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BRASÍLIA
2018
DALTON BARBOSA DE SOUZA JUNIOR
BRASÍLIA
2018
TERMO DE APROVAÇÃO
Keywords: Law nº 11.101/05, Judicial Recovery, Labor Claims, Search for full
employment, Company's social function, Company Preservation, Judicial Recovery.
Companies, Law nº 11.101/05.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO......................................................................................5
2. DIREITO DO TRABALHO..................................................................8
2.1 CONCEITO DE EMPREGO...............................................................................9
2.2 PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO DO
TRABALHO........................................................................................................................10
2.2.1 PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO..............................................................11
2.2.2 PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE DOS DIREITOS
TRABALHISTAS.............................................................................................12
2.2.3 PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DA RELAÇÃO DE
EMPREGO......................................................................................................13
2.2.4 PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA REALIDADE.................................15
2.3 DO EMPREGO E DO PRINCÍPIO DO PLENO EMPREGO À LUZ
DA EMPRESA.................................................................................................16
2.3.1 EFETIVAÇÃO DO PRINCÍPIO DO PLENO EMPREGO..............17
2.3.2 SUCESSÃO TRABALHISTA...............................................................18
2.3.3 DO INSTITUTO DA SUCESSÃO TRABALHISTA...........................20
2.4. PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA.............................21
2.4.1 PRINCÍPIOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL.................................22
2.4.2 DA PROTEÇÃO DO TRABALHADOR.............................................24
2.4.3 DO PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA.....................26
2.4.4 PLENO EMPREGO E A PRESERVAÇÃO DA SOCIEDADE
EMPRESÁRIA................................................................................................30
3. DIREITO DE EMPESA.......................................................................32
3.1 EMPRESÁRO.........................................................................................................32
3.2 DA FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA..........................................................36
3.3 EMPRESÁRIO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - A EFETIVAÇÃO
DA CONCORRÊNCIA E LIVRE INICIATIVA PARA A EFETIVAÇÃO
DO PRINCÍPIO DO PLENO EMPREGO...................................................44
4. DA ADI 3934/DF E A EFETIVIDADE DA PRESERVAÇÃO DO
EMPREGO......................................................................................................51
4.1 DOS DISPOSITIVOS LEGAIS IMPUGNADOS E DE SEU
CONFRONTO COM AS NORMAS CONSTITUCIONAIS...................................51
4.2 IMPOSSIBILIDADE DE SUCESSÃO DAS DÍVIDAS NO PROCESSO
FALIMENTAR DIANTE DA ALIENAÇÃO EMPRESARIAL E SEU
ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL............................................................63
5. CONCLUSÃO.......................................................................................71
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................73
1. INTRODUÇÃO
O Direito do Trabalho não é aplicado em qualquer relação de trabalho, mas sim nas
condições e elementos ventilados acima.
Desta forma, entende-se que a relação empregatícia possui a necessidade da
existência de normas regulamentar, configurando assim a função do Direito do Trabalho.
Assim, se faz possível concluir que o princípio inspira a criação da norma, sendo
sua função a de instruir o legislador e outros agentes.
Mauricio Godinho Delgado refere que “princípio traduz, de maneira geral, a noção
de proposições fundamentais que se formam na consciência das pessoas e grupos sociais, a
partir de certa realidade, e que, após formadas, direcionam-se à compreensão, reprodução
ou recriação dessa realidade” 2.
Na caminhada para a construção de uma nova regulamentação, o princípio será
sempre o primeiro passo, na medida ao qual devem seguir-se outros. Um princípio é muito
1 REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p 37.
2
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. – 10 ed. São Paulo: LTr, 2011, p.180.
mais que uma simples regra, muito além de estabelecer certas limitações, distribui diretrizes
que embasam toda uma ciência e visam à sua correta compreensão e interpretação.
Os princípios são bases importantes nas relações trabalhistas quando se fala no
regime celetista, uma vez que norteiam todo o Direito do Trabalho. A própria
Consolidação das Leis do Trabalho em seu artigo 8º, dispõe a possibilidade de utilização
dos princípios do direito do trabalho na falta de disposições legais ou contratuais:
3
RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 1993. p. 42-43 e 28.
A indisponibilidade aos direitos trabalhistas constitui-se no principal modelo
utilizado pelo Direito do Trabalho para tentar igualizar, no plano jurídico, a paridade
existente entre os sujeitos da relação socioeconômica de emprego.
Se a proteção em síntese é a razão do Direito do Trabalho, a indisponibilidade é o
coração do direito do trabalho, afinal, de nada adiantaria criar um conjunto complexo de
normas protecionistas se, no momento de realizar a contratação o empregado estivesse
autorizado a, simplesmente, despir-se deles, através de renúncias ou transações.
Desta forma, o principio veda que o empregado renuncie ou disponha dos seus
direitos trabalhistas.
E o que se entende por renúncia, é uma declaração de vontade mediante qual a
parte abre mão de um direito já a transação, por outro lado, é um ato bilateral onde sua
base se estabelece em concessões reciprocas.
Os direitos trabalhistas, são imperativos e de observância obrigatória. Destarte, não
são passíveis de renúncia e nem de transação, salvo nas situações em que a própria lei assim
admitir.
O professor Mauricio Godinho Delgado (2012, p. 211) leciona que os direitos
trabalhistas podem ser imantados por indisponibilidade absoluta e indisponibilidade
relativa. Ensinando que a indisponibilidade será absoluta quando o direito merecer tutela de
interesse público, em razão de compor um patamar civilizatório mínimo, a exemplo dos
direitos constitucionais em geral, das normas de tratados ou convenções internacionais,
normas relativas à cidadania do empregado (assinatura da CTPS, inscrição previdenciária e
recolhimento do FGTS).
A inteligência do art. 997 do Código Civil Brasileiro nos ensina que sociedades
personificadas simples se constituem mediante contrato escrito, particular ou público,
prevendo de forma expressa que tal Sociedade adquire direitos e assume obrigações.
Já o art. 1025 CCB preconiza que o sócio admitido em sociedade já constituída, não
se exime das dívidas anteriores, ou seja, as dívidas da natureza trabalhista deverão ser
suportadas pelo novo sócio em empresa, entendimento do art. 1025 CCB c/c arts. 10, 448
e 448-A CLT.
