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ISBN 978-85-62288-47-0
As ideias veiculadas e opiniões emitidas nos capítulos, bem como a revisão dos mesmos, são
de inteira responsabilidade de seus autores. É permitida a reprodução dos artigos desde que
seja citada a fonte.
SUMÁRIO
RESUMO
O presente trabalho foi baseado em cenas do filme Astérix e Obélix contra César, onde são
presenciadas tentativas de cobranças abusivas de impostos contra uma aldeia celta, tentativas
inválidas graças à presença de uma misteriosa poção, preparada por um druida. Modo pelo
qual, se fez uma analogia entre esta poção e os direitos fundamentais do contribuinte
na atualidade. Primeiramente, introduziu-se à ambientação do tema, tratando sobre o filme e a
pertinência deste para um estudo em Direito Tributário. No primeiro capítulo tratou-se sobre a
relação jurídica obrigacional tributária, uma evolução na relação Fisco-Contribuinte. Depois,
discutiu-se o princípio da legalidade como base para a tributação e as relações e
consequências dele advindas. Por derradeiro, discorreu-se sobre os princípios constitucionais
tributários em espécie, suas características e importâncias. O último princípio tratado foi o da
"inafastabilidade" do Poder Judiciário, indispensável para a efetivação de todos os outros.
Desta maneira, chega-se à conclusão que, os direitos fundamentais dos contribuintes são
verdadeira "poção" à disposição dos cidadãos contra abusos do fisco, podendo socorrerem-se
no Judiciário em caso de desrespeito destas normas constitucionais por atos de um fisco
cesarista.
ABSTRACT
The present paper was based on scenes from the movie Asterix and Obelix take on Cesar,
where attempts are made to charge abusive taxes against a Celtic village, attempts that results
invalid by the presence of a mysterious potion, prepared by a druid. The way which an analogy
was made between the celtic’s potion and the today’s fundamental rights of the taxpayer.
Firstly, the theme was introduced, dealing with the movie and its pertinence to a study in
Tax Law. The first chapter dealt with the tax obligatory legal relationship, evolution in the
Revenue-Taxpayer relationship. Then, the principle of legality was discussed as the basis for
taxation and the relations and consequences of taxation. Finally, was discussed the
constitutional principles of taxation in kind, their characteristics and importance. The last
principle treated was the "inafasability" of the Judiciary, indispensable for the activity of the
other principles. In this way, it is concluded that the fundamental rights of taxpayers are a true
"potion" available to the citizen against abuses of the Reavenue, being the Judiciary able to
help in case of disrespect of these constitutional norms by acts of a cesarist revenue.
KEY WORDS: Principles. Taxation. Taxpayer's guarantees. Constitutional Tax Law. Tax
Justice.
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INTRODUÇÃO
O objetivo proposto, já há três anos seguidos, no Simpósio Regional Direito e Cinema
em Debate, nos parece ter por base a possibilidade da discussão dos mais variados assuntos
ligados ao direito, tratados nas telas da sétima arte. Uma situação interessante foi pensar
justamente sobre qual filme instigaria a produção de um trabalho científico, dentre a imensidão
de boas obras cinematográficas que atualmente nos são colocadas à disposição através de um
toque. Entre tantos grandes cineastas, retratando dramas com perfeccionismo, como o italiano
Federico Fellini, grandes nomes da ficção, como Steven Spilberg, o presente trabalho
encontrou inspiração em uma cena quase que remota, e muito bem trabalhada na película
francesa "Astérix e Obélix contra César", lançada em 1999, do gênero da fantasia, dirigida pelo
cineasta e roteirista francês Claude Zidi, tendo como protagonistas: René Goscinny, como
Astérix, e Albert Uderzo, como Obélix.
O filme, sucesso de público, televisionado por diversas vezes nos últimos anos, é por
muitos considerado como uma das melhores "comédias de época", retratando a realidade de
uma aldeia gaulesa que, sob o domínio do Império de Júlio César, se negava a pagar os
impostos de natureza meramente arrecadatória, usados apenas a fim de manter o poderio e a
pompa do reino. Entretanto, os coletores de impostos não deixavam a situação aquém, mas
buscavam os mais diversos meios de cobra-los à força. Ocorre que, na aldeia, havia um druida
chamado Panoramix, que produzia uma poção mágica, poção esta que fazia com que os
aldeões se tornassem invencíveis, mantendo o tesouro a salvo, mesmo depois de diversas
investidas dos romanos. As "investidas em vão" tornam o filme uma verdadeira comédia,
despertando o humor do espectador, vez que toda a força do exército de Roma não era
suficiente para incomodar os gauleses, protegidos pela poção que consumiam antes das
batalhas.
