Você está na página 1de 94

Curso Superior de Tecnologia

em Gestão Ambiental

Semestre 04

Gestão de Recursos Hídricos

Autoria

Ioná Maria Beltrão Hameh Barbosa

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco

D-EaD - Diretoria de Educação a Distância

2009
Governo Federal
Presidência da República
Ministério da Educação
Secretaria de Educação a Distância - SEED
Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior - CAPES
Diretoria de Educação a Distância - CAPES

Instituto Federal de Educação,


Ciência e Tecnologia de
Pernambuco
Reitoria
Pró-Reitoria de Ensino
Diretoria de Educação a Distância
Pró-Reitoria de Extensão
Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação
Pró-Reitoria de Administração e Planejamento

Equipe Técnica
Coordenação do Curso
José Severino Bento
Supervisão de Tutoria
Erica de Carvalho Paz
Revisão Linguística e Textual
Fátima Suassuna
Logística de Conteúdo
Clayson Pereira da Silva
Giselle Tereza Cunha de Araújo
Verônica Emilia Campos Freire
Projeto Gráfico e Editoração Eletrônica
Eliana Virgínia Vieira de Melo
Rayana Hanna Verissimo Pereira
Tiaggo Correia Cavalcanti de Morais
Diagramação
Rayana Hanna Verissimo Pereira
Tiaggo Correia Cavalcanti de Morais
Edição de Imagens
Rayana Hanna Verissimo Pereira
Verônica Emilia Campos Freire
Sumário Aula 01 05

Aula 02 19

Aula 03 35

Aula 04 49

Aula 05 63

Aula 06 81
Aula 01
Apresentação ANOTAÇÕES PESSOAIS
7

Caro(a) aluno(a)!

É com grande satisfação e entusiasmo que damos início a mais uma


disciplina do Curso de Tecnologia em Gestão Ambiental.

Satisfação por sabermos que estudante, como você, irá se apropriar de


conhecimentos técnicos e de aspectos legais que regem a gestão de
recursos no nosso País.

Por outro lado, o entusiasmo aparece por termos a certeza de que, no


futuro, será gestor ambiental capacitado para utilizar os conhecimentos
adquiridos na sua vida profissional.

Esperamos contar com o seu esforço e a sua dedicação, para que o


curso seja proveitoso e, juntos, alcancemos os objetivos da disciplina.

O conteúdo abordado neste material didático se divide em seis aulas. Na


primeira, trataremos do ciclo da água, mostrando a interação solo-água-
atmosfera, assim como as reservas de água no planeta. Na segunda,
abordaremos o conceito e as características da bacia hidrográfica e o
relacionamento entre os recursos hídricos superficiais e subterrâneos. Na
terceira aula, apresentaremos as propriedades da água, os indicadores e
padrões de qualidade e uma breve descrição da classificação dos corpos
d´água, segundo o CONAMA. Na aula 4, mostraremos alguns aspec-
tos hidrológicos do semiárido nordestino. Na quinta aula, faremos uma
introdução à gestão de recursos hídricos, apresentando alguns conceitos
fundamentais, a Política Nacional e o Sistema de Gerenciamento de
Recursos Hídricos do País. Por fim, na sexta aula, apresentaremos um
breve histórico de criação de comitês de bacias, a outorga e cobrança
pelo uso da água e os planos de bacias, como instrumentos de gestão
dos recursos hídricos.
8 Ciclo da Água e os Recursos Hídricos no
Brasil e no Mundo
Nesta aula apresentaremos o ciclo hidrológico, mostrando a interação
da água com outros elementos da natureza, assim como, as reservas
hídricas superficiais e subterrâneas no Brasil e no mundo.
Hidrologia é a ciência que trata A água é um recurso natural fundamental à vida. Além da necessidade
da água na Terra, sua ocorrência,
circulação e distribuição, suas
física inerente aos seres vivos, ela está presente em todas as atividades
propriedades físicas e químicas humanas.
e reações com o meio ambiente,
incluindo suas relações com a A água é utilizada para transporte, geração de energia, nas atividades
vida. (Definição recomendada agrícolas e industriais, para lazer, dentre outras, fazendo com que se
pela Unites States Federal
Council of Sciencie and torne um bem estratégico de alto valor econômico e que dela dependa
Tecnology, Comittee for Scientific inteiramente o desenvolvimento das regiões.
Hidrology, 1962).
Por outro lado, sabemos que a água é um recurso finito e que, cada vez
mais, a demanda por este bem tem aumentado no planeta. Alavancadas
pelo aumento populacional e desenvolvimento econômico, surgem as
mais diversas formas de degradação da qualidade das águas, diminuindo
sua disponibilidade e aumentando os conflitos entre usuários.

O objetivo desta aula é compreender os processos físicos que estão


envolvidos no ciclo da água e a interação desta com outros elementos da
natureza, informar sobre a situação das reservas hídricas do Brasil e des-
pertar o interesse pelos aspectos relacionados à distribuição e renovação
da água no meio ambiente.

Ciclo da Água
A água é parte integrante dos seres vivos e essencial à vida. Ela é um
mineral presente no meio ambiente nos estados sólido, líquido e gasoso.

Além da sua função natural de manutenção da vida, destina-se aos mais


diversos fins, como abastecimento público e industrial, dessedentação de
animais, geração de energia, transporte, lazer/recreação, irrigação, entre
outros. Além disso, a água recebe, dilui e transporta esgotos domésticos,
efluentes industriais e resíduos sólidos das atividades humanas.

A água é um recurso finito que se renova a cada instante através dos


processos físicos do ciclo hidrológico.
O ciclo da água inicia-se com a ação da energia solar evaporando as
águas dos oceanos, rios, lagos e da superfície terrestre, formando as 9
nuvens. A água precipita-se na forma de chuva, neve ou gelo que corre
pela superfície, infiltra-se no subsolo, escoa sobre os corpos d´água
superficiais, recarrega os aquíferos subterrâneos e é absorvida pelas
plantas. Parte desta água que se precipita é novamente levada à atmos- É interessante entender o
fera pela evaporação, onde se inicia todo o processo novamente. processo de formação da chuva,
granizo e neve. Sabemos que o
ciclo hidrológico é fechado, isto
O ciclo da água é constituído por processos físicos, os quais, de acordo é, ele inicia-se pela evaporação
com a sua natureza, recebem denominações diferentes. Vejamos como o da água, seja na forma de vapor,
ciclo se processa, acompanhando o que é apresentado na Figura 1. de partículas líquidas (chuva)
ou sólidas (gelo ou neve) e
Na ilustração, podemos observar que parte da precipitação não chega a finaliza-se com a precipitação.
Quando as partículas de água
atingir o solo, devido à evaporação, durante a própria queda, ou porque formadas por condensação do
é retida pela vegetação, perda a que se dá o nome de interceptação. Do vapor atingem determinada
volume que atinge o solo, parte infiltra-se, outra escoa pela superfície e dimensão, precipitam-se
na forma de chuva. Se na
uma parcela evapora-se diretamente ou através das plantas, fenômeno queda passarem por zonas de
conhecido por transpiração. temperatura abaixo de 0°C, pode
haver a formação de granizo e,
A infiltração é o processo onde a água penetra no solo. Quando a quando a condensação ocorre
precipitação excede a capacidade de infiltração do solo, ou seja, o solo sob temperaturas abaixo do
ponto de congelamento (0°C), há
se torna saturado, a água escoa na superfície. Inicialmente, as depres- formação de neve.
sões do terreno são preenchidas, para que posteriormente se processe
o escoamento superficial propriamente dito: a água procura os cami-
nhos naturais para concentrar-se nos vales principais e, assim, formar os
cursos dos rios, e posteriormente dirigir-se aos lagos, mares e oceanos. Condensação é a passagem do
estado gasoso da água (vapor)
Neste percurso, a água pode sofrer evaporação ou infiltração, de acordo para o estado líquido.
com as características do solo e da atmosfera por onde escoa, assim
como a água retida nas depressões ou como umidade superficial do solo. O ponto de congelamento da
água é 0°C e o ponto de ebulição
é 100°C.

Em muitos livros, o fenômeno


de transpiração das plantas,
juntamente com a evaporação
do solo, constitui-se do
processo conhecido como
evapotranspiração.

Figura 1- Esquema do ciclo hidrológico


Durante todo o ciclo hidrológico, as interações entre o solo, a atmosfera e
10 a água acontecem de forma intensa e incessante.

A vegetação retira do solo a umidade necessária à sua sobrevivência e


a elimina na atmosfera sob a forma de vapor. Por outro lado, a água se
infiltra no solo, movimentando-se através dos espaços vazios entre os
grãos e, eventualmente, atinge uma zona saturada, formando um lençol
Lençóis artesianos são
reservas de água no subsolo os subterrâneo que poderá interceptar uma vertente, retornando à superfície
quais são confinados entre duas para alimentar os rios, oceanos ou lençóis artesianos.
camadas impermeáveis. Com
isso, torna-se de difícil acesso e Estes, por sua vez, sofrem evaporação e formam as nuvens, que, atin-
menos passível à contaminação.
gindo determinado volume, precipitam-se, e fazem com que a água volte
a interagir com a atmosfera e o solo.

Nos processos de evaporação e precipitação, fase aérea do ciclo


hidrológico, a água é pura somente enquanto vapor e no momento da
condensação. Logo depois, as impurezas começam a se acumular nas
gotas de chuva através da dissolução de gases da atmosfera. A água, ao
atingir o solo, dissolve os sais minerais e substâncias presentes (cálcio,
magnésio, sódio, bicarbonatos, cloretos, sulfatos e nitratos). Também
podem aparecer na água metais (cobre, chumbo, manganês) e substân-
cias orgânicas provenientes dos processos de decomposição do solo.
Diante disto e de acordo com a geologia da região, a vegetação e o
clima, as águas subterrâneas e superficiais adquirem impurezas que as
caracterizam.

Podemos considerar região


hidrográfica aquele espaço
Recursos Hídricos no Brasil e no Mundo
territorial compreendido por
uma bacia, grupo de bacias De um modo geral, o Brasil é considerado muito rico em águas superfi-
ou sub-bacias hidrográficas ciais e subterrâneas. O crescimento demográfico e econômico aumentou
contíguas com características
naturais, sociais e econômicas
a pressão sobre os recursos hídricos e fez surgir diversos conflitos de
homogêneas ou similares, com usos e situação de escassez. Na mesma época, observou-se uma pro-
vistas a orientar o planejamento gressiva piora da qualidade das águas dos rios que atravessam cidades
e gerenciamento dos recursos e regiões de intensa atividade industrial, agropecuária e de minera-
hídricos.
ção. Desta forma, em locais onde não existiam restrições de natureza
qualitativa, encontram-se atualmente com a qualidade de suas águas
comprometida, a ponto de ser inviabilizada sua utilização para determina-
dos fins.

Assim como a demanda de água, a sua disponibilidade também é


bastante variada no Brasil, devido às diversidades de climas, relevos,
potencialidades econômicas e condições socioeconômicas e culturais
existentes.
Podemos encontrar, no território brasileiro, regiões riquíssimas em água
de boa qualidade, até regiões semiáridas que passam por longos perí- 11
odos de estiagem, além de áreas urbanas com sérios problemas de
poluição e inundações.

Estima-se que 10% da água doce do planeta se encontra no Brasil, Verifica-se que mais de 70% dos
tornando-o, em termos quantitativos, um dos mais ricos em água doce do recursos hídricos superficiais
estão na região Amazônica,
mundo. Contudo, observa-se, também, que esta água não é bem distribu- 47% do território nacional. Um
ída no tempo e no espaço, entre as diferentes regiões do País. indicador bastante utilizado para
mostrar a grande diversidade
Dentro do espírito da Lei 9.433/97, conhecida como “Lei das Águas” hidrológica do território brasileiro
é a vazão específica. Ela
(assunto que será abordado na aula 5 deste material didático) e para indica as regiões mais e menos
efeito de gestão das águas, o Brasil foi dividido em 12 regiões produtoras de água.
hidrográficas.
No Brasil, a vazão específica
Na Figura 2, são apresentadas as regiões hidrográficas brasileiras com varia de menos de 2 L/s.km2, nas
bacias da região semi-árida, até
seus respectivos valores percentuais de área, população e vazão média mais de 40 L/s.km2, no noroeste
em relação ao Brasil. Observe que a Região Hidrográfica do Amazonas da região Amazônica, sendo a
possui o maior percentual de área e vazão média, entretanto apresenta média nacional igual a 21 L/s.
km2. A baixa vazão específica
baixo percentual de população. Situação contrária a esta observamos na observada na região do Pantanal
Região Hidrográfica do Paraná, que possui 32% da população do País, e (região hidrográfica do Pantanal)
nas Regiões Costeira do Nordeste Oriental e Costeira do Sudeste, com mostra que esta área, apesar
da abundância de água oriunda
um percentual de população de 20% e 15%, respectivamente.
na região de Planalto, não é
produtora de água, resultando
em baixa contribuição da região
do Pantanal ao escoamento
superficial. No Pantanal há uma
expressiva perda de água por
evapotranspiração (ANA, 2005).

Vazão específica é obtida pela


razão entre a vazão média que
flui em um determinado ponto
específico de um rio e a área
de contribuição das chuvas até
este mesmo ponto, também
conhecida como área de
drenagem.

Figura 2 - Regiões hidrográficas brasileiras e percentuais de área, população e vazão


média em relação ao País.
Fonte: ANA, 2002.
Uma forma de mostrar o cenário nacional dos usos dos recursos hídricos
12 brasileiros é apresentando os percentuais de demanda de água de cada
setor usuário, conforme mostra a Figura 3.

A população mundial e suas


atividades já atingiram uma
escala de utilização dos recursos
naturais disponíveis que obriga
todos a pensar no futuro de uma
nova forma. É previsto que a
população mundial estabilize-se,
por volta do ano 2050, entre 10 e
12 bilhões de habitantes, o que Figura 3- Distribuição das demandas de água no País.
representa cerca de 5 bilhões Fonte: ANA, 2002.
a mais que a população atual,
enquanto a quantidade de água Observamos com a figura anterior que a maior demanda por água do
disponível para o uso permanece País é exercida pela agricultura, mais especificamente a irrigação,
a mesma (OMM/UNESCO apud
com quase 63% do total. O uso doméstico (urbano e rural) aparece em
Setti et al, 2001).
segundo, com 18%, seguido do industrial, com 14%, e, por último, a
dessedentação de animais, com 5%.

A disponibilidade de água por habitante também é um forte indicador da


distribuição dos recursos hídricos no Brasil. A Figura 4 apresenta a dispo-
nibilidade hídrica per capita por regiões hidrográficas, a partir do Censo
Demográfico de 2000. Observamos que há uma grande variabilidade
deste indicador no País. A situação mais crítica é observada na Região
Costeira do Nordeste Oriental, onde estão os estados da Bahia, Sergipe
ANOTAÇÕES PESSOAIS e Pernambuco. Para a bacia do rio Capibaribe, em Pernambuco, obser-
va-se uma vazão per capita de 428 m3/hab.ano. No rio Inhambupe, que
compreende parte da Bahia e Sergipe, este indicador chega a 479 m3/
hab.ano, e, no rio Vaza Barris, na Bahia, observam-se 610 m3/hab.ano.
Estas áreas foram consideradas muito pobres em relação à disponibili-
dade hídrica.

Nesta região, observam-se valores de 740 m3/hab.ano para a região


Oriental de Pernambuco, de 886 m3/hab.ano para a Oriental da Paraíba,
de 1.024 m3/hab.ano para as regiões do Leste Potiguar, no Rio Grande
do Norte, e de 1.165 m3/hab.ano para a bacia do rio de Contas, na Bahia,
caracterizando-a como pobre e regular em disponibilidade de água.
13

Estima-se que, atualmente, mais


de 1 bilhão de pessoas vivem
em condições insuficientes de
disponibilidade de água para
consumo e que, em 25 anos,
cerca de 5,5 bilhões de pessoas
estarão vivendo em áreas com
Figura 4- Vazão per capita nas regiões hidrográficas brasileiras. moderada ou séria falta de água.
Fonte: ANA, 2002. Quando se analisa o problema
de maneira global, observa-se
que existe quantidade de água
A região hidrográfica do Paraná, na bacia do rio Tietê, em São Paulo, suficiente para o atendimento de
apresenta um quadro de baixa disponibilidade hídrica (810 m3/hab.ano de toda a população. No entanto,
a distribuição não uniforme dos
vazão per capita), devido a uma grande concentração populacional. recursos hídricos e da população
sobre o planeta acaba por
Em contraste com estas áreas, na Região Hidrográfica do Amazonas, gerar cenários adversos quanto
encontramos os maiores índices de disponibilidade hídrica do País. à disponibilidade hídrica em
diferentes regiões (Setti et al,
2001).
Em se tratando de recursos hídricos mundiais, considera-se, atualmente,
que a quantidade total de água na Terra tem permanecido mais ou menos
constante durante os últimos 500 milhões de anos. Contudo, as quanti-
dades estocadas nos reservatórios individuais (oceanos, subsolo, lagos,
rios, etc.) variam ao longo deste período.

Aproximadamente 97,5% do total de água do planeta é de água salgada,


que forma os oceanos, e somente 2,5% são de água doce. Grande parte
desta água doce, cerca de 68,7%, encontra-se nas calotas polares e
geleiras, que não estão disponíveis ao consumo; 30,1% correspondem
aos reservatórios de água subterrânea e 1,2% são águas superficiais
(rios, lagos, atmosfera, etc.). A água doce contida nos rios e lagos, que
constituem a forma de armazenamento mais acessível ao uso humano e
de ecossistemas, corresponde apenas a 0,27% do volume total de água
doce da Terra e a 0,007% do volume total mundial.
Observamos, com isso, que mesmo a Terra apresentando um volume
14 muito grande de água (1.386 milhões de km3), o que realmente está
disponível para ser aproveitado são apenas 0,007% deste total. Estes
números são apresentados na Figura 5.

O consumo per capita de água


é afetado por diversos fatores,
como clima, porte e condições
econômicas da comunidade,
grau de industrialização, custo da
água, entre outros.

Constitui-se um importante
indicador de grau de
desenvolvimento das
comunidades. Para se ter ideia,
um povoado rural, com uma faixa
de população menor que 5.000
habitantes, apresenta, em média,
um consumo per capita de 90 a
140 litros/hab.dia, enquanto que, Figura 5- Total de água na Terra e distribuição de água doce no planeta.
em grandes cidades, o consumo Fonte: Adaptado de Setti et al, 2001.
pode chegar a 300 l/hab.dia
(Sperling, 1996). A distribuição espacial dos recursos hídricos no mundo é muito variável,
assim como a distribuição demográfica. Em uma análise da disponi-
bilidade hídrica por unidade de área de cada país, podemos observar
que grandes diferenças existem na distribuição geográfica dos recursos
hídricos. A Mauritânia, por exemplo, possui uma disponibilidade hídrica de
388,3 m3/km2.ano, enquanto que o Panamá apresenta 1.800.000 m3/km2.
ano. O mesmo ocorre com a disponibilidade hídrica por habitante (per
capita). Tanto a má distribuição espacial dos recursos hídricos como
da população sobre a Terra geram os mais variados cenários. Existem
situações em que a escassez se dá pela baixa disponibilidade hídrica na
região em um dado momento, em outras, mesmo havendo alta disponi-
bilidade, a escassez é ocasionada devido a uma excessiva demanda de
utilização dos recursos hídricos.