Art. 1025 CCB: O sócio admitido em sociedade já constituída, não se exime das dividas
sociais anteriores a admissão;
Art. 10 CLT Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos
adquiridos por seus empregados;
Art. 1.142. Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da
empresa, por empresário, ou por sociedade empresária;
(...)
Art. 1.145. Se ao alienante não restarem bens suficientes para solver o seu passivo, a eficácia
da alienação do estabelecimento depende do pagamento de todos os credores, ou do
consentimento destes, de modo expresso ou tácito, em trinta dias a partir de sua notificação.
Art. 1.146. O adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à
transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo
solidariamente obrigado pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da
publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento.
Art. 10 CLT Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos
adquiridos por seus empregados.
4
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. Ed: Ltr. 5° edição. SP. 2006 (pag 406)
Temos as que estão inseridas nos tipos clássicos as quais abrangem as modificações
na modalidade societária ou derivam do processo de fusão, incorporação, cisão e etc...
também existem as que incluem a substituição do antigo titular passivo da relação
empregatícia por outra pessoa física ou jurídica, em situações em que enseja a aquisição de
estabelecimentos isolados.
Entretanto, ocorre que a generalidade e imprecisão dos artigos 10 e 448 da CLT
têm dado maior permissão à jurisprudência a proceder a uma adequação do tipo legal
sucessório a situações fatidicamente jurídicas novas que surgem no mercado empresarial
dos últimos anos no país.
Na extensão da sentença proferida pelo juiz Múcio Nascimento Borges:
“essas situações novas, que se tornaram comuns no final do séc. XX, em decorrência da
profunda reestruturação do mercado empresarial brasileiro (em especial o mercado financeiro, de
privatizações e outros seguimentos), conduziram a jurisprudência a reler os dois preceitos
celetistas, encontrando neles um tipo legal mais amplo do que o originalmente concebido pela
doutrina e jurisprudências dominantes”5
Sendo assim, não há que se falar em uma divisão de polos negativos e ou positivos
da empresa deixando a competência do lado passivo trabalhista da relação a parte negativa.
O princípio do pleno emprego e sua consagração constitucional, é o primeiro passo
para a análise do conflito entre o direito do trabalhador a continuidade do emprego e o
princípio do direito empresarial, que prega a continuidade da atividade empresária.
O pleno emprego, enquanto base constitucional consagrada na ordem econômica é
o norte conciliador dos dois interesses anteriormente referidos, como veremos nos
capítulos seguintes.
5
33° VT/R, RT 1053-2006-033-01-00-7, sentença, Juiz Titular Múcio Nascimento Borges, 30 ago,
2006
6
Ibid.
2.4 PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA
Não apenas na momentânea crise econômica que afeta o país, mas desde sempre o
governo garante políticas públicas no sentido de empregar cada vez mais pessoas e assim
melhorar a qualidade de vida de seu povo, erradicando assim de forma gradual a pobreza.
Temos como exemplo com o PRONATEC, o Programa Nacional de Acesso ao
Ensino Técnico e Emprego, criado pelo Governo Federal em 2011, por meio da Lei n.
12.513/2011, que visa expandir, interiorizar e democratizar a oferta de cursos de educação
profissional e tecnológica no país, somando entre os anos de 2011 a 2014 mais de 8,1
milhões de matrículas, entre cursos técnicos e de qualificação profissional (Portal MEC,
2017, p.1).
O princípio da proteção do trabalhador se encontra em nossa Carta Magna através
de uma interpretação do artigo 1º, III e IV, e também pela sistematização dos Direitos
Sociais.
Assim, Silva (2003, p. 289):
Temos para nós que a garantia do emprego é um direito, por si bastante, nos
termos da Constituição, ou seja, a norma do Art. 7º, I, é por si só suficiente para
gerar o direito nela previsto. Em termos técnicos, é de aplicabilidade imediata,
de sorte que a lei complementar apenas virá determinar os limites dessa
aplicabilidade, com a definição dos elementos (despedida arbitrária e justa causa)
que delimitem sua eficácia, inclusive pela possível conversão em indenização
compensatória da garantia de permanência no emprego.
E ainda:
3. DIREITO DE EMPRESA
De fato, será empresário aquele que prática atividade empresária e está é uma
definição material do conceito de empresário, sendo ele o sujeito de direitos e obrigações
que exerce a atividade econômica organizada para a circulação de bens ou serviços, exceto
a atividade intelectual.
Tal atuação ocorre de forma absolutamente profissional, o empresário tem que
exercer a atividade com habitualidade, não entrando neste conceito aquele que
esporadicamente praticou uma atividade empresária, como por exemplo, uma pessoa que
vende seu próprio carro, mas não tem como cotidiano a prática de venda de automóveis.
A alteração dos fundamentos do Direito Comercial fez com que surgisse a figura do
empresário em substituição a do comerciante. De fato, a teoria da empresa que fundamenta
o atual modelo jurídico comercial está consubstanciada no Livro II do Código Civil de
2002 sendo que surgimento da figura do empresário faz com que surja o assunto em
questão.
Preferiu o legislador, portanto, conceituar e caracterizar o sujeito da relação
empresarial, empresário, que desenvolve uma atividade econômica organizada.
Como já dito, o conceito de empresário está conceituado no art. 966 do Código
Civil de 2002. E de acordo com o dispositivo supracitado, “considera-se empresário quem
exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou circulação de
bens ou de serviços”7.
Executa a função e empresário, de forma abrangente, todo sujeito que empreende,
ou seja, aquele que vai dar “impulso, vida” às empresas. Incorreto é confundir, portanto,
empresa com empresário pois, este é a pessoa e aquele o empreendimento. Em síntese, o
empresário é o sujeito, enquanto que a empresa é o objeto da relação jurídica empresarial.
Cada partícula de palavra que dá a definição legal da figura do empresário traz
consigo conceitos intrínsecos. Dentro do dispositivo legal é possível e identificar elementos
que configuram o empresário e a ausência de qualquer desses elementos acarretará a não
qualificação da pessoa como empresário, inviabilizando a aplicação das regras inerentes a
tal figura do ordenamento jurídico.
Um dos primeiros elementos da definição traz a noção de que a condição de
empresário pode ser exercida por qualquer sujeito, sendo natural ou jurídico.
