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em Busca Do Sentimento PDF
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da paisagem
In search of landscape feeling
Margareth Afeche Pimenta
Resumo Abstract
Entre aproximações e distanciamentos, o senti- B e t w e e n p r ox i m i t i e s a n d d is t a n c e s , t h e
mento da paisagem ( stimmung ) resulta de um landscape feeling (stimmung) is the result of
longo debate que coloca em questão a racionalida- a long debate about the final rationality of the
de definitiva do mundo. A conflitualidade latente world. The latent conflict between reason and
entre razão e emoção leva Kant a admitir a possi- emotion leads Kant to admit the possibility
bilidade da apreensão suprassensível da natureza. of apprehending nature beyond the sensitive.
Sulzer e Herder alinham-se com ressalvas nessa di- Sulzer and Herder align with caveats in this
reção, reconhecendo a existência de prazer ou ex- direction, recognizing the existence of pleasure
citação, provocados a partir da interação exterior. or excitement caused by external interaction.
Carus, a partir de então, refere-se diretamente ao Carus, from there, refers directly to the landscape
sentimento da paisagem, apoiado em influências feeling, supported by cross-influences of Goethe
cruzadas de Goethe e Humboldt. Este artigo pre- and Humboldt. This article intends to follow this
tende acompanhar essa trajetória de elaboração path of conceptual elaboration, recognizing that
conceitual, reconhecendo à pintura a capacidade painting has the ability to arouse, in Carus, the
de suscitar, em Carus, o estímulo para a apreensão stimulus for the sensitive apprehension of the
sensível do mundo. world.
Palavras-chave: paisagem; sentimento; natureza; Keywords: landscape; feeling; nature; Humboldt;
Humboldt; Carus. Carus.
Cad. Metrop., São Paulo, v. 18, n. 37, pp. 863-877, set/dez 2016
http://dx.doi.org/10.1590/2236-9996.2016-3712
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um lado como extensão ou pedaço de terra objetividade seria questionada pela capacida-
e, por outro, como representação pictórica de de estupefação da obra pictural, de onde
(FR, 1694,1762,1798,1832-5, 1932-5, 1992; decorrea elaboração do sentimento da paisa-
Féraud, 1788). gem ( stimmung ).
O sufixo age, acrescido então a pays, que Entre aproximações e distanciamentos,
conforma paisagem (paysage), designa, quan- o sentimento da paisagem (stimmung) resulta
do vem depois de um verbo, uma ação; quando desse longo processo histórico que coloca em
colocado depois de um nome de pessoa, um es- questão essa dualidade conflituosa na apreen-
tado; e, depois de um nome de coisa inanima- são do real. Elabora-se a partir das reflexões de
da, uma coleção (Filleron, 2005). Parece haver, Carus sobre a evocação sensível da obra pic-
atualmente, uma inclinação pela última acep- tural. Contemporâneo de Goethe e Humboldt,
ção e a generalização da noção de paisagem pôde ser mandatário de influências cruzadas,
como coletânea de objetos naturais e culturais. mas, contrariamente aos demais, direciona o
Numa época em constante intervenção foco diretamente à paisagem cuja reflexão se
do homem sobre a natureza, em que as técni- desenvolve a partir da obra pictural. A vida
cas se desenvolvem rapidamente, a compreen- mais uma vez imitaria a arte. Dessa associação,
são do mundo estaria associada à objetividade depreende-se a capacidade de fascínio do be-
da observação racionalista. Assim, a paisagem lo, que poderia ser capaz de suscitar interações
como conjunto de objetos seria analisada com emocionais. Stimmung não pode se restringir,
o distanciamento do investigador, em sua ex- no entanto, a algo similar a alguma alteração
terioridade. Ela apareceria, dessa forma, sob e de humor (Oxford Research Encyclopedias,
para o olhar inquisitivo. Não haveria lugar, por- 2015). Seu debate circula entre os diversos sig-
tanto, para um relacionamento variável entre o nificados de “vocação, ressonância, tonalidade,
sujeito e o objeto a ser analisado. Somente no ambiência, acordo afetivo subjetivo ou objeti-
âmbito artístico haveria a permissão à contem- vo” (Richir, 2015). Resulta, no entanto, de um
plação evasiva. embate conceitual que tem por objetivo colo-
O conflito entre conhecimento e intuição car em dúvida a racionalização do mundo. A
perpassaria grande parte da história da filoso- tessitura dessas reflexões modernas apoia-se,
fia, sobretudo alemã, como se pudesse haver, historicamente, sobre a relação que se estabe-
até mesmo, o risco de uma certa perversão lece entre razão e sentimento.
