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EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E O FUTURO DA EDUCAÇÃO

SOBRE OS QUATRO PILARES DE DELORS

Guacira Quirino Miranda


Faculdade de Gestão e Negócios, Curso de Administração a Distância
Universidade Federal de Uberlândia
Endereço eletrônico: guacira@triang.com.br

RESUMO: Estudo teórico sobre a educação a distância, na perspectiva do aluno de um curso


superior a distância, e o futuro da educação, com base nos pilares da educação divulgados no
relatório para a UNESCO, da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI,
coordenada por Jacques Delors.

PALAVRAS-CHAVE: ensino superior; educação; educação a distância.

ABSTRACT: Theoretical study about distance learning, from the perspective of the higher
distance learning student, and the future of education, based on Delors’ pillars, explained in
UNESCO report of the International Commission on Education for the Twenty-First Century
(The Delors Report).

KEYWORDS: higher education; education; distance learning.

O objetivo deste trabalho é verificar a Educação a Distância – EaD e o futuro da


educação, com base nos quatro pilares da educação relatados por Jacques Delors: aprender a
conhecer, aprender a fazer, aprender conviver e aprender a ser.
Trata-se de um estudo teórico sobre a educação a distância, na perspectiva do aluno de
um curso superior a distância, e sobre o futuro da educação, com base nos pilares da educação
divulgados no relatório para a UNESCO, da Comissão Internacional sobre Educação para o
Século XXI, coordenada por Jacques Delors.
Segundo o educador Moacir Gadotti, “estes pilares podem ser tomados também como
bússola para nos orientar rumo ao futuro da educação”.
A educação a distância tem sido apontada como uma possibilidade de educação para o
futuro, impulsionada pelos seguintes fatores: desenvolvimento dos meios tecnológicos que
permitem a comunicação rápida e eficaz e o acesso a uma grande quantidade de informações;
necessidade de permanente aprendizado e qualificação em virtude da rápida obsolescência dos
conhecimentos e da grande competitividade existente no mercado de trabalho; expectativa de
ampliação do acesso à educação para atender às demandas sociais.
A Educação a Distância é a modalidade educacional na qual a mediação didático-
pedagógica nos processos de ensino e aprendizagem ocorre com a utilização de meios e
tecnologias de informação e comunicação, com estudantes e professores desenvolvendo
atividades educativas em lugares ou tempos diversos. Esta definição está presente no Decreto
5.622, de 19.12.2005 (que revoga o Decreto 2.494/98), que regulamenta o Art. 80 da Lei
9394/96 da Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB.
Se os pilares de Delors orientam o futuro da educação, resta saber se a educação a
distância tem seguido esta bússola. Uma forma de buscar respostas a este questionamento é
analisar cada um dos pilares, desenvolvendo as relações entre seus pressupostos e a educação
a distância:

1. Aprender a conhecer: “é preciso pensar também o novo”. A educação a distância


exige que o aluno abandone os pressupostos da educação tradicional, presencial, para buscar
novas formas de aprendizagem. Por se tratar de uma modalidade de ensino que ainda enfrenta
preconceitos, é preciso estar aberto para as novas metodologias. Este aprender a conhecer, nas
palavras de Delors, significa aprender a aprender. Para o aluno da educação a distância o uso
das tecnologias da informação e da comunicação para a aprendizagem em ambientes virtuais e
de interatividade, requer a disposição e a curiosidade.
Nos ambientes virtuais de aprendizagem existem diferentes recursos, tais como vídeo-
aulas, teleconferências, chats, fóruns, além de muitos textos e links de conteúdo. Existe a
presença do orientador, não como um professor transmissor de conhecimento, mas como um
consultor acadêmico. O atendimento ao aluno é organizado para o acompanhamento e a
avaliação de seu processo de aprendizagem, no entanto, a maior parte do processo de
aprendizagem deve acontecer de forma independente e autônoma.
Nesta modalidade de ensino deixa de existir o processo centrado no professor, e o
aluno percebe que existem diversas fontes de conteúdo. Delors alerta para a necessidade de
fixação do conhecimento, dizendo que “o exercício da memória é um antídoto necessário
contra a submersão pelas informações instantâneas difundidas pelos meios de comunicação
social”. Este aprender a conhecer exige do aluno da educação a distância a disciplina e o
compromisso com o processo de aprendizagem, pois a fixação do conhecimento depende da
dedicação do aluno quanto ao cumprimento das tarefas que são prescritas com a finalidade de
fixar os conteúdos. O aluno aprende que a liberdade e a flexibilidade dos cursos a distância
exigem responsabilidade, para que ele não se perca no decorrer do caminho.

