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O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

CURSO 1
INSTITUTOS FUNDAMENTAIS

MÓDULO 1
DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

nalização:
inks com informação na internet
VERSÃO IMPRESSA
2 CURSO 1
INSTITUTOS FUNDAMENTAIS

1. Como foi criado o novo CPC?


Vivemos um momento histórico! Estamos diante de um novo Código de Processo Civil, o
primeiro construído a partir de um regime exclusivamente democrático, decorrente da partici-
pação de diversos setores da sociedade, de um rico embate doutrinário e político.
Antes do novo CPC existiram apenas outros dois Códigos do gênero.
O primeiro, de 18 de setembro de 1939, foi concebido de forma autoritária, por meio
de um Decreto-Lei de Getúlio Vargas, sob a égide de um regime ditatorial e contemporâneo à
Constituição Federal outorgada (imposta) conhecida como “A Polaca”.
O segundo, fruto da redação monocrática de Alfredo Buzaid, após a designação do General
Emílio Garrastazu Médici, nasceu durante a ditadura militar e espelhou muitos dos valores do
seu tempo: prova disso ter sofrido 71 alterações durante a sua vigência, a grande maioria
após a Constituição Federal de 1988.
A necessidade de uma nova sistematização, o clamor dos operadores do direito por um
processo mais célere e efetivo, a fragmentação da sensação de incerteza por um sem nú-
mero de decisões contraditórias – prova disso a criação da súmula vinculante pela Emenda
Constitucional 45/2004 –, e o acúmulo de demandas nos tribunais, somados, abriram trinchei-
ras para uma nova e importante mudança.
O projeto de novo Código de Processo Civil nasceu no Senado Federal, por meio do Projeto
de Lei do Senado 166 de 2010, apresentado em 08.06.2010 pelo Senador José Sarney, após o
assessoramento e o parecer de uma rica comissão de doze processualistas, capitaneados pelo
então Ministro do Superior Tribunal de Justiça Luiz Fux – atual Ministro do Supremo Tribunal
Federal – e composta por outros renomados juristas do quilate de Bruno Dantas, Elpídio Donizetti
Nunes, Humberto Theodoro Júnior, José Miguel Garcia Medina e Teresa Arruda Alvim Wambier.
No Senado Federal, o Relatório do Senador Valter Pereira foi aprovado em 15.12.2010.
Na Câmara dos Deputados, a proposição foi renumerada, passando a tramitar como
Projeto de Lei 8.046 de 2010 e com o auxílio de diversos especialistas “notáveis”, dentre eles
Cândido Rangel Dinamarco, Kazuo Watanabe, Ada Pellegrini Grinover, Thereza Arruda Alvim,
Cássio Scarpinella Bueno e Fredie Didier Júnior.
Os números impressionam: após quinze audiências públicas naquela Casa Legislativa,
treze conferências estaduais, ouvidos 140 palestrantes e um total de novecentas emendas, o
Relatório elaborado pelo Deputado Paulo Teixeira foi aprovado em 26 de março de 2014 e,
por fim, o projeto foi reenviado à Casa de origem.
Retornando ao Senado Federal, o projeto recebeu o nome de Substitutivo da Câmara dos
Deputados (SCD) ao projeto de Lei do Senado 166/2010 . Após célere tramitação, foi aprovado
o texto-base do novo Código de Processo Civil em 16.12.2014, a partir do Relatório do Senador
Vital do Rêgo , e apreciados outros dezesseis destaques (dos quais dez restaram aprovados)
no dia seguinte (17.12.2014).
Após alguns pequenos reparos de redação e renumeração de artigos em razão da aprova-
ção dos referidos destaques, no dia 25 de fevereiro de 2015 o Projeto foi remetido à Presidência
da República para sanção ou veto.
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Finalmente, a Lei 13.105, de 16 de março de


2015 , foi sancionada, após apenas seis vetos pon- Relatório elaborado pelo Deputado Paulo
tuais , sendo publicada no Diário Oficial da União de Teixeira aprovado em 26 de março de 2014

17.3.2015, entrando em vigência após um ano1. Ao


todo são 1.072 artigos.
15
Audiências
Públicas
Impende ressaltar que o novo Código de
Processo Civil contém institutos e procedimentos que
afetam diretamente o trabalho de todos os operado- Conferências
res do direito, indistintamente. Estaduais

O respeito ao contraditório substancial, o


respeito à ordem cronológica dos autos postos à con-
Palestrantes
clusão, a fundamentação das decisões judiciais e a
importante sistemática do respeito aos precedentes
jurisprudenciais provocarão reflexos, inclusive, nas
esferas penal, trabalhista e eleitoral, porquanto todos Emendas

os novos dispositivos têm aplicação imediata e subsi-


diária em relação à legislação processual específica.
Poucos dias antes do início da vigência do Novo CPC, a Lei 13.256/16 – publicada no DOU
05.02.2016 e com início de vigência simultânea ao novo diploma processual – alterou a sua
redação original e, em apertada síntese, transformou a “obrigatoriedade” do cumprimento da
ordem cronológica para as demandas aguardando julgamento em “preferencial”, restituiu a
dupla análise dos pressupostos de admissibilidade dos recurso especial e extraordinário, bem
como procedeu a pequenos ajustes, mormente na seara recursal.2

2. A constitucionalização do direito processual civil: um novo


paradigma

O Código de Processo Civil de 2015, como já referido no item anterior, foi o primeiro
gestado em um ambiente completamente democrático (no qual deve prevalecer a vontade da
maioria, após discussão e votação por representantes legitimamente eleitos) e republicano (a
república vem de res – coisa – pública, ou seja, é guiada pela supremacia do interesse público e
a indisponibilidade de utilização de bens ou instituições públicas para a satisfação de interesses
particulares).

1 Art. 1.045. Este Código entra em vigor após decorrido 1 (um) ano da data de sua publicação oficial.
2 Para um estudo mais detido das alterações trazidas pela Lei 13.256/16, recomendamos a leitura de dois
artigos publicados pelo Prof. Oscar Valente Cardoso: As Velhas Novidades do Novo CPC: Mais Mudanças e Retornos
ao Passado com a Lei nº 13.256/16. In: https://jus.com.br/artigos/46535/as-velhas-novidades-do-novo-cpc-mais-
mudancas-e-retornos-ao-passado-com-a-lei-n-13-256-16; e, Mais Novidades do Novo CPC: Os Artigos “Natimortos”
pela Lei nº 13.256/16. In: https://jus.com.br/artigos/46674/mais-novidades-do-novo-cpc-os-artigos-natimortos-pela-
lei-n-13-256-16. Acesso em 21.02.2016.
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Uma das implicações foi a de, logo em seu art. 1º, determinar-se que o CPC deverá ser
sempre interpretado à luz dos valores e normas fundamentais que emanam da Constituição
Federal3. Assim, a Constituição Federal transforma-se em um parâmetro mínimo e indispensá-
vel para fins de interpretação e aplicação do novo Direito Processual Civil.
Não há como pensar o processo, portanto, sem antes aplicar o filtro constitucional, pois
não? Mas, o que isto implica? Ora, simplesmente uma mudança paradigmática no comporta-
mento de todos os operadores do direito. Trata-se de uma forma de olhar o novo com os olhos
do novo.
Esta visão (constitucional) permitiu que a doutrina mais moderna rediscuta o próprio con-
ceito de processo. Elio Fazzalari, doutrinador italiano da atualidade, defende que o processo é
uma espécie de procedimento em contraditório4, o que explica a possibilidade de existência
de um processo tramitar fora da jurisdição, como é o caso do processo administrativo e da
arbitragem.
Para Eduardo de Avelar Lamy5 processo contemporâneo é:

[...] o instrumento de que se serve o estado para, tanto no


exercício da sua função jurisdicional quanto fora dela, com a par-
ticipação das partes e obedecendo ao procedimento estabelecido
na legislação específica, eliminar os conflitos de interesses, solu-
cionando-os; um ato jurídico complexo constituído pela operação
de um núcleo de direitos fundamentais sobre uma base procedi-
mental, não somente no âmbito da jurisdição e não apenas para
declarar os direitos, mas principalmente para satisfazê-los no mun-
do dos fatos, na vida dos litigantes.

