Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Para uma rápida consideração a respeito do sábado e a "crise da adoração", veja o artigo de
Jon Paulien nesta edição (p. 28-29).
4 Na mente de João e de seus leitores, essa universalidade pode ou não ser equivalente à
Isso não equivale a dizer que o sábado é uma lei "cerimonial", como na distinção tradicio-
nal entre lei moral e cerimonial. Esse artificio teológico não deve ser imposto ao Decálogo.
10 A marca da besta não parece "lembrar" ou comemorar algo realizado pela besta, embora
ela recorde aos que a possuem onde está a lealdade deles. ,
Doutrina do Sábado
" A marca da besta e o selo de Deus identificam com o objetivo de proteger, da mesma forma
que o sinal de sangue da Páscoa protegeu os israelitas (Ex 12:7, 13-14). Existem paralelos entre os
mandamentos-sinais e o sinal de sangue da Páscoa. O sangue da Páscoa era colocado ritualmen-
te nas ombreiras e nas vergas da porta. Em Deuteronômio, os mandamentos deviam ser ritual-
mente colocados não apenas na mão e na fronte, mas também nas ombreiras e nas vergas. O ato
de' colocar sangue da Páscoa nas ombreiras protegia das pragas o povo. No Apocalipse, aqueles
que.resistem à marca da besta e recebem o selo de Deus são protegidos das sete últimas pragas.
12 O Apocalipse também utiliza a imagem da visão de Ezequiel sobre o anjo que põe uma mar-
ca na fronte dos que suspiram e gemem pelas abominações (Ez 8-9) As piores abominações
são descritas em Ezequiel 8, todas relacionadas com falsa adoração e idolatria. Os que guar-
dam os mandamentos recebem a marca protetora de Deus, ao passo que os idólatras sofrem o
juizo divino. O foco na guarda dos mandamentos, especialmente os relacionados à adoração,
é a questão tratada neste artigo. No Apocalipse, a imagem e teologia do Antigo Testamento
sobre os mandamentos-sinais, o sinal da Páscoa e a marca de Ezequiel 9 são unidos para criar
uma figura composta (a marca da besta) como uma marca identificadora e protetora sobre os
que adoram e obedecem ao poder da besta.
O sábado e a marca da besta
is As cenas introdutórias de vitória, propostas por Strand, são 1:10-20; 4-5; 8:2-6; 11:19; 15:1-
16:1; 16:18-17:3a; 19:1-10; 21:5-11a (p. 40-46). Eu discordaria de Strand em seu uso de 16:18.
14 Shea e Christian seguem a estrutura de Jon Paulien (1997), que sugere a seguinte estru-
tura: as sete igrejas (1:9 3:22); os sete selos (4:1 — 8:1); as sete trombetas (8:2 — 11:18);
a crise final (11:19 —15:4); as sete taças (15:5 — 18:24); o milênio (19:1 — 20:15); e a
nova Jerusalém (21:1 — 22:5). O crucial para este artigo não é uma estrutura precisa em
particular, mas a relação entre as cenas celestiais duodirecionais de 11:19 e 15:1-8 e o con-
teúdo da visão localizada entre essas cenas.
is Ver Paulien (1988, p. 1-2). As "nações iradas" estão em paralelo com a ira do dragão
contra a mulher (12:17); "veio a ira de Deus" é elaborado na ira das pragas (14:10; 15:1); "o
Doutrina do Sábado
como a conclusão de 1115-18. Ver também Elckehardt IVIüeller (1998, p. 260-277). Milefler (1998,
p. 175), demonstra que 1119 funciona como a cena introdutória celestial dos capítulos 12-14, as-
sim como os capítulos 4 e 5 o fazem em relação aos selos e 8:2-6, em relação às trombetas Apoca-
lipse 1119 é claramente parte do capitulo 12, visto que compartilha expressões de fórmulas-chave
que aparecem somente nesses capítulos; por exemplo, 1119 (grego); 12:1 (grego), 123 (grego).
17 Michael Willcock (1975, p. 110-116) delineia a quarta visão como 1119 — 154. Wilcock
(1975, p. 112) argumenta que uma abertura no céu indica uma nova visão: "Portanto, há qua-
tro textos [4:1; 1119; 15:5; 19:11) em que aberturas desse tipo marcam o início de novas cenas."
