈ I + J sendo
−i ∈ I e −j ∈ J e sendo I e J ideais. Se i1 , i2 ∈ I e j1 , j2 ∈ J então
(i1 + j1 ) + (i2 + j2 ) = (i1 + i2 ) + (j1 + j2 ) ∈ I + J sendo i1 + i2 ∈ I e
j1 + j2 ∈ J e sendo I e J ideais, logo I + J é um subgrupo aditivo
de A. Se a ∈ A e i + j ∈ I + J então a(i + j) = ai + aj ∈ I + J
sendo ai ∈ I e aj ∈ J e sendo I e J ideais. Logo I + J é um ideal
de A. Se a, b ∈ A então (a) + (b) = {i + j : i ∈ (a), j ∈ (b)} =
{ax + by : x, y ∈ A} = (a, b) (por definição de ideal gerado por
dois elementos).

(13) Seja A um anel comutativo unitário, seja I um ideal de A e seja


u ∈ U (A). Mostre que u ∈ I se e somente se I = A. O conjunto
A − U (A) é sempre um ideal?

Suponha u ∈ I. Para mostrar I = A basta mostrar A ⊆ I


(a inclusão contrária sendo clara). Se a ∈ A então a = uu−1 a ∈ I
sendo u ∈ I e sendo I um ideal. O conjunto A − U (A) não é sempre
um ideal, por exemplo Z−U (Z) = Z−{1, −1} não é um ideal porque
3 e −2 pertencem a Z − U (Z) mas 3 + (−2) = 1 6∈ Z − U (Z).

(14) Conte os ideais do anel comutativo unitário A = Z/10Z.


[Dica: são subgrupos aditivos de A, que é um grupo aditivo
cı́clico de ordem 10.]

Os subgrupos aditivos de Z/nZ são hdi com d che divide n.


Observe que hdi é um ideal de Z/nZ pois se a ∈ Z/nZ então ad ∈
hdi (pois ad é uma soma d+d+. . .+d logo pertence a hdi). Logo os
ideais de Z/nZ são exatamente os seus subgrupos aditivos. Como
10 tem quatro divisores positivos (ou seja 1, 2, 5 e 10), Z/10Z
contem exatamente 4 ideais (ou seja (0) = (10), (1), (2) e (5)).
7. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 125

(15) Seja k um corpo, e seja F o conjunto das funções k → k. Seja


g : k[X] → F a função definida por g(P (X))(a) := P (a). Mostre
que g é injetiva se e somente se k é infinito.

Suponha g injetiva. Se por contradição k é finito então k =


{a1 , . . . , an }. Considere o polinômio
P (X) = (X − a1 )(X − a2 ) · · · (X − an ).
É claro que P (a) = 0 para todo a ∈ k, logo g(P (X)) é igual à
função nula k → k (a função que leva tudo para 0). Por outro lado
g(0) também é a função nula, logo g(P (X)) = g(0). Sendo P (X)
de grau n, P (X) 6= 0, e isso contradiz o fato que g é injetiva.

Suponha k infinito. Mostraremos que g é injetiva. Sejam


P1 (X), P2 (X) ∈ k[X] tais que g(P1 (x)) = g(P2 (X)). Isso signi-
fica que P1 (a) = P2 (a) para todo a ∈ k, ou seja P1 (a) − P2 (a) = 0
para todo a ∈ k. Mas então o polinômio H(X) := P1 (X) − P2 (X)
verifica H(a) = 0 para todo a ∈ k, e sendo k infinito isso implica
que H(X) admite infinitas raizes. Como um polinômio de k[X] de
grau n tem no máximo n raizes (sendo k um corpo) H(X) não tem
grau, ou seja H(X) = 0 ou seja P1 (X) = P2 (X).

(16) Encontre todos os x ∈ Z/17Z tais que x2 + 8x + 14 = 0.