Imagine que uma parte junte aos autos novos documentos. Pouco importa se um proce-
dimento previsto no novo CPC é omisso ou não em relação à manifestação da parte contrária:
consoante a garantia constitucional do contraditório, é evidente que qualquer manifestação

3 Art. 1º O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamen-
tais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.
4 [...] Os processualistas têm sempre dificuldade, por causa da imponência do fenômeno (a trave no próprio
olho...), de definir o “processo” (esquema da disciplina de sua competência) e permanecem ligados, ainda durante
alguns decênios do século passado, ao velho e inadequado clichê pandetístico da “relação jurídica processual”. [...]
Como repetido, o “processo” é um procedimento do qual participam (são habilitados a participar) aqueles em cuja
esfera jurídica o ato final é destinado a desenvolver efeitos: em contraditório, e de modo que o autor do ato não possa
obliterar as suas atividades. [...] Existe, em resumo, o “processo”, quando em uma ou mais fases do iter de formação
de um ato é contemplada a participação não só – e, obviamente – do seu autor, mas também dos destinatários dos
seus efeitos, em contraditório, de modo que eles possam desenvolver atividades que o autor do ato deve determinar,
e cujos resultados ele pode desatender, mas não ignorar. In: FAZZALARI, Elio. Instituições de Direito Processual Civil. 8.
ed. Trad. Elaine Nassif. Campinas: Bookseller, 2006, p. 109-128.
5 LAMY, Eduardo de Avelar; RODRIGUES, Horácio Wanderlei. Curso de Processo Civil: Teoria Geral do Processo.
São Paulo: Conceito Editorial, 2011, p. 188.
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decisória do magistrado deverá ser precedida da oportunidade de a parte contrária expor os


seus argumentos (salvo se demonstrado que o acesso à nova informação levaria ao perecimen-
to do direito).
Ora, supremacia da Constituição em detrimento da lei não nos é uma novidade.
Evidentemente que não. Mas a incorporação de valores constitucionais pelo CPC de 2015 já re-
vela o ambiente que permeou o espírito do legislador durante a confecção do aludido diploma.
Vivemos, portanto, um intenso processo de constitucionalização do processo civil.
Neste sentido, como veremos, o novo CPC já incorporou em seu bojo a maioria das mais
importantes garantias processuais constitucionais, muitas vezes com maior profundidade e em
busca de decisões com maior qualidade de prestação jurisdicional. Como exemplos podemos
citar o respeito ao efetivo contraditório6 e a coerência e integridade das decisões judiciais7.

3. O que é isto – neoprocessualismo?


Parte da doutrina, diante deste novo paradigma (constitucional), passou a defender a
existência de uma nova fase evolutiva da ciência processual, intitulando-a de neoprocessualis-
mo: o direito processual civil à luz do neoconstitucionalismo8.
Luís Roberto Barroso9 identifica o neoconstitucionalismo, por sua vez, como um conjunto
amplo de transformações ocorrido no Estado e no Direito Constitucional, analisando-o de dife-
rentes perspectivas:
a) como um marco histórico, consolidou a formação do estado constitucional de
direito;
b) como marco filosófico, coincide com o pós-positivismo ao adotar a centralida-
de dos direitos fundamentais e a reaproximação entre ética e direito;
c) como marco teórico, simboliza o desenvolvimento de uma nova dogmática de
interpretação constitucional.
Consoante Eduardo Cambi, o neoconstitucionalismo, ao propor uma nova metodologia
jurídica, e o neoprocessualismo, ao incorporar a necessidade de compreender e utilizar as
técnicas processuais, a partir das bases constitucionais, trazem novas ideias que permitem
revisar posições tradicionais [...].10

6 Vide os arts. 7º, 8º e 10 da Lei 13.105/15.


7 Vide o § 1º do art. 489 da Lei 13.105/15.
8 HERZL, Ricardo A. Neoprocessualismo, processo e constituição: o direito processual civil à luz do neoconstitu-
cionalismo. Florianópolis: Conceito Editorial, 2013.
9 BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito: o triunfo tardio do direito
constitucional no Brasil. Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito
Público, n. 9, 2007. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/7547/neoconstitucionalismo-e-constitucionalizacao-do-
direito. Acesso em 28.05.2015.
10 CAMBI, Eduardo. Neoconstitucionalismo e neoprocessualismo: direitos fundamentais, políticas públicas e pro-
tagonismo judiciário. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 21.
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Fredie Didier Júnior aduz que, após a evolução do direito processual civil ter ocorrido
em três fases (sincretismo, processualismo e instrumentalismo), passa a ser mais adequado
considerar o momento atual como uma quarta fase da evolução do direito processual: neste
sentido, utiliza-se da expressão neoprocessualismo.11
Ainda, Carlos Alberto Álvaro de Oliveira denomina esta nova fase do direito processual civil
de formalismo-valorativo12, ao destacar a importância dos valores constitucionalmente prote-
gidos na pauta de direitos fundamentais na construção e aplicação do formalismo processual.
É salutar destacar que parcela da doutrina critica a ampliação desmedida dos meios de
interpretação calcado apenas em valores e princípios – assim como a criação de princípios
jurídicos sem uma norma jurídica que lhes dê guarida diante do ordenamento, o que é deno-
minado de pan-principiologismo13 –, ao argumento de potencializar o grau de subjetividade
das decisões judiciais.
Neste sentido, é possível que o julgador, eventualmente, utilize-se da (técnica de) ponde-
ração de valores sem nenhuma definição de critérios claros de julgamento, transformando-a
em um álibi teórico para decidir de acordo com sua vontade pessoal. Ora, isso não é democrá-
tico, tampouco republicano.
Utilizar-se dos princípios constitucionais como instrumentos para a abertura interpreta-
tiva (e não para o fechamento da compreensão) – e aqui o grande risco – pode conduzir ao
que Lenio Streck denomina de solipsismo judicial14. O juiz solipsista acredita que as razões de
decidir estão fundadas em suas experiências interiores e pessoais, sem conseguir estabelecer
uma relação entre seu ser interior e o conhecimento para além de si mesmo.
Para evitar a grande disparidade de interpretações divergentes, a desaguar em um gran-
de número de decisões conflitantes (diante de situações similares) – o que ironicamente vem
sendo apelidado de justiça lotérica15 –, o novo Código trabalha a partir do respeito a um novo