2. Aprender a fazer: “vale mais hoje a competência pessoal”. A educação a distância


muda o foco do ensino para a aprendizagem, ou seja, não é o professor, mas o aprendiz. O
aluno é levado a ser mais autônomo e responsável pela sua aprendizagem.
Delors afirma que “aprender a conhecer e aprender a fazer são, em larga medida,
indissociáveis”, pois o aprender a fazer significa colocar em prática os conhecimentos. Mais
do que a noção de qualificação existe hoje a noção de competência, que é um conceito mais
amplo do que a qualificação. A qualificação trás um sentido de adaptação, enquanto a
competência está voltada à autonomia. Por isto o aluno da educação a distância é mais
autônomo, e já que a aprendizagem autônoma é mais centrada no aprendente, o aluno precisa
ser capaz de auto-dirigir e auto-regular o seu processo de aprendizagem. Aprender a fazer
implica na aplicação prática de habilidades e conhecimentos, por isto vale mais a competência
pessoal.
Delors ressalta que “as aprendizagens devem evoluir e não podem mais ser
consideradas como simples transmissão de práticas mais ou menos rotineiras, embora
continuem a ter um valor formativo que não é de desprezar”. Ele se refere à qualificação que
não cria novos conhecimentos. O aprender a fazer não é simplesmente aprender a
desempenhar uma tarefa, embora esta aprendizagem também seja necessária. Os alunos
precisam adquirir competências para que possam “exercer no futuro funções que ainda nos
são desconhecidas ou indefinidas, o que implica que a educação deve preparar os jovens
aprendentes para adquirir autonomia suficiente – capacidade de aprender – que lhes permitam
continuar a sua formação ao longo da vida profissional” (BELLONI, 2001: p. 85).
A metodologia do ensino a distância estimula a pesquisa, a experimentação e a
aprendizagem teórico-prática. O aluno é incentivado a trazer suas experiências pessoais para o
ambiente de aprendizado, e a fazer as conexões entre o seu cotidiano e a teoria que está
estudando. No aprender a fazer o aluno coloca em prática os seus conhecimentos.

3. Aprender a conviver: “a descoberta progressiva do outro e a participação em projetos


comuns”. A educação a distância descobriu na internet a possibilidade de interatividade, e os
alunos se relacionam on-line em salas de bate-papo, mensagens eletrônicas e fóruns, além dos
encontros presenciais que estimulam o relacionamento e a troca de saberes.
O atual modelo de educação a distância, denominado educação on-line ou e-learning,
difere dos modelos anteriores por utilizar uma rede de computadores, ou conexões via
internet, que proporcionam uma educação bidimensional na qual o aluno interage com
Orientadores e colegas de curso.
Muitas vezes, entende-se o aluno da educação a distância como uma pessoa solitária,
sentada diante da tela de um computador, isolada do mundo e imersa em suas atividades. É
preciso considerar que o processo de aprendizagem é individual, que exige momentos de
concentração e de reflexão. Porém, este aluno é estimulado a compartilhar informações, a
desenvolver tarefas em grupo, participar de comunidades virtuais, se encontrar em salas de
bate-papo (chats), e publicizar nos fóruns o seu conhecimento e as suas opiniões.
Os alunos dos cursos a distância são estimulados a desenvolverem relações
interpessoais, e aprenderem a interagir com os colegas nos diferentes momentos do curso, em
uma relação de circularidade que não se restringe ao Orientador e sobre a qual o Orientador
não tem domínio.
Aprender a viver com os outros, na opinião de Delors, é um dos maiores desafios da
educação. Vivemos em uma época de conflitos e de alta competitividade, em que o espírito de
competição e a busca do sucesso individual são altamente valorizados. Segundo o autor, a
educação deve propiciar a descoberta progressiva do outro e “num segundo nível, e ao longo
de toda a vida, a participação em projetos comuns”.
Na educação a distância os objetivos e os projetos são comuns a todos os alunos, que
aprendem a buscar nas relações com pessoas de diferentes localidades e conhecimentos, a
forma de diminuir as distâncias e encontrarem apoio para o desenvolvimento das tarefas.
Além disto, uma vez que o aluno é estimulado a trazer suas experiências pessoais e
profissionais para o ambiente do curso, na aplicação prática de habilidades e conhecimentos, a
troca de experiências propicia a aproximação dos componentes do grupo. Os encontros
presenciais, que são obrigatórios em alguns cursos desta modalidade de ensino, em função da
legislação vigente, também apresentam oportunidades de maior interação entre os
participantes.
Ainda sobre aprender a viver junto, a conviver, a interação com os colegas e o
orientador, ajuda o aluno a aprender a ouvir diferentes pontos de vista, argumentar, filtrar as
informações que considera cabíveis, e formular o seu pensamento sobre os diversos assuntos.

