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Ano 9 · Nº 31 · 2017

DESAFIOS DA SÍNDROME
CONGÊNITA DO ZIKA
O BIOFARMACÊUTICO ANTÔNIO OLIVEIRA
MÉTODO CANGURU HARMONIZA
RELAÇÕES ENTRE FAMÍLIA E FALA SOBRE O TRABALHO NO LABORATÓRIO
EQUIPE MÉDICA NAS UNIDADES DE PESQUISA CLÍNICA (LPC) EM BUSCA DE
NEONATAIS DIAGNÓSTICOS MAIS PRECISOS PARA CASOS
DE LEUCEMIAS INFANTIS
ALEITAMENTO MATERNO É O
MELHOR ALIMENTO PARA CRIANÇAS JOGO ELETRÔNICO ENSINA CRIANÇAS
DE ATÉ SEIS MESES COMO DESCARTAR LIXO
Editorial
O Brasil possui uma po- dos grandes centros urbanos, no Trazemos também uma
pulação de 201,5 milhões de pes- Semiárido, na Amazônia e na entrevista (página 10) com o fár-
soas, dos quais 59,7 milhões têm zona rural. E é comum que mui- maco-bioquímico, professor e
menos de 18 anos de idade (Pnad tas crianças deixem a escola para coordenador do Laboratório de
2013). É um mar de gente que trabalhar e contribuir com a renda Pesquisa Clínica do Centro de
necessita da garantia de direitos familiar. Pesquisa Clínica do Hospital Uni-
e deveres e condições adequadas versitário da UFMA (LPC-CEPE-
para que se desenvolva físico e in- O Maranhão, infeliz- C-HUUFMA), Raimundo Antônio
telectualmente. De 1990 a 2012, o mente, está representado por meio Gomes Oliveira, que fala do tra-
Brasil reduziu a taxa de óbito en- desses graves índices de desen- balho de pesquisa e assistência às
tre crianças menores de 1 ano em volvimento humano relativos à crianças pacientes portadoras de
68,4%, atingindo a marca de 14,9 infância. Para reverter essa rea- leucemias do Instituto Maranhen-
mortes para cada 1.000 nascidos lidade, o Projeto de Mobilização se de Oncologia Hospital Aldeno-
vivos, segundo o Ministério da Social pela Primeira Infância da ra Bello (IMOAB).
Saúde (SIM/Sinasc 2012). Defensoria Pública do Estado do
Maranhão integra um conjunto de A partir desta edição
No entanto, bebês de até ações articuladas nas áreas de edu- apresentamos duas colunas, a Foto
1 ano ainda morrem por causas cação, saúde, cultura e assistência Síntese, de fotografia (página 07)
que podem ser evitadas. De 1990 social que são desempenhadas e a Sábias Palavras, de opinião
a 2013, o percentual de crianças por embaixadores e parceiros. A (página 52). A primeira é ofereci-
com idade escolar obrigatória fora Fundação de Amparo à Pesquisa da para que professores-pesquisa-
da escola caiu 64%, passando de e ao Desenvolvimento Científico e dores divulguem imagens de seus
19,6% para 7% (Pnad). Ainda as- Tecnológico do Maranhão (FAPE- trabalhos. A segunda é um espaço
sim, mais de 3 milhões de meni- MA) participa da campanha por reservado para artigos opinativos.
nos e meninas ainda estão fora da meio desta edição da revista Ino- Esperamos com nossa publicação
escola (Pnad, 2013). Não é difícil vação que publica a partir da re- contribuir para a melhoria de con-
identificar a quem a exclusão es- portagem de capa Desafios da sín- dições de vida para nossas crian-
colar atinge: são pobres, negros, drome congênita do zica (página ças. Boa leitura!
indígenas, quilombolas e deficien- 20), uma série de estudos voltados
tes. A maioria vive nas periferias à primeira infância. Maristela Sena|Editora
Expediente

