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quando as autoridades desse campo conseguem estabelecer uma definição da ciência segundo
a qual a realização mais perfeita consiste numa matriz do que o campo possui e produz de
investigação. Por isso, Bourdieu et al. (2003) defende a necessidade de perguntar: o que é
fazer ciência?
Preguntarse qué es hacer ciencia o, más precisamente, tratar de saber qué hace el
científico, sepa éste o no lo que hace, no es sólo interrogarse sobre la eficacia y el
rigor formal de las teorías y de los métodos, es examinar a las teorías y los métodos
en su aplicación para determinar o qué hacen con los objetos y qué objetos hacen”
(BOURDIEU et al., 2003, p. 25).
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(2002, 2006) uma possível solução está em uma postura crítica e renovadora em
comunicação realizando pesquisa da pesquisa5 para fazer avançar os conhecimentos na área.
A busca obstinada pela constituição científica do campo acadêmico da comunicação se
desdobra em uma forte tendência: o uso do empirismo como uma forma de comprovação da
pesquisa. De encontro a essa propensão, começo por lembrar, com Maldonado que na
“pesquisa em comunicação o empírico é imprescindível se considerarmos os sistemas,
estruturas e campos midiáticos como um referente central dos problemas de conhecimento
para a nossa área” (2006, p. 279). Bachelard (1981), por sua vez observa que o fazer
científico deve ser construído e conquistado de acordo com cada prática científica. Dessa
forma, percebo na concepção transmetodológica uma possibilidade de renovação da prática
investigativa, pois consegue conjugar as problematizações teóricas com as metodológicas e
com as dimensões empíricas do objeto.
A questão que rompe é como articular essas dimensões? Encontramos pistas nas dez
premissas propostas por Maldonado (2008). Entretanto, elas não serão retomadas de forma a
repetir o que já foi desenvolvido por Maldonado, a tentativa buscada aqui é de fazer avançar
esse conhecimento utilizando conceitos e propondo conexões entre elas e com outras
considerações realizadas pelos autores trabalhados nesse artigo. Para isso, serão apresentadas,
primeiramente, as premissas que compõe a transmetodologia com uma ideia chave para
depois articulá-las em conjunto.
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Segundo Maldonado (2003) a pesquisa da pesquisa “propõe-se numa perspectiva epistemológica
histórica/genética/ construtiva/política que problematiza os paradigmas e modelos teóricos, explicitando-os na
sua configuração interna – sistemas de hipóteses, categorias, conceitos e noções - e vinculando-os às suas fontes
de conhecimento precedentes e contemporâneas. Isso significa problematizações teóricas aprofundadas que
estudem com respeito, sistematização e senso crítico os argumentos teóricos de cada modelo, realizando uma
desconstrução minuciosa - que requer de tempos lógico-reflexivos adequados ao amadurecimento da pesquisa –
e reformulando questões teóricas em inter-relação com outras vertentes conceptuais importantes para a
problematizações em comunicação.” (2003, p. 206, grifo do autor).
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Premissa 1
Situar o saber
Premissa 10 humanístico como Premissa 2
elemento central
Construção da pesquisa Desenvolver uma
combinada com a abordagem aberta
vida. Formar é
autoforma-se
Novos Ecologia
processos científica
culturais
Premissa 9 Razão Premissa 3
multilética
Comprometer-se Perspectiva Definir a
com a formação heurística investigação como
do pesquisador práxis
Visão
epistêmica
Perspectiva abrangente
Transmetodológica
Construção
do objeto
Premissa 8 Premissa 4
empírico
Confluên- Ter uma postura
Desenvolver um cia
pensamento construtiva
científica
epistemológico transdisciplinar
Configuração
crítico metodológica
diversificada Bons sensos
Esforço culturais
paradoxal
de distinção Premissa 5
Premissa 7
Fazer os sensos
Assumir a científicos fluírem
Premissa 6
problematização
metodológica da
Distinguir as
investigação
problemáticas
comunicacionais
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Na concepção de Maldonado “refere-se à compreensão dos processos, fenômenos e práxis de inter-
relacionamentos dialéticos múltiplos, que expressam a densidade e riqueza do concreto em movimento.” (2008,
p. 36).
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A partir do que vimos nas premissas transmetodológicas é possível romper com três
paradigmas que, no campo da comunicação, engessam a pesquisa: o isolamento de um objeto,
a rigidez metodológica e a separação entre o sujeito e o objeto.
Tendo em vista as pesquisas em Comunicação, principalmente as que ainda seguem
modelos paradigmáticos, muitas observam seus objetos unicamente por uma via. Seguindo o
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paradigma de isolar o objeto, adotam uma perspectiva determinista que o isola das diversas
conexões que poderiam existir, ou seja, para tentar compreender o objeto, acabam separando
os processos que o compõe em eixos específicos. Por exemplo, pensando nas pesquisas em
comunicação, ou focam na produção, ou na recepção, ou na interação social sobre a mídia.
(BRAGA, 2006).
Dessa forma, é importante não estagnar na perspectiva de que, estudando as estruturas,
é possível identificar os processos que são desenvolvidos, pois é na observação dos processos
em ação que melhor compreende-se a própria formação das estruturas.