Isso fez com que César e seus militares buscassem outras estratégias para tomar a
pequena aldeia e cobrar seus confiscatórios tributos, como, por exemplo, a captura de
Panoramix, o sábio responsável pelo feitio da poção, ou ainda deter Obélix.
Em que pese o passar dos anos e os avanços da civilização, algo continua inevitável
em um Estado Fiscal: o pagamento de tributos pelo cidadão. Porém hoje, diferente da época
retratada no filme, a tributação deve ser regrada, baseada na norma jurídica, devendo, em tese,
oferecer ao contribuinte seguranças sobre a relação jurídica tributária, não sendo mais uma
relação de pura sujeição e poder.
Ainda assim, continua o Estado com uma vontade insaciável de arrecadar receitas
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através da tributação, que é a sua principal fonte financeira, fazendo com que o contribuinte
por vezes sofra graves lesões aos seus direitos através de interpretações extensivas e maldosas
da legislação, ou mesmo pela criação e aplicação de normas que encontram-se em rota de
colisão com aquilo que foi originalmente proposto na carta constitucional, tudo em nome da
máxima arrecadação e de um suposto "interesse público".
Portanto, nas páginas seguintes, buscaremos compreender os direitos e garantias
fundamentais do contribuinte, oponíveis não apenas contra o Fisco, mas inclusive contra quem
detém a competência tributária, sempre visando garantir a segurança jurídica, a cidadania e
império, não o Romano, e sim o império do Estado de Direito.
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Obrigacional Tributária, onde o sujeito passivo da obrigação tributária, o contribuinte, e o
sujeito ativo desta, o Fisco, têm direitos e deveres. Conforme NOGUEIRA:
As relações humanas atingidas pelo Direito passam, por isso mesmo, a constituir
relações jurídicas porque este lhes injeta eficácia. Assim estas relações humanas se
transformam em relações juridicamente vinculantes. Daí podemos distinguir na
relação jurídica a matéria e a forma. A matéria provém da relação humana, a forma
decorre da lei. [...] Vamos então esclarecer o que é a relação jurídico-tributária: o
indivíduo entrando em relação com outro ou outros, pratica como, por exemplo, um
contrato de compra de uma casa. Ao praticar esse ato, essa relação negocial, com ela
incide no campo da lei tributária, porque a lei tributária previamente declara incidente
no imposto a compra e venda de imóvel. A ocorrência dessa relação humana que
incide na lei tributária, isto é, que produz efeitos jurídicos tributários, faz surgir entre
o Estado e o indivíduo direitos e obrigações recíprocos, formando o conteúdo de
uma relação jurídica específica chamada relação jurídica tributária. (1980, p.
141-142. Grifamos)
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Constituição.
O nobre leitor pode imaginar que estamos a nos confundir, vez que, primeiramente,
falou-se em Relação Jurídica Obrigacional Tributária como meio de garantias ao contribuinte, e
agora se entra no tema do princípio da legalidade... Existe alguma contradição?
Não. A prática de atos administrativos pelo Fisco deve ter por base o princípio da
legalidade. Também o legislador, em matéria tributária, submete-se a outro princípio derivado, o
princípio da reserva de lei. É a legalidade que garante ao cidadão a "não surpresa" nos atos
estatais, sendo esta uma garantia de que as ações advindas da máquina pública devem estar
pautadas em autorização legal, dando espaço a uma série de possibilidades de defesa por parte
deste contra o ente maior. Com o princípio da legalidade e seus congêneres, pode questionar o
cidadão, e deve responder o agente público, sobre qual o fundamento legal de determinada
atuação, sob a pena de nulidade do ato praticado, por clara violação à base do Estado de Direito
e, por conseguinte, à própria Lei Fundamental, a Constituição.