11 DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil. Vol. 1. 13. ed. Juspodivm: Salvador, 2011, p. 31-32.
12 OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro. O formalismo-valorativo no confronto com o formalismo excessivo. Revista de
Processo, n. 137. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2006.
13 Com efeito, venho denunciando de há muito um fenômeno que tomou conta da operacionalidade do direito.
Trata-se do pan-principiologismo, verdadeira usina de produção de princípios despidos de normatividade. Há milhares
de dissertações de mestrado e teses de doutorado sustentando que “princípios são normas”. Pois bem. Se isso é
verdadeiro – e, especialmente a partir de Habermas e Dworkin, pode-se dizer que sim, isso é correto – qual é o
sentido normativo, por exemplo, do “princípio” (sic) da confiança no juiz da causa? Ou do princípio “da cooperação
processual”? Ou “da afetividade”? E o que dizer dos “princípios” da “proibição do atalhamento constitucional”, da
“pacificação e reconciliação nacional”, da “rotatividade”, do “deduzido e do dedutível”, da “proibição do desvio de poder
constituinte”, da “parcelaridade”, da “verticalização das coligações partidárias”, da “possibilidade de anulamento” e o
“subprincípio da promoção pessoal”? Já não basta a bolha especulativa dos princípios, espécie de subprime do direito,
agora começa a fábrica de derivados e derivativos. Tem também o famoso “princípio da felicidade” [...] In: STRECK,
Lenio. O pan-principiologismo e o sorriso do lagarto. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2012-mar-22/senso-
incomum-pan-principiologismo-sorriso-lagarto. Acesso em 20.05.2015.
14 STRECK, Lenio. Verdade e Consenso: constituição, hermenêutica e teorias discursivas. 4ª ed. São Paulo: Sarai-
va, 2011, p. 517.
15 “Justiça Lotérica” é uma expressão cunhada pelo jurista Lenio Luiz Streck. In: Justiça lotérica: ativismo judicial
não é bom para a democracia. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2009-mar-15/entrevista-lenio-streck-
procurador-justica-rio-grande-sul. Acesso em 20.05.2015.
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(e complexo) sistema de precedentes jurisprudenciais, cujo intuito é o de fortalecer as decisões


dos tribunais, em especial das Cortes Superiores.

4. A razoável duração do processo


O que significa a expressão razoável duração do processo? Será que é possível medir, de
modo objetivo, qual o tempo ideal do tramitar processual? Evidentemente que não. Não exis-
tem fórmulas mágicas. Cada processo terá o seu tempo natural de amadurecimento.
Quando o art. 4º do novo CPC determina que as partes têm o direito de obter em prazo
razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa, não devemos confundir
efetividade com mera celeridade. Mais que isso: processo efetivo é aquele que se aproxima a
uma ideia de maior qualidade. E normalmente maior qualidade exige maior segurança. Afinal,
cada caso é um caso.16
O que o CPC de 2015 faz no tocante à razoável duração do processo é acelerar as de-
mandas julgadas em massa, ou seja, aquelas que dependem do posicionamento de uma tese
jurídica em um sentido ou em outro. Em outras palavras: as demandas que não exigem dilação
probatória e que podem ser decididas aos milhares, serão julgadas de maneira muito mais cé-
lere – procedentes ou improcedentes –, pelo respeito às decisões dos tribunais. Nestes casos
o juiz ou o relator deverá limitar-se a verificar se o caso enquadra-se em alguma tese já julgada
pelo tribunal ou não e, caso afirmativo, bastar-se-á em aplicá-la.
Neste sentido, o novo CPC traz diversas novidades relevantes, por exemplo:
a) o incidente de resolução de demandas repetitivas17: levará ao conhecimento
dos tribunais a existência de teses repetitivas e com grande repercussão social, so-
brestando todas as demais. Para que isso seja possível, as decisões firmadas pelos
tribunais passarão a compor um banco de informações, de acesso e verificação obriga-
tória pelos magistrados e servidores quando da análise das petições iniciais18. Diante

16 Para maior aprofundamento desta temática qualidade versus celeridade vide o artigo escrito por Ricardo
Augusto Herzl e Wilson Engelmann intitulado Processualismo tecnocrático versus processualismo tecnológico: da
eficiência quantitativa à efetividade qualitativa no Direito Processual Civil, disponível em http://emporiododireito.
com.br/processualismo-tecnocratico-versus-processualismo-tecnologico-da-eficiencia-quantitativa-e-efetividade-
qualitativa-no-direito-processual-civil-por-ricardo-augusto-herzl-e-wilson-engelmann/. Acesso em 27.05.2015.
17 Art. 976. É cabível a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas quando houver, simul-
taneamente: I - efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de
direito; II - risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica. [...]
18 Art. 979. A instauração e o julgamento do incidente serão sucedidos da mais ampla e específica divulgação e
publicidade, por meio de registro eletrônico no Conselho Nacional de Justiça. § 1º. Os tribunais manterão banco eletrô-
nico de dados atualizados com informações específicas sobre questões de direito submetidas ao incidente, comunican-
do-o imediatamente ao Conselho Nacional de Justiça para inclusão no cadastro. § 2º. Para possibilitar a identificação
dos processos abrangidos pela decisão do incidente, o registro eletrônico das teses jurídicas constantes do cadastro
conterá, no mínimo, os fundamentos determinantes da decisão e os dispositivos normativos a ela relacionados. § 3º.
Aplica-se o disposto neste artigo ao julgamento de recursos repetitivos e da repercussão geral em recurso extraordiná-
rio.
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da constatação de se tratar do mesmo assunto jurídico, o julgador deverá observar as


decisões dos tribunais, sob pena de caber reclamação ao tribunal correspondente, a
fim de garantir a supremacia de suas decisões19.

b) a assunção de competência20: toda vez que houver julgamento de recurso en-


volvendo relevante questão de direito e com grande repercussão social e interesse
público – mesmo que não haja repetição em múltiplos processos, como na hipótese
anterior –, o relator deverá propor este incidente para a decisão do Pleno (ou do Órgão
Especial), de modo a vincular todos os juízes e órgãos fracionários do respectivo tri-
bunal. A expressão vincular, até então, era somente utilizada pela súmula vinculante,
certo? Doravante, decisões da cúpula dos tribunais vinculam. Trata-se do dever de es-
tabilidade, integridade e coerência que passa a ser exigido da jurisprudência21.

c) o respeito ao enunciado de súmulas, jurisprudência ou precedentes jurispru-


denciais22: toda decisão (interlocutória, sentença ou acórdão) que desrespeitar as
decisões dos tribunais será nula, por vício de fundamentação23.

