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Uma clara visão sobre CRM

Por Enio Klein*

Em minha atuação profissional, muitas vezes me encontro diante das perguntas: o


que é CRM? É uma tecnologia? Um conceito? Qual é este conceito?
Se olharmos em volta, diante de centenas de livros, artigos e palestras que tratam
sobre o assunto, poderemos encontrar várias formas de responder a estas
perguntas. Prefiro me ater agora ao simples significado das letras desta sigla:
Customer Relationship Management ou Gestão do Relacionamento com Clientes.
Na atividade comercial de qualquer natureza, um fornecedor contacta ou é
contactado por um cliente de seus produtos ou serviços. Para efetuar uma transação
comercial, para proceder a uma reclamação, para dar uma sugestão, para solicitar
uma informação. Os meios para este contato também podem ser vários:
pessoalmente, por telefone, por e-mail, através de um site na Internet, em um
escritório ou em uma loja. Normalmente, a história desta série de contatos, acaba
por se tornar um relacionamento comercial. Este relacionamento poderá ser utilizado
de diversas formas e com diversos objetivos dentro dos processos que regem a
atividade comercial: gerar demanda, vender, entregar, cobrar, prestar serviços.
Gerenciar este relacionamento é, portanto, administrar estes processos demodo a
obter os melhores resultado para a Empresa, considerando os limites éticos que a
atividade exige. As questões maiores são, no entanto: Quem define quais são os
melhores resultados para a Empresa? Quem define qual o melhor uso destes
relacionamentos? Quem são os responsáveis por esta gestão?

A maior complexidade que o assunto traz não está na definição, mas na


abrangência da relação de causa e efeito que as atividades envolvidas com o CRM
possui. É um novelo onde a dificuldade maior está em encontrar a ponta e
principalmente quem a puxe (Figura 1).

GO TO MARKET
- Ampliar a Cobertura
- Criar clientes rentáveis
-Incentivo ao uso de canais
-Crescimento da Margem
de venda
-Redução no custo de venda
- Aumentar a base de clientes
- Aumento na receita
Olhar do Mercado
Olhar do Acionista
Viabilidade (Cliente)
(Financeiro)
Estímulo
ROI
- Compensação diferenciada
- Implementar canais de venda
- Novas metodologias de venda
de baixo custo
- Segmentar Clientes por Canal
- Melhor oferta por segmento
- Melhorar nível de serviço
Olhar Interno Olhar dos Funcionários
(Processos) (Recursos Humanos )
Figura 1
(Relacionamento com Clientes – Exemplo:”Diagrama de Causa e Efeito(1)”)

A gestão do relacionamento com clientes é dependente do modelo de ida ao


mercado que será desenvolvido para atender aos objetivos dos acionistas, a quem
cabe determinar as métricas de resultados da companhia e a quem o retorno sobre
os investimentos necessários devem ser apresentados. Parece claro, neste
momento, onde está o fio e quem o puxa. Cada Empresa, individualmente, baseado
nas práticas que seus respectivos mercados possuem, precisa definir este modelo.
A partir daí, ações e os processos necessários poderão ser determinados para sua
viabilidade. É importante não esquecer que modelo, ações e processos são geridos
por pessoas. É preciso estimulá-las e treiná-las para a execução. CRM não é o
modelo de gestão das companhias, porém é parte importantíssima do mesmo,
embora ainda desconhecido e pouco disseminado. Da mesma maneira que o ERP
(Enterprise Resource Planning), muito mais conhecido e já completamente
disseminado.

Com certeza o leitor estará me perguntando, e a tecnologia, onde está a tecnologia?


Não existe um software para CRM?

A missão das empresas de software tem sido, através dos tempos, modelar os
processos de gestão em componentes – chamados de aplicativos – que permitem
as empresas não só modelarem seus processos de gestão, como também executar
suas atividades e processos de forma eficiente (Figura 2).

Eficácia
Eficácia Rentabilidade
Rentabilidade Comportamento
Comportamento Valor
Valor
(Transação)
(Transação) (ROI)
(ROI) (Processos) (Lucro)
(Lucro)

Plano Plano Plano


Operacional Tático Estratégico
O que e como estamos fazendo? Estamos fazendo de forma rentável? Geramos valor p/ acionista?

