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EDUCAR E DISCIPLINAR
Outro dia, a Daiane trouxe à rede uma pequena grande questão, que permitiu a todos parar
para pensar… De um caso corriqueiro, surgiram várias reflexões. E o mais importante: a
dúvida que a Daiane compartilhou acendeu luzes e suscitou interrogações em diversos
membros da rede, que puderam se desligar por um momento de sua prática para refletir
sobre a mesma. Obrigada, Daiane! Para quem não acompanhou o que #rolounarede, aí
vai a sistematização:
Laura também foi por esta linha, citando um texto do psicanalista D. Winnicott chamado
“Delinquência como sinal de esperança”. Ela explicou que neste texto o significado do
roubo, do furto e de ações agressivas são entendidos como um pedido da criança para
reaver algo que acredita lhe ter sido tomado (como o direito a uma família,
exemplifica). “Nesse sentido, uma atenção maior já pode dissolver o “sintoma” antes
que o adolescente se torne de fato um “anti-social”, termo que o psicanalista gosta de
usar. Toda essa compreensão, no entanto, não culmina na ausência de repreensão.
Apenas nos lembra que nossa intervenção não se restringe ao “pôr limites“”.
Ana Paula concorda com tais reflexões, lembrando que “entender o porquê do roubo
não atenua a falta cometida e que deve ser reparada através de reflexões e medidas, mas
é importante para um entendimento mais global do histórico de vida desse adolescente e
para ajudar a nomear as angústias desse adolescente, que age intempestivamente e
não sabe o porquê”.
O Renato acredita que a privação do direito de ir e vir pode ser necessária, “desde que
isto seja uma consequência que provoque incômodo ao adolescente. Muitas vezes, além
do diálogo que é sempre necessário, é preciso estabelecer consequências de atitudes.
Como disse uma das colegas, ninguém morre por ficar sem sair vez ou outra”.
Lúcia também acha que deve haver alguma punição, defendendo que se isto não
acontecer, a tendência é a repetição do ato. “Aconteceu aqui em nosso abrigo: uma
criança de 09 anos pegou o celular de uma Conselheira Tutelar. Após muita luta, o
entregou. Conversamos, a psicóloga conversou bastante, ela pediu desculpas, relevamos.
Algum tempo depois, foi ocorrendo uma sucessão de pequenos furtos na instituição e
comprovamos que nossa atitude infelizmente foi falha”. Mas, o que seria a atitude correta
então?
Luciana nos trouxe um novo ponto de vista quando reflete que todas as nossas ações
junto às crianças e adolescentes têm de ter caráter protetivo e educativo. “Nesse caso
acredito que não houve nenhum dos dois. Seria muito mais benéfico solicitar que esse
adolescente se retratasse com os padrinhos, do que mantê-lo “preso” por 36 horas”.
Simone pondera os dois lados da moeda, lembrando que “se a intenção da educadora era
retirar os privilégios do passeio no final de semana por conta do que aconteceu, é super
válido. Até porque é algo grave e poderia gerar consequências maiores. Mas nunca se
esquecendo da conversa e conscientização, porque se não, independente do que é usado,
não haverá significado para a criança”.
Alice sugere que os próprios padrinhos
reafirmem seu amor incondicional ao
adolescente e que lhe deêm a punição, “pois os
limites mais eficazes são aqueles dados por
pessoas que nos amam. Dar o devido limitador
e com a proporcionalidade devida”.
A Simone contou que, na instituição na qual trabalha, a equipe técnica dificilmente toma
uma atitude como esta sem a discussão em equipe, pois “isso tira a autoridade dos
educadores que estão diariamente com os acolhidos. Orientamos, conversamos e
discutimos sobre o que seria ou não adequado, com crianças e funcionários”.
Simone, por exemplo, conta que na instituição na qual trabalha, já tiveram muitos
problemas quando educadores levam as crianças para suas casas, e “pelo envolvimento
afetivo que gera, atualmente é proibido. Focamos que eles são tão importante quanto os
padrinhos e por isso devemos focar na qualificação do seu trabalho”.
A Isabel também não recomenda a combinação de papel dos educadores com família de
apoio, e entende que este tipo de relação faz com que haja confusão de papéis,
influenciando nas tomadas de decisão acerca das ações com as crianças e adolescentes.
No caso, ela percebe que a educadora se sentiu no direito de fazer a represália, mas que
isto deveria ter sido discutido em equipe previamente.
Por fim, a Alice sugeriu que educadores e padrinhos não sejam a mesma pessoa,
esclarecendo: “o objetivo do padrinho/madrinha é ser um afeto diferenciado e especial
na vida do acolhido. Como o educador do dia a dia poderá diferenciá-lo em atenção,
sem misturar as coisas no trabalho? É difícil para a criança/adolescente entender isto.
É difícil ao educador fazer esta diferenciação no dia a dia. As situações se confundem.
Os outros acolhidos não entendem. Cria-se uma situação embaraçosa e desnecessária
que poderá ficar confusa e difícil sem necessidade”.