O conceito de estresse hídrico baseia-se nas necessidades mínimas


de água de um indivíduo para manter um padrão de qualidade de vida
adequado em regiões moderadamente desenvolvidas, situadas em
zonas áridas. Partimos do pressuposto de que um volume de 100 litros
diários (36,5 m3/ano) representa o requisito mínimo de água para suprir
as necessidades domésticas e manutenção de um nível adequado de
saúde.
A experiência tem demonstrado que países em desenvolvimento e relati-
vamente eficientes no uso da água requerem entre 5 e 20 vezes o valor 15
de 36,5 m3/hab.ano para satisfazer também às necessidades dos usos da
água (agricultura, indústria, geração de energia, entre outros). Baseados
nisso e no conceito de estresse hídrico, foram definidos patamares
específicos para classificar a situação de disponibilidade hídrica de uma
região.
Quadro 1- Patamares específicos de estresse hídrico
(Adaptado de Beekman, apud Setti et al, 2001)
Volume disponível per capita
Situação
(m3/hab.ano)
Somente ocasionalmente tenderá a sofrer No Brasil, 15,6 % dos domicílios
> 1.700
problemas de falta de água. utilizam, exclusivamente, água
1.000 – 1.700 Estresse hídrico é periódico e regular subterrânea, 77,8 % usam rede
de abastecimento de água e
A região está sob o regime de crônica escassez
6,6 % usam outras formas de
de água.
abastecimento (IBGE, apud ANA,
500 – 1.000 Nesses níveis, a limitação da disponibilidade
2005).
começa a afetar o desenvolvimento econômico,
o bem-estar e saúde das populações.
É importante destacar que, entre
Considera-se que a situação corresponde à os domicílios que possuem rede
< 500
escassez absoluta. de abastecimento de água,
uma parte significativa usa
água subterrânea. Embora o
Como os recursos hídricos superficiais, a água encontrada no subsolo se uso do manancial subterrâneo
distribui de forma bastante desigual no planeta. Algumas regiões têm sido seja complementar ao
privilegiadas com essa distribuição heterogênea, como é o caso da região superficial em muitas regiões,
meridional da América do Sul. O maior reservatório subterrâneo de água em outras áreas do país, a
água subterrânea representa o
doce da Terra, o Botucatu/Guarani, estende-se por terras brasileiras, pela principal manancial hídrico. Ela
Argentina, Paraguai e Uruguai. desempenha importante papel no
desenvolvimento socioeconômico
No território nacional, temos regiões com baixa disponibilidade hídrica, do País (ANA, 2005b).
como aquelas de ocorrência das rochas cristalinas no semiárido brasi-
leiro, e outras com relativa abundância, havendo áreas com significativa
disponibilidade, como aquelas que estão sobre o aquífero Guarani e os
aquíferos sedimentares em geral.

Mesmo no cristalino do semiárido nordestino, onde a produtividade de


poços é muito baixa e a água possui alta salinidade, para muitas peque-
nas comunidades esta é a única fonte de abastecimento disponível.

O embasamento cristalino está a pouca profundidade e os poços só


apresentam resultados razoáveis de vazão e qualidade da água, quando
localizados nas fraturas das rochas, o que dificulta sua exploração.

Como citado anteriormente, os melhores aquíferos se encontram em


terrenos sedimentares, que ocupam 48% do território brasileiro e têm
grande potencial hídrico, pois estão aliados a condições climáticas
favoráveis.
ANOTAÇÕES PESSOAIS Na Figura 6, são mostradas as áreas de recarga dos 27 sistemas aquífe-
16 ros brasileiros em sobreposição às regiões hidrográficas brasileiras.

Figura 6- Áreas de recarga dos principais sistemas aquíferos brasileiros.


Fonte: ANA, 2005.

Para satisfazer as demandas de água, o homem tem modificado a


natureza construindo barragens, perfurando poços, implantando redes de
abastecimento de água, sistemas de drenagem e outras estruturas. No
entanto, não basta construir obras públicas para assegurar o atendimento
às demandas, mas também gerenciar, de forma adequada, os recursos
hídricos, para que seja promovido o uso múltiplo e racional.

Segue abaixo um gráfico que mostra a evolução do consumo de água


por setor, com uma estimativa até o ano de 2025. Através da Figura 7,
podemos observar que o consumo de água tem aumentado considera-
velmente ao longo dos anos. No início do século, temos um consumo
total de, aproximadamente, 580 km3/ano, chegando ao final com cerca de
4.000 km3/ano. Enquanto isso, no mesmo período, a população mundial
aumentou de, aproximadamente, 2 bilhões de habitantes para cerca de 6
bilhões, representando um acréscimo de três vezes a população do início
do século. Todavia, o volume total de água consumida cresceu de seis a
sete vezes durante o século XX, o que mostra uma mudança nos padrões
de consumo de água da população mundial.
ANOTAÇÕES PESSOAIS
17

Figura 7- Evolução do volume de água utilizado por diversos setores ao longo dos anos.
Fonte: Adaptado de Shiklomanov, apud Setti et al, 2001.

Problemas como o aumento da demanda, a degradação dos mananciais,


o descompasso entre a oferta de água e a sua localização (distribuição
heterogênea da água) têm agravado o cenário de disponibilidade hídrica
em muitas regiões do mundo, gerando situação de escassez e conflitos
entre usuários.

O grande desafio para gestores e a sociedade em geral é aliar o desen-


volvimento econômico com o uso sustentável dos recursos hídricos, pois,
como sabemos, a oferta de água permanece a mesma, enquanto que a
demanda e a degradação ambiental aumentam substancialmente a cada
ano.

Nesta aula, apresentamos o ciclo da água da natureza e os processos


que são desencadeados durante este fenômeno. Também mostramos
a distribuição espacial dos recursos hídricos nas regiões hidrográficas
brasileiras e no mundo.

Atividades Propostas
1. Descreva, de forma sucinta, os caminhos que a água percorre no
ciclo hidrológico.

2. Na sua opinião, as características do solo e da vegetação interferem


no ciclo hidrológico? De que forma?

3. Observe a figura 4 do material didático da Aula 1 e correlacione a


vazão per capita das regiões hidrográficas brasileiras com o volume
disponível per capita apresentado no quadro 1. Apresente na forma
de quadro.
ANOTAÇÕES PESSOAIS 4. Conforme o que foi verificado na resposta à pergunta anterior,
18 existe, no Brasil, situação de escassez absoluta? Qual?

5. Liste as possíveis causas dessa escassez.

Bibliografia Recomendada
BARTH, F. T.; BARBOSA, W. E. S. Recursos Hídricos. Texto não publi-
cado. 1999. 46 p.

BRASIL, Agência Nacional de Águas (ANA). Disponibilidade e de-


mandas de recursos hídricos no Brasil. Cadernos de Recursos
Hídricos. Brasília: Agência Nacional de Águas, 2005a. 134 p.

BRASIL, Agência Nacional de Águas (ANA). Panorama da qualidade


das águas subterrâneas no Brasil. Cadernos de Recursos
Hídricos. Brasília: Agência Nacional de Águas, 2005b. 80 p.

BRASIL. Agência Nacional de Águas (ANA). A Evolução da gestão


dos recursos hídricos no Brasil = The evolution of water resources
management in Brazil. Brasília: Agência Nacional de Águas, 2002. 64 p.
(Edição comemorativa do Dia Mundial da Água).

PORTO, R. L. L.; FILHO, K. Z.; SILVA, R. M. Bacias hidrográficas.


Texto da disciplina Hidrologia Aplicada. Escola Politécnica de São Paulo.
Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária. 1999. 35 p.

PORTO, R. L. L.; FILHO, K. Z. Introdução à Hidrologia- ciclo hi-


drológico e balanço hídrico. Texto da disciplina Hidrologia Aplicada.
Escola Politécnica de São Paulo. Departamento de Engenharia Hidráulica e
Sanitária. 1999. 35 p.

SETTI, A. A.; LIMA, J. E. F. W; CHAVES, A. G. M.; PEREIRA, I. C. Introdu-


ção ao gerenciamento dos recursos hídricos. 2ª. Ed. Brasília:
Agência Nacional de Energia Elétrica, Superintendência de Estudos e Infor-
mações Hidrológicas, 2001. 207 p.

TUCCI, C. E. M. Hidrologia: ciência e aplicação. 2ª Ed. Porto Ale-


gre: Edit. Universidade/ UFRGS: ABRH, 2001. 943p
19

Aula 02
Bacia Hidrográfica e os Recursos Hídricos
Superficiais e Subterrâneos
Nesta aula, trataremos do conceito de bacia hidrográfica, da interação 21

da água superficial e subterrânea e algumas das características que O conceito de bacia hidrográfica
foi difundido e consolidado
exercem influência no comportamento hidrológico da bacia. Também será no mundo todo perante as
descrito, de forma sucinta, como são obtidas algumas variáveis hidroló- necessidades de enfrentar a
gicas utilizadas em modelos e apresentados alguns equipamentos que poluição, a escassez, os conflitos
gerados pelo uso da água, entre
fazem o registro desses dados. outros. No Brasil, esse conceito
passou a ser desenvolvido em
Diante da necessidade de recuperação dos recursos naturais afetados meados dos anos 70. No estado
pela degradação ambiental e com a intenção de promover a gestão inte- de São Paulo, as primeiras
grada do meio ambiente, surge, a partir da década de 70, uma nova visão experiências surgiram em 1976,
na região metropolitana, com
para a gestão dos recursos hídricos no Brasil, que tem a bacia hidrográ- a criação do Comitê do Acordo
fica como unidade de planejamento. firmado entre o estado de São
Paulo e o Ministério das Minas e
A importância em se adotar a bacia como unidade básica de plane- Energia.
jamento está no fato de suas características estarem, intimamente,
relacionadas com a qualidade e quantidade de água produzida. Aspectos,
como a área da bacia, o relevo, o padrão da drenagem, o uso e ocupação
do solo, entre outros, exercem forte influência sobre o regime de escoa-
mento e a qualidade da água.

Por outro lado, a realização de estudos hidrológicos em bacias hidrográfi-


ANOTAÇÕES PESSOAIS
cas se faz necessária para compreendermos os processos que controlam
o movimento da água e os impactos de mudanças do uso da terra sobre
a quantidade e qualidade da água para um efetivo gerenciamento dos
recursos hídricos.

O objetivo desta aula é compreender conceitos e fundamentos da hidrolo-


gia e despertar o interesse por aspectos técnicos ligados à quantificação
dos recursos hídricos em bacias hidrográficas.

Bacia Hidrográfica
O conceito de bacia hidrográfica ou bacia de drenagem é simples de
entender. Podemos conceituá-la como sendo a área drenada por um ou
mais cursos d´água, delimitada pelo divisor de água, de modo que toda
precipitação se dirija para uma única saída, em seu ponto mais baixo,
denominada foz ou exutório da bacia.
É preciso salientar que, mais que uma simples região geográfica, a bacia
é um sistema ecológico onde os processos físicos, químicos e biológicos
acontecem de forma interligada e dependente, não respeitando os limites
geográficos impostos pelo homem. Trabalhar com a bacia hidrográfica
requer não só o entendimento do conceito, mas, principalmente, das
22
interações que ali ocorrem.

Para um melhor entendimento da definição de bacia hidrográfica, é


importante conceituar o termo “divisor de água” e apresentar os tipos de
divisores que uma bacia hidrográfica pode apresentar.

O divisor de água é a região no terreno que une os pontos de máximas


cotas e que separa as águas pluviais que correm para certa bacia.

Na Figura 1, podemos observar os divisores de água e a bacia hidrográ-


fica por eles formada.
Muitas vezes, a dificuldade de se
planejar a intervenção em bacias
hidrográficas, com toda a sua
complexidade e infinitas variáveis
sócioeconômicas e ambientais,
fez com que surgisse, entre
gestores públicos, o termo
microbacia hidrográfica.

A microbacia não se diferencia


da definição de bacia
hidrográfica, podendo até
ser classificada como uma
pequena bacia. O fato é que
a microbacia está associada
à realização de programas de
desenvolvimento sustentável,
tendo como beneficiários
diretos as comunidades rurais.
Figura 1- Representação esquemática de uma bacia hidrográfica
Para saber mais acesse o
seguinte endereço: http://www. Na bacia hidrográfica, existem dois tipos de divisores de água:
microbacias.rj.gov.br/
» Topográfico ou superficial: é condicionado pela topografia e fixa a
área de onde provém a contribuição superficial da chuva;
» Freático ou subterrâneo: é, em geral, determinado pela estrutura
geológica, sendo, muitas vezes, influenciado pela topografia e
estabelece os limites dos reservatórios de água subterrânea. Este
divisor muda de posição de acordo com as flutuações do lençol.
Os tipos de divisores de água podem ser visualizados na Figura 2. Note
que o divisor freático é delimitado pela formação geológica, enquanto que
o relevo determina o divisor topográfico.
ANOTAÇÕES PESSOAIS

23

Figura 2- Representação esquemática dos divisores de água numa bacia hidrográfica

Vale ressaltar que, para efeito de conceituação de bacia hidrográfica,


adotamos o divisor de água topográfico ou superficial.

Recursos Hídricos Superficiais e Subterrâneos


Como vimos na aula anterior, há uma forte interação entre a água, o solo
e a atmosfera no ciclo hidrológico, assim como entre as águas superfi-
ciais e subterrâneas na bacia hidrográfica.

O conhecimento do sistema de drenagem, ou seja, o tipo de curso d´água


que drena uma região é muito importante para se entender a ocorrência e
distribuição da água na bacia. Para tal, costumamos dividir o sistema de
drenagem em três tipos, de acordo com a constância no escoamento da
água:
» Perenes - que contêm água durante o ano todo. O lençol subterrâ-
neo mantém a alimentação;
» Intermitentes- em geral escoam durante as chuvas e secam na
estiagem;
» Efêmeros- existem, apenas, durante ou imediatamente após os
períodos de precipitação e só transportam escoamento superficial.
Verificamos, no Brasil, que muitos rios possuem seções dos três tipos,
dependendo da variação da estrutura geológica ao longo de seu curso.
Aquíferos são formações
A maioria dos grandes rios é perene, enquanto os rios definidos como geológicas que contêm água que
efêmeros são normalmente bastante pequenos. pode mover-se em quantidades
suficientes para permitir um
Rios e lagos podem alimentar ou serem alimentados pela água dos aproveitamento.
aquíferos. Na Figura 3, podemos constatar a interação que existe entre a
água superficial e subterrânea.
ANOTAÇÕES PESSOAIS Quando o lençol subterrâneo exerce influência no nível da água do curso
d´água, este é denominado rio efluente. E quando o contrário acontece,
ou seja, o curso d´água abastece o lençol freático, dizemos que o rio é
influente.
24

Figura 3- Interação da água superficial e subterrânea

Por outro lado, o conhecimento das características físicas de uma bacia


torna-se imprescindível em estudos hidrológicos. Seguem, abaixo,
algumas das características que mais exercem influência sobre o regime
hidrológico e a qualidade da água numa bacia.

A área de drenagem compreende a área plana (projeção horizontal)


definida pelos divisores de água superficiais da bacia. É elemento básico
para determinação de outras características físicas.

Atualmente, com o uso do geoprocessamento e de posse de mapas


topográficos com as curvas de nível em meio digital, a área de drenagem
de bacias hidrográficas pode ser facilmente determinada.

Antigamente, o cálculo da área de drenagem era feito com planímetro em


mapas impressos, numa escala razoavelmente grande (1: 500.000).

A área de drenagem pode ser expressa em Km2 ou hectares, conforme


for mais conveniente, de acordo com o tamanho da bacia estudada.
Curvas de nível são linhas que
É importante salientar que, como a área da bacia recolhe as águas e
ligam pontos, na superfície do
terreno, que têm a mesma cota as encaminha para um curso d´água, verifica-se que a vazão cresce de
(mesma altitude). montante (ponto anterior) para jusante (ponto posterior), à medida que
cresce a área da bacia hidrográfica.

Outro aspecto a salientar é que, em uma dada seção, as variações das


vazões instantâneas são tanto maiores quanto menor a área da bacia
hidrográfica.
Observe o que foi dito anteriormente através da Figura 4. Imagine uma
bacia hidrográfica como a representada esquematicamente abaixo. Nela
podemos verificar que, no ponto 1(montante), a área de drenagem é
menor que a área de drenagem no ponto 2 (jusante). Com isso, a vazão
anual (Qa) em 1 é menor que em 2. Por outro lado, a vazão instantânea
25
(Qi) em 1 é maior que no ponto 2.

É importante salientar que


devemos atentar para a escala
do mapa digital que está sendo
utilizado para determinação das
características físicas da bacia
hidrográfica. Estudos revelam
que há um acréscimo em torno
de 75% do valor da densidade
de drenagem, quando obtida em
Figura 4- Representação de dois pontos mapas numa escala grande (1:
100.000), daquela obtida a partir
O sistema de drenagem de uma bacia é constituído pelo rio principal e
de mapas numa escala pequena
seus tributários. É considerado como rio principal aquele curso d´água (1: 1.000.000). Já para a área
que drena a maior área no interior da bacia. Os outros são considerados de drenagem, não se verifica
tributários do rio principal. uma diferença significativa nos
valores, quando determinados
em mapas em escalas diferentes
A densidade de drenagem é expressa pela relação entre o comprimento (Barbosa, 2002).
total dos cursos d’água de uma bacia e a sua área de drenagem. Varia
de 0,5 Km/Km² para as bacias de drenagem pobre, a 3,5 ou mais, para
aquelas excepcionalmente bem drenadas. É importante conhecer a den-
sidade de drenagem, pois ela indica a maior ou menor velocidade com
que a água escoa. Bacias bem drenadas oferecem mais facilidade para
escoamento das águas.

Como a área da bacia, a densidade de drenagem também pode ser


determinada por geoprocessamento, a partir de arquivo digital da rede
hidrográfica e sua área de drenagem.

Na Figura 5, são representados os tributários e o rio principal de duas


bacias de mesma área. Como a densidade de drenagem é função da
extensão total dos cursos d´água, esta se apresenta maior para a
bacia 2.
26

Figura 5- Representação do rio principal e seus tributários e comparação entre duas


bacias com densidade de drenagem distinta.