Assim, é possível desenvolver uma pesquisa investigando não somente o objeto, mas os
próprios processos relacionados a ele, ou seja, cada objeto exige métodos próprios que se
conjugam entre o teórico e o empírico para construir o objeto e vice-versa.
Devemos compreender o método como processualidade, pois ela está presente em cada
momento da pesquisa. A processualidade se faz presente nos avanços e nas paradas, em
campo, em letras e linhas, na escrita, no sujeito/pesquisador, ou seja, a partir do
reconhecimento de que o tempo todo estamos em processo, em obra. Permito-me pensar com
Jesús Martín Barbero, para o qual é necessário passar dos meios às mediações, ou ainda,
refletir com sua frase sintomática, na qual é necessário perder o objeto para ganhar o
processo. Mas como ganhar o processo? Uma das possibilidades é se livrando da rigidez
metodológica.
Nesse sentido, pensando a questão da rigidez metodológica, a transmetodologia reverte
com os sentidos tradicionais de um único método para a obtenção de conhecimento. Podemos
pensar o método como um processo que vai sendo arquitetado e estabelecido em conexão
com o objeto, o contexto, a práxis teórica e o sujeito/pesquisador, tendo por intuito que a
pesquisa só se realiza no agenciamento desses diferentes processos.
De acordo com Morin, “o método só pode se construir durante a pesquisa; ele só pode
emanar e se formular depois, no momento em que o termo transforma-se em um novo ponto
de partida, desta vez dotado de método” (2003, p. 36). O método para Morin, portanto, “se
opõe a conceituação dita ‘metodológica’ em que ela é reduzida a receitas e técnicas”. (2003,
p. 36).
Como método o método cartesiano, ele deve inspirar-se de um princípio
fundamental ou paradigma. Mas a diferença é justamente paradigma. Não se trata
mais de obedecer um princípio de ordem (eliminando a desordem), de claridade
(eliminando o obscuro), de distinção (eliminando as aderências, as participações e
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indivíduo traz latente dentro de si, pois é esse sentimento que enriquece o trabalho, não
deixando que todas as pesquisas sejam conduzidas da mesma maneira e com um final
premeditado. Fica claro, então, “que a idéia de um método fixo ou de uma teoria fixa da
racionalidade baseia-se em uma concepção demasiado ingênua do homem e de suas
circunstâncias sociais” (2007, p. 42).
Se para Popper, a investigação científica inicia com um problema e avança resolvendo-
o, para Feyerabend “essa caracterização não leva em conta que os problemas podem ser
erradamente formulados, que se pode investigar acerca de propriedades de coisas e
processos que visões posteriores declararão não existentes” (2007, p. 401), ou seja,
problemas dessa ordem não são resolvidos, mas dissolvidos no domínio de uma
investigação.
Assim, o método utilizado em uma pesquisa é, sem dúvida, o alicerce de um trabalho,
pois sem ele não existe investigação e se torna mais difícil ao pesquisador responder aos seus
problemas. Contudo, Feyerabend (2007) afirma que o verdadeiro problema não está na
visualização de uma possível resposta, desde o início de sua formulação, pois o que torna
uma pesquisa rica são os percursos plurais que o pesquisador realiza no processo de
investigação.
De acordo com Feyerabend (2007, p.69) o “pluralismo das teorias e concepções
metafísicas não é apenas importante para a metodologia; é, também, parte essencial de uma
perspectiva humanitarista”. Para ele, os educadores progressistas buscam sempre cultivar a
individualidade, as crenças específicas e os talentos de uma criança. Contudo, essa educação
pautada em um modelo simplificador se propõe a preparar os jovens para a vida, mas isso não
significa que eles aprendam somente um conjunto particular de concepções, a ponto de
excluir tudo o mais.
E, caso um vestígio de sua imaginação ainda permaneça, não encontrará aplicação
adequada nas artes ou em um tênue domínio de sonhos que tem pouco a ver com o
mundo em qual vivemos? Não levará esse procedimento, no final, uma divisão
entre a realidade odiada e fantasias bem-vindas, entre a ciência e as artes, entre a
descrição cuidadosa e auto-expressão irrestrita? Os argumentos em favor da
proliferação mostra que isso não precisa acorrer. É possível conservar o que se
poderia chamar de liberdade de criação artística e usá-la na íntegra não somente
como via de escape, mas como meio necessário para descobrir, e talvez mesmo
modificar, os traços do mundo que vivemos. Essa coincidência da parte (o
indivíduo) com o todo (o mundo em que vivemos), do puramente subjetivo e
arbitrário com o objetivo e governado por regras, é um dos argumentos mais
importantes em favor da metodologia pluralista. (FEYERABEND, 2007, p. 69,
grifo do autor).
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Referências
BRAGA, José Luiz. A sociedade enfrenta sua mídia. São Paulo: Paulus, 2006.
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MORIN, Edgar. O método 1: a natureza da natureza. 2. ed. Porto Alegre: Sulina, 2003.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma epistemologia do Sul. In: Boaventura de Sousa
Santos. A gramática do Tempo: para uma nova cultua política. Porto: Edições
Afrontamento, 2006.
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