Temos x2 + 8x + 14 = (x + 4)2 − 2 logo a equação é equivalente


a (x + 4)2 = 2. Seja y = x + 4. Precisamos resolver y 2 = 2 ou seja
y 2 − 2 = 0. Como 62 = 36 = 2 temos que 6 é raiz de Y 2 − 2 logo
y 2 −2 = 0 pode ser escrito (y−6)(y+6) = 0. Sendo Z/17Z um corpo
deduzimos y − 6 = 0 ou y + 6 = 0 ou seja y = ±6, daı́ x + 4 = ±6
logo as duas soluções são x = −4 + 6 = 2 e x = −4 − 6 = −10 = 7.

(17) Conte os polinômios de grau 5 em Z/2Z[X].

Se trata dos polinômios aX 5 + bX 4 + cX 3 + dX 2 + eX + f com


a, b, c, d, e, f ∈ Z/2Z e a 6= 0. O único elemento de Z/2Z diferente
de zero é 1 logo a = 1. Daı́ temos duas escolhas para cada um dos
coeficientes b, c, d, e, f logo no anel Z/2Z[X] existem exatamente 25
polinômios de grau 5.

(18) Mostre por indução que se A é um anel comutativo unitário e x ∈ A,


x2 = x então xn = x para todo n ≥ 1.

A base da indução é x1 = x que é verdadeiro. Suponha xn = x,


queremos mostrar xn+1 = x. Lembrando que (por hipótese) x2 = x
obtemos xn+1 = xn x = xx = x2 = x.
126 3. ANEIS

7.2. Seção “Fatoração”.


(1) Escreva a fatoração de X 2 + 5X + 1 e de X 3 + 5X + 1 em Z/pZ[X]
para todo primo p ≤ 11.

Sejam P (X) = X 2 + 5X + 1, Q(X) = X 3 + 5X + 1. Sendo


polinômios de grau 2 ou 3, se forem redutı́veis admitem um fator
de grau 1 ou seja uma raiz no corpo dos coeficientes.

p = 2. Temos P (0) = 1 e P (1) = 1 logo P (X) é irredutı́vel em


Z/2Z[X]. Temos Q(0) = 1 e Q(1) = 1 logo Q(X) é irredutı́vel em
Z/2Z[X].

p = 3. Temos P (2) = 0 logo X − 2 divide P (X) e uma divisão


com resto (ou a formula de Bhaskara) mostra que P (X) = (X − 2)2
em Z/3Z[X]. Temos Q(0) = 1, Q(1) = 2 e Q(2) = 1 logo Q(X) é
irredutı́vel em Z/3Z[X].

p = 5. Temos P (2) = 0 logo X − 2 divide P (X) e uma divisão


com resto (ou a formula de Bhaskara) mostra que P (X) = (X −
2)(X − 3) em Z/5Z[X]. Temos Q(4) = 0 logo X − 4 divide Q(X) e
uma divisão com resto mostra que Q(X) = (X − 4)(X 2 + 4X + 1).
A fatoração terminou porque X 2 +4X +1 é irredutı́vel em Z/5Z[X]
(tem grau 2 e não tem raizes em Z/5Z).

p = 7. Temos P (1) = 0 logo X − 1 divide P (X) e uma divisão


com resto (ou a formula de Bhaskara) mostra que P (X) = (X − 1)2
em Z/7Z[X]. Temos Q(1) = 0 logo X−1 divide Q(X) e uma divisão
com resto mostra que Q(X) = (X − 1)(X 2 + X + 6). A fatoração
terminou porque X 2 + X + 6 é irredutı́vel em Z/7Z[X] (tem grau
2 e não tem raizes em Z/7Z).

p = 11. P (X) é irredutı́vel em Z/11Z[X] pois tem grau 2 e não


tem raizes em Z/11Z. Q(X) é irredutı́vel em Z/11Z[X] pois tem
grau 3 e não tem raizes em Z/11Z.

(2) Mostre que X 3 + X + 1, X 3 + X + 3 ∈ Q[X] são irredutı́veis.