O relevo exerce forte influência sobre os fatores meteorológicos e hidro-


lógicos numa bacia, pois a velocidade com que a água escoa sobre o
terreno é função da sua declividade, enquanto que a precipitação, evapo-
ração, temperatura, entre outros fatores, são devido à altitude da bacia.
No Brasil, que possui uma
grande extensão territorial A declividade da bacia controla grande parte da água que forma o esco-
e carência de informações amento superficial, afetando, diretamente, o tempo que esta leva para
adequadas de seus recursos
naturais e seu território, o uso de
chegar ao leito dos rios, que constituem a rede de drenagem da bacia.
técnicas de geoprocessamento
apresenta enorme potencial Bacias planas, ou seja, com relevo pouco acidentado, apresentam menor
quando aplicado em ações susceptibilidade a picos de enchentes que bacias com declividade acen-
de tomada de decisão sobre tuada.
problemas urbanos, rurais e
ambientais.
A maior ou menor declividade de uma bacia também pode determinar a
Como visto, muitas das maior ou menor oportunidade de infiltração da água e a vulnerabilidade à
características físicas da erosão dos solos.
bacia hidrográfica são
determinadas em ambiente
A declividade pode ser determinada por geoprocessamento. Basta que se
de Sistema de Informações
Geográficas- SIG ou obtidas obtenham os arquivos digitais de curvas de nível da bacia ou o modelo
do tratamento de imagens numérico do terreno (MNT).
de satélite. Daí a importância
do geoprocessamento para Outra característica que desempenha importante papel para os fluxos de
subsidiar a tomada de decisão
no gerenciamento dos recursos água na bacia é o tipo de solo. O escoamento superficial é influenciado
hídricos. pelo solo predominante, ou melhor, pela sua capacidade de infiltração.
Esta é função do tamanho dos grãos, agregação, forma e arranjo das
partículas.
A porosidade também varia bastante de um solo para outro e afeta tanto ANOTAÇÕES PESSOAIS
a infiltração como a capacidade de armazenamento dos solos.

Existem rochas que possuem porosidade de 1%, enquanto solos orgâ-


nicos apresentam de 80 a 90% deste índice. A porosidade não depende
do tamanho das partículas, e, sim, do arranjo, variedade, forma e grau de 27

compactação do solo.

Por outro lado, o solo também exerce forte influência na qualidade da


água. Solos ricos em cálcio, magnésio, sódio, bicarbonatos, entre outros,
terminam por transferir estas substâncias para as águas subterrâneas e,
consequentemente, para as superficiais.

A informação de uso e ocupação do solo se constitui em outra caracte-


rística física muito importante numa bacia hidrográfica.

As ações antrópicas, como o desmatamento, o reflorestamento, a


urbanização, entre outras, possuem a capacidade de modificar, conside-
ravelmente, o regime das vazões nos rios, assim como da quantidade de
água acumulada no subsolo.

Áreas sem cobertura vegetal favorecem um maior escoamento superficial


e menor infiltração da água no solo, acarretando menor recarga dos aquí-
feros. Além disso, as alterações na cobertura natural dos solos fragilizam
estas áreas, deixando-as mais vulneráveis aos processos de erosão, que,
por sua vez, repercutem na qualidade das águas.

Em síntese, podemos dizer que a quantidade e qualidade dos recursos


hídricos de uma bacia hidrográfica são o reflexo do uso e ocupação do
seu solo.

Do ponto de vista da gestão da bacia hidrográfica, toda ação de pla-


nejamento e intervenções, visando o ordenamento territorial, deve ser
precedida de um diagnóstico do uso e ocupação do solo da região.
Diante disto e da extensão territorial que, muitas vezes, a bacia hidrográ- Para se ter acesso ao mapa
fica ocupa, o uso de métodos tradicionais de mapeamento (topografia e à tabela com as estações
fluviométricas (que medem
e aerofotogrametria) se torna caro e, nem sempre, dentro de um prazo vazão no rio) e pluviométricas
razoável de execução. (que medem a precipitação) por
estado, é só acessar o seguinte
Sendo assim, as imagens de satélite podem ser excelentes fontes para o endereço: http://www.ana.gov.br/
mapeamento do uso e ocupação do solo numa bacia, assim como para a rhn/index.htm
atualização de mapas existentes.

Através de técnicas de processamento digital de imagens, é possível


identificar as atividades desenvolvidas na bacia (agricultura, criação
de animais, mineração, etc), como também a cobertura do solo (solo
exposto, afloramento rochoso, floresta, área impermeabilizada, entre
outros), tão importantes para a definição do comportamento hidrológico.

Atualmente, um dos desafios na gestão de bacias hidrográficas é tentar


28 O modelo hidrológico é uma
ferramenta extremamente
equilibrar as disponibilidades hídricas (oferta) com as demandas, de
útil que permite, através da modo a atender os usos múltiplos de forma sustentável.
equacionalização dos processos,
representar, entender e simular Como sabemos, a grande variabilidade da vegetação, relevo e solos e
o comportamento de uma bacia suas interações com estímulos meteorológicos produzem efeitos comple-
hidrográfica (Tucci, 1998).
xos numa bacia hidrográfica. Por outro lado, a hidrologia, como ciência
que trata da água e sua interação com o meio ambiente, tenta explicar a
sua ocorrência e distribuição através da observação das variáveis envol-
vidas no ciclo da água e utilizando os chamados modelos hidrológicos.

Contudo, uma simples coleta de dado em campo não é suficiente para


caracterizar as variáveis hidrológicas e a qualidade da água numa bacia,
ANOTAÇÕES PESSOAIS sendo necessária a instalação de uma rede de monitoramento. Esta, por
sua vez, é capaz de registrar dados de precipitações, as vazões nos rios,
a evaporação, entre outros, por longos períodos, para que possamos
utilizá-los em estudos de disponibilidade e qualidade da água.

Desta forma, fica evidente que o monitoramento de variáveis hidrológi-


cas e parâmetros de qualidade são fundamentais para o planejamento
e gerenciamento dos recursos hídricos numa bacia hidrográfica, assim
como, para o correto dimensionamento das obras de aproveitamento dos
recursos hídricos.

A hidrologia tem desenvolvido metodologias que, de certa forma, suprem


a deficiência de dados para caracterizar o regime hidrológico de deter-
minadas regiões, mas que nos dão pouca confiança, pois os resultados
precisam ser comparados com dados observados que, nem sempre, são
disponíveis.

Por esta e outras razões já apresentadas, as redes de monitoramento


desempenham papel fundamental para a hidrologia, pois são os dados
observados que alimentam os modelos hidrológicos e estes, por sua
vez, traduzem o comportamento hidrológico e a qualidade da água numa
bacia.

No Brasil, cabe à Agência Nacional de Águas a coordenação das ativida-


des desenvolvidas no âmbito da Rede Hidrometeorológica Nacional. Esta
rede realiza o monitoramento de chuva, vazão, nível e qualidade da água ANOTAÇÕES PESSOAIS
e sedimentos em diversos pontos distribuídos por todo o território nacio-
nal. Todos os dados gerados são armazenados em um banco de dados e
disponibilizados pela Internet, no endereço da Agência (www.ana.gov.br).

O objetivo de passar a responsabilidade da coordenação da Rede 29

Hidrometeorológica Nacional para a ANA é assegurar que os dados cole-


tados sejam efetivamente armazenados, processados, interpretados e
difundidos entre todos os segmentos interessados, subsidiando a gestão
dos recursos hídricos a nível federal e dos estados.

Seguem, abaixo, algumas ilustrações de equipamentos que fazem o


registro de algumas variáveis hidrológicas.

Na Figura 6, apresentamos um pluviômetro, aparelho coletor de chuva


com área de captação padronizada e dotada de um reservatório interno
para acúmulo da água. O pluviômetro marca o total acumulado em
um dado período de tempo, e sua leitura é efetuada uma vez por dia,
geralmente às 7 ou 9 h, através da liberação da água para uma proveta
graduada, especificamente, para cada tipo de pluviômetro. O total de
água coletada pode ser afetado por objetos vizinhos e pela altura em que
o aparelho é instalado. Assim, cada fabricante recomenda que ele seja
instalado a certa altura do solo e afastado de possíveis obstáculos, de
preferência protegido por um cercado, conforme mostra a Figura 6.

Figura 6- Pluviômetro instalado.


Fonte: UFPE, 2000.

Quando é necessário o conhecimento da distribuição temporal da chuva


e da variação da sua intensidade, utiliza-se o pluviógrafo, aparelho
apresentado na Figura 7.
ANOTAÇÕES PESSOAIS

30

Figura 7- Pluviógrafo instalado e detalhe do registro de dados


Fonte: UFPE, 2000.

Para o registro da evaporação são utilizados os tanques evaporimétri-


cos, que, pela sua simplicidade, têm maior aplicação. O mais utilizado,
no Brasil, é o tanque Classe A, instalado em base de madeira. O instru-
mento fica exposto à chuva e é necessário que se determine a lâmina
precipitada (pluviômetro) para saber o quanto desta foi evaporada,
correspondendo à descida do nível da água no tanque. Na Figura 8, é
apresentado um tanque Classe A, instalado para determinação da evapo-
ração do local.

Figura 8- Tanque Classe A para determinação da evaporação


Fonte: UFPE, 2000.
A determinação de vazões em rios pode ser obtida pela medição do nível ANOTAÇÕES PESSOAIS
da água, através de réguas graduadas ou por instrumentos de registro
contínuo, os linímetros ou linígrafos.

Na Figura 9, são apresentadas réguas linimétricas para medição do nível


da água numa seção de um rio, e, na Figura 10, um linígrafo de boia. 31

Com esses dados, é possível obter as variações de vazões num ponto ou


seção do curso d´água.

Figura 9- Réguas linimétricas instaladas numa seção transversal de um rio.


Fonte: Serviço Geológico do Brasil- CPRM

Figura 10- Linígrafo de boia para registro de nível da água

Existem outras formas de determinação de vazão num curso d´água.


Esses métodos incluem a construção de estruturas como vertedouros e
calhas, e, também, a instalação de aparelho numa seção do rio, os quais
determinam a velocidade da água e, posteriormente, determina-se a
vazão.
ANOTAÇÕES PESSOAIS Nesta aula, apresentamos o conceito e as principais características
das bacias hidrográficas que interferem na qualidade e quantidade
da água, assim como, a interação dos recursos hídricos superficiais e
subterrâneos. Também mostramos como são obtidas algumas variáveis
hidrológicas, com uso de equipamentos instalados em campo.
32

Atividades Propostas
1. Por que a bacia hidrográfica deve ser considerada como unidade de
planejamento de recursos hídricos? E como você definiria
microbacia?
2. O armazenamento hídrico numa bacia é feito tanto superficialmente
como no subsolo. Qual das duas reservas está mais exposta à ação
da evaporação? Por quê?
3. Descreva como identificar um rio perene, intermitente e rio efêmero.
4. Escolha uma atividade antrópica e, a partir dela, descreva como o
uso e a ocupação do solo podem alterar a quantidade e/ou quali-
dade da água na bacia hidrográfica.
5. Cite vantagens e desvantagens do uso da água subterrânea e da
água superficial no suprimento das demandas geradas por
diversos usos.

Bibliografia Recomendada
BARBOSA, I. M. B. R. Contribuição aos estudos de regionali-
zação de vazões a partir do conhecimento do meio físico
– estudo de caso: bacia do rio São Francisco. Recife, PE.
Originalmente apresentada como dissertação de mestrado, Universidade
Federal de Pernambuco. 2002. 118p.

BARTH, F. T.; BARBOSA, W. E. S. Recursos Hídricos. Texto não publi-


cado. 1999. 46p.

PAIVA, J. B. D.; PAIVA, E. M. C. (Org.). Hidrologia aplicada à gestão


de pequenas bacias hidrográficas. Porto Alegre: ABRH, 2001.
625p.
PORTO, R. L. L.; FILHO, K. Z.; SILVA, R. M. Bacias hidrográficas. ANOTAÇÕES PESSOAIS
Texto da disciplina Hidrologia Aplicada. Escola Politécnica de São Paulo.
Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária. 1999. 35p.

SETTI, A. A.; LIMA, J. E. F. W; CHAVES, A. G. M.; PEREIRA, I. C. Introdu-


ção ao gerenciamento dos recursos hídricos. 2ª. Ed. Brasília: 33
Agência Nacional de Energia Elétrica, Superintendência de Estudos e Infor-
mações Hidrológicas, 2001. 207p.

TUCCI, C. E. M. Hidrologia: ciência e aplicação. 2ª Ed. Porto Ale-


gre: Edit. Universidade/ UFRGS: ABRH, 2001. 943p.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO. Medições Hidrológi-


cas utilizando multimídia – PROENSINO. 2000. 1 CD- ROM.
Aula 03
Características, Requisitos e Padrões de
Qualidade da Água
Nesta aula, trataremos das características físicas, químicas e biológicas
das águas, assim como, dos padrões de corpos d´água e de lançamento
no corpo receptor. O texto também abordará o enquadramento dos
corpos d´água em classes e apresentará a classificação das águas de 37
acordo com os usos previstos, tendo em vista a relação com a manuten-
ção da qualidade da água.

A qualidade da água, numa bacia hidrográfica é resultante de fenômenos A primeira legislação federal
naturais e da atuação do homem. Diante desta realidade, faz-se neces- específica que trata da poluição
das águas foi o Decreto Federal
sário, para o gerenciamento da qualidade da água, uma legislação que
50.877, de 1960. Neste Decreto
classifique os corpos d´água e os enquadre dentro de uma das classes, é previsto o tratamento de
segundo seus usos previstos. efluentes sólidos, líquidos
e gasosos, domiciliares ou
Os objetivos desta aula são compreender como o meio ambiente inter- industriais, antes de seu
lançamento, além de prever a
fere nas características da água; entender como a legislação brasileira classificação das águas segundo
estabelece os padrões de qualidade dos corpos d´água e para o lança- seus usos preponderantes.
mento de efluentes no corpo receptor, motivar o aluno a aprofundar seus Este Decreto teve um critério
regulamentado pela Portaria 13/
conhecimentos em relação aos aspectos que influenciam na qualidade
Minter, de 1976, classificação
das águas numa bacia hidrográfica. precursora da Resolução Nº
20/86, do Conselho Nacional
de Meio Ambiente, atualmente
substituída pela Resolução Nº
Características da Água 357, de 2005. (PANTE, 2006)

De um modo geral, podemos dizer que a qualidade da água de uma fonte


é função das condições naturais e os usos que se fazem do solo na bacia
hidrográfica.

Mesmo numa bacia preservada, que mantém suas condições naturais, a


qualidade da água é afetada pelo escoamento superficial e pela infiltra-
ção da água no solo.

A ação erosiva da precipitação sobre o solo e as rochas faz com que a


água incorpore sólidos em suspensão (partículas de solo) ou dissolvidos
(oriundos da dissolução de rochas), mesmo que a cobertura vegetal e o
solo original na bacia estejam preservados.

Por outro lado, quando a bacia apresenta a interferência do homem,


seja de forma concentrada num ponto, como é o caso do lançamento
de esgoto doméstico ou industrial, ou de forma dispersa, como é o que
acontece quando são utilizados defensivos agrícolas no solo, a qualidade
A Matéria orgânica é formada da água é bastante afetada.
a partir de arranjos do elemento
químico carbono. Matéria
inorgânica é toda aquela Assim, concluímos que a forma como o homem usa e ocupa o solo da
que não é orgânica, como os bacia tem implicação direta na qualidade da água.
minerais, por exemplo. A água,
o sal de cozinha, os metais Na Figura 1, apresentamos uma representação esquemática dos usos do
(obtidos a partir de minerais)
solo numa bacia hidrográfica e os possíveis inter-relacionamentos com a
como o ferro, o cobre, o alumínio
são exemplos de matérias qualidade da água.
38 inorgânicas.

http://www.brasilescola.com/
quimica/substancias-naturais.htm

Segundo a sua degradabilidade,


a matéria orgânica pode
ser biodegradável e não
biodegradável.

Matéria orgânica não


biodegradável são aquelas que
não podem ser decompostas
(reduzidas a substâncias
mais estáveis), por ação dos
microorganismos ou então são
lentamente decompostas. Como
exemplo, podemos citar os
detergentes, os pesticidas, os
metais pesados, o petróleo, entre
outros. Figura 1- Uso e ocupação do solo e inter-relação com a qualidade da água.
Fonte: Adaptado de Von Sperling, 2007.
A estabilização completa da
matéria orgânica demora, em Os corpos d´água apresentam características físico-químicas, que são
termos práticos, vários dias.
determinadas pelas condições climáticas, geomorfológicas e geoquímicas
Esta medida corresponde à
Demanda Última de Oxigênio existentes na bacia de drenagem. No que diz respeito às características
(DBO u). Contudo, para evitar biológicas nas águas superficiais, são as condições ambientais que
espera pelo resultado e permitir determinam a seleção das espécies e as atividades fisiológicas dos orga-
a comparação com outros,
ficaram estabelecidas algumas nismos presentes.
padronizações:
Na Figura 2, é apresentado um quadro que resume, de forma clara, as
» convencionou-se proceder à
análise no 5º dia útil; impurezas que podemos encontrar na água, relacionado-as com as suas
» determinou-se que o teste características.
deve ser efetuado na tempe-
ratura de 20° C.
Sendo assim, a DBO padrão
ficou convencionada como DBO
5,20. (Von Sperling, 1996).
O fenômeno da Autodepuração
está vinculado ao
restabelecimento do equilíbrio no
meio aquático, por mecanismos 39
essencialmente naturais, após
as alterações induzidas pelo
despejo de efluentes. Neste
processo, os compostos
orgânicos são convertidos
em compostos inertes e não
prejudiciais do ponto de vista
Figura 2- Impurezas contidas na água. ecológico. (Von Sperling, 1996).
Fonte: Adaptado de Von Sperling, 2007.

As características físicas, químicas e biológicas representam a qualidade


da água. As principais são listadas e comentadas abaixo.
Eutrofização é o crescimento
» Matéria orgânica - é composta por proteínas, carboidratos, gordu- excessivo das plantas aquáticas,
ras e óleos, além da ureia e outros componentes. Face à grande tanto planctônicas quanto
variedade de formas e compostos que a matéria orgânica pode aderidas, a níveis tais que sejam
considerados como causadores
apresentar e à dificuldade em determinar, em laboratório, os seus
de interferências com os usos
diversos componentes, são utilizados métodos indiretos para a desejáveis do corpo d’água
quantificação da matéria orgânica. Podemos determiná-la através (Thomann e Mueller, 1987, apud
da medição do consumo de oxigênio (DBO e DQO) e do carbono Sperling, 1996).
orgânico (Carbono Orgânico Total- COT). Os parâmetros tradicio-
nalmente mais utilizados são a DBO e DQO.
A matéria orgânica é causadora do principal problema de poluição
das águas: o consumo de oxigênio dissolvido pelos microorganis-
mos nos seus processos metabólicos de utilização e estabilização
da matéria orgânica.

» Demanda bioquímica de oxigênio (DBO) - é uma medida aproxi-


mada da quantidade de matéria orgânica biodegradável presente
numa amostra de água. Representa a quantidade de oxigênio
necessária para as bactérias, presentes na amostra de água, oxida-
rem a matéria orgânica presente para uma forma estável inorgânica.

» Demanda química de oxigênio (DQO) - mede o consumo de


oxigênio ocorrido durante a oxidação química da matéria orgânica.
É muito utilizada como medida de suscetibilidade à oxidação de
materiais orgânicos e inorgânicos presentes em corpos d´água e
efluentes sanitários e industriais.
Enquanto na DBO a oxidação ocorre pela ação das bactérias, na
DQO, a oxidação se dá por um forte oxidante, geralmente o dicro-
mato de potássio.

» Temperatura - as condições climáticas determinam a variação da


temperatura da água e esta influencia os processos físicos, quí-
micos e biológicos em corpos d´água, afetando as concentrações
de diversas variáveis. O aumento da temperatura também causa o
40 aumento da demanda bioquímica de oxigênio.