19 Art. 985. Julgado o incidente, a tese jurídica será aplicada: I - a todos os processos individuais ou coletivos que
versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal, inclusive àqueles
que tramitem nos juizados especiais do respectivo Estado ou região; II - aos casos futuros que versem idêntica questão
de direito e que venham a tramitar no território de competência do tribunal, salvo revisão na forma do art. 986. § 1º.
Não observada a tese adotada no incidente, caberá reclamação. [...]
20 Art. 947. É admissível a assunção de competência quando o julgamento de recurso, de remessa necessária
ou de processo de competência originária envolver relevante questão de direito, com grande repercussão social, sem
repetição em múltiplos processos. § 1º. Ocorrendo a hipótese de assunção de competência, o relator proporá, de ofício
ou a requerimento da parte, do Ministério Público ou da Defensoria Pública, que seja o recurso, a remessa necessária
ou o processo de competência originária julgado pelo órgão colegiado que o regimento indicar. § 2º. O órgão colegiado
julgará o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária se reconhecer interesse público na as-
sunção de competência. § 3º. O acórdão proferido em assunção de competência vinculará todos os juízes e órgãos fra-
cionários, exceto se houver revisão de tese. § 4º. Aplica-se o disposto neste artigo quando ocorrer relevante questão
de direito a respeito da qual seja conveniente a prevenção ou a composição de divergência entre câmaras ou turmas
do tribunal.
21 Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente. § 1º. Na
forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribunais editarão enunciados de
súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante. § 2º. Ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem
ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação.
22 Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão: I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concen-
trado de constitucionalidade; II - os enunciados de súmula vinculante; III - os acórdãos em incidente de assunção de
competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetiti-
vos; IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de
Justiça em matéria infraconstitucional; V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vincula-
dos.
23 1º. Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão,
que: [...] VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demons-
trar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.
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Todavia, desde já avisamos ao leitor: não se iluda com o discurso de que o novo CPC sem-
pre trará celeridade processual. Isso não é verdadeiro. O que o CPC de 2015 obtém, com a ideia
de incorporação em seu bojo das mais relevantes garantias constitucionais é, acima de tudo,
segurança jurídica e uma grande melhoria na qualidade das decisões judiciais.
Explica-se. De um lado tem-se o fim das demandas de massa a partir de um forte sistema
que pauta pelo respeito aos precedentes jurisprudenciais. Em decorrência, é certa a obtenção
de maior celeridade das demandas que envolvem teses jurídicas. Todavia, em relação aos ou-
tros tipos de demandas – aquelas que envolvem dilação probatória e que, por isso, não podem
ser resolvidas em uma única “tacada” – exigir-se-á maior esforço do sistema de justiça, o que
naturalmente aumentará o tempo de duração desse “tipo” de processo.
Vamos dar alguns exemplos do CPC de 2015 para ilustrar o que afirmamos:
a) a exigência de integridade e coerência das decisões judiciais24: doravante,
o novo CPC exige que todas as decisões judiciais sejam muito bem fundamentadas.
Não existirá mais espaço para decisões genéricas, padronizadas, ou aquelas que me-
ramente utilizam-se de paráfrase à lei ou a enunciado de súmulas, sem adentrar nas
peculiaridades do caso para indicar como deve ser aplicado o direito. Serão nulas deci-
sões do tipo indefiro a tutela porquanto não restam presentes seus requisitos ou com
base no princípio da proporcionalidade entendo que o interesse da sociedade deve
preponderar. Ora, o CPC de 2015 exige mais: de acordo com o caso em análise, quais
fatos (ou a ausência deles) desautorizam a concessão da tutela antecipada? Ainda,
quais são os fatos, os bens jurídicos em sopesamento e as peculiaridades do caso em
concreto que autorizam a ponderação em um determinado sentido? Assim, o ato de
decidir tornou-se mais complexo na medida em que o novo sistema processual buscará
maior qualidade da fundamentação.

b) o respeito ao contraditório substancial: relaciona-se não apenas ao direito de a


parte autora se manifestar nos autos (contraditório formal), mas principalmente de ser
ouvida pelo magistrado e poder influenciar em sua decisão. Assim, o juiz não poderá
decidir, mesmo em matérias que exigem o reconhecimento de ofício (por exemplo, in-
competência absoluta ou reconhecimento de inconstitucionalidade por meio difuso),

24 Art. 489. [...] § 1º. Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença
ou acórdão, que: I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com
a causa ou a questão decidida; II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua
incidência no caso; III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; IV - não enfrentar todos
os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador; V - se limitar
a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que
o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou
precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do
entendimento. § 2º. No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação
efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamen-
tam a conclusão. [...]
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sem antes baixar os autos em diligência e dar a oportunidade às partes de dizerem o


que pensam a respeito daquela decisão.
Mais que isso, o magistrado deverá se manifestar sobre todas as teses levantadas
pelas partes. No sistema do CPC de 1973 sequer eram conhecidos os embargos de de-
claração sob o fundamento da omissão. Agora é lei. Acerca do contraditório substancial
dedicamos um item a seguir para aprofundar o seu estudo, devido à sua importância.
c) a flexibilização procedimental: diante do novo sistema processual, as partes de
comum acordo poderão estipular mudanças nos procedimentos25, assim como podem
fixar um calendário para a prática de atos processuais26. Ainda, é permitido ao ma-
gistrado dilatar os prazos processuais e alterar a ordem de produção dos meios de
prova27. Imagine cada processo a tramitar por um procedimento diferente. Será que,
na prática, isto vai funcionar? Só o tempo irá dizer.
d) a técnica de suspensão de decisões colegiadas não unânimes: o novo CPC
acabou com o recurso dos embargos infringentes, ao argumento de maior celeridade
processual. Todavia, em contrapartida, criou um incidente processual a determinar,
de ofício, que toda decisão colegiada não unânime (o 2 a 1) seja suspensa, automa-
ticamente, a fim de que sejam chamados mais julgadores a viabilizar a reanálise e a
inversão do julgamento (a possibilitar o 2 a 3).

A respeito desta nova técnica, muito respeitosamente, já tecemos diversas críticas e re-
comendamos a leitura de um artigo publicado conjuntamente com o professor Lenio Streck28.
Assim, acreditamos que a saída dos embargos infringentes deu lugar a um incidente a propor-
cionar um grande aumento no retardamento do julgamento dos recursos ou, pior, estimular
que o julgador que se posicionou pelo voto vencido mude o seu entendimento em busca de
uma aparente segurança com a unanimidade do julgamento.
A fim de mitigar o ônus do tempo de duração do processo, ainda, o CPC de 2015 inova
acrescentando a tutela da evidência. Trata-se de uma técnica provisória de aceleração do mé-
rito da demanda, sem a necessidade da presença do requisito urgência. Aqui, muito cuidado:

25 Art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente
capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus
ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo. [...]
26 Art. 191. De comum acordo, o juiz e as partes podem fixar calendário para a prática dos atos processuais,
quando for o caso. § 1º. O calendário vincula as partes e o juiz, e os prazos nele previstos somente serão modificados
em casos excepcionais, devidamente justificados. [...]
27 Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: [...] VI - dilatar os
prazos processuais e alterar a ordem de produção dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito de
modo a conferir maior efetividade à tutela do direito; [...] Parágrafo único. A dilação de prazos prevista no inciso VI
somente pode ser determinada antes de encerrado o prazo regular.
28 HERZL, Ricardo A.; STRECK, Lenio. O que é isto – os novos embargos infringentes? Uma mão dá e a outra...
Disponível em: http://www.conjur.com.br/2015-jan-13/isto-novos-embargos-infringentes-mao-outra. Acesso em
28.05.2015.
11 CURSO 1
INSTITUTOS FUNDAMENTAIS

a tutela da evidência, portanto, é espécie de tutela provisória, ao lado das tutelas de urgência,
portanto.
Para a concessão da tutela da evidência, trabalha-se com a seguinte lógica: um fardo ne-
cessário que todo processo contém é o seu necessário tempo de tramitação. Até os processos
mais céleres exigem um decurso temporal mínimo para o seu tramitar.
Assim, o que a tutela da evidência faz é inverter o ônus do tempo de duração do proces-
so para que este fardo – a demora – seja carregado por aquele que tem a menor probabilidade
de estar com a razão29.
Em conclusão, a razoável duração do processo diz respeito ao tempo necessário para que
se extraia o máximo de qualidade e, consequentemente, uma maior aproximação do papel do
poder judiciário ao ideal de Justiça.
E não se diga, aqui, que o juiz perdeu poderes porque estará engessado pelos tribunais
superiores. Ao contrário, se o novo sistema processual reduz a margem para entendimentos
divergentes no tocante às teses jurídicas, de outro fortalece o papel dos magistrados nas de-
mandas que envolvem dilação probatória, do qual se espera uma atuação muito mais próxima
e atuante, mormente no tocante à integridade e coerência de suas decisões.

