seus trinta e poucos anos de idade, que perde a sua mãe. Sua mãe estava em um asilo de velhos em Marengo, que fica a oitenta quilômetros de Argel. Meursault acaba não desejando ver sua mãe pela última vez dentro do caixão. Começa o velório, que dura a noite toda. Alguns amigos da falecida aparecem, entre eles, uma grande amiga, que chora bastante. Quando amanheceu o dia, fez-se uma procissão até o cemitério. Além do protagonista, foram também o padre, dois acólitos, o diretor do asilo e Tomaz Pérez, um grande amigo da falecida sua mãe. Meursault não sabia direito a idade de sua mãe. Rapidamente presenciou o enterro, e partiu para sua casa em Argel, sem ter se emocionado muito, e feliz por tudo ter se arranjado, como ele gosta de dizer. No outro dia Meursault toma um banho de mar com Maria Cardona, uma antiga datilógrafa do escritório. Depois vai com ela ao cinema assistir um filme de comédia. No domingo descansa bastante, para no próximo dia voltar ao trabalho. Salamano, um vizinho seu, tinha um cão, que vivia a insultar. Outro vizinho com que Meursault convive é Raimundo, que entra na sua casa algumas vezes e conversa muito com ele. Raimundo não era querido pela vizinhança, e disse ao seu único amigo que estava sendo enganado por uma mulher. Dizia que ela não lhe ajudava e também não trabalhava. Raimundo chegou a bater num homem na rua e mesmo espancar sua amante. Meursault escreveu uma carta, a pedido do mesmo, endereçada à sua ex-amante, com o objetivo de fazê-la voltar para ele. Mas de nada adiantou. Raimundo voltou a bater na mulher, e só parou quando a polícia chegou e a levou. Os vizinhos partilhavam o desgosto pelos policiais e Meursault serviu de testemunha no caso para Raimundo. Salamano aparece sem o seu cão, e Meursault tenta ajudá-lo, dando instruções ao velho, para que ele conseguisse seu cão de volta. Em seguida, Raimundo combinou de passar um domingo na casa de Masson, Maria foi convidada. Disse também que fora seguido durante todo o dia por um grupo de Árabes entre os quais estava o irmão de sua antiga amante. Meursault desligou o telefone e seu chefe lhe propôs um trabalho em Paris. Logo à noite, Maria veio buscá-lo, perguntou se ele queria casar com ela e se animou com a possibilidade de morar em Paris. No dia seguinte, Salamano veio até a casa de Meursault e entre outras coisas disse que ele devia sentir-se bem infeliz desde a morte da mãe. E também concordou que o asilo era o melhor lugar para ela. No domingo, Raimundo e Maria foram com Meursault à casa de praia de Masson. No caminho viram os árabes, e Raimundo apontou ao recém-casado quem era seu “ex-cunhado”. Logo que chegaram, os três se juntaram aos moradores da casa, foram tomar um banho de mar, e depois almoçaram. Depois do almoço, Raimundo, Meursault e Masson foram caminhar pela praia, e dois Árabes vinham em suas direções. Raimundo foi para cima de seu desafeto, desferiu-lhe socos e voltou para a casa de seu amigo com o braço enfaixado e um adesivo no canto da boca. Depois de certo tempo, voltaram a andar ao longo da praia, até que encontraram novamente os Árabes. Meursault pediu o revólver a Raimundo e disse para ele brigar com o árabe homem a homem. Fez menção de disparar, mas resignou. Os dois voltaram pra casa. Meursault estava prestes a subir a escada, quando decidiu voltar ao rochedo em que os Árabes se encontravam, no intuito de, segundo ele, descansar. Mal começara a repousar, quando viu o desafeto de Raimundo voltando ali. Logo que o viu, o árabe pôs a mão no bolso, procurando a navalha. Naturalmente, agarrou no revólver. Depois de alguns breves e tensos movimentos, Meursault viu com clareza a luminosidade da navalha do Árabe, tremeu com o revólver na mão e disparou. Voltou a disparar mais quatro vezes contra o corpo do Árabe. Oito dias depois de preso, o juiz de instrução olhou o caso com curiosidade, e no dia seguinte, um advogado veio até a prisão. O advogado relacionou a morte da mãe com o caso, e Meursault tentou fazê-lo notar o contrário. Levado ao juiz de instrução, ele foi submetido a várias perguntas, às quais não respondia. O juiz de instrução disse ser cristão e ouviu o preso contrariá-lo várias vezes e dizer que não acreditava em Deus. Antes de sair, o juiz perguntou se ele estava arrependido do seu gesto. Ele disse que mais que isso, experimentava certo aborrecimento. Apenas depois da primeira e última visita de Maria que Meursault se sentiu realmente na prisão. Na prisão, lera uma história impressionante que deveria ter se passado na Tchecoslováquia. Sem perceber direito, e depois de cinco meses preso, começara o julgamento do caso. O presidente da sessão chamou as testemunhas, que eram: Tomás Perez, Raimundo, Masson, Salamano, Maria e Celeste, o dono de um restaurante em Argel. Imediatamente começou o interrogatório. Na presença também de jornalistas, o presidente, além de perguntas protocolares, insistia no fato do acusado ter mandado sua mãe para o asilo. A uma pergunta do procurador em relação ao fato de Meursault ter voltado à nascente com a intenção de matar