Governador do Estado Diretora - Científica Fotos


do Maranhão Silvane Magali Vale Nascimento Arquivo FAPEMA, divulgação,
Flávio Dino Israel De Napoli, Leandro Alves,
Coordenadora do Núcleo de Julyane Galvão e Francisco Campos.
Secretário de Estado da Ciência, Difusão Científica - NDC e
Tecnologia e Inovação Editora responsável Fale Conosco
Jhonatan Almada Maristela Sena ndc@fapema.br
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e ao Desenvolvimento Científico e Asmynne Barbosa , Israel De Napoli, Endereço
Tecnológico do Maranhão - FAPEMA Leandro Alves e Maristela Sena Rua Perdizes, nº 05, Qd 37
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Mariza dos Santos Mendes

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Entrevista
12 Raimundo Antônio Gomes Oliveira

18 Desafios da síndrome
congênita do zika

Aleitamento materno é
o melhor alimento para
crianças de até seis meses
26

30 Universo literário
infantil no computador

4 Revista Inovação nº 30 / 2017


Sumário
Fatores socioeconômicos e
serviços de saúde na atenção
básica reduzem mortalidade
32
infantil no Brasil e no Maranhão

36 Assistência e controle no pré-natal


identificam síndrome hipertensiva
em mulheres gestantes

40 Método Canguru
harmoniza relações entre
família e equipe médica
nas Unidades Neonatais

45 Jogo eletrônico ensina crianças


como descartar lixo

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6 Revista Inovação nº 30 / 2017
FOTO SÍNTESE
Aqui você tem a oportunidade de revelar imagens do universo da sua pesquisa
É só enviar para ndc@fapema.br

PERIGO NA AREIA de 2017, uma outra dissertação do

O
Projeto Physalia, coor-
denado pelo professor mesmo programa de Pós-Graduação
Fotografia de Nivaldo Almeida
Jorge Luiz Silva Nunes foi defendida por Mayana Mendes
Piorski, professor do Departamento
do Departamento de e Silva Luana enfatizando a relação
de Biologia/Laboratório de Ecologia
e Sistemática de Peixes da UFMA Oceanografia e Limno- entre a distribuição de caravelas e
logia (DEOLI/UFMA), iniciou suas a ocorrência de acidentes com ba-
atividades em março de 2005. O ob- nhistas nas praias de São Luís. No
jetivo do estudo era definir o período momento, o grupo do professor Jor-
do ano de maior incidência de cara- ge Nunes estuda a sazonalidade da
velas em praias urbanas de São Luís ocorrência das caravelas nas praias
e, dessa forma, preparar estratégias urbanas de São Luís. Esse estudo faz
de prevenção e cuidados a serem re- parte do trabalho desenvolvido pelo
passados aos usuários das praias da mestrando Fábio da Silva Almeida
Ilha de São Luís. Ao longo dos anos do Programa de Pós-Graduação em
o projeto gerou muitas informações Oceanografia da UFMA. A FAPEMA
científicas por meio de projetos de contribuiu com todos os trabalhos do
iniciação científica e dissertações de projeto Physalia com bolsas de ini-
mestrado. Recentemente, o grupo pu- ciação científica, bolsas de extensão,
blicou um artigo científico na Revista bolsas de mestrado e outros editais,
da Sociedade Brasileira de Medicina a exemplo do projeto “Acidentes
Tropical intitulado Human enveno- causados por animais aquáticos em
mations caused by Portuguese man- comunidades pesqueiras tradicionais
-of-war (Physalia physalis) in urban do estado do Maranhão: Epidemio-
beaches of São Luis City, Maranhão logia, aspectos clínicos e propostas
State, Northeast Coast of Brazil terapêuticas e preventivas”. Os pro-
como um subproduto da dissertação jetos também tiveram a participação
de Mestrado de Denise Maria Rama- do professor Vidal Haddad Júnior da
lho Ferreira Bastos, ex-aluna do Pro- UNESP, renomado cientista brasilei-
grama de Pós-Graduação em Saúde ro na área de acidentes causados por
e Ambiente da UFMA. Em fevereiro animais aquáticos.