5. A boa-fé processual

Um dos princípios que permeou toda a elaboração do novo Código é a boa-fé processual.
Tanto é assim que há previsão expressa para que esta seja levada em conta desde a interpreta-
ção do pedido30 até a interpretação da decisão judicial31.
A principal forma de preservar a boa-fé é combater a litigância de má-fé. Embora as cau-
sas enumeradas para a sua configuração tenham permanecido as mesmas32, o valor da multa
foi majorado (de até 1%) para de 1% a 10% sobre o valor corrigido da causa, condenando os

29 Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou
de risco ao resultado útil do processo, quando: I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto pro-
pósito protelatório da parte; II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver
tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante; III - se tratar de pedido reipersecutório
fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega
do objeto custodiado, sob cominação de multa; IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos
fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. Parágrafo único.
Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.
30 Art. 322. [...] § 2º A interpretação do pedido considerará o conjunto da postulação e observará o princípio da
boa-fé.
31 Art. 489. [...] § 3º A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e
em conformidade com o princípio da boa-fé.
32 Art. 80. Considera-se litigante de má-fé aquele que: I – deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de
lei ou fato incontroverso; II – alterar a verdade dos fatos; III – usar do processo para conseguir objetivo ilegal; IV – opu-
ser resistência injustificada ao andamento do processo; V – proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato
do processo; VI – provocar incidente manifestamente infundado; VII – interpuser recurso com intuito manifestamente
protelatório.
12 CURSO 1
INSTITUTOS FUNDAMENTAIS

litigantes de má-fé na proporção dos seus interesses. Quando a causa for de valor inestimável
(não for possível a sua liquidação) ou irrisório, o valor da multa poderá ser fixado em até dez
vezes o valor do salário mínimo33. Eventual condenação em litigância de má-fé reverterá em
benefício da parte contrária, salvo as sanções impostas aos serventuários da justiça34.
Arrolamos outras hipóteses de combate à má-fé processual constantes do novo CPC:
a) Quando o beneficiário da assistência jurídica gratuita simula esta condição para,
de má-fé, furtar-se do pagamento de custas e eventual condenação em despesas pro-
cessuais. Nesta hipótese, será condenado no décuplo da condenação das despesas
processuais35.
Ainda, o CPC de 2015 determina permanecer o dever de pagar as multas processuais
ao beneficiário da gratuidade judiciária36; caso contrário, o beneficiário da gratuidade
poderia faltar livremente com a boa-fé processual, em seus mais variados aspectos e
restaria livre de qualquer sanção.
Mas, se o beneficiário da gratuidade judiciária o é exatamente por não ter con-
dições econômicas de arcar com as despesas processuais, como responderá por tais
sanções? Obviamente, dever de pagar e efetivo pagamento são coisas completamente
diversas.
Neste sentido, vale lembrar que não existe isenção do beneficiário da gratuidade
judiciária em relação às despesas processuais, mas apenas a suspensão da exigibilida-
de da cobrança, que perdurará pelos próximos cinco anos do trânsito em julgado da
decisão37. Se dentro destes cinco anos houver demonstração de condição econômica
suficiente para arcar com as despesas, pode-se dar início à fase de cumprimento da
sentença.

33 Art. 81. De ofício ou a requerimento, o juiz condenará o litigante de má-fé a pagar multa, que deverá ser supe-
rior a um por cento e inferior a dez por cento do valor corrigido da causa, e a indenizar a parte contrária pelos prejuízos
que esta sofreu, além de honorários advocatícios e de todas as despesas que efetuou. § 1º Quando forem dois ou mais
os litigantes de má-fé, o juiz condenará cada um na proporção de seu respectivo interesse na causa ou solidariamente
aqueles que se coligaram para lesar a parte contrária. § 2º Quando o valor da causa for irrisório ou inestimável, a multa
poderá ser fixada em até dez vezes o valor do salário mínimo. § 3º O valor da indenização será fixado pelo juiz, ou, caso
não seja possível mensurá-la, liquidado por arbitramento ou pelo procedimento comum, nos próprios autos.
34 Art. 96. O valor das sanções impostas ao litigante de má-fé reverterá em benefício da parte contrária, e o valor
das sanções impostas aos serventuários pertencerá ao Estado ou à União.
35 Art. 100. [...] Parágrafo único. Revogado o benefício, a parte arcará com as despesas processuais que tiver
deixado de adiantar e pagará, em caso de má-fé, até o décuplo de seu valor a título de multa, que será revertida em
benefício da Fazenda Pública estadual ou federal e poderá ser inscrita em dívida ativa.
36 Art. 98. [...] § 4º A concessão da gratuidade não afasta o dever de o beneficiário pagar, ao final, as multas pro-
cessuais que lhe sejam impostas.
37 Art. 98. [...] § 3º Vencido o beneficiário, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição
suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos cinco anos subsequentes ao trânsito em julgado
da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que
justificou a concessão da gratuidade; passado esse prazo, extinguem-se tais obrigações do beneficiário.
13 CURSO 1
INSTITUTOS FUNDAMENTAIS

b) Caso as partes simulem a existência de um processo com a intenção preordena-


da de, por meio dele, atingir um objetivo ilegal – prática denominada colusão –, haverá
condenação nas sanções da litigância de má-fé38. Vale mencionar que, assim como o
CPC de 1973, o novo diploma processual arrola a colusão como uma das hipóteses a
ensejar a ação rescisória39.

c) Por violação a mecanismos de tutela inibitória – que visam inibir a prática de um


ilícito civil –, em razão do descumprimento injustificado de ordem judicial em execução
de obrigação de fazer ou não fazer, o recalcitrante deverá ser condenado nas penas da
litigância de má-fé40 cumuladas com as astreintes (multa cominatória).

d) Na hipótese daquele que propõe ação monitória ou do que contra esta opuser
embargos (defesa) imbuído de má-fé – ou seja, tenha consciência da falsidade ou si-
mulação da prova escrita –, haverá condenação em multa de até 10% sobre o valor da
causa41.

e) Ao que tiver acesso aos autos do processo e inserir observações pessoais entre
as linhas ou à margem de uma peça ou documento processual, além da determinação
de que tais observações sejam riscadas e não levadas em consideração, caberá conde-
nação em multa no valor de meio salário mínimo42.

f) Ao advogado público ou particular que não devolver os autos em até três dias da
intimação judicial para esta finalidade, sem prejuízo da apuração da falta disciplinar,
haverá condenação em meio salário mínimo43.

38 Art. 142. Convencendo-se, pelas circunstâncias da causa, de que autor e réu se serviram do processo para
praticar ato simulado ou conseguir fim vedado por lei, o juiz proferirá decisão que impeça os objetivos das partes,
aplicando, de ofício, as penalidades da litigância de má-fé.
39 Art. 963. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: [...] III – resultar de dolo ou
coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda, de simulação ou colusão entre as partes, a fim
de fraudar a lei; [...].
40 Art. 536. [...] § 4º O executado incidirá nas penas de litigância de má-fé quando injustificadamente descumprir
a ordem judicial, sem prejuízo de sua responsabilização por crime de desobediência.
41 Art. 702. [...] § 10. O juiz condenará o autor de ação monitória proposta indevidamente e de má-fé ao paga-
mento, em favor do réu, de multa de até dez por cento sobre o valor da causa. § 11. O juiz condenará o réu que, de
má-fé, opuser embargos à ação monitória ao pagamento de multa de até dez por cento sobre o valor atribuído à causa,
em favor do autor.
42 Art. 202. É vedado lançar nos autos cotas marginais ou interlineares, as quais o juiz mandará riscar, impondo a
quem as escrever multa correspondente à metade do salário mínimo.
43 Art. 234. [...] § 2º Se, intimado, o advogado não devolver os autos no prazo de três dias, perderá o direito à vista
fora de cartório e incorrerá em multa correspondente à metade do salário mínimo.
14 CURSO 1
INSTITUTOS FUNDAMENTAIS

g) Quando a parte autora conhecer do local da residência do réu e, ainda assim,


requerer a citação por edital44 (pretendendo se beneficiar dos efeitos da revelia), será
condenada em multa de cinco salários mínimos45.