Uma abertura no céu parece indicar que começa uma nova visão; entretanto, não devemos
tornar o corte entre as visões tão abrupto e preciso que nos esqueçamos da natureza bidirecio-
nal dos limites entre as visões. Então, 15:5 é parte de 15:1-8, que remete aos capítulos 12-14,
enquanto intencionalmente recorda 11:19, bem corno avança rumo ao capítulo 16.
" A respeito do fluxo da visão completa, G. K Beale (1999, p. 801-802) observa que a mi-
sericórdia divina está disponível em 1119 porque o templo ainda está acessível, mas ela se
torna inacessível em 15:8 devido à fumaça, e o templo se torna um lugar de execução de juízo.
19 Creio que o significado da visão da arca em 11:19 inclui, mas definitivamente se estende
O sábado e a marca da besta
baerde Ford argumenta que a visão da arca, que representa a ordem celestial de
Deus, está relacionada à guerra entre Deus e as bestas. Ela afirma
•
Com 11:15, 19, o primeiro segmento (capítulos 4-11) do Apoca-
lipse se encerra com uma epifania, uma visão da ordem celestial.
Tal desfecho é apropriado, visto que o segundo segmento (capítulos
12-20) será orientado para a Terra. A arca celestial de guerra (1119)
é um prelúdio apropriado para a Guerra Santa contra a besta da ter-
ra que será apresentada no segundo segmento (FORD, 1975, p. 182).
além de um símbolo do amor constante de Deus, o ato de lembrar-se de seu povo ou, como
afirma Robert H. Mounce (1977, p. 228), "o símbolo da fidelidade de Deus ao cumprir suas pro-
messas. A repetição essencial do foco em 15:5 sugere a presença de algo muito mais concreta
Doutrina do Sábado
" Reale (1999, p. 766) observa que 'mandamentos de Deus' é uma referência holística à
revelação objetiva da antiga e nova alianças, à qual o fiel permanece leal". O Decálogo está
incluído nessa compreensão, mas não é ressaltado.
2 ' Aune (1997, p. 711-712) declara: "É nesse contexto que 'guardam os mandamentos de
Deus' em Apocalipse 12:17 e 14:12 deve ser considerado como referindo-se aos requeri-
mentos éticos da Torá."
O sábado e a marca da besta
Por outro lado, embora não seja chamada de adoração como tal,
existe uma clara alternativa à adoração à besta. Em 14:12, após
a descrição do juizo de Deus contra todos os idólatras, João con-
voca a paciente perseverança da parte dos santos, que obedecem
os mandamentos de Deus e permanecem fiéis a Jesus (ver 13:10).
" Esse diagrama foi inspirado numa palestra proferida por Ed Dickerson, no Longburn
College, Nova Zelândia, em 1995: Dickerson, que sugeriu paralelos com a primeira tábua do
Decálogo de modo mais simplificado, não explorou OS paralelos com o sábado.
O sábado e•a marca da besta
47
Ranko Stefanovic (2009, p. 423) conclui que as atividades da besta que sai do mar são
ataques planejados contra os primeiros quatro mandamentos do Decálogo.
Doutrina do Sábado
pelo dragão, pela besta e pelo falso profeta leva o mundo a se rebelar contra
a lei pactual de Deus. Em primeiro lugar, essa trindade assume a adoração e
posição de um falso deus na violação do primeiro mandamento Segundo, ela
blasfema contra Deus e seu nome. Terceiro, constrói' uma imagem idolátrica
que as pessoas são obrigadas a adorar. Por Ultimo, a trindade maligna impõe
uma marca semelhante ao sábado. Stefanovic (2009, p. 435 436) afirma: -
25Outros exemplos incluem: Jesus, que esteve morto, mas agora vive, é imitado pela besta,
que recebe uma ferida mortal mas é curada; a paródia da falsa trindade (o dragão, a besta e o
falso profeta); o "Senhor Deus, Aquele que era, que é e que há de vir" (Ap 1:8) é imitado pela
besta, que "era e não é, está para [vir]" (17:8).
iár O sábado e a marca da besta
feita pela besta no Apocalipse, contêm semelhanças e diferenças. Eles não são
paralelos artificiais, mas alusões conceituais em natureza.