Observe que não há no art. 966, restrição alguma para que uma pessoa jurídica
possa ser caracterizada como empresária. O empresário deve executar suar atividades de
forma profissional, logo, profissionalismo é o fator indispensável na caracterização do
empresário.
Assim, não se pode afirmar que o empresário é o sujeito que exerce atividades
esporádicas ou eventuais, uma vez que, o profissionalismo está relacionado principalmente
com a habitualidade com que a atividade é desenvolvida.
Fábio Ulhoa Coelho agrega, no profissionalismo, dois outros elementos além da
habitualidade: “a pessoalidade e o monopólio das informações” 8. Ensina que o primeiro
elemento faz relação com a necessidade de o empresário exercer atividades por meio de
funcionários, mas não de forma pessoal; já quanto ao segundo justifica-se no sentido de
que o empresário detém o monopólio sobre o produto ou serviço objeto da sua empresa,
11
A função social e a boa-fé objetiva são princípios fundamentais do Código Civil 2002, conforme intenção
expressa por seus idealizadores e descrita na Exposição de Motivos do referido diploma legal, contando,
ainda, com o relevo dado nos artigos 186 e 927 e seguintes.
sob a alusão à ordem econômica, de preceitos que, na Constituição de 1988, encontram-se
localizados em Títulos outros que não o da Ordem Econômica (e Financeira)”.
A função social da sociedade empresária encontrou respaldo no art. 170, III, da
Constituição Federal, que o institui como princípio da ordem econômica. De acordo com
Cavallazzi Filho (2006, p. 153), a função social é devida vez que a sociedade empresária
atua não apenas para atender aos interesses dos sócios, mas de toda a coletividade e
principalmente dos empregados, finaliza (COMPARATO, 1990).
Desta forma, percebe-se a função social da empresa inserida implicitamente em
nossa Carta Magna, razão pela qual em uma primeira visão podemos concluir que há
respaldo constitucional ao princípio.
Tal proteção é de extrema importância, permitindo assim que possamos
compreender que sua incidência e aplicação tem grande influência no sistema
recuperacional brasileiro. Assim ensina Maria Helena Diniz (2009, p. 23).
No mesmo entender, para Carvalhosa (1977, p. 237) a sociedade empresária tem
uma evidente função social, nela sendo interessados os empregados, os fornecedores, a
comunidade em que atua o próprio Estado que dela retira contribuições fiscais e
parafiscais. Segue o Autor, afirmando que existem três principais funções sociais da
sociedade empresária: a primeira refere-se às condições de trabalho e às relações com seus
empregados; a segunda volta-se ao interesse dos consumidores; a terceira volta-se ao
interesse dos concorrentes. Ainda mais atual se faz a preocupação com os interesses dos
concorrentes. E ainda mais atual é a preocupação com os interesses de preservação
ecológica urbana e ambiental da comunidade em que a sociedade empresária atua.
Com o mesmo pensar, Gama (2007, p. 28) e Barcellos (2002, p. 110-113) apontam
que, a função social do direito civil, como uma das exigências fundamentais do Estado
brasileiro, é um aspecto componente do aparato de proteção que se dá ao princípio da
dignidade da pessoa humana, no sentindo de viabilizar a consolidação efetividade dos
princípios de igualdade material e justiça social.
Ainda a respeito da função social da sociedade empresária, registra Tokars (2002, p.
77-96), que a função social significa um paliativo retórico aos efeitos concretos de nossas
politicas econômicas, ou seja, traduz uma válvula de escape psicossocial, a qual pode ser
definida como instrumento de aparente conquista social em que na realidade, acaba por
atuar exatamente de diferente, oposta, mantendo na realidade, acaba por atuar exatamente
de forma oposta, mantendo privilégios ou impedindo a real conquista dos interesses
sociais.
A função social da sociedade empresária se vincula, pois, de sorte imediata à
atividade empresária desenvolvida. Quanto a isso, anota a doutrina pátria a divisão em duas
espécies: endógenas e exógena, levando em conta os fatores envolvidos tanto na sociedade
empresária quanto em seus métodos para cumprir sua função social.
A função social de caráter endógeno é referente aos fatores empregados na
atividade empresária no interior da produção. Assim, fazem parte dessa espécie as relações
trabalhistas desenvolvidas no âmbito empresário, o ambiente no qual o trabalho é exercido;
os interessados dos sócios da sociedade empresária não implícitos na relação
administradores-sócios etc.
Já a função social da sociedade empresária em seu perfil exógeno leva em conta os
fatores externos à atividade desenvolvida pela sociedade empresária. Desta forma, são
compreendidos nessa espécie de incidência a função social da sociedade empresária:
concorrentes, consumidores e o meio ambiente (AMARAL, 2008, p. 119).
Tanto o perfil exógeno quanto o endógeno foram levados em conta pelo legislador
constituinte, para Amaral (2008, p. 120), faz-se imprescindível a transcrição do texto do art.
170 da Constituição Federal, enfatizando que tal preceito abre disposições constitucionais
acerca da ordem econômica no Estado brasileiro.
O art. 170 da Constituição Federal em seu caput traça limites que deverão ser
obedecidos na aplicação dos princípios que integram seu rol, ao delimitar objetivo relativo à
existência digna de todos os brasileiros, devendo ser levados em conta os ditames da justiça
social, isto é, de uma justa organização social dos componentes da sociedade numa
expressa referência ao direito como instrumento social.
Asseverando, há que se afirmar que a ordem econômica deve ser explicitamente
fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa.
O professor Amaral (2008, p. 120-121) acrescenta ainda que, a transcrição do
preceito não só demonstra a preocupação do constituinte com a construção de uma
sociedade justa e igualitária, como traz à baila o fato de que ao serem previstos diversos
princípios aplicáveis á ordem econômica, cada um deles deverá ter a mesma importância,
mas poderá se moldar mais adequadamente à determinado caso em concreto.
Constata-se, pois, que os fatores exógenos e endógenos da atividade empresária
estão presentes em tal artigo da Carta Magna. De certo, a valorização do trabalho humano,
sob o ponto de vista empresário, encontra-se dentes os fatores endógenos e da função
exercida pela sociedade empresária. Quando nos referimos ao meio ambiente, aos
consumidores etc., existe expressa preocupação do legislador constituinte com fatores
exógenos à função social da sociedade empresária, vez que voltadas à coletividade na qual a
mesma exerce suas atividades (AMARAL, 2008, p. 121).