Modelo de Negócios

Tecnologia
Aplicações para
Aplicações Aplicações Analíticas Inteligência de
Operacionais Negócios(BI)
Automação Análise/ROI Causa e Efeito

Figura 2
(Modelo de Negócios e a Tecnologia)

Assim, baseado em práticas e modelos de negócios usuais em diversos segmentos


empresariais, o CRM, se transformou – sob a ótica da tecnologia - em um conjunto
de aplicativos de software que visam de forma integrada, apoiar as Empresas em
seus processos de relacionamento com o cliente e na sua gestão. No plano
operacional (CRM Operacional e Colaborativo), no plano tático (CRM Analítico) e no
plano estratégico (Customer Balanced Scorecard).

Por construção, existe uma associação direta entre os componentes de software e


os processos de relacionamento, da mesma maneira que existe entre estes e o
modelo de ir ao mercado. A conclusão é que não existe um software para CRM. O
que existe é um “guarda chuva” de aplicativos de software que permitem às
companhias, a partir de um modelo de ida ao mercado, automatizar as funções
operacionais e processos que viabilizarão as estratégias contempladas no modelo
adotado e permitirão analisar os resultados tanto táticos quanto estratégicos.

O uso da tecnologia é, portanto, conseqüência e não causa - nem origem - do


modelo de ida ao mercado. Ao contrário, a partir deste é que a tecnologia passa a
ter um papel e um uso determinado.

O que ocorreu, no entanto, é que a força da mensagem da tecnologia levou o CRM


a ser compreendido como software mais do que como parte de um modelo de
gestão e entendido pelas áreas de tecnologia de informação como uma “ferramenta
de automação baseada em Software, que emergiu das sombras do mercado de
ERP”(2) reconhecendo nela uma série de promessas implícitas ou explicitas cuja
importância é relevante:

Aumentar a produtividade na automação dos serviços ao cliente


Aumentar a informação sobre os clientes
Aumentar a retenção dos clientes (fidelização)
Integrar vendas ao serviço ao cliente e à retaguarda transacional (ERP)
Otimização nas ações de marketing e campanhas

No caso particular do Brasil, a obrigatoriedade do Serviço de Atendimento ao Cliente


–SAC(3) aliados a adoção muito rápida da ISO 9000(4) por empresas brasileiras,
levaram à necessidade da implantação de centrais de serviços ao cliente, A
necessidade premente da operação se sobrepunha à táticas e estratégias
empresariais. O CRM passou a ser compreendido como Central de Atendimento(5),
inicialmente por telefone e mais tarde considerando todas as formas de contato
disponíveis (e-mail, site na internet, loja física, etc...). As indicações de que o bom
atendimento ao cliente resultaria em uma maior retenção ou mesmo fidelização do
cliente levaram à crença de que todas as promessas poderiam ser cumpridas a
partir da implementação tecnológica na automação do SAC.

O CRM passou a ser compreendido como as promessas tecnológicas e passou a


ser muito comum expressões do tipo: “o call center fideliza o seu cliente”, “o
datawarehouse permite você conhecer melhor o seu cliente” entre outras. A
proposta original se perdeu. Buscar tecnologia ganhou prioridade e passou a ser
feita departamentalmente a partir das promessas da tecnologia. Não é a toa que as
implementações passaram a ser departamentais e em sua g rande maioria nas áreas
de Centrais de Atendimento (51%). A maior parte delas terceirizadas em prestadoras
de serviço de Call Center (54% dos investimentos). Em empresas onde a força de
vendas constitui o maior canal, a Automação da Força de Vendas ganhou maior
importância (22%). Isto aconteceu mais fortemente no segmento de
telecomunicações (36% -SAC e serviços de suporte ao cliente) e manufatura (24% –
SAC(6), serviços de assistência técnica e automação de força de vendas). No
segmento bancário e serviços financeiros, a automação dos canais (call center,
internet banking e agências) já era feita a partir de desenvolvimento interno,
conhecer o cliente e melhorar o desempenho das campanhas de marketing era a
prioridade e representou 18%(6) dos investimentos em tecnologia relacionada com
CRM(6).