» Matéria em suspensão, turbidez e transparência - matéria em


suspensão consiste em silte, argila, partículas finas de matéria orgâ-
nica e inorgânica, compostos orgânicos solúveis, plâncton e outros
A eutrofização não só altera a microorganismos microscópicos. A turbidez representa o grau de
qualidade da água, mas causa
impactos ambientais, como perda dificuldade que um feixe de luz tem ao atravessar certa quantidade
da biodiversidade, as alterações de água, conferindo-lhe uma aparência turva. Do ponto de vista
na composição das espécies óptico, a transparência da água pode ser considerada o oposto da
(invasão de outras espécies)
turbidez. A transparência mede o limite de visibilidade na água.
e, além disso, prejuízos
econômicos, como entupimento
de turbinas, aumento de custos » Oxigênio dissolvido (OD) - este elemento é muito importante para
com tratamento de água para a sobrevivência dos organismos aeróbios (que vivem na presença
abastecimento humano, etc. Em
função da eutrofização, vários de oxigênio). No processo de autodepuração em águas naturais, as
reservatórios e lagos no mundo bactérias fazem uso do OD, que pode vir a causar uma redução da
já perderam sua capacidade de sua concentração no meio aquático. Nas águas doces, o oxigênio
abastecimento de populações,
recreação e de manutenção da
dissolvido varia de 15 mg/L a 0°C, de 8 mg/L a 25°C de tempera-
vida aquática. Esse fenômeno é tura. Este é o principal parâmetro de caracterização dos efeitos da
mais comum em ambientes com poluição das águas.
águas paradas, pois, em cursos
d´água, há uma renovação da
massa líquida que dificulta o » Nitrogênio - é fundamental a presença deste elemento químico
processo. em certa quantidade, para que reações biológicas ocorram no meio
aquático. O nitrogênio é constituinte de proteínas e vários outros
compostos biológicos. Em corpos hídricos, o nitrogênio pode ser
encontrado nas seguintes formas: (a) nitrogênio molecular (N2),
escapando para a atmosfera; (b) nitrogênio orgânico (dissolvido e
em suspensão); (c) amônia (livre NH3 e ionizada NH4 +); (d) nitrito
(NO2 -) e nitrato (NO3-).
Em um corpo d´água, a determinação da forma predominante de
nitrogênio pode indicar o estágio da poluição. Poluição recente está
associada ao nitrogênio na forma orgânica ou de amônia, enquanto
uma poluição mais remota está associada ao nitrito.
» Fósforo - é indispensável ao crescimento de algas e, quando em
elevadas concentrações em lagos e represas, pode causar eutrofi-
zação (crescimento exagerado de algas).
Em águas naturais, ocorre, principalmente, na forma de ortofosfatos,
polifosfatos e fosfatos organicamente ligados. O intemperismo das
Para ter acesso à Resolução
rochas contendo fósforo é fonte natural deste elemento, mas ele 357/2005 e a outras legislações
também pode ser encontrado em esgotos domésticos ou efluentes do CONAMA, é só acessar o
industriais, assim como em fertilizantes, colocados no solo. seguinte endereço: http://www.
mma.gov.br/port/conama/legi.cfm 41
Os valores de fósforo encontrados num corpo d´água podem indicar
o estado de eutrofização. Quanto maior a concentração deste ele-
mento, maior é o nível de trofia da água.

» Algas - são plantas aquáticas microscópicas que crescem onde


Antes da Resolução do CONAMA
ocorrem condições propícias de nutrientes, incidência de luz solar e
n. 357/05, o enquadramento
temperatura. Mesmo pequenas concentrações de nitratos e fosfatos seguia a Resolução do
na água podem estimular o crescimento de algas, que, em grande CONAMA n. 20/86. Outras
quantidade, torna-se um problema ambiental (eutrofização). resoluções também tratam do
enquadramento de recursos
hídricos: a Resolução CONAMA
» Clorofila - serve para uma avaliação indireta da biomassa de algas n. 396, de 3 de abril de 2008,
e indica o estado trófico do corpo d´água, pois o pigmento verde estabelece o enquadramento das
águas subterrâneas; a Resolução
clorofila está presente na maioria dos organismos fotossintéticos.
CNRH n. 91, de 5 de novembro
Corpos hídricos com baixos níveis de nutrientes (nitrogênio e de 2008, trata dos procedimentos
gerais para o enquadramento
fósforo) apresentam baixos teores de clorofila, enquanto aqueles dos corpos de água superficiais e
que apresentam altos teores de clorofila possuem elevados níveis subterrâneos.
destes dois elementos.

Requisitos e Padrões de Qualidade


Os requisitos de qualidade da água são função dos usos previstos ou
pretendidos. As exigências se fazem necessárias, mas não devem ser
1. Os padrões de potabilidade
as mesmas para qualquer que seja o seu uso, pois, dependendo da são definidos pelo Ministério
finalidade à qual se destina, a água poderá ou não conter determinados da Saúde, através da Portaria
elementos em concentrações diferenciadas. 518/04 e não são objetos de
estudo desta disciplina.
Diante disto, há a necessidade de se estabelecerem os padrões de quali-
dade, que são embasados por um suporte legal.

Podemos dividir os padrões de qualidade da água em três grupos:


» Padrões de corpos d´água
» Padrões de lançamento no corpo receptor
» Padrões de potabilidade¹
Para tratarmos dos padrões de qualidade de corpos d´água ou de lan-
çamento de efluentes no corpo receptor é necessário falarmos sobre o
enquadramento dos corpos d´água.

Os estudos sobre a qualidade da água em bacias hidrográficas busca


avaliar se o cenário atual está de acordo com a legislação ambiental. No
Brasil, a Lei 9.433/97 instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos
e estabeleceu, como um dos instrumentos de gestão, o enquadramento
A implementação do
enquadramento apresenta uma dos corpos d´água em classes, segundo os usos preponderantes da
42
situação bastante diversa entre água.
as unidades da Federação. Com
relação aos corpos d’água de Segundo a Lei das Águas (9.433/97), o enquadramento representa uma
domínio estadual, atualmente
apenas 10 das 27 unidades da
meta de qualidade a ser mantida ou alcançada, que visa assegurar às
Federação (Alagoas, Bahia, Mato águas, qualidade compatível com os usos mais exigentes a que forem
Grosso do Sul, Minas Gerais, destinadas e diminuir os custos de combate à poluição hídrica, mediante
Paraíba, Paraná, Rio Grande ações preventivas permanentes.
do Norte, Rio Grande do Sul,
Santa Catarina e São Paulo)
possuem instrumentos legais que Em termos práticos, podemos dizer que o enquadramento é um instru-
enquadram total ou parcialmente mento de gestão territorial que estabelece um zoneamento dos corpos
seus corpos d’água (ANA, 2009). hídricos (hidrozoneamento), sendo, portanto, mais que uma simples
classificação. O enquadramento deve ser baseado não necessariamente
no estado atual do corpo hídrico (o rio que temos), mas nos níveis de
qualidade que deveriam possuir ou serem mantidos (o rio que queremos)
para atender os usos previstos para aquela água.
O estado de Pernambuco
enquadrou seus principais Diante do que a Lei prevê, é interessante diferenciar as etapas que
corpos d’água em 1986, com
base na Portaria do Ministério
envolvem o processo de enquadramento dos corpos d´água. O termo
do Interior n. 13, de 1976, por “estabelecer” as classes de corpos d´água significa, numa primeira fase,
meio de decretos. Entretanto, dar as características da cada classe e isto é feito, como a própria Lei
com a mudança da legislação 9.433/97 afirma, pela legislação ambiental (CONAMA 357/05). Numa
ambiental, esses decretos
perderam sua validade (ANA, segunda etapa, devem-se constatar as características existentes do
2009). corpo hídrico, o qual se deseja enquadrar, e propor as metas para alcan-
çar determinada classe e, finalmente, efetivar o enquadramento do corpo
hídrico na devida classe.

Para efetivação do enquadramento, deverão ser seguidas as resoluções


do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA). Atualmente, a
Resolução CONAMA n. 357/05 define o sistema de classificação dos
corpos d’água, estabelecendo 13 classes de qualidade para as águas
doces, solobras e salinas do Território Nacional, definindo os padrões
de corpos d´água para cada uma delas e os padrões de lançamento
no corpo receptor.

Sendo assim, os corpos hídricos do Brasil devem estar enquadrados


dentro de uma das classes estabelecidas nesta Resolução, de acordo
com o uso previsto para a água, garantindo a sua qualidade para aquela ANOTAÇÕES PESSOAIS
finalidade.

O enquadramento dos corpos d´água em classes é uma ferramenta


essencial para a gestão de recursos hídricos, pois possibilita compa-
tibilizar desenvolvimento econômico com a manutenção da qualidade
ambiental.

Na Resolução 357/05, as águas doces são classificadas em cinco grupos


43
(especial, classe 1, classe 2, classe 3 e classe 4), as águas salinas e
salobras em quatro (especial, classe 1, classe 2 e classe 3).

No quadro abaixo, é apresentada a classificação das águas doces


em função dos usos preponderantes, segundo a Resolução CONAMA
357/05.
Quadro 1- Resumo da classificação das águas doces de acordo com os usos previstos

Uso Especial 1 2 3 4
Abastecimento para consumo X (a) X (b) X (c) X (d)
humano
Preservação do equilíbrio natural X
das comunidades aquáticas
Preservação dos ambientes aquá
ticos em unidades de conservação X
de proteção integral.
Proteção das comunidades aquá- X(h) X
ticas
Recreação de contato primário,
tais como natação, esqui aquático X X
e mergulho, conforme Resolução
CONAMA 274/2000 (balneabilidade)
Irrigação X(e) X(f) X(g)
Aquicultura e à atividade de pesca X
Pesca amadora X
Dessedentação de animais X
Recreação de contato secundário X
Navegação X
Harmonia paisagística X

(a) Com desinfecção.


(b) Após tratamento simplificado.
(c) Após tratamento convencional.
(d) Após tratamento convencional ou avançado.
(e) De hortaliças consumidas cruas e de frutas que se desenvolvam rentes ao solo e
que sejam ingeridas cruas, sem remoção de película.
(f) De hortaliças, plantas frutíferas e de parques, jardins, campos de esporte e lazer, com
os quais o público possa vir a ter contato direto.
(g) Culturas arbóreas, cerealíferas e forrageiras.
(h) De forma geral e em comunidades indígenas.
(*) Conforme Resolução CONAMA 274/2000 (balneabilidade).
No Quadro 2 e 3, apresentamos, respectivamente, um resumo com a
classificação das águas salinas e águas salobras de acordo com os usos
previstos, conforme Resolução CONAMA 357/05.
Quadro 2- Resumo da classificação das águas salinas de acordo com
os usos previstos
Em 2007, a ANA elaborou uma
proposta de enquadramento Uso Especial 1 2 3
dos trechos dos rios Mundaú,
Preservação dos ambientes aquáticos em
Canhoto e Inhumas e da Lagoa unidades de conservação de proteção X
Mundaú no estado de Alagoas. integral
44
Preservação do equilíbrio natural das comu- X
Em 2008, uma proposta de nidades aquáticas
enquadramento foi feita no
Plano Estratégico das Bacias Recreação de contato primário X
Hidrográficas dos rios Tocantins Proteção das comunidades aquáticas X
e Araguaia. Aquicultura e atividade de pesca X
Pesca amadora X
No momento, está em
elaboração o Plano Estratégico Recreação de contato secundário X
de Recursos Hídricos das Bacias Navegação X
Hidrográficas dos Afluentes Harmonia paisagística X
da Margem Direita do Rio
Amazonas, o qual também
apresentará uma proposta de Quadro 3- Resumo da classificação das águas salobras de acordo com os usos previs-
enquadramento (ANA, 2009). tos

Uso Especial 1 2 3
Preservação dos ambientes aquáticos em
unidades de conservação de proteção X
integral
Preservação do equilíbrio natural das comu- X
nidades aquáticas
Recreação de contato primário X
Proteção das comunidades aquáticas X
Aqüicultura e atividade de pesca X
Abastecimento para consumo humano X(a)
Irrigação X(b)
Pesca amadora X
Recreação de contato secundário X
Navegação X
Harmonia paisagística X
(a) Após tratamento convencional ou avançado.
(b) De hortaliças que são consumidas cruas e de frutas que se desenvolvam rentes ao
solo e que sejam ingeridas cruas, sem remoção de película, e a irrigação de parques,
jardins, campos de esporte e lazer, com os quais o público possa vir a ter contato direto.

Para cada classe, seja para água doce, salobra ou salina, há um conjunto
de parâmetros de qualidade selecionado, em que estão estabelecidos
os valores máximos admissíveis. Esses valores, segundo a Resolução
357/05, deverão ser monitorados periodicamente pelo órgão gestor de
meio ambiente e recursos hídricos para a garantia do enquadramento e,
consequentemente, o cumprimento da legislação.
Um ponto importante a salientar nesta Resolução é referente aos cor-
pos d´água não enquadrados. Ela diz que, enquanto não aprovados os
respectivos enquadramentos, as águas doces serão consideradas classe
2, as salinas e salobras, classe 1, exceto se as condições de qualidade
atuais forem melhores, o que determinará a aplicação da classe mais
rigorosa correspondente.

Quanto aos padrões de lançamento de efluentes no corpo receptor, a


Resolução 357/2005 é bem clara. Ela prevê que os efluentes de qualquer A Resolução 357/05 também
prevê o estabelecimento 45
fonte poluidora somente poderão ser lançados, direta ou indiretamente, de metas obrigatórias,
nos corpos de água, após o devido tratamento e desde que obedeçam às intermediárias e final, de
condições, padrões e exigências dispostos nesta Resolução. melhoria da qualidade da água
para efetivação dos respectivos
enquadramentos, nas bacias
Os padrões de corpos d´água, assim como os de lançamento, estão, hidrográficas em que a condição
de certa forma, inter-relacionados, devido ao fato de que a garantia no de qualidade dos corpos de
atendimento aos padrões de lançamento de um efluente deve garantir, água esteja em desacordo
simultaneamente, o atendimento aos padrões do corpo d´água que irá com os usos preponderantes
pretendidos.
recebê-lo.

Neste caso, duas situações podem ocorrer:


» Caso o efluente satisfaça os padrões de lançamento, mas não
satisfaça a do corpo receptor, as características do efluente lan-
çado deverão ser tais que, necessariamente, atendam ao padrão
do corpo receptor. Esta situação se verifica em corpos d´água com
baixa capacidade de assimilação e diluição de efluentes.
» Caso o efluente não satisfaça o padrão de lançamento, no entanto
satisfaça os padrões do corpo receptor, o órgão ambiental poderá
autorizar lançamento com valores acima do máximo permitido
dos padrões de lançamento. Esta autorização ocorre em casos
excepcionais, de relevante interesse público, fruto de estudos de
impacto ambiental e permitindo o atendimento ao enquadramento.
Esta situação pode ocorrer em corpos receptores que possuem boa
capacidade de assimilação e diluição.
Seguem, abaixo, algumas condições de lançamento de efluentes, retira-
das da Resolução CONAMA 357/05:
» pH entre 5 a 9;
» temperatura: inferior a 40ºC, sendo que a variação de temperatura
do corpo receptor não deverá exceder a 3ºC na zona de mistura;
Quanto a óleos e graxas:
» óleos minerais: até 20mg/L;
» óleos vegetais e gorduras animais: até 50mg/L; e
» ausência de materiais flutuantes.
ANOTAÇÕES PESSOAIS No Quadro 4, são apresentados os valores máximos permissíveis de
parâmetros orgânicos e inorgânicos de efluentes para o lançamento em
corpos hídricos.

Quadro 4- Padrões de lançamento de efluentes, segundo CONAMA 357/05


PADRÕES DE LANÇAMENTO DE EFLUENTES
Parâmetros Inorgânicos Valor Máximo
46 Arsênio Total 0,5 mg/L
Bário Total 5,0 mg/L
Boro Total 5,0 mg/L
Cádmio Total 0,2 mg/L
Chumbo Total 0,5 mg/L
Cianeto Total 0,2 mg/L
Cobre Dissolvido 1,0 mg/L
Cromo Total 0,5 mg/L
Estanho Total 4,0 mg/L
Ferro Dissolvido 15 mg/L
Fluoreto Total 10 mg/L
Manganês Dissolvido 1,0 mg/L
Mercúrio Total 0,01 mg/L
Níquel Total 2,0 mg/L
Nitrogênio Amoniacal Total 20,0 mg/L
Prata Total 0,1 mg/L
Selênio Total 0,30 mg/L
Sulfeto 1,0 mg/L
Zinco Total 5,0 mg/L
Parâmetros Orgânicos Valor Máximo
Clorofórmio 1,0 mg/L
Dicloroeteno 1,0 mg/L
Fenóis Totais 0,5 mg/L C6H5OH
Tetracloreto de Carbono 1,0 mg/L
Tricloroeteno 1,0 mg/L

Resumindo, nesta aula, apresentamos as principais características das


águas e os padrões de qualidade de corpos d´água e de lançamento no
corpo receptor, segundo a legislação vigente no País. O enquadramento
dos corpos hídricos em classes e a classificação das águas segundo
seus usos previstos, também foram assuntos abordados.
Atividades Propostas ANOTAÇÕES PESSOAIS

1. As águas superficiais, assim como as subterrâneas apresentam


características da sua qualidade de acordo com o uso e ocupação
do solo da bacia hidrográfica correspondente. Entre as duas, qual
está mais exposta aos efeitos da ação antrópica?

2. Os processos naturais também alteram a qualidade da água numa


bacia hidrográfica. Explique como a natureza pode exercer influên- 47
cia nas características da água.

3. Pesquise, junto aos órgãos responsáveis (Secretaria de Recursos


Hídricos e órgão licenciador do seu Estado) se há algum corpo
hídrico com propostas de enquadramento.

Bibliografia Recomendada
BRASIL. Agência Nacional de Águas (ANA). Conjuntura dos Re-
cursos Hídricos no Brasil 2009. Brasília. 2009. 204 p. Disponível
em: <http://www.ana.gov.br/AcoesAdministrativas/CDOC/Catalogo_
imgs/2009/20090417_Conjuntura_dos_recursos_hidricos_no_Brasil_2009.
pdf> Acesso em: maio/09.

PAIVA, J. B. D.; PAIVA, E. M. C. (Org.). Hidrologia aplicada à gestão


de pequenas bacias hidrográficas. Porto Alegre: ABRH, 2001.
625p.

SETTI, A. A.; LIMA, J. E. F. W; CHAVES, A. G. M.; PEREIRA, I. C. Introdu-


ção ao gerenciamento dos recursos hídricos. 2ª. Ed. Brasília:
Agência Nacional de Energia Elétrica, Superintendência de Estudos e Infor-
mações Hidrológicas, 2001. 207p.

VON SPERLING, M. Introdução à qualidade das águas e ao


tratamento dos esgotos. 2ª Ed. Belo Horizonte: Departamento de
Engenharia Sanitária e Ambiental; Universidade Federal de Minas Gerais,
1996. 243p.

VON SPERLING, M. Estudos e qualidade da água de rios. Belo


Horizonte: Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental; Universidade
Federal de Minas Gerais, 2007. 588p.
Aula 04
Aspectos Hidrológicos do Semiárido ANOTAÇÕES PESSOAIS

Nesta aula, serão apresentados, sucintamente, as características climá-


ticas e hidrológicas no Nordeste, os critérios adotados pelo Ministério
da Integração Nacional e a atual delimitação do Semiárido brasileiro.
Também será apresentada a classificação climática, segundo o Índice de
Aridez, utilizada como critério para áreas sujeitas à desertificação.