h) Ao perito, especialista de confiança nomeado pelo juízo, que deixar de cum-


prir com seu múnus no prazo determinado, deverá ser aplicada multa por litigância de
má-fé46.

i) Caso o inventariante não cumprir com suas obrigações legais no processo de in-
ventário47, deverá ser aberto um incidente de remoção e, caso seja removido, deverá
entregar imediatamente ao inventariante substituto todos os bens (e documentos) re-
ferentes ao espólio. Não havendo a entrega imediata por circunstâncias que dependam
de sua vontade, ser-lhe-á aplicada multa de até 3% sobre o valor dos bens inventaria-
dos48, sem prejuízo de eventual indenização.

j) Quando houver a interposição do recurso de agravo interno (cabível contra de-


cisões interlocutórias do relator) manifestamente inadmissível, ou seja, o recorrente
age meramente com intuito protelatório e consciente de que o recurso é destituído de
fundamento, será condenado em multa de 1% a 5% sobre o valor atualizado da causa49.

44 Art. 256. A citação por edital será feita: I – quando desconhecido ou incerto o citando; II – quando ignorado,
incerto ou inacessível o lugar em que se encontrar; III – nos casos expressos em lei. [...].
45 Art. 258. A parte que requerer a citação por edital, alegando dolosamente a ocorrência das circunstâncias au-
torizadoras para sua realização, incorrerá em multa de cinco vezes o salário mínimo.
Parágrafo único. A multa reverterá em benefício do citando.
46 Art. 468. O perito pode ser substituído quando: [...] II – sem motivo legítimo, deixar de cumprir o encargo no
prazo que lhe foi assinado. § 1º No caso previsto no inciso II, o juiz comunicará a ocorrência à corporação profissional
respectiva, podendo, ainda, impor multa ao perito, fixada tendo em vista o valor da causa e o possível prejuízo decor-
rente do atraso no processo.
47 Art. 622. O inventariante será removido de ofício ou a requerimento: I – se não prestar, no prazo legal, as
primeiras ou as últimas declarações; II – se não der ao inventário andamento regular, suscitar dúvidas infundadas ou
praticar atos meramente protelatórios; III – se, por culpa sua, se deteriorarem, forem dilapidados ou sofrerem dano
bens do espólio; IV – se não defender o espólio nas ações em que for citado, deixar de cobrar dívidas ativas ou não
promover as medidas necessárias para evitar o perecimento de direitos; V – se não prestar contas ou as que prestar
não forem julgadas boas; VI – se sonegar, ocultar ou desviar bens do espólio. [...].
48 Art. 625. O inventariante removido entregará imediatamente ao substituto os bens do espólio; deixando de
fazê-lo, será compelido mediante mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse, conforme se tratar de bem
móvel ou imóvel, sem prejuízo da multa a ser fixada pelo juiz em montante não superior a três por cento do valor dos
bens inventariados.
49 Art. 1021. [...] § 4º Quando o agravo interno for declarado manifestamente inadmissível ou improcedente em
votação unânime, o órgão colegiado, em decisão fundamentada, condenará o agravante a pagar ao agravado multa
fixada entre um e cinco por cento do valor da causa atualizado. § 5º A interposição de qualquer outro recurso está
condicionada ao depósito prévio do valor da multa prevista no § 4º, à exceção do beneficiário de gratuidade da justiça
e da Fazenda Pública, que farão o pagamento ao final.
15 CURSO 1
INSTITUTOS FUNDAMENTAIS

k) Em caso de embargos de declaração manifestamente protelatórios, o recorrente


será condenado em multa de até 2%, elevando-a até 10% em caso de reiteração50.

6. A dignidade da Justiça

Além do litigar de má-fé – em que, via de regra, pressupõe-se a intenção deliberada de


prejudicar a parte contrária e, por isso, o valor da multa é a esta revertida –, o novo CPC re-
pudia com veemência todos os atos atentatório à dignidade da justiça51. A preservação desta
dignidade institucional tem como destinatário o Estado-juiz, razão porque o valor desta multa
pertencerá sempre ao Estado (Justiça Estadual) ou à União (Justiça Federal, do Trabalho, Militar
ou Eleitoral). Assim como no CPC de 1973, a cobrança da aludida multa dependerá do procedi-
mento de execução fiscal, salvo quando aplicada no bojo do processo de execução52.

As hipóteses de ato atentatório à dignidade da justiça no CPC de 2015 são:


a) Quando qualquer um que participe do processo (inclusive quem não for parte ou
interessado) deixar de cumprir com exatidão as decisões jurisdicionais ou criar emba-
raços à sua efetivação (v.g., quando uma empresa particular, sem que seja parte, deixa
de cumprir um ofício do juízo requisitando-lhe um documento).

50 Art. 1026. [...] § 2º Quando manifestamente protelatórios os embargos de declaração, o juiz ou o tribunal, em
decisão fundamentada, condenará o embargante a pagar ao embargado multa não excedente a dois por cento sobre
o valor atualizado da causa. § 3º Na reiteração de embargos de declaração manifestamente protelatórios, a multa será
elevada a até dez por cento sobre o valor atualizado da causa e a interposição de qualquer recurso ficará condicionada
ao depósito prévio do valor da multa, à exceção do beneficiário de gratuidade da justiça e da Fazenda Pública, que a
recolherão ao final.
51 Art. 77. Além de outros previstos neste Código, são deveres das partes, de seus procuradores e de todos aque-
les que de qualquer forma participem do processo: [...] IV – cumprir com exatidão as decisões jurisdicionais, de natu-
reza antecipada ou final, e não criar embaraços a sua efetivação; [...] VI – não praticar inovação ilegal no estado de fato
de bem ou direito litigioso. [...] § 2º A violação ao disposto nos incisos IV e VI constitui ato atentatório à dignidade da
justiça, devendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa de
até vinte por cento do valor da causa, de acordo com a gravidade da conduta. § 3º Não sendo paga no prazo a ser fixado
pelo juiz, a multa prevista no § 2º será inscrita como dívida ativa da União ou do Estado após o trânsito em julgado da
decisão que a fixou, e sua execução observará o procedimento da execução fiscal, revertendo-se ao fundo previsto no
art. 97. § 4º A multa prevista no § 2º poderá ser fixada independentemente da incidência das previstas nos arts. 520, §
1º, e 533. § 5º Quando o valor da causa for irrisório ou inestimável, a multa prevista no § 2º poderá ser fixada em até
dez vezes o valor do salário mínimo. § 6º Aos advogados públicos ou privados e aos membros da Defensoria Pública e
do Ministério Público não se aplica o disposto nos §§ 2º a 5º, devendo eventual responsabilidade disciplinar ser apu-
rada pelo respectivo órgão de classe ou corregedoria, ao qual o juiz oficiará. [...].
52 Art. 775. A cobrança de multa ou de indenizações decorrentes de litigância de má-fé ou de prática de ato aten-
tatório à dignidade da justiça será promovida no próprio processo de execução.
16 CURSO 1
INSTITUTOS FUNDAMENTAIS

b) A punição será aplicada a quem inovar ilegalmente no estado de fato de bem


ou direito litigioso (v.g., aquele que se desfaz rapidamente do bem ao saber que será
demandado), como no caso do depositário infiel53.
c) Caso, no processo de execução54, o executado aja com fraude, oposição malicio-
sa, dificulta, resiste às ordens judiciais ou não indica os bens à penhora55.

d) Pelo não comparecimento injustificado de autor ou réu à audiência de concilia-


ção e julgamento (a multa será de até 2% sobre o valor da causa)56.

e) Contra aquele que suscitar vício infundado com o objetivo de ensejar a desistên-
cia do arrematante (a multa será de até 20% do valor atualizado do bem arrematado)57.

f) Por fim, quando houver o oferecimento de embargos à execução meramente


protelatórios, ou seja, desprovidos de qualquer fundamento58.