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A reserva de lei, por sua vez, mais vincula ao Poder Legislativo, estabelecendo a
Constituição as competências e matérias a serem reguladas por lei, impondo restrições e
limites:
A doutrina não raro confunde ou não distingue suficientemente o princípio da
legalidade e o da reserva de lei, ou a atuação dentro da esfera estabelecida pelo
legislador. O segundo consiste em estatuir que a regulamentação de determinadas
matérias há de fazer-se necessariamente por lei formal. Embora às vezes se diga que
o princípio da legalidade se revela como um caso de reserva relativa, ainda assim é de
reconhecer-se diferença entre ambos, pois que o legislador, no caso de reserva de lei,
deve ditar uma disciplina mais específica do que é necessário para satisfazer o
princípio da legalidade. Em verdade, o problema das relações entre os princípios da
legalidade e da reserva de lei resolve-se com base no Direito Constitucional positivo,
à vista do poder que a Constituição outorga ao Poder Legislativo. (SILVA, 2005, p.
422)
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cobrança autorizado ao Fisco. A cobrança dos créditos tributários deve, por sua vez, seguir um
procedimento previsto expressamente em lei: o da Execução Fiscal (Lei 6.830, de 1980).
Como a relação entre as partes é uma relação lastreada no Direito, há uma relação de
confiança, de segurança jurídica, conforme analisa o Professor Catedrático da Faculdade de
Direito de Coimbra, José Casalta Nabais, em sua tese de doutoramento sobre "O dever
fundamental de pagar impostos" naquela universidade:
Com efeito, sendo certo que o princípio constitucional da segurança jurídica,
enquanto manifestação da ideia de estado de direito, vale face a todas as funções do
estado (funções legislativa, administrativa e judicial), não é menos certo que, atenta a
importância e o alcance do princípio da legalidade fiscal, ele há-de actuar, no que ao
direito fiscal diz respeito, sobretudo face ao legislador, a quem cabe o poder tributário
de cuja limitação estamos agora a tratar. O que quer dizer que a sua eficácia face aos
operadores ou aplicadores concretos do ordenamento jurídico-fiscal, sobretudo face à
administração fiscal, apenas se verificará se e na medida em que aos mesmos seja
deixada uma qualquer margem de livre decisão, cuja utilização possa ser convocado
um tal princípio constitucional como padrão ou paradigma de actuação. (2015, p.
396).
Não existe, desta forma, espaço para atuação discricionária do Fisco fora da lei ou
ainda, em caso de errônea omissão por parte do legislador, uma atuação afastada dos princípios
constitucionais, incluídos não apenas os princípios constitucionais tributários, mas a norma
constitucional como um todo.
Por isso, ousamos colocar o princípio da legalidade como a base para a atuação do
Fisco na relação jurídica tributária, vez que este dá ao contribuinte as garantias inerentes à vida
em um Estado de Direito, vedando arbitrariedades e ilegalidades que acometiam os mais fracos
no passado. Entretanto não se pode afirmar que tais problemas estejam totalmente solucionados
na atualidade. Obviamente que, infelizmente, estes continuam a ocorrer. Porém, existem entes
aos quais aqueles que, sentindo-se injustiçados, podem recorrer, tanto administrativamente
quanto judicialmente, uma vez que, a própria Constituição, prevê a inafastabilidade da atuação
do Poder Judiciário (cf. Art. 5º, XXXV, da Constituição Federal), conforme estudaremos com
mais afinco adiante.
Assim, é forçoso reconhecer a importância ímpar deste princípio, motivo pelo qual,
no presente trabalho, o colocamos de modo apartado, em um tópico único, antes de discorrer
sobre os demais princípios constitucionais inerentes à tributação.
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hermenêutica constitucional e do modelo de Estado que busca a Constituição instituir no
Brasil. Quando se fala em Direito Constitucional Tributário, é inolvidável referencial teórico a
obra “Curso de Direito Constitucional Tributário” de Roque Antonio Carrazza, professor da
Faculdade Paulista de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP),
monografia tão inspiradora quanto o filme que utilizamos para basear este artigo, portanto, são
alguns dos princípios neste livro elencados que traremos à discussão neste tópico. Diz-se que,
tais princípios, compõem um verdadeiro "estatuto do contribuinte", pelos motivos que, cada
um deles, logicamente, adiante expressará.
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Saber que uma modificação no quantum dos tributos cobrados não se dá de imediato,
traz ao contribuinte uma segurança em suas relações, inclusive a chance de planejar saídas
elisivas, a fim de, caso haja possibilidade, não ter seu negócio ou patrimônio afetado
diretamente pela mudança na regra fiscal, transparecendo verdadeira garantia em favor do
sujeito passivo.