o árabe, sua resposta foi “não” e que fora o acaso que lá, armado, o levara. Depois do almoço em sua cela, a sessão recomeçou, e foi chamado o depoimento do diretor do asilo. O diretor disse que o réu não quis ver o corpo da sua mãe. Depois foi chamado o porteiro do asilo, repetindo-se o mesmo cerimonial. Tomás Perez depôs, e respondeu que não vira Meursault chorar. Celeste destacou que para ele o crime foi uma desgraça. Maria, por sua vez, disse era amiga do réu. O procurador perguntou a Maria bruscamente quando começara essa ligação, e observou que parecia ser apenas um dia depois da morte da mãe. Maria contou o banho e também indicou sua ida ao cinema, para ver um filme cômico de Fernandel, para espanto de toda sala. Depois de Masson, e de Salamano, chegou a vez de Raimundo, a última testemunha. Disse que a presença de Meursault na praia fora um mero acaso. O procurador argumentou que o acaso tinha costas largas nesta história toda. Afirmou que o réu era seu cúmplice e amigo. O procurador terminou declarando: “O mesmo homem que, um dia depois da mãe ter morrido, se entregava à mais vergonhosa devassidão, matou por razões fúteis e para liquidar um inqualificável caso crapuloso.” O advogado de acusação afirmou que não se tratou de um crime banal, e que não podia ser atenuado. O mesmo procurador disse que o acusado não tinha alma, nem nada de humano. Para o advogado de defesa ele era um filho modelo, que sustentara a mãe até não mais poder. Meursault perguntou a seu advogado se não poderia derrogar o processo, em caso de sentença desfavorável. Foi-lhe explicado que não se derroga um processo sem mais nem menos. O presidente, mais tarde, anunciou que lhe cortariam a cabeça em praça pública, em nome do povo francês. O réu questionava a seriedade da decisão, mas foi obrigado a reconhecer que a partir do instante em que fora tomada, os seus efeitos eram tão sérios como a presença da parede ao longo da qual se estendia. Nestes momentos se lembrou de uma história que a mãe costumava contar-lhe a respeito de seu pai, que nunca conhecera. A história era de que seu pai adorava assistir às execuções. Meursault verificou que o que havia de defeituoso na guilhotina era não existir nenhuma possibilidade de salvação. Para ele, ali era-se morto discretamente, talvez com um pouco de vergonha, mas com muita precisão. Para ele também, pouco importava se morresse aos trinta ou aos setenta. O capelão entrou em sua cela, conversou bastante com o preso, tentou fazê-lo crer que seria salvo, mas ele discordava veementemente. O padre acabou sendo puxado pela gola da sotaina, depois de ter seus sermões rejeitados por Meursault. Os seguranças vieram para separá-los. Meursault, depois de vários questionamentos de valores morais, terminou aceitando a rejeição do seu recurso e foi executado em praça pública.
Apreciação Crítica
“O Estrangeiro” é um romance de Albert Camus, que
bem parece com um conto, devido à sua brevidade. O livro ilustra o pensamento chamado “absurdo da existência”, que é desenvolvido pelo autor francês em muitas de suas obras. Camus continua muito atual, mesmo cinco décadas após a sua morte. O estrangeiro é hoje o recordista absoluto de vendas em formato de bolso na França, e é também a principal obra do francês nascido na Argélia. Albert Camus tem como principais influências os romancistas Franz Kafka e Dostoiévski. Para mim, a obra descorre com uma velocidade simplesmente absurda, fazendo jus ao estilo do autor. Mesmo assim, há muita tensão. Nada comparável a Dostoiévski,por exemplo, mas interessante com certeza. Principalmente quando o protagonista e ao mesmo tempo narrador faz suas observações características do campo da metafísica. Mas o livro, a meu ver peca pela falta de detalhes sobre os personagens, poderia ser maior e discorrer mais lentamente. Apesar disso, o estrangeiro é o ponto alto do “ciclo do absurdo” de Camus. Porém, o mais impressionante, é que se me pedissem para dar um elogio ao romance, seria o repúdio que Meursault causa no leitor. Este que comete um assassinato praticamente sem motivo, mas que pelo menos foi bem descrito, atenuando pelo menos um pouco a sensação de que Meursault não tinha sentimento. Pelo menos o assassino tremeu ao segurar a arma. Para mim, é um livro muito artificial. Em alguns trechos se percebe claramente algumas observações protocolares de um escritor que não consegue esconder sua própria vida e personalidade. O anti-herói Meursault é um homem sem sentimentos, literalmente. Pois, para que serve a arte, senão para manifestar os sentimentos do ser humano? Também não gostei do final, que acaba com as reflexões de Meursault. Em algum momento essas reflexões passam a ficar sem pé nem cabeça, e até pouco condizentes com a falta de personalidade do personagem principal. Tivemos alguns bons momentos no julgamento e também as manjadas indagações sobre a existência de Deus. Mas, sinto dizer, sem muito brilhantismo. Concluindo, não posso aplaudir, mesmo que tenha chegado a seu propósito com muito talento, uma obra que é “contra” a arte.