A respeito das demais importantes atuações da função social da sociedade
empresária, Brevidelli (200, p. 5) explica que seus reflexos sobre o contrato de trabalho que
também são evidentes. Neles, impõe-se a incidência de outro princípio a reger o contrato, a
boa-fé objetiva que, por sua vez, pode ser entendida sob dois enfoques, o subjetivo e o
objetivo.
Outrossim, há reflexos da função social no âmbito do direito laboral. Para
Brevidelli (200, p. 6) toda a essência da relação de trabalho e proteção do trabalhador pode
ter uma nova dimensão e parâmetro dentro desse novo pensar da sociedade empresária.
O questionamento do trabalho é até mesmo da efetividade do processo do
trabalho, ultrapassa a maneira como se estruturam ás sociedade empresárias, como o
Direito as conforma e como permite ou não aberturas, brechas para que as obrigações
empresárias contraídas e os deveres contratuais não sejam cumpridos, favorecendo a
instabilidade social, a concentração de riquezas e aumentando o fosso da injustiça social.
A função social da sociedade, portanto, acarreta a superação do caráter
eminentemente individualista, tendo como dever o direito individual do seu titular coexistir
com funcionalização do instituto, desempenhando, pois, um papel produtivo em benefício
de toda a coletividade.
A atividade empresária, então, apresenta um caráter dúplice, uma vez que serve não
só ao sujeito proprietário, como também às necessidades sociais (CASTRO, 2007, p. 138).
A função social da sociedade empresária, então, constitui-se em linha mestra do direito de
empresa no Código Civil, o que reforça a opinião da preservação da sociedade empresária
como princípio essencial desse diploma legal.
Portanto, tem-se, então, que a busca da concretização de uma sociedade mais justa
e solidária, com a efetiva participação da sociedade, requer a preservação das sociedades
empresariais que adotem uma postura positiva no tocante à concretização dos direitos
sociais.
Essa responsabilidade e dever social das empresárias, não afastam os deveres
inerentes ao Estado. Muito pelo contrário, incumbe ao Estado não só concretizar politicas
públicas destinadas à moradia, segurança, saúde e educação, como também evitar práticas
anticoncorrenciais de determinados grupos de sociedades empresárias. Estado e sociedade
empresária, portanto, não mais atuam em setores distintos, na verdade se completam
(CASTRO, 2007, p. 143).
A função social da empresa exige desta uma atividade voltada para os objetivos
relacionados ao interesse coletivo. Não implica somente no cumprimento efetivo das
obrigações legais e na observância dos direitos mais efetivos da sociedade empresária,
como as questões sociais, direitos trabalhistas e tributários. Neste diapasão, realiza-se a
função social. Porém, muito além da função social, existe também a função solidária, pois a
empresa também se responsabiliza no compromisso com a preservação ambiental,
relacionamento ético com fornecedores e consumidores, bem como o cuidado com o
impacto de sua atuação na comunidade onde está inserida.
Também por esse viés, nos explica Maria Helena Diniz que a empresa tem grande
responsabilidade no sentido social. Ela sustenta que seu papel nesse sentido é de
desempenhar uma função de cunho tanto econômico como social. A empresa se traduz
como “elemento de paz social e solidariedade, constituindo um instrumento de política
social e de promoção da justiça social.”.
Segundo Maria Helena Diniz, a responsabilidade social vai mais além; ela
impulsiona através de sua atividade econômica, uma comunicação ampla entre os
trabalhadores e a sociedade em geral, propiciando assim “melhores condições sociais,
garantindo sua sobrevivência no mercado globalizado, por ser fator decisivo para seu
crescimento, visto que ganhará o respeito de seus colaboradores e consumidores e
provocará sua inserção na sociedade.” (DINIZ, 2009, p. 33).
Dando sequência ao raciocínio, percebemos que a preocupação com a função social
da empresa tem com um dos melhores meios de garantir a existência digna da pessoa
humana: o trabalho.
Assim também tece Mamede:
Deste modo, Mamede explica ser a função social elemento inerente a cada
faculdade jurídica e, por isso, para que haja uma adequada compreensão, é exigível que se
considere tanto seus fins econômicos como também o fim social.
Em resumo ele explica:
[...] O princípio da função social da empresa é metanorma que tem essa matriz,
demandando seja considerado o interesse da sociedade, organizada em Estado,
sobre todas as atividades econômicas, mesmo sendo privadas e, destarte,
submetida ao regime jurídico privado. Embora tenha essa finalidade imediata de
remunerar o capital nela investido, atendendo o interesse de seu titular ou dos
sócios do ente (sociedade) que a titulariza, a atividade negocial atende
igualmente ao restante da sociedade. (MAMEDE, 2010, p. 53)
Demonstrado que existe interesse tanto por patê de interesse estatal quando da
sociedade em si em uma empresa (mediante seus fins econômicos e sociais), Mamede
(2010, p. 53) diz que esse princípio da função social da empresa nos leva a focar na tão
importante livre iniciativa, que não se resume ao trabalho individual de cada um buscando
para si a realização de suas metas e planos pessoais, mas sim como cumpridora de um papel
digno e importante na sociedade.
Conclui-se, assim, que “o princípio também exige a atenção à atividade em si,
percebendo-a como unidade de uma estrutura, um sistema no qual todas as atividades se
combinam a bem da sociedade”, ressalta Mamede (2010, p. 54).
A recuperação de empresas, seguindo o princípio da função social da empresa, se
da no tocante à garantia da proteção dada não somente à empresa em si ou ao seu titular,
mas também a “proteção da comunidade e do Estado que beneficiam – no mínimo
indiretamente – com produção de riquezas” (MAMEDE, 2010, p. 54).
Por isso, termina por não se limitar a função social da propriedade dos bens
organizados que compõe o estabelecimento, porém, sim um contexto viés de coletividade.
Com isso, verificamos que a função social de empresa nos remete primeiramente a
proteção de sua atividade econômica. Sintetizando de modo mais aprofundado,
percebemos que o sentido é muito mais além do que simplesmente proteger a proteger a
propriedade em si e todos os seus elementos.