4. Aprender a ser: “ter capacidade de discernimento e de responsabilidade pessoal”. A


educação a distância pressupõe uma maior liberdade do aluno de forma que possa conciliar
seus interesses pessoais, mas exige a administração do tempo e da realização das tarefas, com
um alto índice de comprometimento.
Na concepção de Delors, aprender a ser abrange o desenvolvimento total da pessoa. A
sua capacidade de formular pensamentos autônomos e críticos, e seus próprios juízos de valor,
para que desenvolva o poder de decisão.
A educação deve preparar os alunos para estarem aptos a agirem nas diferentes
situações da vida. Eles precisam estar preparados para as mudanças, e para compreenderem os
fatos e decidirem de forma livre e responsável.
O aluno da educação a distância reconhece que o sucesso de seu empreendimento
depende do seu comprometimento. Durante o curso ele enfrenta dificuldades diversas, de
adaptação aos novos métodos de ensino, de cumprimento de tarefas em prazos estipulados, de
desenvolvimento de pesquisas e da busca de contextualização do conhecimento teórico. Além
disto, em muitos casos, passa por problemas familiares porque o fato de desenvolver seus
estudos no ambiente doméstico exige a capacidade de organização, para conciliar os estudos e
o relacionamento familiar.

Delors afirma que a educação ao longo da vida baseia-se nestes quatro pilares, e que a
educação ocupa cada vez mais espaço na vida das pessoas, “porque a evolução rápida do
mundo exige uma atualização contínua dos saberes”. O Relatório Jacques Delors aponta para
a educação no século XXI, e a comissão que o elaborou sob a sua coordenação, desenvolveu
um trabalho que se tornou referência para se pensar a educação em todos os seus aspectos.
Neste relatório ressalta as notáveis descobertas e avanços tecnológicos do último
quarto de século que se passou, e acrescenta que “a Comissão não poderia analisar as
principais opções sociais que a educação tem que enfrentar sem recordar a importância que
convém dar às novas tecnologias da informação e da comunicação”. Refere-se não somente às
práticas pedagógicas, mas à questão de acesso ao conhecimento. Informa que há um farto
material que advém de uma sólida experiência nesta modalidade de educação em vários
países, que pode oferecer apoio à comunidade educativa. A opinião é de que a introdução das
novas tecnologias de informação e de comunicação nos sistemas educativos é “um desafio
decisivo, e é importante que a escola e a universidade se coloquem no centro desta profunda
transformação que afeta o conjunto da sociedade” (DELORS, 1998: p.190). A Comissão
percebe vantagens no uso das novas tecnologias na educação.
Belloni, na introdução de seu livro sobre educação a distância, ressalta o conceito de
educação ao longo da vida, e aborda a crise da educação, principalmente no que se refere à
inovação educacional e ao uso educativo das novas tecnologias. Ao falar sobre a educação no
futuro reafirma a ênfase no estudante, que vai além da introdução das novas tecnologias, mas
que considera suas necessidades e expectativas, e o desenvolvimento de suas capacidades de
auto-aprendizagem. Lembra ainda que não basta implantar novas tecnologias, pois a
mediatização do ensino exige uma nova postura comunicacional e pedagógica. Menciona a
flexibilização como palavra-chave deste processo: flexibilização do acesso, com a
democratização das oportunidades; flexibilização do ensino, para o desenvolvimento das
habilidades de auto-aprendizagem; flexibilização da aprendizagem, no sentido de autonomia e
independência do estudante; e flexibilização da oferta: para atender às demandas sociais e
para a educação ao longo da vida.
O Seminário Internacional Universidade XXI – Novos caminhos para a educação
superior – Ministério da Educação e Cultura – MEC, realizado em Brasília, de 25 a 28 de
agosto de 2003, elaborou um relatório, coordenado pelo professor José Geraldo de Souza
Junior, do Departamento de Política do Ensino Superior da Secretaria de Ensino Superior –
SESu, e por Irislene Fernandes de Paula, da Assessoria Internacional da Secretaria de