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ENTREVISTA
Raimundo Antônio Gomes de Oliveira

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EM BUSCA DA SINTONIA PERFEITA
ENTRE A PESQUISA E A ASSISTÊNCIA
Maristela Sena
Fotos: Leandro Alves

R
aimundo Antônio Go- imunomoleculares em oncohematologia
mes Oliveira tem nos por citometria de fluxo e biologia mole-
genes o amor pela ciên- cular aplicada; estudo de polimorfismos e
cia. É filho dos profes- pesquisa de mutações em anemias heredi-
sores do departamento tárias (eritroenzimopatias e hemoglobino-
de farmácia da UFMA, patias), automação e controle de qualidade
Antônio Benedito de em hematologia.
Oliveira e Maria do So-
corro Gomes Oliveira, e tem no currículo É professor das disciplinas, He-
pessoal um dado raro: tem três irmãos pro- matologia Clínica I e II e estágio supervi-
fessores-pesquisadores-doutores. O fato de sionado em Hematologia do Departamento
também ter abraçado o curso de farmá- de Farmácia da UFMA. Possui doutorado
cia trouxe alguns fatos memoráveis à sua e mestrado em Farmácia (Análises Clíni-
vida. Em 2003, a turma de formandos do cas - Hematologia) pela Universidade de
Curso de Farmácia homenageou pai, mãe
São Paulo (USP). Tem Proficiência Técnica
e filho como paraninfo, nome de turma e
em Hematologia pela Sociedade Brasilei-
patrono, talvez um fato único na história
ra de Hematologia Clínica. É colaborador
da UFMA. E hoje, ele e o pai, são membros
do Programa de Educação Continuada e
da Academia Nacional de Farmácia. Com
Consultor do Programa de Proficiência
um caso de família como este, não foi di-
fícil construir uma trajetória profissional Técnica em Mielograma da ControlLab.
admirável. Possui graduação em Farmácia Bioquími-
ca pela Universidade Federal do Maranhão
O professor Antônio Oliveira, (UFMA).
como é conhecido, é pesquisador e res-
ponsável pelo Serviço de Imunofenotipa- Nesta edição, dedicada a crianças
gem do Laboratório de Pesquisa Clínica de zero a seis anos, o professor Antônio
do Centro de Pesquisa Clínica do Hospital Oliveira fala sobre seu trabalho no Labo-
Universitário da UFMA (LPC-CEPEC-HUU- ratório de Pesquisa Clínica (LPC) em busca
FMA), que presta Assistência Diagnóstica de diagnósticos mais precisos em casos de
e em Pesquisa ao Instituto Maranhen- leucemias infantis, o que tem contribuído
se de Oncologia Hospital Aldenora Bello de forma determinante para o sucesso e
(IMOAB). Atua em estudo de marcadores tratamentos.

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Chama atenção o número de li- Farmácia da UFMA. Passei nove também, que envolve os exames
vros que você conseguiu publicar anos em São Paulo fazendo pós- de diagnóstico de câncer, o mielo-
ao longo de mais de duas déca- -graduação. Aqui tem dados do grama e a imunofenotipagem.
das como professor pesquisador, laboratório das doutoras Juliana
alguns sendo traduzidos para o Pereira e Beatriz Beitler, do Hos- E o que você diria sobre os ou-
espanhol e adotados em univer- pital das Clínicas de São Paulo, tros?
sidades de Portugal. A publica- na época, a diretora do Serviço de
ção da sua produção científica Diagnóstico Onco-Hematológico Meu primeiro livro, não menos
foi o motor da convocação em da Faculdade de Medicina da Uni- importante que aquele, é o “Ane-
2016, para participar da Acade- versidade de São Paulo e do Hos- mias e Leucemias - Conceitos Bá-
mia Nacional de Farmácia. Qual pital Aldenora Bello. Foi um tra- sicos e Diagnóstico por Técnicas
dos seus livros foi apresentado balho desenvolvido em São Paulo Laboratoriais”. Publiquei antes de
para atender o chamado? e também aqui, em São Luís, com terminar o meu doutorado. De-
a tecnologia que trouxemos para pois veio o livro de “Hemograma:
Sem dúvidas, o convite partiu o Maranhão, que é a imunofeno- como fazer e interpretar”, que está
da minha bibliografia, mas o li- tipagem. Na imunofenotipagem esgotado, teve três reimpressões e
vro que indiquei para estar lá no trabalhamos com o citômetro de durante dois anos foi, nessa área,
meu memorial como integrante, fluxo para observar o aspecto o mais vendido no Brasil. Este li-
foi o “Mielograma e Imunofeno- imunológico da célula. Trabalha- vro foi traduzido para o espanhol
tipagem por Citometria de Fluxo mos também com o DNA e o RNA e é vendido em toda a América
em Hematologia - Prática e Inter- da célula, a parte molecular da do Sul e também é usado na Uni-
pretação” com a colaboração das célula, que é uma outra história. versidade de Lisboa como livro de
doutoras Juliana Pereira e Beatriz Então indiquei essa publicação, referência para hematologia. Em
Beitler, médicas Hematologistas como o livro de grande impacto 2013/2014 veio a publicação do
do Hemocentro de São Paulo e da na minha carreira acadêmica para “Atlas em Hematologia: da mor-
Faculdade de Medicina da USP. entrar na Academia Nacional fologia para a Clínica”, feito para
Esse livro traduz a minha carrei- de Farmácia. É o que tem maior quem trabalha em laboratório de
ra universitária de 23 anos. Entrei relevância científica para a He- bancada porque ele é um han-
no Hospital Universitário em 1994 matologia. Retrata toda a minha dbook, estilo americano com um
e, em 1996, passei a dar aula de história em São Paulo fazendo a atlas e as técnicas na bancada.
hematologia no Departamento de pós-graduação e o nosso serviço Ano passado, fizemos a segunda