Ao defendermos a função social da empresa, não defendemos somente a
organização que visa à elaboração de produtos ou serviços. Aqui, protegemos de forma
direta e indireta o trabalhador que tem em seu labor sua fonte econômica e de dignidade. O
que seria de uma empresa sem o trabalho humano. Com isso, é possível enxergarmos que
os reflexos da função social da empresa são vistos em toda a sociedade, em termos
econômicos e de caráter social.
Mamede (2010, p. 57 e 58) nos introduz ao próximo princípio da preservação da
empresa, nos dizendo: afirmando que o princípio da função social é o princípio da
preservação da empresa, metarnoma que é diretamente decorrente daquela anterior;
necessário é preservar a empresa para que ela cumpra sua função social.
Pontua-se assim, a existência de um interesse público na preservação da estrutura e
da atividade empresarial, isto é, na continuidade das atividades de produção de riquezas
pela circulação de bens ou prestação de serviços, certo que a empresa atende não apenas
aos interesses do seu titular, de seus sócios (se sociedade empresarial), e de seus parceiros
negociais.
O Código Civil reflete o princípio da preservação da empresa chegando a permitir
que o incapaz continue a empresa após a interdição civil ou após a sucessão hereditária. O
mesmo se diga do artigo 1.033, IV, a permitir unicidade de sócios pelo prazo de 180 dias,
evitando-se, assim, a dissolução da sociedade.
É possível a percepção de que a função social da empresa, para ser efetiva, necessita
de sua preservação.
Propagando o horizonte da função social, encontra-se a função solidária, pela qual
se exige por parte da atividade empresária a adoção de operações e interferências na vida
social afinadas aos valores éticos, valorizando os princípios dos direitos fundamentais
relacionados ao trabalho.
Ademais, pela função solidária as empresas determinam suas ações pelo uso
racional dos recursos naturais, na transparência de relações e no cuidado com a coisa
pública e com os direitos e deveres que deste espaço decorrem.
Segundo expressam Campello e Santiago (2015), foi a partir da nova dimensão dos
Direitos Humanos, a terceira, que se possibilitou uma subsunção dos direitos de primeira e
segunda dimensão, ou seja, os individualistas de liberdade e os sociais de igualdade, com os
direitos de solidariedade, cujo sujeito é difuso.
Nesse sentido:
Desta forma, não basta para a atividade empresarial o cumprimento das leis. A
sociedade exige mais das empresas: exige ao exercício pautado na função solidária, para
enfrentar, combater ou minimizar as consequências sociais do poder das empresas,
especialmente em relação aos impactos que suas atividades acarretam nas esferas políticas,
econômicas, sociais e ambientais.
Significa que a atividade empresarial deve efetivas ações sustentáveis, solidárias, em
vista do maior bem coletivo possível.
Em uma leitura com o viés constitucional dos princípios que regem a empresa, é
fundamental enfatizar que a empresa seja promotora de atividades benéficas e
extremamente garantidoras de direitos dos cidadãos, especialmente assegurando a
dignidade de vida e a promoção de sadias relações sociais.
Em nosso país (...) as funções sociais e solidárias das empresas orientam para que
elas não sejam aceitas simplesmente como entidades focadas na “maximização
auto interessada do lucro, mas que sejam estruturas cujas atividades sejam
projetadas para promover e beneficiar as sociedades e os indivíduos com quem
interagem (SANCHES; SILVEIRA, 2013, p. 124).
3.3 Empresário na Constituição Federal - A Efetivação da Concorrência e
Livre Iniciativa para a efetivação do Princípio do Pleno Emprego.
Fábio Ulhoa Coelho (2012), afirma que a livre concorrência é que garante ao
mercado, que empresários exponham seus produtos e serviços.
Neste sentido, José Afonso da Silva (1998, p. 876), nos ensina que:
A livre concorrência está configurada no art. 170, IV, como um dos princípios
da ordem econômica. Ele é uma manifestação da liberdade de iniciativa e,
para garanti-la, a Constituição estatui que a lei reprimirá o abuso de
poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da
concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros. Os dois dispositivos se
complementam no mesmo objetivo. Visam tutelar o sistema de mercado e,
especialmente, proteger a livre concorrência contra a tendência açambarcadora
da concentração capitalista (grifos nosso).
12 Disponível em www.cade.com.br
"Ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação
de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área."
Isto significa que a Administração Pública não tem título jurídico para aspirar a
reter em suas mãos o poder de outorgar aos particulares o direito ao
desempenho da atividade econômica tal ou qual; evidentemente, também lhe
faleceria o poder de fixar o montante da produção ou comercialização que os
empresários porventura intentem efetuar. De acordo com os termos
constitucionais, a eleição da atividade que será empreendida assim como o
quantum a ser produzido ou comercializado resultam de uma decisão livre dos
agentes econômicos. O direito de fazê-lo lhes advém diretamente do Texto
Constitucional e descende, mesmo, da própria acolhida do regime capitalista,
para não se falar dos dispositivos constitucionais supramencionados.
No que tange à conceituação propriamente dita, entendemos que deva haver uma
interpretação restritiva no que concerne à significação do referido princípio em nosso
ordenamento jurídico, mormente para os fins a que se destina esse trabalho.
Desta forma, não há que se falar, em nossa Constituição, um desenvolvimento tão
amplo e detalhado, quanto se dá na seara econômica; muito menos são abarcados em nosso
campo normativo os reflexos das ideias fixas de cunho técnico que modernas teorias
desenvolvem considerando a aplicação ampla do princípio da busca do pleno emprego em
um dado país.
Destarte, encontramos o princípio em estudo próximo com o direito social ao
trabalho (art. 6°, caput, CF), que trata não apenas da democratização das oportunidades de
trabalho por meio da efetivação do pleno emprego, mas por outro lado o da melhoria de
condições de saúde e segurança no trabalho.
Nessa percepção, considerando a da busca do pleno emprego, principalmente
enquanto um princípio garantidor de oportunidade de trabalho a toda população ativa,
imprimimos reflexão acerca do papel do princípio supracitado, criado pelo professor José
Eustáquio Diniz Alves (2010) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística:
O pleno emprego é uma exigência prévia para a dignidade dos trabalhadores e uma
condição imprescindível para a solidez, segurança e o progresso da sociedade. Todo ser
humano tem direito a um emprego e a um trabalho decente.