da razão, provocada pela emoção. Uma longa Este artigo pretende acompanhar essa
trajetória de reações e argumentações promo- trajetória de elaboração conceitual, colocan-
ve a diluição de algumas barreiras e mesmo, do em destaque os debates realizados a partir
em alguns momentos, um convívio entre os do século XVII que culminariam, aqui, na ela-
dois termos que pareciam historicamente an- boração do sentimento da paisagem . Numa
tagônicos. A apreensão do real pelo conheci- época em que as contextualizações parecem
mento traz à luz o questionamento do próprio perder ressonância, talvez se tornem ainda
objeto “externo”, então natureza e, com ela, mais necessárias para a construção de um de-
a natureza transformada (Lefebvre, 1974). Sua bate intelectual profícuo, quando se pretende
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humana , que todas as obras e impulsões e literário, mas foi um importante precursor do
todos os membros mecânicos servem volunta- Romanticismo em seu experimentalismo for-
riamente”. Enquanto presença, “essa unidade mal, seu entusiasmo pela cultura popular e o
convergente e animada em nós se chama ima- primitivo, sua aceitação do poder do incons-
ginação”, quando se lhe atribui seu próprio ciente, forças irracionais e, acima de tudo, sua
alcance. “No contexto das forças intelectuais, relação com a experiência individual (ibid.).
espaço e tempo, que parecem existir somente Enquanto Herder erige Sulzer no verdadeiro
para o mundo robusto dos corpos, desapare- mentor de uma verdadeira ciência do sentir,
cem” (Herder, 2013, p. 39). Goethe o considera gestor de uma concepção
Herder exerceu uma enorme influên- moralizadora e insensível da arte (Décultot,
cia sobre a antropologia, geografia, filosofia 2006, p. 106). O debate seguia, portanto, entre
da história, tal qual sua obra Ideen que junta convergências e dissonâncias, elaborando de
muitos assuntos – história natural, história da forma cada vez mais complexa a relação entre
humanidade, literatura, filosofia – sem seguir ideia e sensações.
uma classificação enciclopédica, mas segundo A apreensão do real pela sensação, ela-
o duplo processo de progressão e de antologia borada pela razão, demonstra-se insuficiente
(Pénisson, 1996, p. 63). para responder à elaboração artística. Em uma
Herder, assim como Rousseau, acreditava carta endereçada a Goethe, em 1794, Schiller
que a evolução da civilização tinha alienado a desenvolve a ideia da interação entre intuição
humanidade da natureza – ou seja, da própria e abstração como via de mão dupla (Schiller e
natureza inerente à humanidade e do meio am- Goethe, 1923). Assinala que existe uma tarefa
biente. Ele advogava que as diferentes formas a mais, porque, depois de ter passado da intui-
de arte tiravam sua energia da experiência di- ção concreta à abstração, ter-se-ia que tomar
reta e não da correção das normas impostas, o caminho inverso, “traduzir de novo as ideias
recusando os modelos universais do classicis- abstratas em intuição” e transformar pensa-
mo francês (Hill, 2013, p. 1101). Atribui, como mentos em sentimentos, já que somente “as
os mais importantes autores alemães da época, intuições concretas fornecem a matéria prima à
a primazia à experimentação e ao sensível no produção criadora do gênio” (Herr, 1923, p. 7).
processo de elaboração artística. Entre sentimento, arte e razão vão se
Herder foi o pai intelectual do movimen- desenvolver as primeiras impressões que per-
to romântico Sturm und Drang (Tempestade e mitem posteriores reflexões sobre a paisagem
Paixão) que teve em Goethe sua figura central. como percepção e sensações. Elaboram-se,
O encontro com Herder em Estrasburgo, em portanto, as primeiras ideias da apreensão da
1770, permitiu a Goethe descobrir seu próprio paisagem como preocupação primordial, pole-
potencial como escritor original. O Sturm und mizando entre as expectativas de compreensão
Drang teve curta duração como movimento e os sentimentos suscitados.