São polinômios mônicos com coeficientes inteiros e de grau 3,


logo para mostrar que são irredutı́veis basta mostrar que não ad-
mitem raizes inteiras. As eventuais raizes inteiras são divisores do
coeficiente de grau zero. Logo P (X) = X 3 + X + 1 é irredutı́vel
pois P (1) = 3 6= 0 e P (−1) = −1 6= 0 e Q(X) = X 3 + X + 3 é
7. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 127

irredutı́vel pois Q(3) = 33 6= 0, Q(−3) = −27 6= 0, Q(1) = 5 6= 0 e


Q(−1) = 1 6= 0.

(3) Quais são os ideais de Q[X] contendo (X 3 − 4X 2 + X + 6)?

Para responder precisamos fatorar o polinômio P (X) = X 3 −


4X 2 + X + 6. Sendo P (X) mônico de grau 3 com coeficientes
inteiros, P (X) é redutı́vel se e somente se admite uma raiz inteira,
e tal raiz tem que dividir 6. Calculando P (d) onde d é divisor de
6 obtemos P (−1) = 0, P (2) = 0 e P (3) = 0 logo P (X) = (X +
1)(X −2)(X −3) daı́ os ideais de Q[X] contendo (X 3 −4X 2 +X +6)
são (1), (X +1), (X −2), (X −3), ((X +1)(X −2)), ((X +1)(X −3)),
((X − 2)(X − 3)), (X 3 − 4X 2 + X + 6).

(4) Quais são os ideais de k[X] contendo (X 3 + X − 3) onde k é um


dos corpos Q, Z/pZ com p = 2, p = 3, p = 5, p = 7?

P (X) = X 3 + X − 3 ∈ k[X] é um polinômio de grau 3 logo é


redutivel se e somente se admite uma raiz no corpo k. Se o corpo k
é Q então essa raiz tem que ser inteira pois os coeficientes de P (X)
são inteiros e P (X) é mônico, e tal raiz é um divisor de P (0).

Caso k = Q. Os divisores de P (0) = −3 são 1, −1, 3, −3, e


P (1) = −1, P (−1) = −5, P (3) = 27, P (−3) = −33 logo P (X) é
irredutı́vel em k[X] e os únicos ideais de k[X] que contêm (P (X))
são (1) e (P (X)).

Caso k = Z/2Z. P (0) = 1 e P (1) = 1 logo P (X) não admite


raizes em k, logo é irredutı́vel em k[X] e os únicos ideais de Q[X]
que contêm (P (X)) são (1) e (P (X)).

Caso k = Z/3Z. Temos P (X) = X 3 + X = X(X 2 + 1) e o fator


X 2 + 1 é irredutı́vel pois tem grau 2 e não tem raizes em k. Logo
os únicos ideais de k[X] que contêm (P (X)) são (1), (X), (X 2 + 1),
(P (X)).

Caso k = Z/5Z. P (4) = 0 e uma divisão com resto mostra que


P (X) = (X − 4)(X 2 + 4X + 2). O fator X 2 + 4X + 2 tem grau 2
e não tem raizes em k logo é irredutı́vel em k[X]. Logo os únicos
ideais de k[X] que contêm (P (X)) são (1), (X − 4), (X 2 + 4X + 2)
e (P (X)).

Caso k = Z/7Z. P (2) = 0 e uma divisão com resto mostra que


P (X) = (X − 2)(X 2 + 2X + 5). O fator X 2 + 2X + 5 tem grau 2
e não tem raizes em k logo é irredutı́vel em k[X]. Logo os únicos
128 3. ANEIS

ideais de k[X] que contêm (P (X)) são (1), (X − 2), (X 2 + 2X + 5)


e (P (X)).

(5) Quais são os ideais de k[X] contendo (X 3 + 2X − 3) onde k é um


dos corpos Q, Z/pZ com p = 2, p = 3, p = 5, p = 7?