O pleno emprego é o modo de se garantir este direito e uma forma de melhorar as
condições econômicas do país, aproveitando o seu “capital humano”.
Com a assistência advinda da análise das reflexões ventiladas acima pelo Prof° José
Eustáquio Diniz Alves colhemos a importância não apenas do oferecimento de vagas de
emprego bastantes a tantos quantos puderem participar da atividade laboral, além de a
preocupação de que tais empregos sejam decentes, isto é, de maneira efetiva coadunem-se
com o corolário da dignidade da pessoa humana, promovendo o mister da cidadania.
Após a análise dos princípios gerais que regem as relações de trabalho e visam a
preservação do emprego e da empresa, tendo em vista a continuidade da atividade
empresária, como forma da realização do pleno emprego, este último capítulo visa
discorrer sobre a ADI3934, esta que levou ao Supremo Tribunal Federal o suposto conflito
de interesse destes dois ramos do direito, o direito do trabalho e o direito empresarial.
A ADI aqui analisada teve como objeto os artigos 141, inciso II e 60, parágrafo
único da Lei 11.101/05, em confronto com o artigo 1°, Inciso III e IV; 6°; 7°, inciso I e
artigo 170 da Constituição Federal.
Consoante estabelece o inciso II do artigo 141 da Lei 11.101/05, quando ocorre a
alienação judicial “conjunta ou separada” de ativos, da própria empresa em recuperação
judicial ou de suas filiais, em qualquer das modalidades previstas na referida norma, o
adquirente estaria, segundo o que ali consta, isento de quaisquer obrigações do devedor
“derivadas da legislação do trabalho”, como se transcreve:
Art. 141. Na alienação conjunta ou separada de ativos, inclusive da empresa ou
de suas filiais, promovida sob qualquer das modalidades de que trata este artigo:
...
(grifos nosso)
(grifamos)
“Art. 7° São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social:
I – relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos
termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros
direitos;”
(grifamos)
Em relação a tal norma e, exatamente pelo mesmo vício formal de tratamento da
matéria por lei ordinária ou medida provisória, é que este Excelso Pretório, recentemente e
em ação análoga a esta da ADI 3934, também promovida pelo mesmo pelo mesmo partido
autor, houve por bem declarar a inconstitucionalidade do parágrafo 2° do artigo 453 da
CLT, no julgamento da ADI 1.721-3, ocorrido em 11/10/2006 cujo acórdão foi publicado,
no DJU, estando assim ementado:
(grifamos)
“VOTO
O SENHOR MINISTRO CARLOS AYRES BRITTO
(Relator):
(...)
15. De se notar, então, que a Magna Carta Federal outorgou à lei complementar duas
específicas funções: a) a de instituir as hipóteses em que não pode ocorrer despedida arbitrária
ou sem justa causa; b) a de fixar, “entre outros direitos”, os parâmetros de
indenização compensatória aos trabalhadores que vierem a ser
despedidos, exatamente, sem justa causa ou pelo exclusivo arbítrio do
seu empregador.
16. Isso não obstante, a própria Lei Maior, sem esperar pela edição da sobredita
lei complementar, avançou algumas regras de proteção do trabalhador-empregado, de sorte
a lançar algumas hipóteses proibitivas da demissão arbitrária ou sem justa causa.
...
19. Sucede que o novidadeiro § 2° do art. 453 da CLT, objeto da presente ADI, instituiu
uma outra modalidade de extinção do vínculo de emprego. E o fez
inteiramente à margem do cometimento de falta grave pelo empregado e
até mesmo vontade do empregador.
20. Ora bem, a Constituição versa a aposentadoria do trabalhador como um benefício. Não
como malefício. E se tal aposentadoria se dá por efeito do exercício regular de um direito (aqui
se cuida de aposentadoria voluntária), é claro que esse regular exercício de um direito não é de
colocar o seu titular numa situação jurídico-passiva de efeitos ainda mais drásticos do que
aqueles que resultariam do cometimento de uma falta grave. Explicito. Se um empregado
comete falta grave, assujeita-se, lógico, a perder o seu emprego. Mas essa causa legal de ruptura
do vinculo empregatício não opera automaticamnte. É preciso que o empregador, no uso de sua
autonomia de vontade, faça incidir o comando da lei. Pois o certo é que não se pode recusar a
ele, empregador, a faculdade de perdoar seu empregado faltoso.
21. Não é isto, porém, o que se contém no dispositivo legal agora adversado. Ele determina o
fim, o instantâneo desfazimento da relação laboral, pelo exclusivo fato da opção do empregado
por um tipo de aposentadoria (a voluntária) ...
...
23. Não exagero, portanto, fundamentação jurídica para deduzir que a concessão da
aposentadoria voluntária ao trabalhador deve extinguir, instantânea e automaticamente, a
relação empregatícia. Quanto mais que os “valores sociais do trabalho” se põem como um dos
explícitos fundamentos da República Federativa do Brasil (inciso IV do art. 1°). Também
assim, base e princípio da “Ordem Econômica”, voltada a “assegurar a todos existência
digna conforme os ditames da justiça social (...)” (art. 170 da CF), e a “busca do pleno
emprego” (inciso VIII). Sem falar que o primado do trabalho é categorizado como “base” de
toda a ordem social, a teor do seguinte dispositivo constitucional:
“Art. 193. A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar
e a justiça sociais.”
24. Daí o seguinte magistério de Maurício Goginho Delgado, citando José Afonso da Silva 3:
“(...) Finalmente, na leitura de todos esses dispositivos há que se considerar o estuário cultural
e normativo característicos de toda a Constituição, em que se demarcam
o primado conferido ao trabalho e as inúmeras garantias deferidas a seu
titular. Como bem apontado pelo constitucionalista José Afonso da Silva, o direito ao
trabalho “... ressai do conjunto de nomas da Constituição sobre o trabalho”. É que, para a
Constituição, a República Federativa do Brasil tem como seus
fundamentos, entre outros, os valores sociais do trabalho (art. 1°, IV); a
ordem econômica também se funda na valorização do trabalho (art. 170),
ao passo que a ordem social tem como base o primado do trabalho (art.