A gama de fornecedores de aplicativos de software incluída neste mundo


tecnológico chamado CRM é muito grande. Desde fornecedores de nicho locais até
grandes fornecedores globais de soluções integradas (Figura 3 )(6).

Participação - Software Aplicativo


(Desempenho de vendas em 2000)

20% Fornecedores Globais - Soluções Integradas


26%

Fornecedores Locais - Soluções Integradas

Fornecedores Globais - Nicho

Fornecedores Locais - Nicho


11%
3%
Outros - Inclusive desenvolvimento interno

40%

20
37% 62%
18
16
14
12
10
8
6
4
2
0
Siebel Peoplesoft SAP Plusoft Clarify Oracle Microsiga

Figura 3 – Fornecedores de Tecnologia (Plusoft – nicho local, Siebel – nicho global,


Peoplesoft – Soluções Integradas Global)

Todos eles com a mesma mensagem: CRM, porém nem todos com a mesma oferta
nem a mesma abrangência. A diversidade ganhou força, principalmente entre os
fornecedores locais ou de nicho em função do próprio comportamento de compra:
completamente departamentalizado, orientado a funcionalidades específicas e
limitados em orçamentos.

É importante evitar a confusão entre as estratégias, táticas e operação contidas nos


modelos de gestão e a proposta tecnológica. Marketing um para um(7), onde cada
cliente é tratado de forma individual e personalizada, Marketing de Segmentação ou
Marketing de Relacionamento(8) são abordagens táticas de estratégias de
relacionamento. Aplicativos como “Gestão de Campanhas”, “Banco de Dados e
Modelo de Clientes” modelados sobre infra-estrutura do “Datawarehouse” e Modelos
de Segmentação desenhados em aplicativos para “Mineração de Dados” e
“Modelos de Predição e Comportamento”, permitem desde a identificação individual
do cliente (um para um), identificação de segmento comportamental (um para
muitos) ou mesmo a identificação de um grupo com propensão de compra à um
determinado p roduto ou linha de produtos (massa e orientação à produto). Quero
dizer, a tecnologia não pressupõe em nenhum momento a abordagem tática a ser
feita. Ao contrário, foi construída para que a tática seja modelada de acordo com a
opção de cada empresa e a partir daí operada com eficácia.

O processo de suporte ao cliente é tratado por um aplicativo normalmente chamado


de “Customer Support” ou “Suporte” e viabilizado através de múltiplos canais como
por exemplo a central de atendimento com um módulo chamado “Customer
Interaction Center”. Nestes componentes podem ser modeladas a tática de
personalização como é a receita do one to one. Por outro lado, em uma operação de
automação de vendas por call center – módulo para “Telesales” ou “Televendas” – a
modelagem pode ser por segmentos com propensão de compra semelhantes sem
nenhuma personalização individual. Isto quer dizer, em um mesmo ambiente
tecnológico, convivem várias táticas para gerenciar o relacionamento com clientes,
conforme as estratégias determinadas pela Empresa. Não existe, portanto, sentido
em associar como sinônimos Marketing de Relacionamento, One to One e CRM.
Muito menos sentido faz afirmar-se que a tecnologia para CRM implementa o
marketing de relacionamento ou one to one nas Empresas. O fato é que as mais
diversas táticas que podem ser adotadas pelas Empresas de forma a obter os
melhores resultados com seus clientes – gestão do relacionamento -, encontram
suporte em sua automação na proposta tecnológica do CRM. Sejam táticas para a
cobertura de mercado (aumento do marketshare) ou controle do mercado (loyalty
share ou fidelização). A automação e tratamento de conflitos de canais na tecnologia
não se traduzem necessariamente em orientação à Clientes(9), mas permite às
Empresas administrar os canais de contato com o Cliente e os processos de venda,
marketing e serviços de acordo com táticas mais convenientes em cada situação,
ora orientado ao cliente, ora orientado à produto. Finalmente, a tecnologia baseada
na arquitetura Internet. Sem confundir com o chamado e -CRM(10), que é o
gerenciamento da relação com o cliente no ambiente web, esta arquitetura
disponibiliza para as Empresas as facilidades de colaboração, instantaneidade
(tempo real) e integração que este ambiente tecnológico oferece. Colaboração e
operação em tempo real são premissas eventuais do modelo de gestão, viabilizadas
e potencializadas pela tecnologia (e -business) e não o contrário.