O Semiárido ocupa uma área de, aproximadamente, 980.000 km2 e


possui 12,2% da população brasileira. Com forte insolação, altas tem-
peraturas e elevadas taxas de evapotranspiração, além de baixos e
irregulares índices pluviométricos, o Semiárido brasileiro é uma região 51
altamente vulnerável às secas.

Diante desta realidade, o conhecimento das condições climáticas e hidro-


lógicas desta região é fator fundamental para o correto aproveitamento
dos recursos hídricos, tendo em vista os efeitos devastadores da estia-
gem prolongada no contexto socioeconômico e ambiental da região.

Os objetivos desta aula são conhecer um pouco das características


hidroclimáticas do Semiárido do Nordeste, despertar para as diferenças
regionais e motivar a busca de alternativas de convívio e minimização
dos problemas existentes.

Abrangência Atual do Território do Semiárido


Definiu-se como semiárido “a região inserida na área de atuação da
Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste - SUDENE, com
precipitação pluviométrica média anual igual ou inferior a 800mm,
definida em portaria daquela Autarquia”. Esta definição é de acordo
com a Lei 7.827, de 27 de dezembro de 1989, que criou e estabeleceu
as condições de aplicação dos recursos dos Fundos Constitucionais de
Financiamento do Norte (FNO), do Nordeste (FNE) e do Centro-Oeste
(FCO). Em 2001, com a extinção da SUDENE, o Ministério da Integração
Nacional assumiu a atribuição de posicionar-se acerca dos pleitos de
inclusão de municípios interessados em beneficiar-se do tratamento
diferenciado das políticas de crédito e benefícios fiscais conferido ao
semiárido brasileiro.
Atualmente, este Ministério reconheceu que a definição anteriormente
adotada, baseada somente na precipitação média anual dos municípios
dessa região, era inadequada e definiu novos limites para a área geográ-
fica de abrangência do semiárido brasileiro.

Para a nova delimitação, um grupo de trabalho do Ministério da


Integração Nacional tomou por base três critérios técnicos:

1) Precipitação pluviométrica média anual inferior a 800 milímetros;


Índice de Aridez: Definido 2) Índice de aridez de até 0,5 calculado pelo balanço hídrico que rela-
como a razão entre
a precipitação e a
ciona as precipitações e a evapotranspiração potencial, no período
evapotranspiração entre 1961 e 1990;
52 potencial. Este índice
estabelece as classes 3) Risco de seca maior que 60%, tomando-se por base o período entre
climáticas (hiperárido, 1970 e 1990.
árido, semiárido, subúmido
seco e subúmido úmido),
sendo um dos critérios Com isso, além dos já incorporados 1.031 municípios, passaram a fazer
adotados pela Convenção parte outros 102 novos municípios, que atenderam a, pelo menos, um
das Nações Unidas de dos critérios descritos.
Combate à Desertificação,
para classificar as Desta forma, a área classificada oficialmente como semiárido aumentou
áreas susceptíveis à
desertificação. de 892.309,4Km² para 969.589,4km². O Estado de Minas Gerais teve o
maior número de inclusões na nova lista - dos 40 municípios anteriores,
passou para 85. Portanto, são, hoje, 1.133 municípios os integrantes do
novo semiárido brasileiro.

O Balanço Hídrico: Na Figura 1, é apresentada a nova delimitação do semiárido brasileiro,


Consiste em comparar através da inclusão de novos municípios.
a quantidade de água
recebida pelo ambiente,
através das chuvas, com
a quantidade perdida
pela evapotranspiração
(evaporação do solo e
transpiração das plantas).
A Convenção das Nações
Unidas de Combate à
Desertificação e Mitigação 53
dos Efeitos da Seca –
UNCCD é um instrumento
jurídico do direito
internacional, concluído
pela ONU em 17 de junho
de 1994 e ratificado por
mais de 200 países, do
qual o Brasil tornou-se
signatário em 25 de junho
de 1997.

Zona Climática Intertropical


situa-se entre os trópicos
de Câncer, no hemisfério
norte, e de Capricórnio,
Figura 1- Nova delimitação do Semiárido Brasileiro
no hemisfério sul. Cortada
Fonte: Secretaria de Políticas de Desenvolvimento Regional (SDR/MI, 2005).
ao meio pelo Equador,
é a zona mais quente
do planeta, também
denominada zona tórrida.
Conforme estudos climáticos, a oferta insuficiente de água nesta região
não é devido apenas à falta de chuvas, e, sim, a sua má distribuição,
associada a uma alta taxa de evapotranspiração, resultando no fenômeno
conhecido por todos nós: as secas.

A Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação- UNCCD


define que o fenômeno da desertificação ocorre nas regiões áridas,
semiáridas e subúmidas secas e estabelece como critério para delimi-
tação dessas áreas o Índice de Aridez (THORNTHWAITE, 1941), o qual
é dado pela razão entre a precipitação e a evapotranspiração potencial
(ET). Segue, abaixo, o Quadro 1, que mostra os limites entre as classes
climáticas, de acordo com o Índice de Aridez.

Quadro 1- Classificação climática, a partir do Índice de Aridez

Classificação Índice de Aridez


Hiperárido < 0,03
Árido 0,03 – 0,20
Semiárido 0,21 – 0,50
Subúmido Seco 0,51 – 0,65
O El Niño é o aquecimento
da água do mar no Pacífico Subúmido Úmido ou Úmido > 0,65
Tropical da costa do Peru/
54 Equador até o oeste do Dessa maneira, seguindo o critério estabelecido pela UNCCD, a
Pacífico. O nome El Niño
Secretaria de Políticas de Desenvolvimento Regional (SDR/MI, 2005)
se refere ao Menino Jesus,
pois, desde o século XVI, realizou estudos para reavaliação da área compreendida no Semiárido
os pescadores do Peru/ brasileiro. Foram utilizadas, para cálculo das precipitações, séries histó-
Equador denominaram o ricas de 1.255 estações pluviométricas da SUDENE, INMET e entidades
aquecimento das águas
do mar com esse nome, estaduais de Meteorologia.
já que o aquecimento
acontece próximo do natal
em praticamente todos os
anos. O anti-El Niño ou La
Niña é o oposto, ou seja,
o resfriamento da água do
mar no Pacífico Tropical
desde a costa da América
do Sul até o oeste do
Pacífico.

A Oscilação do Sul é a
variação anômala da
pressão atmosférica
tropical, sendo uma
resposta aérea ao El Niño
ou anti-El Niño (La Niña),
associada a mudanças
na circulação geral da
atmosfera (Cirilo et al,
2007).

Figura 2- Semiárido e Subúmido Seco do Brasil, de acordo com o índice de aridez


Fonte: SDR/MI, 2005.
Características Climáticas e Hidrológicas do Nordeste ANOTAÇÕES PESSOAIS

O Nordeste, situado na zona climática intertropical, possui um clima


quente, cuja média térmica do mês mais frio é superior a 18ºC. Na
verdade, essa média térmica é inferior a 18ºC apenas em alguns pontos
do Planalto da Borborema e da Chapada Diamantina, onde a altitude se
eleva a mais de 800 metros.

Analisando os dados das estações meteorológicas do Departamento


Nacional de Meteorologia, observa-se, no Nordeste, que a mais elevada
média térmica anual é encontrada em Teresina (27,4º), no Piauí, e a mais
baixa é em Garanhuns (20,4º), em Pernambuco. Nas regiões intertropi-
cais, é normal haver pequena variação térmica entre 2º e 5ºC, portanto 55
a amplitude térmica anual é baixa no Nordeste. A amplitude diurna é,
naturalmente, bem maior nas áreas distantes da costa do que nas mais
próximas, face ao papel regularizador da massa oceânica.

A temperatura apresenta-se elevada durante todo o ano e, de maneira


geral, não é um elemento do clima que tem grande influência na diferen-
ciação climática entre as várias regiões do semiárido, com exceção das
áreas situadas em altitudes elevadas.

Para a maior parte do território nordestino, a umidade relativa do ar é


elevada. Apenas em áreas de elevadas altitudes é que se verificam valo-
res baixos (umidade relativa anual superior a 80%). Nas cidades situadas
em áreas de clima semiárido, a umidade é inferior a 70%.

As grandes diferenciações climáticas regionais do Nordeste, porém,


não são ditadas pelas temperaturas, como citado anteriormente, mas,
sobretudo, pelas precipitações pluviais que dependem da dinâmica das
massas de ar. Poucas são as áreas que possuem precipitações anuais
superiores a 2.000mm em média. Nas regiões de clima subúmido e semi-
árido, as dados das estações acusam pluviosidade inferior a 1.000mm,
apesar de, dentro do Semiárido, serem observadas manchas com
pluviosidade de 400mm, onde são encontrados os trechos subdesérticos
do Nordeste.

Outro ponto importante a salientar é a irregularidade das chuvas de ano


para ano no Nordeste. Esta também é responsável pelas grandes secas
e é aferida pelos climatologistas como desvios pluviométricos, que
podem ser positivos, quando ocorre uma quantidade de chuvas acima
do normal, ou negativos, quando essa quantidade é inferior ao normal.
Como esses desvios ocorrem com frequência, dificultam o planejamento
para aproveitamento dos recursos naturais. A variação interanual da pre-
ANOTAÇÕES PESSOAIS cipitação no Nordeste é muito grande e depende, principalmente, de dois
fenômenos do sistema oceano-atmosfera, o El Niño/Oscilação do Sul (ou
anti-El Niño/Oscilação do Sul) e o Dipolo do Atlântico.

A distribuição das chuvas durante o ano e a comparação entre as preci-


pitações e a capacidade de evaporação são tão importantes quanto os
volumes das precipitações anuais para determinação de semiaridez.
Sobretudo nas áreas secas do interior, a evaporação anual é bem mais
elevada que nas áreas úmidas do litoral oriental e da faixa de transição
da Amazônia. Sendo assim, observa-se, no Maranhão e Piauí, onde a
umidade relativa do ar é elevada, evaporação inferior a 1.500mm, fato
que se repete na porção úmida oriental. Por outro lado, na região onde
56 a vegetação dominante é a caatinga, com precipitações inferiores a
1.000mm, a evaporação se eleva para 2.000, 2.500 e até 3.000mm.

Tão importante quanto a quantidade de chuvas que cai sobre uma região
é a distribuição espacial e temporal das mesmas. Quando estas se
concentram em um determinado período, provocam a formação de uma
estação úmida, que se alterna com uma estação seca e o clima se torna
tanto mais árido, quanto mais prolongada for a estação de estiagem.

Na maior parte do Nordeste, há uma bem acentuada diferença entre


a estação chuvosa e a seca, ocorrendo uma diversificação entre elas
quanto ao número de meses secos, assim como quanto à quantidade de
chuvas precipitadas nesses meses. Na maior parte do Maranhão, obser-
va-se que os meses de mais intensa precipitação ocorrem no período de
novembro a abril, sendo pouco chuvosos os meses do período de maio a
outubro. Nas cidades de clima mais próximo ao da Amazônia, como São
Bento, São Luís e Turiaçu, o período seco é de apenas três meses, de
setembro a novembro.

À medida que se avança para o Leste e para o Sudeste da região


Nordeste, há uma diminuição na quantidade de chuvas e aumento dos
meses secos. No sertão baiano, onde dominam as chuvas de verão,
o período seco vai de maio a outubro. Em Remanso, a estação seca
praticamente se estende por sete meses – de abril a outubro. Em algu-
mas partes do Nordeste, quase não chove durante dois ou três meses,
chegando a ocorrer menos de 2mm de chuva em cada mês. Conclui-se
que existem, em linhas gerais, três regimes de chuva no Nordeste: o de
verão-outono na porção ocidental, estendendo-se desde a fronteira
do Pará – Maranhão até o sertão semiárido, o de chuvas de outono –
inverno na faixa litorânea oriental e o de chuvas distribuídas durante
todo o ano no litoral Sul da Bahia.
O Nordeste é uma região pobre em descarga dos rios, face às condições
climáticas dominantes que provocam a existência de rios temporários e
de rios com regime muito irregular, apesar de permanentes. Além disso,
os seus mananciais apresentam-se com reservas insuficientes de água.

A vazão média de longo período em uma seção de rio representa a


potencialidade hídrica superficial. Este é um importante indicador, visto O ATLAS NORDESTE -
que permite avaliar a disponibilidade hídrica em um determinado local, Abastecimento Urbano de
Água, concluído em 2006, teve
apresentando carências e abundâncias dos recursos hídricos de forma a coordenação da Agência
espacializada. Nacional de Águas, com intensa
cooperação das Secretarias
A Figura 3 apresenta as potencialidades hídricas espacializadas na Estaduais de Recursos
região, como resultado de trabalho desenvolvido pela ANA/MMA em Hídricos e acompanhamento
do Ministério da Integração 57
2006, intitulado Atlas Nordeste: Abastecimento Urbano de Água. Nacional, Ministério das Cidades
e Ministério da Saúde. Foi
Analisando esta figura, podemos observar alguns polígonos, que corres- elaborado com o objetivo de
pondem às áreas que devem ser objetos de atenção especial, em função identificar e propor alternativas
técnicas para atender as atuais e
do maior risco à escassez hídrica. futuras demandas de água, com
garantia hídrica, da população
Essas regiões são caracterizadas pelo conjunto das seguintes variáveis: dos nove Estados da Região
Nordeste e parcelas das bacias
» Precipitação média anual menor que 700mm; dos rios São Francisco, Pardo,
» Índice de aridez inferior a 0,35 (valor central da faixa que determina Mucuri e Jequitinhonha, situadas
a região semiárida), indicando regiões mais críticas em relação ao em Minas Gerais. O documento
balanço precipitação-evapotranspiração; está disponível na internet no
seguinte endereço:
» Ausência de aquíferos sedimentares, que poderiam representar
fonte de suprimento para abastecimento humano e segurança http://atlas_nordeste.ana.gov.br/
hídrica; atlas_nordeste/nw_downloads.
htm
» Ausência de rios perenes, que também representariam segurança
hídrica para a região.
Segundo o Atlas Nordeste (ANA, 2006), os problemas a serem enfrenta
dos no Semiárido são caracterizados pelos seguintes déficits:
ANOTAÇÕES PESSOAIS

58

Figura 3 - Vazões específicas médias das unidades de planejamento do


Semiárido do Brasil.
Fonte: ANA, 2006.

No que se refere à ocorrência de águas subterrâneas, como as rochas


cristalinas predominam o território nordestino, há predominância de
águas com teor elevado de sais captadas em poços de baixa vazão. A
exceção ocorre nas formações sedimentares compostas, em sua maior
parte, por manchas esparsas na região.

Na Figura 4, podemos observar os domínios hidrogeológicos que carac-


terizam o Semiárido brasileiro.
ANOTAÇÕES PESSOAIS

59

Figura 4 - Domínios hidrogeológicos no Semiárido e sua respectiva descrição


e potencial hídrico associado.
Fonte: ANA, 2006.

Segundo o Atlas Nordeste (ANA, 2006), os problemas a serem enfrenta-


dos no Semiárido são caracterizados pelos seguintes déficits:
ANOTAÇÕES PESSOAIS Oferta de água insuficiente para o atendimento da demanda de abas-
tecimento humano.

Esta situação se verifica devido à distribuição espacial irregular dos recur-


sos hídricos, à baixa produção hídrica dos mananciais nos períodos de
estiagem, aos conflitos de usos existentes e à deficiência de investimen-
tos para aproveitamento de novos mananciais.

Abastecimento de água intermitente.

Este cenário é provocado pela produção de água bruta em quantidades


inferiores às demandas, em função da precariedade dos sistemas de
captação, adução e tratamento de água e por altos índices de perdas de
60
água.

Ocorrência de águas salobras ou poluídas.

Esta característica das águas do semiárido é devido à precária conserva-


ção das bacias hidrográficas e dos seus recursos hídricos, fazendo com
que tanto a qualidade quanto a quantidade de água sejam diminuídas.

Nesta aula, apresentamos os novos critérios adotados para definição


da área do Semiárido brasileiro, algumas das características do clima e
hidrológicas do Nordeste e a classificação climática, segundo o Índice de
Aridez.

Atividades Propostas
1. Na sua opinião, os critérios utilizados para a nova delimitação do
Semiárido brasileiro é mais coerente? Por quê?

2. Resuma as características climáticas e hidrológicas do Nordeste


brasileiro, observadas nesta aula.

3. O aproveitamento das águas das chuvas pode ser uma boa alterna-
tiva para o suprimento de água no Semiárido? Por quê?

4. Escolha um dos problemas a ser enfrentado no Semiárido, listado


no texto, e relacione-o com ações ou políticas que deveriam ser
adotadas para solucioná-lo ou minimizá-lo.
Bibliografia Recomendada
BRASIL. Agência Nacional de Águas (ANA). A Evolução da gestão dos
recursos hídricos no Brasil = The evolution of water resources management
in Brazil. Brasília: Agência Nacional de Águas, 2002. 64 p. (Edição comemo-
rativa do Dia Mundial da Água).

CIRILO, J.A.; CABRAL, J.J.S.P.; FERREIRA, J.P.C.L.; OLIVEIRA, M.J.P.M.;


LEITÃO, T.E.; MONTENEGRO, S.M.G.L.; GÓES, V.C.. O Uso Sustentável
dos Recursos Hídricos em Regiões Semiáridas. Recife. Editora Universitária
da UFPE, 2007. 508 p.

ANA/MMA. Atlas Nordeste - Abastecimento Urbano de Água. Brasília - DF.


2006 Disponível em: < http://atlas_nordeste.ana.gov.br/atlas_nordeste/ 61
nw_downloads.htm> Acesso em: agosto/2009.

GNADLINGER, J. Captação de Água de Chuva na Região Nordeste do


Brasil. 2000. Disponível em: <http://www.irpaa.org.br/colheita/indexb.htm>
Acesso em: agosto/2009.

SDR/MI. Relatório Final do Grupo de Trabalho Interministerial para Redeli-


mitação do Semiárido Nordestino e do Polígono das Secas. Brasília – DF,
2005.
Aula 05
Introdução à Gestão de Recursos Hídricos:
Conceitos Fundamentais, Política Nacional
e o Sistema de Gerenciamento de Recursos
Hídricos
Nesta aula, iremos tratar dos aspectos legais que compreendem a
gestão dos recursos hídricos. A Política Nacional e o Sistema Nacional Para ter acesso à Política
de Gerenciamento de Recursos Hídricos serão apresentados, para o Nacional de Recursos Hídricos
acesse:
conhecimento da legislação federal que fundamenta a gestão dos corpos
d´água brasileiros. http://www.mma.gov.br/sitio/
index.php?ido=legislacao.
A água, como parte integrante das atividades humanas e elemento index&tipo=4&pag=2&
essencial à vida, é um recurso limitado e, diante disto, torna-se um bem
65
de alto valor econômico e social para o desenvolvimento de um País.

Diante destes fatos, cabe à União e aos Estados a gestão dos recursos
hídricos, como forma de assegurar o uso, controle e proteção das águas,
com vistas ao desenvolvimento sustentável. Para isso, torna-se neces- No endereço abaixo é
sário o estabelecimento de políticas públicas que direcionem as ações disponibilizado o 1º documento
que trata das águas brasileiras, o
governamentais e a criação de órgãos que possam colocá-las em prática.
Código das Águas de 1934.