193). Tudo isso, inevitavelmente, conduziria ao necessário
reconhecimento do “.., direito social ao trabalho, como condição da
efetividade da existência digna (fim da ordem econômica) e, pois, da
dignidade da pessoa humana, fundamento, também, da República
Federativa do Brasil (art. 1°, III)”.
25. Nessa ampla moldura, deduzo que uma proposição em contrário levaria à
perpetração de muito mais desrespeito à Constituição do que prestígio
para ela. Quero dizer, o que se ganharia com a tese contrária seria suplantado, de muito,
pelas perdas infligidas ao sistema de comandos da Constituição-cidadã, a significar, então,
postura interpretativa oposta à preconizada pelo chamado “principio da proporcionalidade em
sentido estrito”.
26. Seguindo a mesma linha de raciocínio até aqui expendida, ajunto que a colenda 1ª Turma
deste Supremo Tribunal Federal deu provimento ao RE 449.420 (RI. Min. Sepúlveda
Pertence), ocasião em que proclamou: “viola a garantia constitucional o acórdão
que, partindo e premissa derivada de interpretação conferida ao art. 453,
caput, da CLT (redação alterada pela L. 6.204/75), decide que a
aposentadoria espontânea extingue o contrato de trabalho, mesmo
quando o empregado continua a trabalhar na empresa após a concessão
do benefício previdenciário” (DJU de 14.10.2005).
27. Isso posto, meu voto é pela procedência da presente ADI, para o fim de declarar
inconstitucional o § 2° do art. 453 da C.L.T.”
(grifamos)
Na hipótese vertente, a única diferença que existe é entre o ato jurídico que gera a
extinção que automática do contrato de trabalho.
No caso do parágrafo 2°, de acordo com a Lei 9527/97, era a aposentadoria (ato
que poderia até vir a ser praticado pelo próprio empregado) enquanto no inciso II do artigo
141 da Lei 11.101/05 é a simples alienação da empresa em processo falimentar, fato esse
que, diga-se de passagem, sequer expressa a vontade do empregado ou dele depende e, em
alguns casos, nem mesmo a do empregador.
Também não se diga, por outro lado que não seria o caso de exigir a edição da Lei
Complementar porque assim como a regra previu a extinção de direitos trabalhistas, o fez
relação a tributos, de modo a explicitar que a matéria falimentar isentaria o legislador dessa
formalidade.
Isto porque, não bastasse exigir o citado artigo 7°, inciso I a edição de lei
Complementar, é de se registrar que na parte relativa aos tributos cuidou o legislativo de
editar – e o poder executivo de promulgar no mesmo dia em que promulgou a Lei
11.101/05 – a Lei Complementar n. 118/05, que alterou o artigo 133 do CTN,
exatamente para permitir que, em casos de alienação judicial de empresas e de suas filiais,
em processos de recuperação judicial e falência, não haja sucessão de obrigações tributárias
pelo adquirente.
Entretanto, relativamente aos direitos sociais do trabalho e a dignidade do
trabalhador, o mesmo não ocorreu, suprimindo-se não só essas garantias constitucionais,
como inovando-se em matéria trabalhista. Se houve por bem estabelecer, por via de uma lei
ordinária, uma nova e, permissa vênia, heterogênea e neo-liberal forma de extinção de
contratos de trabalho, sem que fosse por justa causa ou vontade unilateral do empregador
e, pio do que isso, sem qualquer garantia ou indenização dos empregados.
Todavia, a decisão que privilegia os direitos sociais trabalhistas não prevaleceu, na
mesma intensidade, quando julgada a ADI 3934, que passou a ser considerada um notável
precedente para (em termos de decisões judiciais) a Lei de Recuperação e Falência de
Empresas, cuja ementa é a seguinte:
Neste caso o Supremo rejeita ação do PDT contra Lei de Recuperação Judicial,
julgando totalmente improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3934) do
PDT contra a Lei de Recuperação Judicial (Lei 11.101/05).
O PDT contestou três dispositivos da norma, apontando “descaso com a valoração
do trabalho e a dignidade dos trabalhadores”. Para os ministros, ao contrário, a nova
norma representa uma significativa inovação diante da antiga Lei de Falências (Decreto-Lei
7.661/45), que raramente permitia a sobrevivência de uma empresa em concordata.
Trechos dos votos de alguns ministros denotam as razões da improcedência da
ação e da constitucionalidade do art. 142 da lei 11.101/2005.
Em seu voto o relator da ação, ministro Ricardo Lewandowski afirmou que “um
dos principais objetivos da Lei 11.101 consiste justamente em preservar o maior número
possível de empregos nas adversidades enfrentadas pelas empresas, evitando ao máximo as
dispensas imotivadas, de cujos efeitos os trabalhadores estarão protegidos”.
O ministro, então presidente do STF, Gilmar Mendes destacou que “a lei faz uma
belíssima engenharia institucional, buscando viabilizar créditos para eventualmente
satisfazer o ativo e os eventuais passivos [de uma empresa em processo de recuperação
judicial]”.
O ministro Cezar Peluso, que votou antes de Mendes, já havia ressaltado que “todo
o esquema de engenharia da lei foi exatamente de preservar as empresas como fonte de
benefícios e de riquezas de caráter social”.
Se referindo ao texto da lei, Eros Grau afirmou: “tenho que admitir, é plenamente
adequado à Constituição Federal”.
Ainda Celso de Melo entendeu que “a racionalidade econômica subjacente à lei
ajusta-se, a meu juízo, aos padrões, aos critérios e aos parâmetros que a Constituição
Federal estabelece aos critérios de atividade econômica e também de proteção ao próprio
empregador”.
Assim, o recurso do PDT que pretendia fosse julgada inconstitucional o inciso II
do artigo 141 da lei, que impede a sucessão, para o arrematante da empresa, das obrigações
de natureza trabalhista e aquelas decorrentes de acidentes de trabalho foi declarado
constitucional.
Na visão do ministro Lewandowski, o projeto de lei tramitou por cerca de 11 anos
no Congresso Nacional e não apenas resultou de amplo debate com setores sociais
diretamente afetados por ela, como também surgiu da necessidade de preservar-se o
sistema produtivo nacional, inserido em uma ordem econômica mundial”.