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p. 70). De novo, a natureza se manifesta esti- A arte aparece, então, como apogeu da
mulando emoções, por uma relação afetuosa ciência. Torna-se mítica “no verdadeiro sentido
estabelecida com o observador. do termo, ou órfica, como Goethe a qualificou
Carus aceita o romantismo de Schelling, igualmente” (Carus e Friedrich, 1983, p. 103).
Schlegel e Friedrich, visando, no entanto, uma A poesia, que surge anteriormente à pintura
restituição exata do real, pouco compatível da paisagem e que a ultrapassa em termos
com a abordagem subjetiva e mística do uni- de espiritualidade,daria os exemplos “mais
verso. Seria Goethe quem teria alcançado o nobres” às tarefas dos tempos modernos. Nin-
encontro harmonioso entre arte e ciência, ou guém seria, assim, melhor que Goethe para ser
seja, a ”visão poética da natureza com as exi- seguido, já que “através de suas descrições [...]
gências do saber cientifico” (Décultot, 2015). se sente [...] que o poeta tem da natureza des-
Reportando-se aos estudos sobre as nuvens ses fenômenos um conhecimento íntimo e uni-
(longos estudos sobre as leis da atmosfera) versa” (ibid., p. 108). Universalidade esta que
no Terceiro Caderno da Naturwissenschaft poderia ser compreendida em relação tanto à
(Ciências Naturais) e aos seus belos poemas abrangência quanto à generalização a outros
Howard’s Ehrengedächtnis ( Memória de Hon- campos do conhecimento.
ra de Howard ) de Gothe, Carus destaca que a Em sua visão, Goethe teria aberto a via
pureza da vida existe somente em duas situa à regeneração da paisagem pictórica, o que
ções: 1) no ingênuo estado original, onde o se fundamentava em dois processos de co-
divino indica o que é verdadeiro e justo, sem nhecimento: 1) a decomposição científica dos
necessidade de reflexão; e 2) num estágio fenômenos naturais em conformidade, princi-
mais adiantado da vida quando se descobre palmente, com as leis da geologia e da meteo-
“claramente quais são as relações com Deus rologia; e 2) recomposição da unidade estética
e com o mundo”. Nesse momento, essa “pu- pelo olhar poético do artista (Décultot, 2015).
reza interior, inconsciente dela mesma, recebe Assim, a paisagem deveria representar a “vi-
na vida seu carimbo de clareza e consciência” da da terra”, em sua “diversidade de figuras e
(Carus e Friedrich, 1983, p. 102). Tal dualidade fenômenos variados” (Carus e Friedrich, 1983,
na perfeição interior pode ser imaginada igual- p. 63). A realidade seria, portanto, determi-
mente na arte. nada pelos mecanismos físicos que regem o
Os estudos sobre a formação das nuvens, globo terrestre, sendo insuflada de vida pelas
tal como são oferecidas pela simples intuição formas artísticas. A paisagem torna-se, assim,
sensível, requisitam a inteligência que é fruto geognose, conceito que se desenvolve a partir
exclusivo da pesquisa científica. As passagens do contato com Humboldt, complementando
das nuvens “não são desprovidas de lei”. A os aportes efetuados por Goethe.
visão romântica da paisagem pictural conduz, A natureza considerada racionalmente,
assim, a uma abordagem científica da natu- ou seja, submetida ao pensamento, seria “a
reza, “o que não nega, entretanto, sua matriz unidade na diversidade dos fenômenos, a
subjetiva e poética” (Décultot, 2015). harmonia entre as coisas criadas”, que diferem
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pelas formas, pelas suas constituições e pelas de outra forma, “tudo aquilo onde a natureza
forças que as animam (Humboldt, 1855a, p. 4). se revela conforme sua essência mais íntima”
A natureza não perderia “seu charme e o pres- (ibid. p. 123). O “todo penetrado pelo sopro
tígio de seu poder mágico” na medida em que de vida” (Humboldt, 1855a, p. 4). Por isso, os
se “penetre em seus segredos” (ibid., p. 20). desenhos dos geognosistas são animados de
Descobri-la, portanto, seria a revelação de sua vida interior. O mesmo aconteceria com os tra-
magia, a “influência do mundo exterior”se balhos dos intelectuais, já que a apreciação da
exercendo “sobre a imaginação e o sentimen- beleza depende da formação e do aprendizado
to” (ibid., p. 50). do gosto.