O objetivo desta aula é conhecer a Política Nacional e o Sistema http://www.semarh.df.gov.br/


Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e estimular o interesse sites/100/162/00000055.pdf
em conhecer o arcabouço legal que ampara o País e os seus Estados, no
tocante à gestão das águas.

Conceitos Fundamentais
Alguns recursos ambientais são razoavelmente administrados, admitin-
do-se a propriedade privada sobre estes. Diferentemente do solo, por
exemplo, a água é um bem fluido e móvel, que lhe confere a caracterís-
tica de fazer toda a sociedade sentir as consequências geradas pelo seu
uso. Assim, para promover o uso, controle e proteção das águas, cabe ao
Poder Público a gestão dos recursos hídricos.

As águas brasileiras são divididas sob dois domínios: são bens da União
(águas federais) os rios, lagos e quaisquer correntes em terrenos de
seu domínio ou que banhem mais de um estado da Federação, sirvam
de limites entre outros países ou se estendam a território estrangeiro ou
dele provenham, bem como de terrenos marginais, e as praias fluviais;
são bens dos Estados as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes,
emergentes ou em depósito, encontradas em seu território. Desta forma,
as esferas federal e estadual se dividem na gestão dos recursos hídricos.

A Gestão de Recursos Hídricos pode ser definida como um conjunto de


atividades que tem como objetivo final a promoção dos usos, o controle e
a proteção dos recursos hídricos. Nessas atividades, estão compreendi-
das a formulação de princípios e diretrizes, a elaboração de documentos
normativos e orientadores, a estruturação de sistemas gerenciais e a
tomada de decisão.

O Plano Nacional de Recursos Dentro deste contexto, é oportuno listar e definir alguns elementos essen-
Hídricos é instrumento essencial
ciais que compreendem a gestão dos recursos hídricos.
para a gestão dos recursos
hídricos. No Brasil, o primeiro
Plano Nacional foi elaborado A gestão dos recursos hídricos deve partir de uma Política adotada pelo
66 em 1985, pelo Departamento órgão gestor, que consiste na definição de princípios doutrinários em
Nacional de Águas e Energia conformidade com as aspirações sociais e/ou governamentais no que diz
Elétrica- DNAEE. Atualmente,
temos um plano que foi aprovado respeito à regulamentação dos usos, controle e proteção das águas.
em janeiro de 2006, por meio da
Resolução nº 58 do Conselho Contudo, para implementação de uma política de recursos hídricos, é
Nacional de Recursos Hídricos necessário um estudo que adeque os usos, o controle e a proteção das
- CNRH.
águas às aspirações sociais e/ou governamentais expressas na Política.
O Plano de Recursos Hídricos é um documento que consolida um pla-
nejamento da utilização, preservação e recuperação da água e viabiliza
sua execução.

Os planos podem ser temáticos e ter uma maior ou menor abrangência


espacial. Sendo assim, temos o Plano Nacional, os estaduais e os de
bacias hidrográficas.

Outro termo que faz parte da gestão dos recursos hídricos é o


Gerenciamento de Recursos Hídricos. Este consiste num conjunto de
ações governamentais, privadas ou comunitárias destinadas a regular os
usos, o controle e a proteção das águas e a avaliar a conformidade da
situação atual com os princípios doutrinários estabelecidos na Política.

As ações governamentais são embasadas nas leis, decretos, reso-


luções, normas e regulamentos. Essas ações definem o Modelo de
Gerenciamento adotado pelo governo, que é a configuração adminis-
trativa para fazer a gestão das águas. Como exemplo, podemos citar o
modelo de gerenciamento que adota a bacia hidrográfica como unidade
administrativa de gestão, em vez de serem adotados limites político-
administrativos (estado, município, etc.).
Para executar a Política das Águas, o governo necessita definir um
arcabouço institucional. Este arcabouço deverá ser constituído de orga-
nismos, agências e instalações governamentais e privadas, definindo,
desta forma, o chamado Sistema de Gerenciamento dos Recursos
Hídricos.

Então, podemos resumir dizendo que a Gestão dos Recursos Hídricos


deve ser constituída de uma Política que estabelece as diretrizes gerais
de um Modelo de Gerenciamento, determina a organização legal e ins-
titucional e um Sistema de Gerenciamento, que reúne os instrumentos
e coloca em prática o planejamento do uso, controle e da proteção das
Segundo Cirilo (2008), a partir
águas (Plano de Recursos Hídricos). da década de 90, implantou-se,
nos Estados, com o suporte da
União e da Lei n.9.433/97, uma
nova filosofia, que se baseia
A Política Nacional de Recursos Hídricos no controle do uso, por meio
de instrumentos como outorga
e da ainda incipiente cobrança 67
Uma política, seja para recursos hídricos ou para qualquer outro recurso, pelo uso da água bruta; planos
deve ser erguida sobre cinco pilares: de recursos hídricos para as
bacias hidrográficas e para
» os objetivos a serem alcançados; os Estados; estruturação de
» os princípios e fundamentos sob os quais deve ser estruturada; entidades gestoras e organismos
» instrumentos ou mecanismos para que possa ser colocada em de bacia; programas de obras
estruturadoras. Segundo o autor,
prática; os maiores avanços na gestão
» um arcabouço legal para lhe dar sustentação; dos recursos hídricos vêm
» instituições para executá-la e fazer o acompanhamento do seu ocorrendo no Nordeste.
cumprimento.
As políticas devem ser moldadas para determinados espaços geográ-
ficos, podendo ser a nível federal ou estadual. As políticas estaduais
devem respeitar a Política Nacional e inserir suas peculiaridades. No
Brasil, a Lei 9.433 (Lei das Águas), de 8 de janeiro de 1997, instituiu a
Política Nacional de Recursos Hídricos e a criação do Sistema Nacional
de Gerenciamento de Recursos Hídricos- SINGREH, regulamentando o
inciso XIX do art. 21 da Constituição Federal.

Antes desse período, alguns estados se lançaram como pioneiros em


suas políticas estaduais. O primeiro estado a possuir uma política pró-
pria para os recursos hídricos sob seu domínio foi São Paulo. A Lei nº
7.663, editada em 1991, estabeleceu normas de orientação à Política
Estadual de Recursos Hídricos, bem como ao Sistema Integrado de
Gerenciamento de Recursos Hídricos.

Na sequência, também estabeleceram suas políticas de recursos hídricos


os Estados do Ceará (1992), Santa Catarina (1994), Rio Grande do Sul
(1994), Bahia (1995), Rio Grande do Norte (1996) e Paraíba (1996).
ANOTAÇÕES PESSOAIS A Figura 1 representa o processo de instituição das políticas estaduais
de recursos hídricos no país. Podemos notar claramente que o processo
foi marcado por dois períodos distintos: um período “pós” Constituição
Federal e outro período “pós” Lei das Águas.

68

Figura 1- Processo de instituição das políticas estaduais de recursos hídricos.


Fonte: ANA, 2009.

Observando o período anterior à Lei nº 9.433/97, podemos notar que, nos


anos seguintes, houve um grande avanço no processo de instituição das
políticas estaduais de recursos hídricos. O último estado a fazer parte
deste universo foi o Estado de Rondônia, com a edição da sua Política de
Recursos Hídricos. Atualmente, todas as unidades da federação brasileira
possuem suas próprias políticas para o setor.

Outro aspecto importante na formulação das políticas estaduais de


recursos hídricos é que ela deve seguir o princípio da descentralização,
ou seja, deixar para os comitês de bacias as questões particulares e de
interesse das diferentes bacias hidrográficas. Não podemos esquecer
que o Brasil é um país imenso e, com isso, prevalecem as diferenças nos
aspectos hidrológicos, culturais e econômicos.

Na Figura 2, é apresentado, sob outro ângulo, o avanço da instituição


das políticas estaduais de recursos hídricos no Brasil, cujo marco foi o
estabelecimento da Política Nacional. Notamos que, durante e após o
ano de 1997, os estados utilizaram a Política Nacional como referência,
contribuindo para que tenham forte alinhamento técnico-ideológico, mas,
por outro lado, esquecendo de inserir as peculiaridades regionais nas
políticas estaduais.
Todas as leis estaduais, até
julho de 2000, consideraram
a água como bem econômico
e estabeleceram mecanismos
para sua cobrança. Ressalta-se
que o fato de ser adotado este
fundamento na Política de um
estado, não necessariamente
implica que a cobrança deva
ser efetuada a toda e qualquer
quantidade de água bruta
retirada, em qualquer tempo e
em qualquer lugar. Há alguns
estados brasileiros, como o
Amazonas e o Pará, onde a água
ainda não é um bem escasso.
Muitos estados têm colocado 69
limites mínimos de retirada,
Figura 2- Avanço da instituição de políticas estaduais de recursos hídricos. abaixo da qual não incide
Fonte: ANA, 2009. qualquer taxa de cobrança.

A Lei 9.433/97, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos e a


criação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos-
SINGREH, é uma lei muito importante para direcionar as políticas
estaduais de recursos hídricos no País. Essa Lei é focada nos princípios A Lei 9.433/97 é menos rigorosa
que o Código das Águas quanto
básicos praticados em todos os países que avançaram na gestão de ao aspecto do uso prioritário.
recursos hídricos. A Lei estabelece a prioridade
em situação de escassez (ver
Tal Lei contempla, entre outros capítulos, os fundamentos, os objetivos, Fundamento III), enquanto que o
as diretrizes gerais de ação e os instrumentos capazes de estabelecer a Código estabelece a prioridade
em qualquer hipótese. Desta
Política Nacional de Recursos Hídricos para o País. forma, a Política Nacional dá
margem para que se defina em
Abaixo seguem alguns desses capítulos que norteiam a gestão da água. que situação fica caracterizada a
escassez.

Fundamentos
A Lei, seguindo os rigores técnicos para o estabelecimento de uma
Política, foi construída sob os seis fundamentos a seguir:

Fundamento I - Do Domínio das Águas

A Política Nacional de Recursos Hídricos estabelece que a água é um


bem de domínio público, ratificando a Constituição Brasileira de 1988.
Há alguns que dizem ser desnecessária esta repetição, e, por outro lado,
outros encaram a repetição como uma ênfase que se dá ao assunto e
que resulta numa melhor estrutura do texto constitucional.

Fundamento II - Do Valor Econômico das Águas


A administração dos problemas A Lei 9.433/97 estabelece que a água é um recurso limitado e dotado de
dos recursos hídricos no Brasil,
considerando os limites da bacia
valor econômico. Além disso, estabelece a cobrança de água bruta com
hidrográfica, não é uma tradição. os seguintes objetivos: a) reconhecer a água como bem econômico; b)
Até a década de 70, as questões dá ao usuário uma indicação de seu real valor; c) incentivar a racionaliza-
relacionadas às águas eram ção do seu uso e d) obter recursos financeiros para o financiamento de
tratadas a partir dos objetivos de
subsetores de usuários ou de programas formulados nos planos de recursos hídricos.
políticas específicas de combate
às secas ou inundações. A
partir desta época, entretanto,
começaram a surgir sérios Fundamento III - Do Uso Prioritário
conflitos de uso da água,
70 desencadeando um processo de Este fundamento estabelece que, em situação de escassez, o uso
discussões nos meios acadêmico
e técnico-profissional quanto prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação
à forma de minimizar esses de animais. Este princípio consta no Código das Águas de 1934, no seu
problemas. Os conflitos não só Artigo 36, o qual estabelece que, quando o “uso depende de derivação,
envolviam diferentes setores
de usuários, como, também, os
em qualquer hipótese, terá preferência aquela para o abastecimento das
interesses de unidades político- populações”.
administrativas distintas (estados
e municípios). Nesta época, o
poder estava muito concentrado
na esfera federal e, partindo dos Fundamento IV - Dos Usos Múltiplos das Águas
próprios técnicos do Governo
Federal, tomou-se a iniciativa
de criar estruturas para gestão
A Política Nacional estabelece que a gestão dos recursos hídricos deve
dos recursos hídricos por bacias sempre proporcionar o uso múltiplo das águas. Este é um princípio de
hidrográficas. caráter técnico que tem por finalidade maximizar os usos da água.
Como exemplo de eventos
Analisando o fundamento anterior, podemos dizer que a palavra sempre
hidrológicos críticos, de origem
natural ou decorrentes do poderá ser forte demais, pois pode haver situações de escassez em que
uso inadequado dos recursos um uso prioritário tenha que ser estabelecido, em detrimento de todos os
hídricos, podemos citar as secas outros conflitantes. Nestas situações, os usos múltiplos seriam restritos
e inundações severas que
atingem determinadas regiões àqueles que não fossem conflitantes com o uso prioritário para abasteci-
do País. mento humano.

Fundamento V - Da Unidade de Gestão das Águas

A Lei 9.433/97 estabelece como unidade de gestão dos recursos hídricos


a bacia hidrográfica para implementação da Política Nacional e a atuação
do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.
Podemos observar que a Lei não utilizou o termo “bacia hidrográfica” ANOTAÇÕES PESSOAIS
como unidade de gestão, sempre presente nos meios técnicos, mas
utilizou o termo como unidade territorial para implementação da Política
Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de
Gerenciamento de Recursos Hídricos.

Fundamento VI - Da Gestão Descentralizada das Águas

Neste último fundamento, a Lei 9.433/97 estabelece que a gestão dos


recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação
do Poder Público, dos usuários e das comunidades.

Dependendo do que a União, o Estado, os municípios, os usuários e as


organizações civis escolherem, a gestão deve ser totalmente pública
ou mista (pública e privada). Entretanto, não poderá ser privada, pois
71
os Poderes Públicos Federal e dos Estados, conforme a dominialidade,
deverão exercer o controle dos usos da água através da outorga e dos
direitos de uso, conforme artigos 11, 29, II e 30, I da Lei 9433/97.

Objetivos
Os objetivos devem estar apresentados de forma clara e objetiva numa
Política. No caso da Política Nacional de Recursos Hídricos, são estabe-
lecidos os seguintes objetivos:

I - assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade


de água, em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos;

II - a utilização racional e integrada dos recursos hídricos, incluindo o


transporte aquaviário, com vistas ao desenvolvimento sustentável;

III - a prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem


natural ou decorrentes do uso inadequado dos recursos naturais.

Instrumentos
Os instrumentos dão força à gestão dos recursos hídricos, indicando os
meios pelos quais a política pode ser exercida.
A Política Nacional de Recursos Hídricos define seis instrumentos para a
gestão dos recursos hídricos:

I - Os planos de recursos hídricos;


II - O enquadramento dos corpos d´água em classes;
Durante os seus dez anos de III - A outorga dos direitos de uso dos recursos hídricos;
existência, entre 1998 e 2007,
o CNRH já se reuniu 39 vezes, IV - A cobrança pelo uso dos recursos hídricos;
sendo 18 ordinariamente e 21
extraordinariamente. Aprovou V - A compensação a municípios;
83 Resoluções, tanto relativas à
sua estrutura e funcionamento VI - Os sistemas de informações em recursos hídricos.
quanto relativas à implementação
do Sistema e da Política
Nacional de Recursos Hídricos.
Neste mesmo período, o CNRH Diretrizes de Ação
também aprovou 44 Moções
relativas, principalmente, a A Lei 9.433/97 estabeleceu as seguintes diretrizes gerais de ação para
recomendações e solicitações
72
dirigidas a outros órgãos das implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos:
esferas nacional e estaduais
para fortalecimento do Sistema I - A gestão sistemática dos recursos hídricos, sem dissociação dos
e implementação da Política aspectos de quantidade e qualidade;
Nacional de Recursos Hídricos.
(ANA, 2009) II - A adequação da gestão de recursos hídricos às diversidades físicas,
bióticas, demográficas, econômicas, sociais e culturais das diversas
regiões do País;
III - A integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental;
IV - A articulação do planejamento de recursos hídricos com o dos seto-
Para conhecer mais sobre o res usuários e com os planejamentos regional, estadual e nacional;
CNRH, acesse o site http://www.
cnrh.gov.br/sitio/ e encontre V - A articulação da gestão de recursos hídricos com a do uso do solo;
vários links interessantes.
VI - A integração da gestão das bacias hidrográficas com a dos sistemas
estuarinos e zonas costeiras.

Vale ressaltar que o estabelecimento de diretrizes é ponto comum em


Sistema estuarino refere-se a
áreas de transição entre o rio e
todas as políticas estaduais de recursos hídricos do Brasil.
o mar. Já o termo zona costeira
corresponde à área de transição Em resumo, podemos dizer que a Lei das Águas promoveu uma des-
entre o continente e o mar. centralização da gestão pública: da sede do Poder Público para a esfera
local da bacia hidrográfica. Ela também permite uma maior atuação dos
usuários de água e da sociedade civil organizada, fazendo parcerias
com o Poder Público na gestão dos recursos hídricos. A Lei passou a
compartilhar o poder decisório com os Comitês de Bacias Hidrográficas
e os Conselhos Nacional e Estaduais de Recursos Hídricos. Quanto
à cobrança, a Lei 9.433/97 delega às futuras Agências de Águas dos
Estados proceder à cobrança pelo uso da água, mas ainda mantém com
o Poder Público a outorga do direito de uso.

O Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos


Hídricos- SINGREH
A organização institucional para a gestão das águas tem evoluído con-
sideravelmente em muitos países, inclusive no Brasil. À medida que a À exceção do Estado de
São Paulo, onde o Conselho
demanda pela água aumenta, os conflitos tornam-se intensos e surge Estadual de Recursos Hídricos
a necessidade de planejar e coordenar a repartição das disponibilida- foi criado antes da Constituição
des hídricas para atendimento aos vários usos. Neste ponto, tornam-se Federal de 1988 e da própria
imprescindíveis novas leis e estruturas organizacionais que assegurem a Política Estadual de Recursos
Hídricos, nas demais unidades
gestão da água numa perspectiva global. da Federação, a criação dos
CERHs seguiu a mesma lógica
O Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH) da implementação das Políticas 73
é formado por um conjunto de órgãos e entidades que atuam na ges- Estaduais de Recursos Hídricos,
ou seja, seis estados já haviam
tão dos recursos hídricos no Brasil. O SINGREH foi instituído pela Lei criado seus conselhos de
9.433/97, em obediência ao inciso XIX do Artigo 21 da Constituição recursos hídricos antes e os
Federal, segundo o qual compete à União instituir o Sistema Nacional outros 17 estados e o Distrito
de Gerenciamento de Recursos Hídricos, assim como definir critérios de Federal, após a edição da Lei n.
9.433/97, mostrando novamente
outorga de direito de uso da água. a importância da gestão de
recursos hídricos no âmbito
Não há um “Sistema Federal de Recursos Hídricos” e um “Sistema nacional para o desenvolvimento
Estadual de Recursos Hídricos” isolados e com regras não convergentes. da gestão nas demais unidades
da Federação (ANA, 2009).
Os órgãos e entidades que lidam com a gestão dos recursos hídricos
nos Estados e no Distrito Federal poderão adaptar estas instituições às
suas peculiaridades, respeitando as características gerais do “Sistema
Nacional” e dos comitês e agências colocadas na Lei 9.433/97.