P (X) = X 3 + 2X − 3 ∈ k[X] é um polinômio de grau 3 logo


é redutı́vel se e somente se admite uma raiz em k. No caso k = Q
tal raiz tem que ser inteira (veja o exercı́cio acima). Observe que
o inteiro P (1) é zero e uma divisão com resto mostra que P (X) =
(X − 1)(X 2 + X + 3). Tal fatoração vale em qualquer k[X].

Caso k = Q. P (X) = (X − 1)(X 2 + X + 3) e o fator X 2 + X + 3


é irredutı́vel pois tem grau 2 e não admite raizes inteiras (P (1) = 5,
P (3) = 15, P (−1) = 3, P (−3) = 9). Logo os únicos ideais de k[X]
que contêm (P (X)) são (1), (X − 1), (X 2 + X + 3) e (P (X)).

Caso k = Z/2Z. Temos P (X) = (X − 1)(X 2 + X + 3) =


(X + 1)(X 2 + X + 1) e o segundo fator é irredutı́vel (tem grau 2
e não tem raizes em k) logo os únicos ideais de k[X] que contêm
(P (X)) são (1), (X − 1), (X 2 + X + 3) e (P (X)).

Caso k = Z/3Z. A fatoração é P (X) = X(X − 1)(X − 2) logo


os ideais são (1), (X), (X − 1), (X − 2), (X 2 − X), (X 2 − 2X),
((X − 1)(X − 2)), (P (X)).

Caso k = Z/5Z. A fatoração é P (X) = (X − 1)2 (X − 3) logo


os ideais são (1), (X − 1), ((X − 1)2 ), (X − 3), ((X − 1)(X − 3)),
(P (X)).

Caso k = Z/7Z. A fatoração é P (X) = (X − 1)(X 2 + X + 3)


logo os ideais são (1), (X − 1), (X 2 + X + 3), (P (X)).

(6) Encontre P (X) ∈ k[X] tal que (X 5 + 2X 3 + X 2 + 1, X 2 + X − 2) =


(P (X)) nos casos k = Q, k = Z/5Z.

Observe que o segundo polinômio é irredutı́vel em Q[X] e ad-


mite a fatoração (X − 1)(X − 3) em Z/5Z[X]. Lembre-se que P (X)
é um maior divisor comum entre os dois polinômios dados. No pri-
meiro caso as únicas possibilidades para o maior divisor comum são
1 e X 2 + X − 2 (a menos de uma constante multiplicativa não nula)
sendo X 2 + X − 2 irredutı́vel, mas o maior divisor comum não é
X 2 + X − 2 pois uma divisão com resto mostra que X 2 + X − 2 não
divide X 5 + 2X 3 + X 2 + 1, logo neste caso o ideal dado é igual a
(1) = Q[X]. No segundo caso como 1 é raiz do primeiro polinômio
7. RESOLUÇÃO LISTAS DE EXERCÍCIOS 129

mas 3 não é raiz do primeiro polinômio, um maior divisor comum


é X − 1 logo o ideal dado é igual a (X − 1).

(7) Conte os polinômios irredutı́veis de grau 3 em Z/2Z[X].

Os polinômios de grau 3 no anel Z/2Z[X] são X 3 , X 3 + 1,


X3 + X, X 3 + X 2 , X 3 + X 2 + X, X 3 + X 2 + 1, X 3 + X + 1,
X 3 + X 2 + X + 1. Os entre eles que não admitem raizes em Z/2Z =
{0, 1} são X 3 + X 2 + 1 e X 3 + X + 1. Se trata dos irredutı́veis (pois
se k é um corpo, um polinômio de grau 3 em k[X] é irredutı́vel se
e somente se não admite raizes em k).

(8) Conte os polinômios irredutı́veis de grau 2 em Z/5Z[X].

