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Joaquim da Silva Porto

Dr. Por Américo Ribeiro Coelho (1923-41)


No primeiro domingo de novembro de 1923, às 2 horas da tarde, mais ou menos,
achava-me no gabinete de trabalho da minha residência, quando a minha atenção foi
atraída pela presença de um homem na varanda da casa , entretendo rápida conversa
com quem viera atendê-lo. Logo depois, eis que o avisto já na porta da minha
residência, solicitam permissão para entrar.
Travando conversa, pude que era membro de uma sociedade filantrópica, e estava
angariando, donativos. Fácil me foi saber qual se tratava de uma seita religiosa, apesar da
cautela com que evitam declina-lhe o nome, e não menos, fácil foi saber que se tratava de
uma religião de que jamais ouvira falar, a dos adventistas do sétimo dia.
Causou-me quasi indignação saber da existência de mais uma religião evangélica,
aumentando-me a impressão da fraqueza do protestantismo desunido, em face dos
elementos coesos que o combatem. A manifestação dêsses sentimento determinou novo
retraimento do meu interlocutor.
Interessei-me, porém, pelo conhecimento dos princípios básicos da religião
desconhecida, principalmente porque, anos antes, alguém, julgando-me protestante,
por ser advogado procurado por quasi todos os protestantes de Vitória acusou a
incoerência do protestantismo ao adotar como única regra de fé a Bíblia, mas guardando o
primeiro dia da semana, mandado observar pelo romanismo em vez do sábado bíblico.
Como não me interessasse a defesa do protestantismo, repliquei apenas que tal a mudança
do calendário tivesse deslocado a posição do dia.
A presença de um observador sábado ofereceu-me então oportunidade para indagar
melhor do assunto, e daí em diante se trava um movimentado diálogo entre o do
representante da sociedade filantrópica e o exaltado advogado entre o tímido
indagador de atos religiosos e o exaltado sabatista.
A leitura da Bíblia enchia-me de admiração e espanto, porque eram que não estavam
escritas, sem ser, entretanto, deturpado o sentido das frases. Onde estava escrito: “Um só i,
ou um só til”, era lido “Um só jota, ou só til”. Atribuí o fato à deficiência de instrução, mas
não o deixei calar.
Quando os recursos da dialética do advogado determinaram um recuo para
textos bíblicos mais claros e positivos ardorosamente defendidos, eu me arrependia de
poder concorrer para abalar uma fé tão sólida, e colocava imediatamente esses
mesmos recursos a procura da harmonia dos textos, o que rapidamente
encontrávamos, com grande alegria para ele e para mim.
Lembro-me ainda da discussão sobre a frase empregada por Jesus, quando acusavam
de transgredir o sábado “Meu Pai trabalha até agora, Eu trabalho também”, com a qual
procurei demostrar que Jesus, de modo expresso, estava autorizando qualquer trabalho no
sábado.
Habituado, como ficou, a ver-me ir imediatamente em auxílio da verdade, esperou a
minha réplica a mim mesmo, e os seus olhos iluminaram-se com os fulgores de um belo
triunfo quando, rematando a discussão afirmei que a obra de Deus, o trabalho de Jesus,
devemos nós também fazer todos os dias e especialmente aos sábados.
Não me havia esquecido da obra filantrópica, e entreguei o único dinheiro que possuía
no momento, sem fazer como a viúva pobre, pois exigi troco da metade. Olhando a bolsa
volumosa, indaguei si havia livros que expusessem a doutrina, adquirindo o que me foi
apresentado sob o título Estudos Bíblicos.
Eu estava naquela ocasião sentado em frente á secretária, de uma de cujas gavetas foi
que tirei a Bíblia, versão de Figueiredo, a qual havia muitos anos eu usava principalmente
em viagens. E, quentes vezes, após os bailes já alta madrugada cansado e abatido, busquei
no sermão da montanha nas parábolas, um descanso muito mais excelente do que o que me
poderiam proporcionar os lençóis.
Jesus era para mim um orador eloquente, um maravilhoso filósofo, que falava coisas
agradáveis à nossa inteligência e ao nossa coração. Mas nunca o pude compreender como o
Filho de Deus, como Deus. Quando muito, Homem-Deus. Nunca, Deus-homem.
A leitura dos Estudos Bíblicos naquela noite, à luz das profecias, convenceu-me de
que Jesus era verdadeiramente o Filho de Deus, o Deus que, sem o saber, eu adorava.
E quando, na manhã, seguinte, se me descerra os olhos para a luz do dia, o meu
primeiro cuidado foi saber ande estaria aquele homem que só um mês depois, um
longo e interminável mês, encontrei de volta de sua viagem ao interior do Estado.
Queria indagar onde se situava a sua Igreja, como me seria permitido pertencer a ela,
porque tôdas as minhas melhores aspirações se enquadravam maravilhosamente nessa
mensagem. Integrara-me em mim mesma, e na verdade que, sem a conhecer, tanto me
atraía.
No sábado anterior à morte, ouviu o irmão Porto o meu comovido agradecimento a
Deus, pelo anjo que me anunciou as boas novas da minha salvação, hino de amor que o
meu corpo, minha alma e meu espírito, permita Deus, orquestrarão triunfalmente através de
todos os séculos eternos.
Américo R. Coelho, “Joaquim da Silva Porto.” Revista Adventista. maio 1941,
pp. 10 e 11.

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