Na Política Nacional, são citados como objetivos do SINGREH:


1. coordenar a gestão integrada das águas;
2. arbitrar administrativamente os conflitos relacionados com os recur-
sos hídricos;
3. implementar a Política Nacional de Recursos Hídricos;
4. planejar, regular e controlar o uso, a preservação e a recuperação
dos recursos hídricos;
5. promover a cobrança pelo uso de recursos hídricos.
A Figura 3 apresenta um esquema da organização institucional do
SINGREH. Neste esquema, também é possível verificar as atribuições de
cada entidade e sua esfera de atuação.

Os três únicos estados


brasileiros que não possuem
Conselho Estadual de Recursos
Hídricos encontram-se na região
Norte. São eles: Rondônia,
Acre e Amapá, sendo também
os últimos a possuir legislação
específica para recursos hídricos.
Vale ressaltar que, na Legislação
de Recursos Hídricos do Estado
do Acre, não é prevista a criação
de Conselho Estadual, cabendo
ao Conselho Estadual de Meio Figura 3- Esquema da organização do SINGREH, de acordo com o âmbito de atuação.
Ambiente o papel normativo e
74 deliberativo. O SINGREH é composto pelos seguintes órgãos:
» Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) - órgão con-
sultivo e deliberativo que tem a função de atuar na formulação da
Política Nacional de Recursos Hídricos. O CNRH teve sua regu-
lamentação e instalação com o Decreto 2.612, de 06 de junho de
1998.
Este Conselho atua como um fórum em que se compatibilizam os
interesses dos três níveis de governo com os da sociedade civil e
dos usuários de água.

O CNRH é composto por representantes dos governos federal e


estaduais que atuam no gerenciamento ou no uso de recursos hídri-
cos, os usuários de água (geradores de energia elétrica, irrigação,
indústrias, saneamento, pesca, transporte hidroviário, etc.) e as
organizações civis de recursos hídricos (consórcios e associações
intermunicipais, organizações técnicas e de ensino e pesquisa, com
interesse na área de recursos hídricos e organizações não governa-
mentais).

O presidente do Conselho é o ministro de Meio Ambiente e o cargo


de secretário executivo é ocupado pelo Secretário de Recursos
Hídricos e Ambiente Urbano do Ministério do Meio Ambiente.

O Conselho Nacional de Recursos Hídricos é a instância máxima do


SINGREH, sendo um dos grandes responsáveis pela implementa-
ção da gestão dos recursos hídricos no País.
Secretaria Executiva do Conselho Nacional de Recursos
Hídricos - órgão que integra a estrutura do Ministério do Meio
Ambiente e atualmente é exercida pela Secretaria de Recursos
Hídricos e Ambiente Urbano (SRHU/MMA).

Esta Secretaria presta o apoio técnico, administrativo e financeiro Nos rios de domínio da União,
necessários à operacionalização do CNRH. os comitês de bacia hidrográfica
são criados por decreto do
Presidente da República. Nos
rios de domínio estadual, os
» Agência Nacional de Águas (ANA) - autarquia que tem como
comitês são criados conforme
sua principal atribuição a implementação da Política Nacional dispuserem as respectivas leis
de Recursos Hídricos e a coordenação do Sistema Nacional de estaduais de recursos hídricos.
Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH). A ANA foi criada Já foram criados e estão em
plena atividade os comitês das
pela Lei n. 9.984/2000 e instalada pelo Decreto 3.692, de 19 de bacias hidrográficas dos rios
dezembro de 2000. Paraíba do Sul, São Francisco,
Doce, Piracicaba/Capivari/
Jundiaí e Verde Grande. Vários
» Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito 75
outros estão em fase de criação
Federal (CERHs) - órgãos com funções de caráter normativo e (Revista Plenarium /2006).
deliberativo semelhantes ao CNRH.

Os CERHs são instâncias máximas nas esferas estaduais dos siste-


mas estaduais de gerenciamento de recursos hídricos. Atualmente,
existem 24 conselhos instituídos e atuando no país. Sua composi- Desde o ano de 2001, quando
iniciou suas atividades, até o
ção é variável, de acordo com as especificidades de cada Estado. ano de 2007, a ANA já teve
Seus conselheiros são representantes de secretarias estaduais e 3.425 resoluções aprovadas
municipais, usuários de água e representantes da sociedade civil e publicadas, em sua grande
maioria referentes a concessões
organizada.
de outorgas de direito de uso
de recursos hídricos, além das
referentes aos certificados de
» Órgãos Gestores Estaduais - a estes órgãos cabe a tarefa de avaliação da sustentabilidade
outorgar e fiscalizar o uso dos recursos hídricos em rios de domínio da obra hídrica (CERTOH)
dos estados. e às declarações de reserva
de disponibilidade hídrica,
Cabe a cada Estado atribuir ou não a uma secretaria específica a fundamentais para a adequada
gestão das águas, sendo a criação da secretaria de recursos hídri- aplicação de recursos do
Governo Federal e garantia de
cos dependente da Política Estadual adotada pelo Governo.
manutenção dos usos múltiplos
da água, respectivamente (ANA,
Atualmente, muitos Estados brasileiros possuem a SRH como 2009).
órgão gestor. Em outros, a gestão das águas é encarada como mais
uma das subdivisões de um órgão de meio ambiente. Contudo, é
na Política Estadual que o Governo institui os órgãos e entidades
que compõem o Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos
Hídricos.
» Comitê de Bacia – integrante do SINGREH, é considerado o
“Parlamento das Águas”, isto é, local onde são discutidas e avalia-
das as questões relacionadas à gestão dos recursos hídricos.
Outro ponto importante a comentar é que os comitês de bacia
hidrográfica podem ter como área de atuação a totalidade de uma
Cabe às Agências propor ao
respectivo ou respectivos bacia hidrográfica, uma sub-bacia hidrográfica (correspondente a
Comitês de Bacia Hidrográfica: um afluente de rio principal de uma bacia hidrográfica) ou um grupo
de bacias ou sub-bacias hidrográficas contíguas.
a) o enquadramento dos corpos
de água nas classes de uso, para
encaminhamento ao respectivo
O comitê tem como objetivo a gestão participativa e descentralizada
Conselho Nacional ou Conselhos dos recursos hídricos, por meio da implementação de instrumentos
Estaduais de Recursos Hídricos, técnicos de gestão, de negociação de conflitos e de promoção dos
de acordo com o domínio destes; usos múltiplos da água na bacia hidrográfica.
b) os valores a serem cobrados
pelo uso de recursos hídricos; Os Comitês de Bacia Hidrográfica são compostos por represen-
tantes da União, dos Estados e do Distrito Federal cujos territórios
76 c) o plano de aplicação dos se situem, ainda que parcialmente, em suas respectivas áreas de
recursos arrecadados com a
cobrança pelo uso de recursos atuação; por membros dos Municípios situados, no todo ou em
hídricos; parte, em sua área de atuação; por usuários das águas de sua área
de atuação e, por fim, por representantes das entidades civis de
d) o rateio de custo das obras de
uso múltiplo, de interesse comum
recursos hídricos com atuação comprovada na bacia.
ou coletivo. » Agência de Bacia - escritório técnico do Comitê de Bacia, funcio-
nando como secretaria executiva do respectivo comitê.

O Capítulo IV do Título II da Lei das Águas trata das Agências de Água


Atualmente são 149 comitês de ou, como é conhecida, Agência de Bacia. De acordo com a Lei, ela terá
bacia existentes no país. Destes, a mesma área de atuação de um ou mais Comitês de Bacia Hidrográfica
141 foram criados em âmbito
estadual. No ano de 2007, foram
e sua criação será autorizada pelo Conselho Nacional de Recursos
criados seis comitês de bacia: Hídricos ou pelos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, mediante
CBHs do rio Guandu, Santa solicitação de um ou mais Comitês de Bacia Hidrográfica.
Maria da Vitória, e do rio Jucu,
no estado do Espírito Santo; A criação de uma Agência de Água é condicionada ao atendimento dos
CBH dos rios Jaguari/Piracicaba,
em Minas Gerais; CBH do rio seguintes requisitos:
Capibaribe, em Pernambuco;
e CBH do rio Japaratuba, em I - Prévia existência do respectivo ou respectivos Comitês de Bacia hidro-
Sergipe (ANA, 2009). gráfica;
II - Viabilidade financeira assegurada pela cobrança do uso dos recursos
hídricos em sua área de atuação.

Notamos pela Lei 9.433/97 que as Agências de Águas devem ser autos-
sustentáveis financeiramente. Sendo assim, sua viabilidade financeira
não pode ser buscada no orçamento da União, dos Estados e dos
Municípios.
Outro ponto importante está no seu art. 51: “Os consórcios e associações
intermunicipais de bacias hidrográficas mencionadas no art. 47 poderão
receber delegação do CNRH ou dos Conselhos Estaduais por prazo
determinado, para o exercício de competência das Agências de Águas,
enquanto esses organismos não estiverem constituídos”.

Justamente, devido ao fato de as Agências de Água não terem sido


regulamentadas pelo Governo Federal, está sendo adotada uma solução Atualmente, encontram-se
alternativa. Em junho de 2004, foi regulamentada a Lei 10.881/04, que instaladas e cumprindo contrato
de gestão com a ANA as
possibilita que as funções de Agências de Águas sejam exercidas por seguintes entidades delegatárias:
“entidades delegatárias”. Associação Pró-Gestão das
Águas da Bacia Hidrográfica do
Essas entidades devem ser enquadradas entre aquelas previstas no art. Rio Paraíba do Sul (Agevap),
no Comitê da Bacia Hidrográfica
47 da Lei 9.433/97:
do Rio Paraíba do Sul;
Consórcio Intermunicipal das
I - Consórcios e associações intermunicipais de bacias hidrográficas;
Bacias Hidrográficas dos Rios
II - Associações regionais, locais ou setoriais de usuários de recursos Piracicaba, Capivari e Jundiaí 77
- Consórcio PCJ, nos Comitês
hídricos; dos rios Piracicaba, Capivari e
III - Organizações técnicas e de ensino e pesquisa com interesse na área Jundiaí. Existem ainda outras
entidades exercendo papéis
de recursos hídricos; de agências nos estados de
IV - Organizações não governamentais com objetivos de defesa de inte- Santa Catarina (Agência de
Água do Vale do Itajaí), São
resses difusos e coletivos da sociedade; Paulo (Fundação Agência da
V - Outras organizações reconhecidas pelo Conselho Nacional ou pelos Bacia Hidrográfica do Alto Tietê
e Fundação Agência da Bacia
Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos. do Médio Tietê/Sorocaba) e
Minas Gerais (Agência de Bacia
Todas estas são organizações civis sem fins lucrativos e deverão ser indi- do Rio Araguari, Agência Peixe
cadas pelos comitês e poderão ser qualificadas pelo Conselho Nacional Vivo - Bacia do Rio das Velhas e
de Recursos Hídricos (CNRH) para o exercício das atribuições legais da Agência dos Afluentes Mineiros
dos Rios Mogi-Guaçu e Pardo).
Agência. As entidades delegatárias possuem as mesmas competências Contudo, algumas dessas
das Agências de Água, exceto efetuar cobrança (inciso VI do art. 2º da “agências” não são reconhecidas
Lei 10.881/04). pelos órgãos gestores dos
estados onde estão instaladas,
Em resumo, podemos dizer que, com a Lei das Águas, a implementação relegando-se a um papel
diferente do preconizado para as
do Conselho Nacional de Recursos Hídricos e com a criação da ANA Agências de Água (ANA, 2009).
(Agência Nacional da Água), houve um grande avanço no arcabouço
institucional, em nível federal, nos últimos anos, com relação a recursos
hídricos.

Nos Estados, observa-se movimento semelhante com a aprovação das


legislações estaduais e o estabelecimento de sistemas de gerenciamento
por meio da criação de instituições estaduais. Alguns estados já deram
partida na criação de Comitês e Agências de Bacias, devido ao impor-
tante papel que é conferido a estas duas instâncias na nova Lei.
ANOTAÇÕES PESSOAIS Há de se reconhecer, no entanto, que as primeiras experiências não
têm mostrado resultados alentadores. Há grandes desafios envolvendo,
principalmente, a capacitação e o financiamento. Atualmente, os Comitês
existentes enfrentam dificuldades, tais como: (a) capacidade incipiente
de decisão; (b) falta de recursos para implementar decisões; (c) falta de
pessoal permanente para implementação das decisões, entre outros.

Nesta aula, apresentamos alguns conceitos/termos fundamentais que


compreendem a gestão dos recursos hídricos, assim como, os funda-
mentos, os objetivos, as diretrizes de ação e os instrumentos de gestão
previstos na Política Nacional e o conjunto de órgãos que formam o
Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos do Brasil.

Atividades Propostas
78
1. De acordo com os conceitos apresentados, diferencie o termo ges-
tão e gerenciamento de recursos hídricos.

2. Selecione da Política Nacional de Recursos Hídricos um fundamento


que você julgue essencial e justifique sua inserção na lei de recur-
sos hídricos do seu estado.

3. Pesquise, na Política de Recursos Hídricos do seu Estado, os


instrumentos de gestão estabelecidos. Verifique se são os mesmos
listados na Política Nacional.

4. Pesquise, na Política de Recursos Hídricos do seu Estado, os


setores e elabore um fluxograma com os órgãos que compõem o
Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Verifique
a composição do Conselho Estadual de Recursos Hídricos.

5. Pesquise e liste os comitês de bacia hidrográfica existentes no


âmbito do seu Estado

Bibliografia Recomendada
BRASIL. Agência Nacional de Águas (ANA). Conjuntura dos Re-
cursos Hídricos no Brasil 2009. Brasília. 2009. 204 p. Disponível
em: <http://www.ana.gov.br/AcoesAdministrativas/CDOC/Catalogo_
imgs/2009/20090417_Conjuntura_dos_recursos_hidricos_no_Brasil_2009.
pdf> Acesso em: maio/09.
BRASIL. Senado Federal. Lei Federal nº 9.433/97. Brasília, DF. 1997.
Institui a Política de Recursos Hídricos, cria o Sistema Nacional de Gerencia-
mento de Recursos Hídricos, regulamenta o inciso XIX do art. 21 da Consti-
tuição Federal e altera o art. 1º da Lei 8.001, de 13 de março de 1990, que
modificou a Lei 7.990, de 28 de dezembro de 1989. Disponível em:< http://
www.mma.gov.br/sitio/index.php?ido=legislacao.index&tipo=4&pag=2& >
Acesso em: junho/09.

BRASIL. Senado Federal. Lei Federal nº 9.984/00. Brasília, DF. 2000.


Dispõe sobre a criação da Agência Nacional de Água - ANA, entidade federal
de implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e de coorde-
nação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, e dá
outras providências. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
Leis/L9984.htm> Acesso em: junho/09.

BRASIL. Senado Federal. Lei Federal nº 10.881/04. Brasília, DF. 2004.


Dispõe sobre os contratos de gestão entre a Agência Nacional de Águas e
entidades delegatárias das funções de Agências de Águas relativas à gestão 79
de recursos hídricos de domínio da União e dá outras providências. Dis-
ponível em: < http://www.ana.gov.br/gestaorechidricos/agenciasagua/docs/
lein10881-04.pdf > Acesso em: julho/09.

CAMPOS, N.; STUDART, T (Org.). Gestão de águas: princípios e


práticas. Porto Alegre: ABRH, 2003. 242 p.

CIRILO, J. A. Políticas públicas de recursos hídricos para o semiárido.


Estudos Avançados, São Paulo, vol. 22, n. 63, 2008, p. 61-82. Dis-
ponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-
40142008000200005> Acesso em: junho/09.

LANNA, A. E. Gestão das águas. Texto da disciplina Gestão de Recur-


sos Hídricos. IPH/UFRGS. 1999, 235 p. (texto não publicado).

REVISTA PLENARIUM. Câmara dos Deputados. Brasília. Coordenação de


Publicações. 2006. Ano III, n. 3 (set. 2006). 343 p. Disponível em: < http://
apache.camara.gov.br/portal/arquivos/Camara/internet/publicacoes/edicoes/
plenarium3> Acesso em: julho /2009.

SETTI, Arnaldo Augusto. Legislação para uso dos recursos hídricos. In:
SILVA, D. D.; PRUSKI, F. F. (Org.). Gestão de recursos hídricos:
aspectos legais, econômicos e sociais. Brasília: Ministério do
Meio Ambiente; Viçosa: Universidade Federal de Viçosa e Porto Alegre:
Associação Brasileira de Recursos Hídricos, 2000. p. 203-226.

TUCCI, C. E. M.; HESPANHOL, I. Gestão da água no Brasil. Brasília:


UNESCO, 2001. 156 p.
Aula 06
Comitês de Bacias Hidrográficas, Outorga e
Cobrança pelo Uso da Água e Planos
de Bacias
Nos rios de domínio da União,
Nesta aula, continuaremos com a apresentação de aspectos legais da os comitês de bacia hidrográfica
gestão dos recursos hídricos, abordados na aula anterior. Inicialmente, são criados por decreto do
Presidente da República. Nos
trataremos dos comitês de bacias hidrográficas, como um dos órgãos rios de domínio estadual, os
integrantes do Sistema Nacional de Gerenciamento, e, posteriormente, comitês são criados conforme
abordaremos a outorga e cobrança pelo uso da água e os planos de dispuserem as respectivas leis
estaduais de recursos hídricos.
bacias, como instrumentos previstos na Política Nacional de Recursos
Já foram criados e estão em
Hídricos. plena atividade os comitês das
bacias hidrográficas dos rios
A Lei das Águas trouxe grandes mudanças na forma de administrar os Paraíba do Sul, São Francisco,
recursos hídricos. A gestão descentralizada por bacia hidrográfica e o Doce, Piracicaba/Capivari/
Jundiaí e Verde Grande. Vários
reconhecimento do valor econômico da água são fundamentos sobre os outros estão em fase de criação.
quais a Lei foi erguida e que norteiam a Política Nacional. Além disso, (Revista Plenarium /2006)
a nova Lei criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos
Hídricos, assegurando, desta forma, a implementação da Política adotada 83
para a gestão da água no Brasil.

Os objetivos desta aula são conhecer alguns aspectos legais e despertar,


no aluno, o interesse em aprofundar o conhecimento sobre a legislação
brasileira de recursos hídricos, no que diz respeito à importância da
atuação dos comitês de bacias hidrográficas e à aplicabilidade dos instru-
mentos de gestão.

Comitês de Bacias Hidrográficas


Tomando o modelo francês como fonte de inspiração, o gerenciamento
de recursos hídricos, através da atuação de comitês, teve início em
1978, quando foi criado o Comitê Especial de Estudos Integrados de
Bacias Hidrográficas – Ceeibh. Esse comitê tinha como objetivo o
“acompanhamento da utilização racional dos recursos hídricos das
bacias hidrográficas, no sentido de obter o aproveitamento múltiplo de
cada uma, e minimizar as consequências nocivas à ecologia da região”
(Portaria n.º 90, de 29 de março de 1978, MME/MINTER).

Os comitês criados a partir deste período eram constituídos apenas por


entidades públicas e eram órgãos auxiliares do Ceeibh. A partir deste
período também foram criados diversos comitês para integração das
ações de órgãos públicos no âmbito do Ceeibh, entre os quais podemos
destacar os comitês das bacias hidrográficas dos rios Paraíba do Sul,
São Francisco, Doce, Grande, Mogi-Guaçu e Paranapanema.