Prática laboratorial sob orientação do professor Antônio Oliveira

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edição do “Hemograma”, só que iria deixar de ser feita. Assim, de- a sensibilidade dos oncologistas e
ele é um outro livro, porque as pois de pouco mais de um ano fa- da administração do IMOAB que
máquinas modificam, os crité- zendo essa pesquisa, tivemos uma viabilizaram o cadastramento
rios de diagnósticos das doenças reunião com os médicos assisten- desse exame na prefeitura para
mudam, a classificação da Orga- tes e diretoria administrativa do que o Hospital Aldenora Bello
nização Mundial da Saúde muda IMOAB onde comunicamos o fim pudesse solicitá-lo através do
a cada oito anos, então esse livro do recurso, e que aquele serviço SUS (sem qualquer custo para os
merecia ser atualizado. iria parar. pacientes). A pesquisa da FAPE-
MA, na época, gerou assistência.
Como surgiu o Centro de Pesqui- Qual foi a estratégia da equipe E hoje, fazemos essa assistência
sa Clínica do Hospital Universi- para continuar o trabalho? pelo SUS.
tário da UFMA (CEPEC)?
Em conversa com os oncologistas Em resumo, a pesquisa imuno-
O Hospital Universitário através e administração do Hospital Alde- lógica que veio em função desse
de vários professores-pesquisa- nora Bello, sugerimos a solicita- projeto aprovado pela FAPEMA
dores da UFMA encaminhou um ção desse exame através do SUS, em 2008, gerou recurso para
projeto para a Finep (Financia- pois como o IMOAB é um centro comprar os reagentes para fazer a
dora de Estudos e Projetos). O de referência no Maranhão para imunofenotipagem. Hoje, através
projeto proposto para do SUS, via IMOAB o Ser-
criação do CEPEC no viço de Imunofenotipagem
Maranhão foi um dos no CEPEC é uma realidade
estados do Norte-Nor- Hoje, ninguém pode tratar há quase 10 anos.
deste contemplado. O
recurso recebido serviu uma leucemia só pelas Qual a influência da pu-
para montar o Centro blicação do artigo “Carac-
de Pesquisa com es- características morfológicas terização imunofenotípica
trutura e equipamen- das leucemias agudas em
tos. Em 30 de maio de das células neoplásicas, é um centro oncológico de
2007, o CEPEC foi en- referência público no Ma-
tão inaugurado. Mas obrigatório fazer a ranhão, Nordeste do Bra-
precisávamos de outros sil”, no São Paulo Medical
recursos para comprar imunofenotipagem. Journal, para que o siste-
os reagentes para ini- ma de imunofenotipagem
ciarmos nossa pesquisa fosse adotado no Cepec?
em leucemias com os pacientes do tratamento de câncer, essa insti-
Hospital Aldenora Bello (IMOAB). tuição poderia solicitar este exa- O artigo “Caracterização imunofe-
Nesse sentido, em 2008, apro- me. Dessa forma poderíamos con- notípica das leucemias agudas em
vamos um projeto na FAPEMA tinuar a realizar um exame que um centro oncológico de referên-
e com esse financiamento com- até então não era feito no Mara- cia público no Maranhão, Nordes-
pramos os reagentes para fazer a nhão. O diagnóstico imunológico te do Brasil”, [assinado pelos pes-
imunofenotipagem no citômetro é muito mais preciso e exato do quisadores Elda Pereira Noronha,
de fluxo (aparelho que permite a que o diagnóstico morfológico. Heliana Trindade Marinho, Erika
execução da técnica citometria de Hoje, ninguém pode tratar uma Bárbara Abreu Fonseca Thomaz ,
fluxo que é utilizada para contar, leucemia só pelas características Cintia Assunção Silva, Geni Lour-
examinar e classificar partículas morfológicas das células neoplá- des Ramos Veras, Raimundo An-
microscópicas suspensas em meio sicas, é obrigatório fazer a imu- tonio Gomes Oliveira do Centro de
líquido em fluxo e determinar a nofenotipagem. A própria Orga- Pesquisa Clínica da Universidade
fenotipagem da célula). Come- nização Mundial da Saúde [OMS] Federal do Maranhão (UFMA) e
çamos a estudar pela citometria, torna imperativo fazer a distinção Instituto Maranhense de Oncolo-
as crianças com câncer, por meio imunológica (com base nos an- gia Aldenora Bello (IMOAB)], é
desse recurso então gerado pela tígenos) da célula. Além disso, resultado de pesquisa financiada
FAPEMA. Só que, naturalmente, o protocolo para tratamento de pela FAPEMA e foi publicado no
com o fim dessa pesquisa e dos crianças com leucemias no Brasil São Paulo Medical Journal/Evi-
recursos para compra de reagen- [protocolo GBTLI] exige esse es- dence for Health Care. A pesquisa
tes a imunofenotipagem realizada tudo. Enfim, pudemos contar com começou em 2008 e divulgava os