No primeiro paralelo, a marca da besta é "o nome da besta ou o nú-
mero do seu nome" (Ap 13:17, tradução literal, ênfase acrescida). A marca -
une nome e número de forma que remete ao sábado, com sua declaração
do nome de Deus, Yahweh, e o "número" de Deus, o sétimo dia. Tanto a
marca como o sábado partilham de um raro padrão de marca/sinal, nome
e número: No segundo paralelo, a marca e o sábado se preocupam com a
• regulamentação econômica da vida, do descanso e do trabalho das pessoas.
Ambos restringem o trabalho, mas por razões diferentes. A marca é puni-
tiva, pois declara que "ninguém possa comprar ou vender, senão aquele
que tem a marca" (13:17), ao passo que o sábado é restaurador e ordena a
cessação do trabalho para que todos possam descansar e se revigorar. Nas
•Escrituras, cessar o trabalho no sábado significa especialmente "não com-
prar ou vender" (ver Ne 10:31; 13:15-22). Nesse aspecto, a marca é uma
paródia direta ao sábado. O terceiro paralelo mostra que a marca e o sába-
do têm alcance universal e se estendem a todos os grupos de pessoas. No
Apocalipse, "todos, os pequenos e os grandes, os ricos e os pobres, os livres
e os escravos, [a besta] faz que lhes seja dada certa marca" (Ap. 13:16, 17). 49
O sábado oferece descanso universal: "Nem tu, nem o teu filho, nem a tua
filha, nem o teu servo, nem a tua serva, nem o teu animal, nem o forasteiro
das tuas portas para dentro" (Ex 20:10)."
A reflexão sobre o significado teológico dos paralelos mostra simi-
laridades adicionais ..e importantes dissimilaridades entre o sinal de Deus
e a marca da besta. A marca, em realidade, é uma inversão dos objetivos
do sábado. Dessa forma, os dois sinais revelam diferenças entre os carac-
teres e reinos de Deus e da besta. O sábado protege os vulneráveis (por
exemplo, servos, estrangeiros e mesmo animais), ao passo que a marca
é opressiva. O sábado traz libertação econômica, enquanto a marca traz
controle econômico e marginalização.
O sábado, corno um mandamento-sinal, expressa lealdade ao Criador,
e a marca é a instituição e o produto de criaturas que expressam lealdade
à besta. Visto que o sábado é um sinal da aliança de uma pessoa com o
25A respeito da marca da besta, Mounce (1977, p. 259) nota que "o duplo oposto (pequenos,
grandes; ricos, pobres; livres, escravos) é uma forma retórica de enfatizar a totalidade da so-
ciedade humana (ver Ap 11:18; 19:5, 18; 20:12)". Semelhante duplicidade e totalidade é vista
no mandamento do sábado. Tanto o sábado como a marca da besta têm alcance universal.
Doutrina do Sábado
" Ford (1982) menciona o estudo de Gnana Robinson (1975, p. 304, 305).
" Nota do tradutor: G. K. Beale (1998, p. 151) argumenta que Apocalipse 14:7 "resume" "a
• ideia principal do livro inteiro", que é a obediência resultante da criação e do juízo.
29 Veja o artigo de Jon Paulien nesta edição. Os editores da edição do Novo Testamento grego
das Sociedades Bíblicas Unidas observam que Apocalipse 14:7b é uma alusão a ti ic 20:11 (ver
STEFANOVIC, 2009, p. 424).
O sábado e a marca da besta
Gênesis 1 e 2 e a inversão da
Criação em Apocalipse 12-14
Até aqui examinamos o padrão do Decálogo e o mandamento do sá-
bado em relação à atividade da besta em Apocalipse 12-14. João parece ter
incorporado outro padrão complementar que reforça a tese deste artigo.
João utiliza Gênesis 1 e 2 como pano de fundo• arquitetônico para enfati-
zar a natureza da rebelião da besta contra o Deus criador que instituiu o
Doutrina do Sábado
30 As comparações entre Gênesis 1,2 e Apocalipse 12,13 são extraídas de Shea (2000, p. 227, 228).
31 Tanto o ataque do dragão como o da serpente estão focalizados nos mandamentos. A
(Gn 1:26-30). Depois, Gênesis 2:7 esclarece que Deus forma sua imagem e
lhe concede vida ao soprar em suas narinas "o fôlego de vida". Deus então
permite que sua imagem dê nomes ao restante da criação. Esse é um ato que
expressa a autoridade e domínio dessa imagem. A localização é a Terra, que
está cheia, entre outras coisas, de bestas da terra e pela imagem especial do
próprio Deus exercendo domínio sobre a Terra.