Atualmente são 149 comitês de Diante das pressões exercidas pelos governos estaduais e a sociedade
bacia existentes no país. Destes,
civil organizada, o Governo Federal criou comitês em três grandes
141 foram criados em âmbito
estadual. No ano de 2007, foram bacias hidrográficas brasileiras: Paraíba do Sul, Alto Paraguai-Pantanal e
criados seis comitês de bacia: Piranhas-Açu.
CBHs do rio Guandu, Santa
Maria da Vitória e do rio Jucu, A Lei das Águas (9.433/97), que instituiu a Política Nacional e criou o
no estado do Espírito Santo;
CBH dos rios Jaguari/Piracicaba,
Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH),
em Minas Gerais, CBH do rio foi marco fundamental na implementação dos Comitês de Bacias
Capibaribe, em Pernambuco; Hidrográficas no Brasil.
e CBH do rio Japaratuba, em
Sergipe. (ANA, 2009) O SINGREH tem, conforme visto na aula 5, os comitês de bacias hidro-
gráficas como um dos integrantes do Sistema.

Podemos dizer que o comitê de bacia constitui-se no “Parlamento das


Águas”, sendo uma entidade de caráter descentralizado, participativo e
84 democrático, onde o governo, a sociedade civil e os usuários de recur-
sos hídricos buscam a negociação de conflitos e a promoção dos usos
múltiplos da água na bacia. Também cabe aos comitês promover a con-
servação e recuperação dos corpos d’água e garantir a utilização racional
e sustentável dos recursos hídricos.

Na Lei 9.433/97, existem dois tipos de comitês: Comitês de Bacia


Hidrográfica de rios de domínio da União e de rios de domínio estadual.
São compostos por uma variedade de atores, que podemos resumir em
três grandes grupos: representantes do governo, usuários de águas e
a sociedade civil organizada, todos com importante papel nas decisões
tomadas pelo comitê.

Na Figura 1, podemos constatar que os marcos legais voltados à gestão


participativa dos recursos hídricos influenciaram a instalação de comitês
de bacia.
ANOTAÇÕES PESSOAIS

Figura 1- Evolução dos comitês estaduais e interestaduais de bacias


Fonte: ANA, 2009.

O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos, no Rio Grande do


Sul, foi o primeiro a ser criado no Brasil, em 1988, em plena Assembleia
Nacional Constituinte. Neste período, não havia legislação que ancorasse
a gestão participativa das águas no País.

Em relação à criação de comitês estaduais, nota-se um avanço após 85


a Constituição de 1988, mas precisamente a partir de 1991, quando o
Estado de São Paulo criou o seu sistema de gerenciamento de recursos
hídricos.

Entre os anos de 1991 e 1997, novos comitês surgiram, de forma mais


discreta, aumentando de modo mais acentuado nos anos seguintes,
devido ao processo de estruturação legal e institucional dos estados
brasileiros nessa área.

Com a criação da ANA em 2000, o processo de criação de comitês de


bacia ganha forças, principalmente em bacias de rios interestaduais,
passando de 1 para 7 CBHs, no período de 2000 a 2003.

Na Figura 2, é apresentado o cenário dos comitês de bacias hidrográficas


até o ano de 2007. Note que as regiões Sul, Sudeste e Nordeste estão na
frente das outras regiões do Brasil.
86
Figura 2- Comitês de bacias existentes no Brasil até 2007.
Fonte: ANA, 2009.

Outorga e Cobrança pelo Uso da Água


A Constituição de 1988 estabeleceu que as águas de lagos, rios e as
Agência de Bacia é o escritório águas subterrâneas constituem bens da União ou dos Estados e, por esta
técnico do Comitê de Bacia,
razão, qualquer intervenção que se deseje fazer em um corpo de água é
funcionando como secretaria
executiva do respectivo comitê. passível de autorização por parte do Poder Público competente.

Posterior a Constituição, a Lei das Águas estabeleceu que a Outorga de


Direito de Uso de Recursos Hídricos é um dos instrumentos de gestão
e tem como objetivos assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos
usos da água e o efetivo exercício dos direitos de acesso à mesma.

A outorga constitui-se de uma autorização emitida pelo Poder Público


(União, Estados ou Distrito Federal) ao outorgado (usuário de água),
para que possa utilizar o recurso hídrico nos termos e condições expres-
sas nesta autorização. Ela é um instrumento necessário à gestão dos
recursos hídricos, porque permite ao Poder Público exercer o controle da
quantidade e qualidade da água, fazendo com que os usos sejam efetu-
ados de forma organizada e sustentável. Além disso, a outorga diminui
os conflitos entre os usuários, assim como evita impactos ambientais
negativos aos corpos hídricos.
Segundo a Lei 9.433/97, estão sujeitos à outorga os seguintes usos de
recursos hídricos:
» Derivação ou captação de parcela da água existente em um corpo
de água para consumo final, inclusive abastecimento público, ou
insumo de processo produtivo;
» Extração de água de aquífero subterrâneo para consumo final ou
insumo de processo produtivo;
» Lançamento em corpo de água de esgotos e demais resíduos Atualmente, a ANA define como
líquidos ou gasosos, tratados ou não, com o fim de sua diluição, insignificante os usos com
transporte ou disposição final; vazões de captação máximas
instantâneas inferiores a 1,0 L/s
» Aproveitamento dos potenciais hidrelétricos; ou 3,6m3/h. Vale ressaltar que
» Outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da essas definições deverão passar
água existente em um corpo de água. pelo CNRH para serem ou não
aprovadas.
Também é objeto desta Lei declarar os usos que independem de outorga
pelo Poder Público. Os quais são:
» O uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de
pequenos núcleos populacionais, distribuídos no meio rural;
» As derivações, captações e lançamentos considerados É necessário fazer uma
insignificantes; diferenciação entre uso 87
consuntivo e não consuntivo.
» As acumulações de volumes de água consideradas insignificantes. O primeiro refere-se àquele
É importante frisar que a obrigatoriedade da outorga para estes usos é uso em que a água é
utilizada, diminuindo-se sua
eliminada na Lei, mas não a necessidade e responsabilidade de compu- disponibilidade, seja quantitativa
tá-la, pois um conjunto de usos insignificantes pode tornar-se significativo ou qualitativamente. Podemos
para a bacia hidrográfica. citar como exemplo os usos
da água para irrigação,
O termo insignificante assumirá um valor de acordo com a legislação abastecimento humano ou
industrial. Enquanto que o uso
vigente. A ANA e os órgãos gestores estaduais são responsáveis por defi- não consuntivo é aquele em que
nir as derivações, captações e lançamentos considerados insignificantes. não há consumo ou modificação
Por outro lado, caso exista a agência de água/bacia hidrográfica, caberá do volume de água de forma
expressiva. Por exemplo os
a esta definir os usos que serão considerados insignificantes. É bom usos da água com transporte
lembrar que, estas definições deverão passar pelo respectivo conselho hidroviário, lazer/recreação/
de recursos hídricos. turismo, pesca e piscicultura.

Para dar uma visão geral sobre a atual situação de outorgas de direito de
uso de recursos hídricos no Brasil, é apresentada a Figura 3.

Nesta, é possível observar os valores de vazão de outorga por unidade


de planejamento hidrográfico (UPH), assim como as regiões hidrográfi-
cas com maiores valores de vazão outorgada (Paraná, São Francisco,
Atlântico Sul e Atlântico Sudeste).
Percebe-se, também, que a maioria das bacias hidrográficas com maio-
res valores de vazão outorgada não está em regiões metropolitanas
(exceto as de São Paulo e Porto Alegre), caracterizando, assim, as
outorgas destinadas para fins de irrigação (especialmente nas regiões
hidrográficas do São Francisco, do Tocantins-Araguaia e do Uruguai).

Analisando os dados de
outorga por região hidrográfica,
verifica-se que a região
Amazônica, do Paraguai e
Parnaíba possuem menos que
16m³/s de vazão outorgada
cada uma e, somadas, não
chegam a 1% do total no País.
Para a Região Hidrográfica
Atlântico Nordeste Ocidental
que está situada, basicamente,
no Maranhão e numa pequena
porção oriental do estado do
Pará não há outorgas emitidas
até 2007. (ANA, 2009)

88

Figura 3- Distribuição das vazões outorgadas no país até 2007.


Fonte: ANA, 2009.

Para expressar os valores de vazões de outorgas no país por finalidade


de uso, apresentamos a Figura 4. Verificamos que a irrigação, o abaste-
cimento público e consumo industrial correspondem a cerca de 90% do
total de vazões outorgadas.

Figura 4- Distribuição das outorgas emitidas no Brasil, em 2007, por finalidade de uso.
Fonte: ANA, 2009.

Quando analisamos o número de outorgas, o abastecimento público


torna-se o uso com maior número de emissões, com 33%, e a irrigação
fica em segundo lugar, com 21% do total de outorgas emitidas no Brasil.
É importante ressaltar que a outorga é o único instrumento da Política
Nacional de Recursos Hídricos previsto expressamente na Constituição
Federal. O reconhecimento constitucional mostra o importante papel que
a outorga desempenha na Política Nacional e dentro do Sistema Nacional Deve-se fazer uma distinção
de Gerenciamento de Recursos Hídricos. entre cobrança pelo uso
da água, que pode ser para
Contudo, a implantação de rotinas administrativas para efetivação da qualquer fim , inclusive para
diluição de efluentes e tarifas
outorga de direitos de usos da água não é simples, principalmente por serviços de saneamento.
quando se consideram as falhas existentes na administração pública. As tarifas pelos serviços de
Atualmente, tem-se avançado consideravelmente neste sentido, contudo distribuição de água e coleta
de esgoto são devido aos
cresce, cada vez mais, a necessidade de melhores e mais bem defini-
custos com a captação, adução,
dos sistemas de outorga e, se possível, integrados com o licenciamento tratamento e distribuição da
ambiental (instrumento da Política Ambiental) para gerenciar, de forma água, assim como a coleta,
segura e eficaz, os recursos hídricos. transporte e tratamento dos
esgotos.
Há uma íntima relação entre a outorga e cobrança pelo uso da água. Os recursos arrecadados com
Ambos são instrumentos da Política Nacional e, segundo o seu art. a cobrança pelo uso da água
20, todos os usuários sujeitos à outorga estarão sujeitos à cobrança. serão para financiar estudos,
programas, projetos e obras
Portanto, a base de cálculo para a cobrança é a vazão outorgada. A na bacia hidrográfica, onde os
integração entre a cobrança e outorga facilita o controle dos recursos recursos foram gerados.
89
hídricos, a colaboração dos usuários na fiscalização e a aceitação da
cobrança pelos usuários.

O comitê, através dos estudos técnicos da sua agência de bacia, caso


exista, ou através do seu órgão gestor (Federal ou estadual), definirá os
usos considerados insignificantes, ou seja, que não serão cobrados pelo
uso da água.

A cobrança tem como objetivo o reconhecimento da água como bem


econômico e dar ao usuário uma indicação de seu real valor; o incentivo
a racionalização do uso da água, a obtenção de recursos financeiros para
o financiamento dos programas e intervenções contemplados nos planos
de recursos hídricos.

A cobrança pelo uso da água pode ser efetuada sob dois mecanismos:
um referente à produção de eletricidade e outro relativo aos demais
setores usuários, tendo esses mecanismos formas diferenciadas de
implementação.

No que se refere aos setores de saneamento (abastecimento de água


e diluição de efluentes), indústria, irrigação, criação animal, mineração,
aquicultura e geração termoelétrica, a cobrança pelo uso da água tem
como objetivos estimular o uso racional da água e gerar recursos finan-
ceiros para a preservação e recuperação da respectiva bacia.
ANOTAÇÕES PESSOAIS É importante salientar que, a cobrança não deve ser encarada como um
imposto, e, sim, um preço público fixado a partir de um pacto entre os
usuários de água, sociedade civil e poder público no âmbito do comitê de
bacia, com o apoio técnico da ANA.

Até o final de 2007, as bacias hidrográficas do rio Paraíba do Sul e dos


rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí – Bacias PCJ haviam implementado
a cobrança pelo uso da água. Neste ano, também, houve considerados
avanços na discussão dos mecanismos e valores de cobrança na bacia
do rio São Francisco, com possibilidade de implementação para o ano de
2009.

Em rios de domínio estadual, o Rio de Janeiro iniciou a cobrança em


2004 e, atualmente, este instrumento está implementado em todas as
bacias do Estado. Em São Paulo, iniciou-se em 2007, com as bacias dos
rios Paraíba do Sul e PCJ, baseada nos valores de cobrança em bacias
de rios federais. No Nordeste, o Ceará iniciou a cobrança pelo uso da
água bruta em 1996, para cobrir despesas de operação e manutenção da
sua infraestrutura hídrica.

90 Em outros estados brasileiros, como Minas Gerais, Paraná, Rio Grande


do Sul e Paraíba, a discussão sobre a implementação da cobrança já
está acontecendo e há uma possibilidade de implementação do instru-
mento a curto prazo.

Atualmente, onde há cobrança, ela é efetuada sobre a captação de água,


sobre o consumo e a carga de lançamento de DBO.

Planos de Bacias
Assim como em muitas ações governamentais, a gestão das águas deve
ser resultado de um processo de planejamento e, neste processo, os
planos são fundamentais. Na formulação da Política, seja ela nacional
ou estadual, devem ser estabelecidos instrumentos de gestão de recur-
sos hídricos, garantindo os meios para se chegar ao cenário desejável.
Dentre estes, o plano de recursos hídricos é o responsável por materia-
lizar, em um documento, um planejamento com vistas a organizar o uso,
controle e proteção das águas.

Os Planos de Recursos Hídricos é um documento que define a agenda


dos recursos hídricos de uma região, apontando ações de gestão, planos,
projetos, obras e investimentos prioritários. O plano se constitui no meca-
nismo de articulação com as várias esferas da sociedade, incluindo-se
órgãos governamentais, a sociedade civil, os usuários e as diferentes ANOTAÇÕES PESSOAIS
instituições que participam do gerenciamento dos recursos hídricos.

A Lei 9.433/97 afirma que os Planos de Recursos Hídricos são documen-


tos de longo prazo e que devem ser elaborados por bacias hidrográficas,
por Estados e para o País. Para melhor apresentar tais planos, coloca-
mos a Tabela 1 que mostra os tipos de planos que devem ser elaborados,
o seu conteúdo e o órgão responsável pela sua aprovação.

Tabela 1- Tipos de planos (adaptado de ANA, 2009)


Plano Conteúdo Aprovação
Nacional Metas, diretrizes e CNRH
programas gerais
Estadual Plano estratégico do Conselho Estadual
sistema estadual
Domínio da União Agenda de recursos Comitês de Bacias
Bacia hídricos da Bacia

Em geral, um Plano de Recursos Hídricos de uma bacia deve ser com-


posto dos seguintes módulos:
91
» Diagnóstico integrado;
» Prognóstico quanto à situação dos recursos hídricos da bacia,
cobrindo (a) um cenário tendencial e uma visão de futuro; (b) uma
prospecção quanto a cenários alternativos; (c) as alternativas de
compatibilização entre disponibilidades e demandas, bem como
entre os interesses internos e externos à bacia, considerados esses
cenários;
» Plano propriamente dito, compreendendo (a) um conjunto de
diretrizes e metas para que a visão de futuro adotada para a bacia
seja construída no horizonte de planejamento; (b) um conjunto de
intervenções para conquistar essa visão de futuro; (c) um conjunto
de indicadores para acompanhar a implementação do plano.
Na Figura 5, apresentamos as bacias interestaduais que possuem planos
de bacias já elaborados. Cada plano possui características próprias de
acordo com os problemas existentes.
ANOTAÇÕES PESSOAIS

Figura 5- Situação dos planos de recursos hídricos em bacias interestaduais


92 Fonte: ANA, 2009.

Em relação aos planos de bacias estaduais, a Figura 6 apresenta a


situação em 2007. É importante salientar que muitos desses planos
foram feitos antes da implementação da Política Nacional e, com isso,
estão excessivamente centrados na etapa de diagnóstico e sem foco na
resolução dos principais problemas da bacia.

A revisão dos planos é prevista na legislação e, graças a isto, atualmente,


vários planos estaduais de recursos hídricos e de bacia estão sendo
atualizados e, desta forma, ajustando-se à Política Nacional.

Muitos desses estão sendo revisados para se ajustar às mudanças


ambientais, legais, econômicas e sociais ocorridas ao longo dos anos e
incluir a participação da sociedade para legitimar a gestão participativa
dos recursos hídricos.
ANOTAÇÕES PESSOAIS

Figura 6- Situação dos planos de bacia estaduais


Fonte: ANA, 2009.

Nesta aula, foi apresentado um pequeno histórico da criação dos comitês


de bacias e a atual situação de implantação no Brasil. Também abor- 93
damos a outorga e cobrança pelo uso da água e os planos de bacias,
como instrumentos da gestão dos recursos hídricos, e o cenário atual da
implementação destes instrumentos no País.

Atividades Propostas
1. Pesquise, no órgão gestor de recursos hídricos do seu Estado,
sobre:
a) Os comitês de bacias hidrográficas implantados e a sua atua-
ção na gestão dos recursos hídricos;

b) Os pleitos de outorga e o processo de cobrança pelo uso da


água;

c) Os planos de bacias hidrográficas e suas respectivas datas de


elaboração.
ANOTAÇÕES PESSOAIS Bibliografia Recomendada
BRASIL. Agência Nacional de Águas (ANA). Conjuntura dos Re-
cursos Hídricos no Brasil 2009. Brasília. 2009. 204 p. Disponível
em: <http://www.ana.gov.br/AcoesAdministrativas/CDOC/Catalogo_
imgs/2009/20090417_Conjuntura_dos_recursos_hidricos_no_Brasil_2009.
pdf> Acesso em: maio/09.

REVISTA PLENARIUM. Câmara dos Deputados. Brasília. Coordenação de


Publicações. 2006. Ano III, n. 3 (set. 2006). 343 p. Disponível em: < http://
apache.camara.gov.br/portal/arquivos/Camara/internet/publicacoes/edicoes/
plenarium3> Acesso em: julho/2009.

SILVA, L. M. C.; MONTEIRO, R. A. Outorga de direito de uso de re-


cursos hídricos: uma das possíveis abordagens. Disponível
em: < http://www.ana.gov.br/AcoesAdministrativas/CDOC/ProducaoAcade-
mica/Luciano%20Meneses%20C.%20da%20Silva/OutorgaDirUsoRecHid_
UmaDasPossiveisAbordagens.pdf > Acesso em: agosto/09.

TUCCI, C. E. M.; HESPANHOL, I. Gestão da água no Brasil. Brasília:


UNESCO, 2001. 156 p.
94
CAMPOS, N.; STUDART, T (Org.). Gestão de águas: princípios e
práticas. Porto Alegre: ABRH, 2003. 242 p.

KETTELHUT, J. T. S. ; AMORE, L.; LEEUWESTEIN, J. M. A experiência


brasileira de implementação de comitês de bacias hidro-
gráficas. In: Simpósio Internacional sobre Gestão de Recursos Hídricos,
1998, Gramado.

Você também pode gostar