Segundo ele, foi neste contexto que o legislador optou pela regra que impede a
sucessão de obrigações de natureza trabalhista. Parecer do Senado sobre esse dispositivo da
lei afirma que o impedimento de sucessão de dívidas trabalhistas não implica em prejuízo a
trabalhadores. Muito pelo contrário, afirma-se o parecer, tende a estimular maiores ofertas
pelos interessados na aquisição da empresa, o que aumenta a garantia dos trabalhadores, já
que o valor pago será utilizado prioritariamente para cobrir débitos trabalhistas.
Desta forma, o aparente conflito entre o art. 141, II da lei 11.101/2005 e a
Constituição Federal, por decorrência de afronta ao princípio do pleno emprego, ao
contrário do que supôs o PDT, na visão da corte constitucional, tem o papel, não de negar
o pleno emprego, mas o de permitir a continuação dos empregos, pela continuidade da
atividade empresária.
Nessa circunstância, o que se percebe é que correta aplicação é do princípio da
preservação da empresa, que tende a ser cada vez mais aplicado, pelos operadores do
direito, em estratégias de defesa e no embasamento de decisões judiciais.
Cabe observar que o preceito em questão não teu seu gênesis, pura e simplesmente,
advindo de uma lei especifica, muito pelo contrário, é resultado de uma lenta evolução,
sendo pormenorizado na medida em que o interesse da coletividade voltava-se para a
preservação das empresas.
Coelho (2008) entende que o princípio da preservação da atividade empresarial
surgiu como preceito norteador da dissolução parcial das sociedades empresárias.
Vejamos a seguinte defesa do citado autor (2008, p. 463):
Art. 133 A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra,
por qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial
ou profissional, e continuar a respectiva exploração, sob o mesmo ou outro
nome empresarial, responde pelos tributos relativos ao fundo ou
estabelecimento adquirido, devidos até a data do ato:
I – integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou
atividade;
II – subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou
iniciar dentro de seis meses, a contar da data da alienação, nova atividade no
mesmo ou em outro ramo de comércio, indústria ou profissão.
§ 1o O disposto no caput deste artigo não se aplica na hipótese de alienação
judicial:
I – em processo de falência;
II – de filial ou unidade produtiva isolada, em processo de recuperação judicial.
(grifos da autora).
Do ponto de vista teleológico, salta à vista que o referido diploma legal buscou,
antes de tudo, garantir a sobrevivência da empresa em dificuldades - não raras
vezes derivadas das vicissitudes por que passa a economia globalizada -,
autorizando a alienação de seus ativos, tendo em vista, sobretudo, a função
social que tais complexos patrimoniais exercem, a teor do disposto no art. 170,
III, da Lei Maior.
Ainda conforme o Relator, a LRFE tem em mira contribuir para que a empresa
eventualmente acometida por uma crise possa superá-la e, no mesmo embalo, também
busca preservar a continuidade da atividade empresarial, os vínculos trabalhistas e a cadeia
de fornecedores, com a qual mantém uma “verdadeira relação simbiótica”.
E, por consequência, o sistema produtivo nacional. Trata-se, no fundo, da
prevenção da “eclosão de crises globais cíclicas altamente desagregadoras”, dando
concreção ao princípio constitucional da livre iniciativa.
Em suma, a partir dessa interpretação teleológica, de caráter principiológico
constitucional, mediante um juízo de ponderação à luz de uma situação concreta, entrevê-
se que a Lei 11.101/2005 concilia-se com os mandamentos constitucionais, uma vez que
referida lei mostrou-se como instrumento de realização ou concretização dos valores e
princípios previstos na CF/88, numa situação atípica e excepcional que é a insolvência,
justificando, assim, esse tratamento diferenciado aos institutos da recuperação de empresas
e da falência.
A lei em tela, por vezes, em razão de reger o exercício de uma atividade econômica
e sua respectiva insolvência, guarda estreita relação com termos não jurídicos, mas de
caráter econômico, o que dificulta a compreensão.
Portanto, para concluir, a lei 11.101/05, ao regular o instituto da falência, é clara ao
declarar que, diante do trespasse do estabelecimento empresarial, alienação judicial de filiais
ou de unidades produtivas isoladas, o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus, não
havendo sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive nas de natureza
tributária, trabalhista ou decorrente de acidente de trabalho. No que concerne à
recuperação judicial, a lei não se refere de maneira expressa quanto à sucessão trabalhista, o
que acaba por alimentar discussões doutrinárias, acerca da ocorrência deste evento jurídico,
na recuperação judicial de empresas.
Entendendo a efetivação do princípio da preservação da atividade empresarial, por
meio de sua alienação, como forma de garantir os créditos trabalhistas - visto que a venda
proporcionará rendimentos para o pagamento dos credores - e, ainda, como meio de
manutenção dos postos de trabalho, no caso de um novo contrato, vê-se que a inovação
trazida pela legislação falimentar beneficia, de forma direta, o credor e, indiretamente, a
sociedade, por meio da manutenção da empresa, conforme já retratado.
No entanto, há resistência à mudança trazida por referida legislação, tendo em vista
que a mesma ofenderia aos princípios da proteção ao trabalhador e da continuidade da
relação de emprego, a qual pode ser visualizada nos arts. 10 e 448, da Consolidação das
Leis Trabalhistas.
Considerando a colisão entre os princípios em discussão, de um lado a preservação
da empresa e, do outro, a continuidade das relações de trabalho, deve-se levar em
consideração os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, para a resolução mais
acertada do litígio.
Analisando a situação em apreço, pode-se dizer que a ocorrência da sucessão
trabalhista, na falência, inviabilizaria tal procedimento, visto que não haveria interessados
na aquisição do patrimônio do falido. Assim, os benefícios sociais gerados com a
manutenção da empresa, em especial para os trabalhadores, que passam a ter a garantia de
seus créditos e dos postos de emprego, não seriam alcançados.
Diante disso, conclui-se que a inexistência de sucessão trabalhista acaba por tornar-
se uma forma de proteção do trabalho e de dignificação da figura do empregado, em razão
do princípio da preservação da empresa.
5 CONCLUSÃO
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