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liberdade de tráfego, previsto no Art. 150, V, da Constituição, traz consigo um espírito de
alforria, segundo o qual é vedada a limitação ao tráfego de pessoas e bens por meios de tributos
interestaduais ou intermunicipais. Tal garantia também está prevista no artigo 5º, LXVIII, da
Constituição, artigo que é o sítio comum dos direitos e garantias fundamentais, onde há a
previsão do remédio heroico, do habeas corpus, contra restrições à liberdade das pessoas.
A doutrina assim conceitua a aplicação do princípio da liberdade de tráfego:
O art. 150, V, da CF de 1988 veda às diversas entidades tributantes o estabelecimento
de limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou
intermunicipais. É importante esclarecer que essa regra não impede a cobrança de
impostos sobre a circulação em operações interestaduais ou intermunicipais. O que
ela proíbe é a instituição de tributo cuja hipótese de incidência seja elemento
essencial a transposição de fronteira interestadual ou intermunicipal. Essa
limitação ao poder de tributar decorre e de certa forma realiza o princípio federativo.
Não configura propriamente uma imunidade. Apenas estabelece parâmetros para a
atividade tributária. Define, na verdade, circunstâncias que a podem tornar
inconstitucional. (MACHADO, 2013, p. 43. Grifamos)
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3.4 Princípio da vedação ao confisco
Confiscar é um ato ligado à ideia de "tomar algo", impedir seu uso, em virtude de
regulamento. O próprio Código Tributário Nacional, na definição de tributo em seu artigo 3º,
dispõe que uma das características do tributo é de não ser punitivo, ou seja, tributo não é
sanção. A Constituição, na mesma toada, proíbe em seu artigo 150, IV, que os impostos
tenham caráter confiscatório. Mas, quando um imposto seria confiscatório? Tal interpretação
primeiramente pertence ao legislador, na elaboração da norma tributária, e, posteriormente, ao
julgador, no controle de sua constitucionalidade, sendo a última voz a da "corte constitucional".
Vozes doutrinárias aclamadas falam que, quando a alíquota ou o montante ultrapassam a casa
dos 50% do valor econômico do bem, já há a prática do confisco. O Supremo Tribunal Federal,
em seu turno, vem entendendo que a vedação ao confisco não aplica-se apenas à obrigações
tributárias principais, mas também às acessórias, como multas tributárias, em recentes
julgados, como o AI 727.872/RS, de 2015, vinculando estas decisões também ao princípio da
proporcionalidade e da razoabilidade, tendo, portanto, um espectro ainda maior.
Hugo de Brito Machado, em seu Curso de Direito Tributário, assim navega pelo
assunto:
A Constituição Federal estabelece que é vedado à União, aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios utilizar tributo com efeito de confisco. Não obstante seja
problemático o entendimento do que seja um tributo com efeito de confisco, é certo
que o dispositivo constitucional pode ser invocado sempre que o contribuinte
entender que o tributo, no caso, lhe está confiscando bens. Cabe ao Judiciário dizer
quando um tributo é confiscatório. A regra constitucional, no mínimo, deu ao
Judiciário mais um instrumento de controle da voracidade fiscal do governo,
cuja utilização fica certamente a depender da provocação dos interessados e da
independência e coragem dos magistrados, especialmente dos que integram o
STF. (2013, p. 41. Grifamos)
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devemos "tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual na medida de sua
desigualdade". A capacidade contributiva, portanto, prevista no artigo 145, § 1º, da
Constituição, é um meio de se alcançar a igualdade material, verdadeira pedra de toque do
Sistema Tributário Nacional, podendo ser compreendida como medida, como parâmetro a ser
utilizado para a cobrança dos tributos, cobrando mais dos que possuem maior riqueza, e menos
dos mais humildes. O que faz do tributo um método constitucional de justiça social e
distribuição de renda, vez que, em um tributo que pode ser individualizado, cobrar a mesma
quantia de um pobre e de um rico causa gravame imensamente maior ao que tem a menor
capacidade de contribuir.
O parágrafo primeiro do referido artigo (Art. 145) dispõe que: sempre que possível,
os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do
contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a
esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o
patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte. O imposto de renda,
por exemplo, é prova prática da atividade deste princípio, pois suas alíquotas variam de acordo
com as faixas de renda, assim, quanto maior a renda, maior a porcentagem de imposto.