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primeiros dados imunológicos do de 1500 a 3000 reais. O SUS paga fins de diagnóstico e prognósti-
Maranhão. Essa publicação é de 800 reais. Então, de 2008 para cá, co/tratamento deve ser com base
2011. No sentido prático, o artigo as crianças com câncer fazer exa- também nas alterações genéticas
mostrou cientificamente que real- mes imunológicos, gratuitamente, da célula, ou seja, no DNA e no
mente existem leucemias que só os quais oferecem acertos de 99 RNA da célula, então precisa-
podem ser diagnosticadas se você por cento. ríamos ter um laboratório que
fizer a imunofenotipagem. Pude- atendesse essa demanda. Com o
mos fazer esses exames e mostrar O CEPEC tem conseguido acom- serviço da imunofenotipagem um
que na população de leucêmicos panhar as determinações da passo foi dado, o protocolo GBTLI
do Maranhão existem casos que Organização Mundial da Saúde de 1999, pode ser modificado para
se não fosse a imunofenotipagem, referentes aos protocolos de tra- o protocolo que é utilizado hoje
teriam tratamentos que seriam fei- tamento do câncer? em todo o Brasil, de 2009 o qual
tos apenas pela morfologia. E que, requer imunofenotipagem tam-
algumas vezes, poderiam ter o re- Em 2014, os oncologistas do bém, mas a classificação da OMS
sultado inesperado porque existem IMOAB, Dra. Gení, Dr. Cesar e estaria completa caso tivéssemos
algumas leucemias que só podem Dra. Aline, nos chamaram para os equipamentos para realização
ser diagnosticadas com a imuno- uma reunião no hospital Aldeno- de testes moleculares quantitati-
fenotipagem: as leucemias mieloi- ra Bello. Fomos informados que, vos. O Laboratório de Real Time
des minimamente diferenciadas; todo ano, a campanha do McDo- PCR foi inaugurado no CEPEC e
as leucemias megacarioblásticas nald’s da venda do big mac, num as técnicas moleculares utilizadas
muito comum em crianças com dia especifico do mês de agosto, já foram validadas. Não são todos
menos de dois anos; a caracteri- é revertida para instituição que os estados do Brasil que têm essa
zação inequívoca das leucemias trata câncer na infância. Aqui no tecnologia implantada. Hoje, para
linfoides agudas, o câncer mais Maranhão é o Hospital Aldenora tratar algumas leucemias é obriga-
comum da infância e sua subclas- Mello. Os médicos nos pergunta- tória a comprovação de algumas
sificação em leucemias linfoides ram o que a gente precisava para alterações moleculares. Por isso, o
agudas B e T; a identificação das melhorar o serviço de diagnóstico paciente entra naquele protocolo
leucemias bifenotípicas agudas e prognóstico. Eu falei que pre- específico. Que bom que a pesqui-
(BAL), por exemplo. cisávamos de um laboratório de sa virou assistência e esse recurso
biologia molecular quantitativa da assistência se reveste em pes-
Quanto custa este exame? porque a classificação da Orga- quisa porque a gente vai ter dados
nização Mundial de Saúde, desde da rotina como dados moleculares
Esse é um exame caríssimo. Se ele 2001, preconiza que a classifica- do Maranhão, que vão participar
for feito por meio particular varia ção das leucemias agudas para da casuística da nossa pesquisa.