Uma tecnica é fazer a lista dos polinômios de grau 2 e eliminar


os que admitem raizes em Z/5Z, lembrando que basta fazer isso
para os mônicos e obter os outros multiplicando por uma constante
não nula. Uma tecnica mais rápida é a seguinte. Os polinômios
de grau 2 são aX 2 + bX + c com a, b, c ∈ Z/5Z e a 6= 0 logo tem
exatamente 4 · 52 = 100 polinômios de grau 2. Os redutı́veis têm a
forma r(X − s)(X − t) onde r, s, t ∈ Z/5Z e r 6= 0. O número de
escolhas para r é 4 (todas as constantes não nulas), o número de
escolhas para {s, t} quando s = t é 5 (todos os elementos de Z/5Z),
o número de escolhas para {s, t} quando s 6= t é 5·4/2 = 10 (levando
em conta que {s, t} = {t, s}) logo tem exatamente 4 · (5 + 10) = 60
polinômios redutı́veis de grau 2, assim o número de polinômios
irredutı́veis de grau 2 é 100 − 60 = 40.

(9) Calcule (10) ∩ (12) no anel Z (encontre um gerador).

Um inteiro pertence a (10) ∩ (12) se e somente se é múltiplo de


10 e de 12 ou seja é múltiplo do menor múltiplo comum entre 10 e
12, logo (10) ∩ (12) = (60).

(10) Calcule (X 2 − X) ∩ (X 2 + X) no anel Q[X] (encontre um gerador).

Um polinômio pertence a (X 2 − X) ∩ (X 2 + X) se e somente


se é múltiplo de X 2 − X e de X 2 + X ou seja é múltiplo do menor
múltiplo comum entre X 2 −X e X 2 +X, logo (X 2 −X)∩(X 2 +X) =
(X(X − 1)(X + 1)) = (X 3 − X).

(11) Seja k um corpo e sejam 0 e 1 os elementos neutros da soma e do


produto em k. Mostre que se 1 + 1 + 1 + 1 = 0 então 1 + 1 = 0.
130 3. ANEIS

Chamando de 2 = 1+1 e de 4 = 1+1+1+1 temos 2·2 = 4 (pela


propriedade distributiva) e se 2 6= 0 então podemos multiplicar os
dois lados de 4 = 0 pelo inverso 2−1 (que existe pois k é um corpo)
obtendo 2−1 · 4 = 2−1 · 0 ou seja 2−1 · 2 · 2 = 0 ou seja 2 = 0
contradição. Logo 2 = 0.

(12) Seja A um anel comutativo unitário finito com |A| = p um número


primo. Mostre que A é um corpo.

Os ideais de A são em particular subgrupos aditivos. Pelo te-


orema de Lagrange se |A| é um número primo A admite só dois
subgrupos aditivos, {0} e A, em particular {0} = (0) e A = (1) são
os únicos ideais de A. Logo A é um corpo.

(13) Seja A um anel comutativo unitário e sejam a, b ∈ A. Mostre que


se a2 = 0 e b3 = 0 existe um número natural n tal que (a + b)n = 0.

(a + b)4 = a4 + 4a3 b + 6a2 b2 + 4ab3 + b4 = 0.

(14) Seja k = Z/3Z. Mostre que no anel k[X] temos


n n
(X + 1)3 = X 3 + 1
para todo n ≥ 1.

Base da indução: (X + 1)3 = X 3 + 3X 2 + 3X + 1 = X 3 + 1


n n
sendo 3 = 0 em Z/3Z. Suponha (X + 1)3 = X 3 + 1, mostraremos
n+1 n+1
que (X + 1)3 = X3 + 1. Temos
n+1 n ·3 n 3 n 3
(X + 1)3 = (X + 1)3 = ((X + 1)3 ) = (X 3 + 1)
n ·3 n ·2 n n ·3
= X3 + 3X 3 + 3X 3 + 1 = X 3 +1
n+1
= X3 +1
sendo o coeficiente 3 igual a zero em Z/3Z.

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