Humboldt desvenda um sentimento de O estudo dos objetos naturais deveria,
natureza, “desenha com palavras, para os também, ensejar um aspecto exterior e um as-
olhos de nossa alma”, inspirando, para Ca- pecto interior; o primeiro daria uma ideia intui-
rus, o “ideal da paisagem artística moderna” tiva do todo, enquanto o segundo apresentaria
(Carus e Friedrich, 1983, p.108). Seria neces- as suas partes. Somente os dois aspectos reuni-
sário, então, precisar o termo paisagem como dos poderiam dar a “ideia completa da essên-
“a representação da vida da terra, a arte da cia geral do objeto natural”. Da mesma forma,
representação da vida da terra (Erdlebenbild, a compreensão do “verdadeiro caráter” de um
Erdlebenbildkunst)”,o que evocaria mais preci- animal não supõe somente “a reprodução iner-
samente seu pensamento (ibid., p. 109). te de seus contornos, mas a apreensão viva do
Todo o objeto na terra, por mais simples, olho do artista”. Também parece impossível
seria um “digno e belo objeto de arte”, desde detectar a verdadeira particularidade de uma
que fosse apreendido com a “alma”, desvelan- montanha, a não ser pela figuração artísti-
do, exatamente, “todo o seu sentido próprio ca, ou seja, “uma paisagem verdadeiramente
e a ideia divina que se esconde nele mesmo” geognósica”(Carus e Friedrich, 1983, p. 136).
(ibid., p. 109). A imagem da vida na terra de- Apreende-se o mundo sensível em seu
veria acolher, não somente a paisagem natural, conjunto, similar ao prazer da contemplação
mas também a vida humana, já que o homem é que se tem, avistando-se a paisagem a partir
o seu “mais belo produto” (ibid., p. 110). de uma montanha. Carus ressalta essa exulta-
Os artistas de “corações puros e leais” ção, quando se intensifica a impressão de con-
deveriam reconhecer o caráter “sagrado” de junto dessa apreciação. Todo estudo verdadei-
tudo o que devem representar (ibid., p. 122). ro da natureza conduziria o homem ao limite
Seria necessário, então, a formação do senti- dos “mistérios superiores” que lhe preenche-
do do artista pela “bela forma”, assim como riam de “um horror o mais sagrado” (Carus e
a formação do gosto no povo. Aproxima-se de Friedrich,1983, p. 59). Habituando-se a ver nas
seus antecessores, sobretudo de Sulzer, quanto características das montanhas e das nuvens
à necessidade de um processo de elaboração e os estados diversos da totalidade orgânica da
desenvolvimento do gosto. O belo estaria em terra e de sua atmosfera, Carus afirma ter de-
“tudo aquilo que exprime puramente uma es- senvolvido um profundo “respeito pela parti-
sência divina nas coisas naturais”, ou seja, dito cularidade da natureza”, o que lhe conduziria
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para uma pesquisa rigorosa da verdade (ibid., Trazida ao primeiro plano por Carus, a
p. 135). Considera, portanto, como Humboldt, função do gênero paisagístico seria de repre-
que as atividades artísticas e a ciências intera- sentar, então, uma certa tonalidade (stimmung)
gem de forma benéfica. da vida interior, em correspondência com a vida
Os amplos painéis geográficos descritos natural, uma formulação próxima de Schlegel
em Viagem às regiões equinociais do novo em Leçons sur l'art (Décultot, 2015). Schlegel
continente (1845-1862), de Humboldt, pre- segue a visão total da obra que ultrapassa a
tendem o maravilhamento com as particulari- soma dos elementos que a compõem. Detectar
dades naturais, assimilando o olhar inquisidor uma verdadeira característica implica essa pe-
do cientista ao campo artístico (Humboldt e netração da ideia geral que permite à literatura
Bonpland, 1814). Torna-se clara sua intencio- e ao quadro “viver organicamente”. A ideia so-
nalidade em Tableau de la Nature, quando se mente valeria “dentro do espírito de sua épo-
propõe a “contemplar a natureza do alto, colo- ca” (Korinman, 2015). Carus, herdeiro de forte
car em evidência a ação combinada das forças tradição conceitual e afinado com seu tempo,
físicas”, oferecendo, ao “homem sensível”, os destaca a paisagem como objeto de reflexão
prazeres sempre renovados pela “pintura fiel das sensações no processo de conhecimento
das regiões tropicais”(Humboldt, 1850, p. 2; e percepção da realidade que o circunda, mas
grifos nossos). também a própria capacidade da natureza de
Para Humboldt, um estudo da natureza suscitar emoções. A pintura da paisagem, repe-
não seria completo quando não fosse consi- tindo o real, deveria envolver os mesmos senti-
derado o reflexo do mundo exterior no pensa- mentos de uma apreensão imergente. Somente
mento e na imaginação das impressões poéti- um homem alerta, que desenvolveu suas capa-
cas, ou seja, a revelação de um mundo interior cidades, aproximando-se do belo, seria capaz
(Humboldt, 1855b). A pintura da paisagem de captar a interioridade do campo externo.