Estudantes estagiárias do curso de Farmácia com o professor Antônio Oliveira

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PRODUÇÃO LITERÁRIA CIENTÍFICA
Anemias e Leucemias - Conceitos Básicos e Diagnóstico
por Técnicas Laboratoriais (coautor Adelino Poli Neto)
(Editora ROCA 2004);
Hemograma: como fazer e interpretar (LMP Editora,
2007);
Hemograma: como fazer e interpretar (2ª edição RED
Editora, 2016);
Atlas em Hematologia: da morfologia para a Clínica (LMP
Editora, 2014);
Mielograma e Imunofenotipagem por Citometria
de Fluxo em Hematologia - Prática e Interpretação
(coautoras Juliana Pereira e Beatriz Beitler) (Editora
Grupo GEN Roca, 2015).

Quantos exames são feitos no ciente ao longo do seu tratamen- curada molecularmente. O incen-
mês e quanto tempo demora para to, e, de fato poder falar em “cura tivo do recurso para o laboratório
sair o resultado de um exame molecular” da leucemia, ou seja, molecular proporcionará a moni-
solicitado por um médico onco- o paciente ao final do tratamento torização terapêutica e a avaliação
logista que atende uma criança poderia ser considerado curado do da cura da criança com leucemia
leucêmica? câncer. Como podemos falar sobre no Maranhão. É um avanço gi-
cura do leucêmico? Há a cura clí- gante, a gente fica feliz em dizer
O limite máximo estipulado são nica, momento em que o paciente que, o Maranhão hoje, está fa-
30 exames mensais que estão ca- está bem clinicamente e sem cé- zendo o que a OMS recomenda e
dastrados no hospital. Então te- lulas neoplásicas na medula, em exige que os grandes centros fa-
mos disponíveis até 30 exames um exame que conta 500 células. çam para diagnosticar leucemia
moleculares mensalmente. O exa- Mas algumas vezes o paciente não e a gente vai poder falar isso a
me em si, da extração do RNA à demonstra células leucêmicas na partir de agora. Ganhamos em es-
quantificação do cDNA amplifica- morfologia da medula, mas pode pecificidade e em sensibilidade do
do leva dois dias para seu término, ainda possuir pequenas quantida- método. A gente vai poder moni-
mas deve-se adequar sua realiza- des destas células, as quais podem torar melhor e o médico vai poder
ção à quantidade de amostras por ser detectadas pela citometria de tomar decisões reais, o laboratório
kit, pois trata-se de um exame de fluxo, a imunofenotipagem, pois diz tem ou não tem a doença, ain-
alto custo. nessa técnica podemos analisar da tem esse resíduo ou não tem. A
50 mil, 100 mil ou mesmo um mi- evolução do paciente no decorrer
Qual a importância da precisão lhão de células. Portanto, aumen- da doença, vai ter maior precisão,
do exame molecular na eficácia ta o poder de detecção de resíduos exatidão com dados refinados de
do tratamento e no alcance da da leucemia. A técnica molecular uma técnica poderosa que é a téc-
cura da leucemia em crianças? quantitativa aumenta ainda mais nica molecular quantitativa [Ter-
o poder de detectar células leu- mociclador quantitativo – “Real
O exame molecular quantitativo é cêmicas pois bilhões de cópias de Time PCR”].
específico para uma determinada cDNA podem ser amplificadas a
alteração genética (oncogenes). O partir de uma única célula leucê- Qual a importância desse labora-
paciente que tenha uma leucemia mica. Assim, nos dias atuais, uma tório para o curso de Farmácia?
com alguma das alterações genéti- reação molecular quantitativa ne-
cas de importância para diagnósti- gativa para um paciente que tinha Depois que o serviço de diagnós-
co e tratamento, terá um protoco- uma alteração genética, pode re- tico complexo envolvendo a imu-
lo de tratamento direcionado para presentar a cura da leucemia. Isso nofenotipagem começou, a nossa
aquela alteração genética. Além é o que poderia ser chamado de carência passou a ser de material
disso, a técnica molecular quanti- cura. Em outras palavras, se, em humano. Os alunos da Liga Acadê-
tativa poderá, de maneira precisa, bilhões de células, eu não encon- mica de Hematologia Laboratorial
exata e com altíssima sensibilida- trar uma que tenha a expressão do da UFMA (LAHEL) podem estagiar
de monitorizar a resposta do pa- RNA da leucemia, a criança está e adquirir conhecimento de pon-