A complexidade para assimilar e a pressão da oferta de tecnologia são prováveis


causas de muitos ca sos de frustração na implementação de aplicativos para CRM. A
dificuldade em medir o retorno sobre o investimento é um ponto que reprime a
adoção da tecnologia. Existe uma impressão de que CRM não decolou. O fato é que
apenas 9% do potencial de empresas no país adotou a tecnologia e cerca de 23% a
estão avaliando. O grande mercado – 54% - ainda está por ser explorado. Apesar
disso, a tecnologia para CRM representou 8,2% das vendas de software aplicativo,
só em 2000, o que para alguma coisa nova é bastante significativo(11).

As Empresas precisam crescer para sobreviver. Crescer significa “ir ao mercado” ou


“go to market” melhor e mais rápido que seus competidores. Neste sentido e com
este objetivo, as Empresas estão começando a focalizar mais e mais seus
investimentos e recursos. Os empresários não pensam em tecnologia, mas em
questões estratégicas. A tecnologia representa a viabilidade e o suporte as questões
estratégicas, mas ainda são só ferramentas. E-business e CRM devem ser
analisados no contexto estratégico da ida ao mercado. É quando seus conceitos e
mensagens se tornam poderosos. O mix de canais é cada vez mais diverso –
vendedores, televendas/teleserviços, distribuidores, internet. O gerenciamento dos
melhores canais, de como atingir aos clientes através deles e a administração do
conflito resultante é um desafio que os executivos estão enfrentando e estão
cansados de falar a respeito. Como fazer múltiplos canais trabalharem em conjunto
de forma efetiva e balanceada? Alguns começam a investir p esadamente em
estratégias, processos e sistemas que façam os canais de marketing, vendas e
serviços trabalharem de iforma cooperada. E-business e CRM representam o papel
da tecnologia, viabilizando estratégias integradas de ida ao mercado (go to market
cooperation). Esta é a mensagem, este é o caminho.

*Enio Klein é professor de cursos de MBA da Faculdade de Economia e


Administração da Universidade de São Paulo (FEA/USP) e atua como palestrante
convidado na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e na Faculdade
de Administração e Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Ao longo de sua
carreira ocupou importantes cargos em empresas de tecnologia, tendo se dedicado,
nos últimos seis anos, exclusivamente à área de CRM. Atualmente é diretor de
Alianças da PeopleSoft do Brasil.

O presente artigo representa a opinião do autor e não da empresa à qual representa.

(1) Balanced Scorecard – Robert S. Kaplan and David P. Norton- http://www.balancedscorecard.com


(2) Latin America Customer Relationship Management(CRM) Solutions: Who’s minding the Front Office
– IDC – March 2000 – http://www.idc.com
(3) SAC – Serviço de Atendimento ao Cliente – obrigatório a partir da promulgação do Codigo Brasileiro
de Defesa do Consumidor – Lei n º 8.078, de 11 de setembro de 1990 - http://www.mj.gov.br/dpdc/
(4) ISO 9000 - padronização inclui a necessidade de prover sistemas de qualidade com difereciais
competitivos e gerenciamento de processos e relacionamento com clientes como forma de atingir a
excelência em serviços. - http://www.isoeasy.org/
(5) Central de Atendimento – Call Center ou Contact Center – Central de Suporte ao Cliente e
televendas
(6) CRM Solutions and Directions 2001 – IDC Brasil – July 2001 - http://www.idc.com
(7) Marketing One to One: “One to one Enterprise” (Empresa um para um) -Don Peppers & Martha
Rogers
(8) Marketing de Relacionamento – Regis Mackenna
(9) Spin Selling – Neil Racham e The Channel Advantage – Larry G Friedman
(11) Clientes.com – Patricia Seybold
(12) CRM Solutions and Directions 2001 – IDC Brasil – July 2001 - http://www.idc.com

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