seria uma descrição animada do mundo, que Um estado poético requereria, portanto, todas
propagaria o estudo da natureza. Ela mostra- as potências da alma para a apreensão da rea
ria o mundo exterior, mas poderia relacionar o lidade exterior. Ratifica, assim, “a afinidade do
mundo visível ao mundo invisível, dependendo homem com o espírito do mundo” (Carus e
de sua qualidade. Friedrich, 1983, p. 59).
Para compreender a natureza em sua
totalidade, não se poderia reter no fenômeno
exterior, mas seria necessário “fazer entrever Paisagem e arte: identidade
algumas dessas analogias misteriosas e harmo-
nias morais” que o vinculam ao mundo exte-
na busca do sublime
rior, mostrando como a natureza pode envol-
Que ninguém é o igual ao outro, que seja
ver num “véu simbólico que deixava entrever de preferência igual ao Supremo; E de que
imagens graciosas”, como faz eclodir o “nobre maneira? Sendo perfeito em si mesmo.
germe das artes” (Humboldt, 1855b, p. 3). (Ibid., p. 103; grifos nossos)
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da paisagem teria sido o mote de incitação da entanto, são longínquos. De quando em quan-
observação do belo que se interioriza, a partir do, precisa-se negligenciar o presentismo, lem-
da aproximação com a natureza. O eu entraria brando que a elaboração teórica é resultado de
em contato consciente com as sensações, de um longo processo reflexivo. Os conceitos se
onde se depreenderia o sentimento de beleza. reelaboram constantemente. De Kant a Carus,
Carus, entremeando as visões mais passou-se das dúvidas propositivas entre razão
científicas e as mais naturalistas de Goethe e e emoção na apreensão do mundo exterior, até
Humboldt,desenvolve uma percepção original o desenvolvimento da interação entre senti-
de paisagem, que aparece associada direta- mento e ambiente.
mente à alma e ao sentimento. Esse foi um pri- A natureza não existe somente em ex-
meiro passo que seria seguido, posteriormente, terioridade. Interage com o olhar inquisidor. A
por diversas versões controversas e criativas, postura contempladora se responsabiliza pela
o que não é objetivo deste texto desenvolver. indução de diversas sensações. Se os homens
Cabe somente destacar a importância do de- são diferentes, revelam, contudo, uma identi-
bate contraditório como método de formação dade comum na busca daquilo que possuem
conceitual. As novas tecnologias fizeram obli- de divino. Perseguir a perfeição torna-se pos-
terar a duração como elemento fundamental sível no reconhecimento do belo. E daí deriva
da compreensão da realidade. Os conceitos, no a paisagem.
Notas
(1) “Tuit li omne de ciel païs, trestuit apresdrent a venir; Et sancz Lethgiers lis predïat”, extraído de La
Vie de Saint Léger, escrito por volta de 980, publicado por J. Linskill (Paris, 1937). Disponível em:
www.hs-augsburg.de/~harsch/gallica/Chronologie/10siecle/Leger/leg_text.html. Acesso em: 13
fev 2014.
(2) Benedei, monge que teria vivido na Corte de Henrique I, no início do século XII, é autor da
vulgarização da Viagem do Santo Brendan, um poema edificante em octossílabas, traduzido por
Ian Short (Guidot, 2015).
(3) A polêmica com Kant explicita-se em sua obra Kalligone (contre la critique du jugement de Kant),
publicada em 1800.
(4) Preferiu-se, aqui, o texto em italiano, porque explicita os termos empregados em alemão.
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