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ta nessa área. Por exemplo, nossa seguiram a carreira acadêmica e do científico, descobri que labo-
colega e ex-aluna de mestrado, todos fizeram doutorado e todos ratório era farmácia. Era como
Elda Noronha, que aprendeu a envolvidos na área do diagnóstico se fosse um curso técnico. E nes-
técnica de imufenotipagem aqui e da pesquisa, talvez a influência se ano, eu quis o laboratório. Eu
no CEPEC, hoje, faz isso no Ins- do pai e da mãe tenha sido cru- tinha um sonho de ser cientista.
tituto Nacional do Câncer (INCA). cial para isso. É a leitura que faço. Mas não sabia que farmácia não
Terminou o doutorado no INCA e Mas nunca fui catequisado para era só medicamento. Eu não tinha
é referência lá, nesse exame, que isso. Meus pais sempre nos dei- essa noção. Eu era uma criança.
aprendeu conosco. O INCA é um xaram muito livres. O que aprendi Coincidentemente meus pais são
centro de referência oncológica com eles foi acreditar no sonho de farmacêuticos, mas a minha es-
brasileira. Como a demanda au- construir uma coisa. A lição que colha não foi por isso. Foi reco-
mentou em três vezes depois que o tive dos meus pais foi quebrar pa- nhecer que o laboratório é ciência
exame se institucionalizou como radigmas. E a maior contribuição e eu queria ser cientista. Os meus
assistencial, fui obrigado a me re- científica que eu trago na minha heróis eram os matemáticos, os
tirar por cinco anos da pesquisa profissão, foi esse serviço que a químicos. Eu adoro matemática. O
nos programas de pós-graduação gente montou. Claro, tem os li- laboratório para mim significava
porque ou eu pararia os serviços vros, mas os livros fazem parte de ser cientista e descobri que farma-
ou continuaria orientando os es- uma coisa mais pessoal, apesar de cêutico-bioquímico é farmacêuti-
tudantes. Foi uma decisão difícil, trazer grande contribuição para a co. Então, eu disse, é isso o que
mas não me arrependo. Estou vol- classe profissional. A questão da eu quero. Mas jamais foi qualquer
tando agora porque tenho outros assistência é muito mais relevante discussão em relação a isso. To-
colegas com conhecimento espe- porque você ajuda a diagnosticar, dos tiveram liberdade de escolha.
cializado dividindo o serviço. A ajuda os médicos a tratar melhor, Tenho um irmão mais velho que
educação continuada você forma então acho que isso é mais rele- é biólogo, referência mundial em
a médio prazo. E naquele momen- vante. gatos tropicais. Tenho uma irmã
to, não tinha como abrir mão de que é médica pesquisadora na área
um serviço, no Maranhão, que é Seus pais também foram profes- de hepatopatias, hepatites autoi-
um estado que é Nordeste e a gen- sores do Departamento de Far- munes. Tenho um irmão que é
te sabe que a realidade é outra, mácia da UFMA? engenheiro, terminou doutorado,
colocar uma coisa nova em prol é professor em universidades, dá