Educação Superior do MEC. O objetivo do seminário foi debater a educação superior no
mundo contemporâneo, para buscar subsídios para uma reforma no sistema brasileiro de
educação superior. Uma das questões prioritárias foi a necessidade de ampliação do acesso à
educação superior de qualidade. Dentre as diretrizes para uma nova Universidade
encontramos: promover a inclusão social e integrar Ciência e Tecnologia. As diretrizes falam
ainda sobre “utilizar a tecnologia, redes de informação, dados digitalizados e educação a
distância como meios facilitadores da transmissão, difusão e acesso ao conhecimento”. O
relatório considera estratégico o desenvolvimento de programas para o uso de novas
tecnologias de ensino, e a aplicação de metodologias de ensino a distância e em rede.
O professor Gadotti recomenda cautela para se analisar as perspectivas da educação,
porque “falar em perspectivas é falar de esperança no futuro”. Porém, dentre as questões que
estabelece para pensar a educação do futuro, pergunta: qual é o papel da educação na era da
informação? E considera que uma das categorias necessárias para se pensar é a da
virtualidade, pois a informática, associada à telefonia, nos inseriu definitivamente na era da
informação.
O desenvolvimento deste ensaio teórico leva a considerar que a educação a distância
se apóia sobre os quatro pilares da educação, descritos por Jacques Delors. O aluno desta
modalidade de educação é autônomo e capaz de auto-dirigir e auto-regular o seu processo de
aprendizagem. É um ser crítico e contextualizado, que valoriza o relacionamento e a troca de
saberes. É produto da sociedade do conhecimento, que exige a educação ao longo de toda a
vida.
O aluno vence a resistência em relação ao novo, e recebe a recompensa de ampliar
suas possibilidades e se sentir parte ativa deste processo de inovação.
Em um mundo competitivo em que as informações se atualizam a cada instante, o
aluno da educação a distância desenvolve habilidades e conhecimentos que o tornam apto a
enfrentar situações de mudanças constantes e para as quais não existe a resposta pronta. Ele
aprende a conhecer, aprende a fazer, aprende a conviver e aprende a ser.
Ao pensar o futuro da educação na perspectiva do aluno de um curso superior a
distância, a conclusão é de que nos novos caminhos da educação superior, a educação a
distância vai estar cada vez mais presente. O aluno vai escolher esta modalidade de ensino
pelas vantagens que ele apresenta, de desenvolver atividades educativas em lugares e tempos
que o aluno escolhe, além de maior possibilidade de acesso à educação já que as vagas
oferecidas são em maior quantidade. As instituições de ensino superior terão que se adaptar
para atenderem à demanda dos alunos de educação a distância e, no futuro, o processo irá se
inverter, com as instituições acompanhando o ritmo evolutivo da educação para tornarem
atrativas e para atenderem às necessidades dos alunos. Pode ser também que, no futuro, a
educação a distância deixe de existir sob esta denominação, pois hoje se costuma mencionar
as inovações tecnológicas em educação, que irão fazer parte do processo educativo sem que,
necessariamente, seja feita a distinção dos cursos pela sua modalidade de ensino. Os cursos
terão atividades presenciais e a distância.

REFERÊNCIAS:
BELLONI, M.L. Educação a Distância. Campinas, SP: Editora Autores Associados, 2001.
DELORS, J. Educação: um tesouro a descobrir. São Paulo, Cortez, 1998.
GADOTTI, M. Perspectivas atuais da educação. Porto Alegre, Ed. Artes Médicas, 2000.
SEMINÁRIO INTERNACIONAL UNIVERSIDADE XXI. Novos caminhos para a
educação superior, 2003, Brasília. 11 p. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/sesu/arquivos/pdf/novoscaminhoseducacaosuperior.pdf>. Acesso
em 25.09.2007.
BRASIL, Ministério da Educação. SESu – Secretaria de Educação Superior. Educação
Superior a Distância. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/sesu/index.php?
option=content&task=category&sectionid=7&id=100&Itemid=298>. Acesso em 25.09.2007.

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