Via de regra, o atentante responderá por multa de até 20% sobre o valor da causa. A apli-
cação da pena processual não se trata de uma mera faculdade, mas sim de um dever expresso
do juiz com a finalidade de prevenir e reprimir qualquer ato atentatório à dignidade da justiça59.

53 Art. 161. [...] Parágrafo único. O depositário infiel responde civilmente pelos prejuízos causados, sem prejuízo
de sua responsabilidade penal e da imposição de sanção por ato atentatório à dignidade da justiça.
54 Art. 770. O juiz pode, em qualquer momento do processo: [...] II – advertir o executado de que seu procedi-
mento constitui ato atentatório à dignidade da justiça; [...].
55 Art. 774. Considera-se atentatória à dignidade da justiça a conduta comissiva ou omissiva do executado que:
I – frauda a execução; II – se opõe maliciosamente à execução, empregando ardis e meios artificiosos; III – dificulta ou
embaraça a realização da penhora; IV – resiste injustificadamente às ordens judiciais; V – intimado, não indica ao juiz
quais são e onde estão os bens sujeitos à penhora e seus respectivos valores, não exibe prova de sua propriedade e, se
for o caso, certidão negativa de ônus. Parágrafo único. Nos casos previstos neste artigo, o juiz fixará multa ao executado
em montante não superior a vinte por cento do valor atualizado do débito em execução, a qual será revertida em pro-
veito do exequente, exigível na própria execução, sem prejuízo de outras sanções de natureza processual ou material.
56 Art. 334. [...] § 8º O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é conside-
rado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica
pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado.
57 Art. 903. [...] § 6º Considera-se ato atentatório à dignidade da justiça a suscitação infundada de vício com o ob-
jetivo de ensejar a desistência do arrematante, devendo o suscitante ser condenado, sem prejuízo da responsabilidade
por perdas e danos, ao pagamento de multa, a ser fixada pelo juiz e devida ao exequente, em montante não superior
a vinte por cento do valor atualizado do bem.
58 Art. 918. O juiz rejeitará liminarmente os embargos: [...] III – manifestamente protelatórios. Parágrafo único.
Considera-se conduta atentatória à dignidade da justiça o oferecimento de embargos manifestamente protelatórios.
59 Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: [...] III – prevenir ou
reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir postulações meramente protelatórias; [...].
17 CURSO 1
INSTITUTOS FUNDAMENTAIS

7. Princípio da cooperação processual?

De acordo com o art. 6º do novo CPC, todos os sujeitos do processo passam a ter o dever
de cooperar60 entre si. Ou seja, em tese, as partes devem cooperar com o juiz. Ainda, devem
autor e réu cooperar um com o outro. Eis o problema: como exigir cooperação entre litigantes?
O problema é definir no que consistirá esta tal cooperação e seus limites.
Parcela da doutrina tem criticado este novo instituto ao argumento de que as partes, em
juízo, estão naturalmente em lados contrários, razão por que ninguém poderia ser obrigado a,
por exemplo, apresentar provas contra si mesmo, sob violação da garantia fundamental à am-
pla defesa61. Ademais, mesmo que haja o dever de cooperar uma parte para com a outra, qual
seria a sanção para o seu descumprimento? A lei é silente a este respeito.
Assim, é perfeitamente sustentável que a cooperação processual entre as partes não pas-
se de uma mera declaração de boas intenções, por já restar absorvida pelo dever de lealdade
decorrente da já mencionada boa-fé processual. Do mesmo modo, a cooperação entre as par-
tes e o juiz já estaria subsumida pelo necessário respeito à dignidade da justiça. Portanto, ao
que nos aparenta, muito respeitosamente, sem qualquer utilidade prática o dispositivo em
comento.

8. Da garantia ao efetivo contraditório


Uma das maiores conquistas do novo CPC foi, sem dúvida, elevar o princípio do contradi-
tório ao seu grau máximo, o que parcela da doutrina afirma significar a transformação do atual
contraditório formal para o denominado contraditório substancial, de modo a assegurar às
partes:
a) A paridade de tratamento em seus mais variados aspectos, relacionados a di-
reitos e faculdades processuais, a meios de defesa, a ônus processuais, bem como a
deveres e a sanções processuais62 .
Esta forma de isonomia, portanto, vai muito além da simples paridade de armas.
Também não se trata de uma paridade apenas formal. Diante das peculiaridades do

60 Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, deci-
são de mérito justa e efetiva.
61 Por todos, vide: [...] Você quer uma decisão justa, efetiva e tempestiva? Então, caro utente, para o fim de
consegui-la deverá cooperar com o juiz e sobretudo com a contraparte, e esperar igual cooperação de ambos. Então
agora as partes deverão cooperar entre si? Parte e contraparte de mãos dadas a fim de alcançarem a pacificação
social... Sem ironias, mas parece que Hobbes foi expungido da “natureza humana”. Freud também. O novo CPC aposta
em Rousseau. No homem bom. Ou seja, com um canetaço, num passe de mágica, desaparece o hiato que as separa
justamente em razão do litígio. [...] (In: Streck, Lenio; Delfino, Lúcio; BARBA, Rafael Giorgio Dalla; LOPES, Ziel Ferreira.
A cooperação processual do novo CPC é incompatível com a Constituição. Disponível em http://www.conjur.com.
br/2014-dez-23/cooperacao-processual-cpc-incompativel-constituicao. Acesso em 23.12.2014.
62 Art. 7º. É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades proces-
suais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo
efetivo contraditório.
18 CURSO 1
INSTITUTOS FUNDAMENTAIS

caso em concreto, é permitido ao julgador promover a inversão do ônus da prova de


ofício, o que normalmente seria uma incumbência do autor. Trata-se da distribuição
dinâmica do ônus da prova63 .
b) O dever de não surpresa: dever de o julgador previamente ouvir a parte que
será atingida pela decisão. O magistrado está autorizado a decidir sem ouvir a parte
contrária (decisão inaudita altera pars) apenas em poucas exceções, quando existir o
risco do objeto ou do bem jurídico perecer diante do prévio conhecimento64.
c) A possibilidade de influenciar no resultado das decisões: se o julgador percebe
que vai se utilizar de um fundamento, em sua decisão, a respeito do qual as partes
ainda não tiveram a oportunidade de se manifestar, deverá (antes) baixar os autos em
diligência e intimar as partes acerca de tal fundamento (v.g., matérias que devem ser
conhecidas de ofício e não foram ventiladas por nenhuma das partes, como a decadên-
cia e a prescrição65) .
d) Exigir do julgador que sejam analisadas todas as teses defendidas pelas partes:
o CPC de 1973 exigia que o julgador apenas apresentasse uma fundamentação, não
havendo omissão na decisão que não enfrentava as teses levantadas pelas partes, in-
clusive para fins de afastar o cabimento de embargos de declaração.
Doravante, todavia, não será considerada fundamentada a decisão (interlocutória,
sentença ou acórdão) que não analisar todos os argumentos trazidos pelas partes66
, sob pena de nulidade. Ademais, o novo CPC repete o mandamento constitucional
insculpido no art. 93, IX, da Constituição Federal, e determina que todas as decisões
judiciais sejam públicas e fundamentadas67.