É o que aborda Roque Carrazza:
O princípio da capacidade contributiva hospeda-se nas dobras do princípio da
igualdade e ajuda a realizar, no campo tributário, os ideias republicanos. Realmente, é
justo e jurídico que quem, em termos econômicos, tem muito pague,
proporcionalmente, mais imposto do que os que tem pouco. Quem tem maior riqueza
deve, em termos proporcionais, pagar mais imposto do que quem tem menos riqueza.
Noutras palavras, deve contribuir mais para a manutenção da coisa pública. As
pessoas, pois, devem pagar impostos na proporção dos seus haveres, ou seja, de seus
índices de riqueza. O princípio da capacidade contributiva informa a tributação por
meio de impostos. Intimamente ligado ao princípio da igualdade, é um dos
mecanismos mais eficazes para que se alcance a tão almejada Justiça Fiscal.
Importante destacar que o legislador tem o dever, enquanto descreve a norma jurídica
instituidora dos impostos, não só de escolher fatos que exibam conteúdo econômico,
como atentar para as desigualdades próprias das diferentes categorias de
contribuintes, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas. (2004, p. 77)
A justiça fiscal deve ser um objetivo de Estado quando se busca cumprir a sério os
fins republicanos, promovendo a igualdade e o desenvolvimento, evitando ônus sufocantes aos
mais humildes e demasiadamente leves aos mais abastados. Apesar de não existir uma medida
211
exata e individualizada sempre à disposição, um Estado em que sua fiscalidade se preoculpa
com a justiça fiscal tem tudo para nele vigorar uma sensação de maior justiça e dignidade,
gerando menor repulsa dos cidadãos à cobrança e ao pagamento dos tributos, deixando uma
sensação de que o tributo tem verdadeira e equitativa destinação ao bem comum da sociedade.
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direito subjetivo foi ou está na iminência de ser lesado. Este é o alcance que tem, no
campo tributário, o princípio da universalidade da jurisdição (também conhecido
como princípio da inafastabilidade da jurisdição). Convém destacar que, quando o
inc. XXXV do art. 5º da Lei Maior estabelece que “a lei não excluirá de apreciação
do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, obviamente não está aludindo,
apenas, aos direitos públicos subjetivos, consagrados pela Constituição, mas
compreende também os direitos decorrentes das normas infraconstitucionais. (2004,
p. 396-397)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando os últimos milênios, a figura do Estado e a figura do tributo mudaram
em demasia. Contudo, o financiamento público continua a ser a maior finalidade do tributo. A
relação Fisco-Contribuinte passou de uma relação de pura imposição de poder, do primeiro
sobre o segundo, para uma relação baseada em regras, em normas advindas do Direito. Nestas
normas estão inscritos os mais diversos e profundos detalhes inerentes à atividade de tributar,
dando à parte mais fraca, o contribuinte, a garantia de segurança e previsibilidade, impedindo
que seu patrimônio, na maior parte das vezes fruto de longos e árduos anos de labor,
desapareça por causa de uma vontade discricionária e inescrupulosa de um governante. Toda
esta série de direitos e garantias do contribuinte está intimamente ligada aos direitos
fundamentais, com base na Constituição, a qual também disciplina sobre a estrutura e as
competências no Sistema Tributário Nacional.
Lamentavelmente, é fato notório e sabido que a atuação do Fisco muitas vezes excede
sua competência e os limites constitucionais, usando o argumento do falso "interesse público" e
do mal compreendido "princípio da solidariedade" para fazer arruaça na vida do contribuinte,
vezes exigindo obrigações principais e acessórias indevidas, outras utilizando de verdadeiros
meios coativos e inquisitórios para a cobrança dos tributos. Independentemente da intenção dos
agentes públicos ao praticarem tais desvios, há uma "poção mágica" à disposição do
contribuinte, como aquela feita pelo druida Panoramix em Astérix e Obélix contra César, com o
fito de protegê-lo contra invasivas injustas. Esta "poção" é formada por aqueles direitos
fundamentais do contribuinte, tratados acima.
Estes direitos, presentes no texto constitucional e ainda na legislação tributária, seja
através de princípios, seja em normas strictu sensu, são os instrumentos para a proteção
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daquele que paga seus impostos e espera que, no Estado de Direito, a legalidade, a
impessoalidade, a moralidade e a publicidade sejam fundamentos inseparáveis da tributação,
podendo ainda, caso necessário, socorrer-se no Judiciário, para nele pleitear a prevalência de
seus direitos contra os resquícios cesaristas ainda presentes na atividade diária de
algumas autoridades fiscais.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25ª Edição, São Paulo:
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