No fim do relato da Criação, Deus vê o mundo que criou — uma or-
dem que está em harmonia com sua vontade — e o declara muito bom. Isso
o leva a cessar sua obra e a descansar no sétimo dia. Além disso, Ele aben-
çoa esse dia e o põe à parte (Gn 2:1-3). O sábado é o clímax coroador da
ação divina. Esse dia numerado, o sétimo, é o dia especial e santificado de
Deus, em contraste com os outros dias, que são associados a várias partes
da ordem criada. O sábado significa que Deus concluiu uma obra perfeita
e que Ele é o Deus criador, o verdadeiro fim, objetivo e sentido de toda a
criação. O sábado é seu selo de aprovação de sua obra.
Continuando o paralelo no sexto e sétimo dias, o dragão e á besta
se unem por meio de uma besta da terra. Essa besta recebe poder para
dar fôlego à "imagem da besta" (Ap 13:15). Por meio dessa imagem, a
trindade maléfica exerce domínio sobre toda a Terra. Ela tenta pôr seu 53
nome sobre todos os habitantes da Terra. Isso é realizado por meio da
marca da besta, que é o clímax da atividade dessa trindade, e incluiu
receber o número da besta. A marca da besta significa que toda a cria-
ção está debaixo do poder da besta. Entretanto, as mensagens de Deus
em Apocalipse 14 mencionam especificamente que aqueles que rece-
bem essa marca não possuem descanso. À luz do contexto de Apocalip-
se 12-14, isso pode ser visto agora como uma punição apropriada para
tal atividade antissabática. Em contraste, aqueles que guardam o sábado
dos mandamentos de Deus recebem essa bênção sabática. Apocalipse
14:13 contém uma alusão ao sábado que inclui uma bênção àqueles que
morrem e uma promessa aos santos que "descansam de suas obras"?' A
plenitude do descanso sabático para esses guardadores dos mandamen-
tos transcende a morte. As alusões estão baseadas na bênção original
sabática de Deus e no descanso de sua obra (Gn 2:1-3). O Deus do sábado,
que realizou a criação e deu vida no princípio, está presente com seus
santos fiéis, que trabalham para Deus e enfrentam a morte por Ele no
fim. O sábado aponta não para a criação e a criatura, mas para o próprio
32 Shea e Christian (2000, p. 289) também observam uma alusão ao sábado nesse versículo.
Doutrina do Sábado
s'li1:4N,:à110.M-eirt',.,-Ogit
p,
-
Considerações finais
A chave para entender a "marca da besta" é, analisar essa figura literária,
baseada na linguagem veterotestamentária de mandamentos-sinais, o De-
cálogo e o sábado à luz das características temáticas, teológicas e estruturais
da visão na qual ela está incorporada. A primeira tábua do Decálogo, inclu-
sive o sábado, é o objeto da ira do dragão. A marca da besta funciona como
um mandamento-sinal e uma paródia direta do sábado. A última rebelião
do dragão é uma tentativa de levar o mundo inteiro a uma rebelião unida
55
contra o Deus criador. O clímax da rebelião acontece quando um sábado
contrafeito ou uma marca antissábado é forçada a toda a Terra. Na crise de
Apocalipse 12-15, a fé em Jesus, combinada com a obediência aos manda-
mentos do Decálogo, inclusive o sábado, constituirão no sinal e selo de leal-
dade pactual ao Deus da criação e redenção. Em contraste, a marca da besta
é o sinal escatológico de rebelião contra Deus.
Referências
CAMPBELL, G. Finding seals, trumpets, and bowls: variation upon the theme
of covenant rupture and restoration in the book of Revelation. Wesleyan
Theological Journal, v. 66, 2004.
JUDGE, E. A. The mark of the beast: Revelation 13:16. Tyndale Bull, v. 42,
n.1, 1991.
PRICE, S. E Rituais and power: the rornan imperial cult in Asia Minor.
Cambridge: Cambridge University Press, 1984.
SHEA, W H.; CHRISTIAN, E. The chiastic structure of Rev 12:1 - 15:4: the
great controversy vision. Andrews University Seminary Studies, v. 38, 2000.