63 Art. 357. Não ocorrendo nenhuma das hipóteses deste Capítulo, deverá o juiz, em decisão de saneamento e
de organização do processo: [...] III - definir a distribuição do ônus da prova, observado o art. 373; [...] Art. 373. O ônus
da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; II - ao réu, quanto à existência de fato im-
peditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. § 1º. Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da
causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior
facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o
faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi
atribuído. § 2º. A decisão prevista no § 1º. deste artigo não pode gerar situação em que a desincumbência do encargo
pela parte seja impossível ou excessivamente difícil. [...].
64 Art. 9º Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que esta seja previamente ouvida. Parágrafo único.
O disposto no caput não se aplica: I – à tutela provisória de urgência; II – às hipóteses de tutela da evidência revistas
no art. 309, incisos II e III; III – à decisão prevista no art. 699.
65 Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não
se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de
ofício.
66 Art. 489. [...] § 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença
ou acórdão, que: [...] IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a
conclusão adotada pelo julgador; [...].
67 Art. 11. Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as deci-
sões, sob pena de nulidade. Parágrafo único. Nos casos de segredo de justiça, pode ser autorizada a presença somente
das partes, de seus advogados, de defensores públicos ou do Ministério Público.
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INSTITUTOS FUNDAMENTAIS

9. Da ordem cronológica de conclusão

O art. 12 do novo CPC determina que tanto juízes quanto tribunais deverão obedecer a or-
dem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão68. Não existe lista cronológica
de processos conclusos para decisões interlocutórias, portanto. Significa dizer: o julgador não
mais poderá escolher quais processos pretende julgar, por mais que busque reduzir a quanti-
dade de processos pendentes para julgamento. E a razão é simples: todos têm direito a uma
resposta do Poder Judiciário com isonomia de tratamento. De acordo com o Professor José
Miguel Medina trata-se do respeito ao princípio da impessoalidade69.
Evidentemente, a depender da matéria (processos criminais, por exemplo), da urgência
e até mesmo das metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça, será possível excep-
cionar a ordem cronológica de conclusão. O rol de exceções é taxativo e consta do § 2º do art.
12 do novo CPC.
A fiscalização ficará a cargo dos advogados e da sociedade, por meio do acesso permanen-
te à consulta pública por meio de uma lista, disponível tanto em cartório como por intermédio
da rede mundial de computadores.
As demais preferências legais deverão ser respeitadas (mandados de segurança, habeas
data, processos de idosos etc.), mas dentre os processos com a mesma preferência deverá tam-
bém ser obedecida a ordem cronológica de conclusão.
E se um advogado peticionar, por exemplo, postulando pela antecipação dos efeitos da
tutela ou requerer a tutela da evidência? Irá para o final da fila? A resposta é negativa, porque o
mero pedido da parte não terá o condão de alterar a ordem de análise do mérito, salvo se hou-
ver a necessidade de se baixar os autos em diligências ou determinar a reabertura da instrução.

68 Art. 12. Os juízes e os tribunais deverão obedecer à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença
ou acórdão. § 1o A lista de processos aptos a julgamento deverá estar permanentemente à disposição para consulta
pública em cartório e na rede mundial de computadores. § 2o Estão excluídos da regra do caput: I - as sentenças profe-
ridas em audiência, homologatórias de acordo ou de improcedência liminar do pedido; II - o julgamento de processos
em bloco para aplicação de tese jurídica firmada em julgamento de casos repetitivos; III - o julgamento de recursos
repetitivos ou de incidente de resolução de demandas repetitivas; IV - as decisões proferidas com base nos arts. 485
e 932; V - o julgamento de embargos de declaração; VI - o julgamento de agravo interno; VII - as preferências legais e
as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça; VIII - os processos criminais, nos órgãos jurisdicionais que
tenham competência penal; IX - a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamen-
tada. § 3o Após elaboração de lista própria, respeitar-se-á a ordem cronológica das conclusões entre as preferências
legais. § 4o Após a inclusão do processo na lista de que trata o § 1o, o requerimento formulado pela parte não altera
a ordem cronológica para a decisão, exceto quando implicar a reabertura da instrução ou a conversão do julgamento
em diligência. § 5o Decidido o requerimento previsto no § 4o, o processo retornará à mesma posição em que anterior-
mente se encontrava na lista. § 6o Ocupará o primeiro lugar na lista prevista no § 1o ou, conforme o caso, no § 3o, o
processo que: I - tiver sua sentença ou acórdão anulado, salvo quando houver necessidade de realização de diligência
ou de complementação da instrução; II - se enquadrar na hipótese do art. 1.040, inciso II.
69 Foi publicado no sítio do CONJUR – Consultor Jurídico interessante artigo a respeito, intitulado Novo CPC, a
ordem cronológica de julgamentos não é inflexível. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2015-fev-09/processo-
cpc-ordem-cronologica-julgamentos-nao-inflexivel. Acesso em: 28.05.2015.
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INSTITUTOS FUNDAMENTAIS

Da mesma forma, o escrivão deverá obedecer à ordem cronológica de recebimento e efe-


tivação dos pronunciamentos judiciais70. Por exemplo, quando um processo vem do Gabinete
com destino à Secretaria da Vara para o cumprimento de uma decisão, só poderá ser preterida a
ordem caso exista algum processo urgente, por determinação expressa do magistrado. Em caso
de desobediência do servidor impõe-se a instauração de processo administrativo disciplinar.
Por fim, há uma regra de transição que deve ser observada com muito cuidado: assim que
o novo CPC entrar em vigor, como terá aplicação imediata, deverá ser formada imediatamente
uma primeira lista de processos para julgamento em ordem cronológica, de modo a observar a
antiguidade da distribuição dentre aqueles que já estiverem conclusos71.
Assim, no primeiro dia da vigência do novo CPC deverão ser levantados todos os proces-
sos conclusos e, a partir da data de antiguidade da distribuição, um a um deverá ser ordenado
para fins de análise e julgamento.

70 Art. 153. O escrivão ou chefe de secretaria deverá obedecer à ordem cronológica de recebimento para pu-
blicação e efetivação dos pronunciamentos judiciais. § 1º. A lista de processos recebidos deverá ser disponibilizada,
de forma permanente, para consulta pública. § 2º. Estão excluídos da regra do caput: I - os atos urgentes, assim reco-
nhecidos pelo juiz no pronunciamento judicial a ser efetivado; II - as preferências legais. § 3º. Após elaboração de lista
própria, respeitar-se-ão a ordem cronológica de recebimento entre os atos urgentes e as preferências legais. § 4º. A
parte que se considerar preterida na ordem cronológica poderá reclamar, nos próprios autos, ao juiz do processo, que
requisitará informações ao servidor, a serem prestadas no prazo de 2 (dois) dias. § 5º. Constatada a preterição, o juiz
determinará o imediato cumprimento do ato e a instauração de processo administrativo disciplinar contra o servidor.
71 Art. 1.046. Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes,
ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973. [...] § 5º. A primeira lista de processos para julgamento em
ordem cronológica observará a antiguidade da distribuição entre os já conclusos na data da entrada em vigor deste
Código.

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