de tratar criança em detrimento de Sim. Eu dei muita sorte na vida aulas relacionadas a isso, e tenho
continuar fazendo a pesquisa. Os pelos pais que a vida me deu. eu que fiz farmácia bioquímica e
dados da pesquisa continuaram, Eles me ensinaram a sonhar e a trabalho na área da bioquímica
mas só me retirei oficialmente dos trabalhar. Sonha, sonha alto, mas clínica, na área do diagnóstico. E
programas. Se eu tivesse conti- trabalhe. Seja simples, seja humil- a área que escolhi dentro do labo-
nuado a pesquisa e parado a assis- de, que o resto vem como con- ratório foi a hematologia. Traba-
tência, eu não teria o laboratório sequência. Uma situação curiosa lho com diagnóstico de anemias e
e o SUS cadastrado. Consequente- que talvez nunca tenha aconteci- leucemias. E a parte da leucemia
mente, o Maranhão não teria um do na UFMA, foi que eu, profes- virou essa parte toda da pesquisa
serviço de diagnóstico complexo. sor, a doutora Maria do Socorro, que a gente contou agora. Curio-
Acho que fiz a escolha certa. professora, o doutor Antônio Be- samente, nasci na vila ao lado do
nedito de Oliveira, professor, nós Hospital Aldenora Bello, e de lá
Qual a influência e a importân- fomos nome de turma, paraninfos nos mudamos ainda criança, pois
cia da sua família, dos seus pais e patronos. Pai, mãe e filho. Os minha mãe teve medo de que eu
exatamente, na escolha da sua três homenageados, todos ativos e meus irmãos pudéssemos desen-
profissão? do Departamento de Farmácia da volver câncer por conta da bomba
UFMA. E outra conquista, pela de cobalto que havia sido recente-
Na verdade, talvez eu vivi uma primeira vez na história da Aca- mente instalada naquele Hospital
condição atípica. Sou o segundo demia Nacional de Farmácia, tem em meados dos anos 70 e “obri-
de quatro irmãos. São três homens um pai e um filho, vivos, que fa- gou” meu pai a mudarmos.
e uma mulher. E todos são douto- zem parte da mesma academia. Eu
res, seguiram carreira acadêmica. nunca imaginei isso. A coisa sem-
Isso não é tão comum no Brasil. pre aconteceu ao acaso. Eu sempre
Acredito eu, a gente não briga fui livre para as minhas escolhas.
com a estatística. Se todos quatro No colégio Marista, no último ano

16 Revista Inovação nº 30 / 2017


Revista Inovação nº 30 / 2017 17
CAPA

m novembro de 2015, início do surto de

E
microcefalia, até dezembro de 2016, o Bra-
sil registrava 2.205 casos de bebês afeta-
dos pela síndrome. O Nordeste liderava esse
triste quadro com 77,2% dos casos registra-
dos. Já o Maranhão notificava 105 casos de recém-nas-
cidos com microcefalia, distribuídos em 48 municípios.
Até então, as causas da doença eram desconhecidas. O
principal suspeito, o zika vírus, seria confirmado como

DESAFIOS DA SÍNDROME
causa da doença apenas em abril do ano passado. O
surto começou na região nordestina e se espalhou pelo
Brasil. Pernambuco foi o primeiro estado a notificar o

CONGÊNITA DO ZIKA
Asmynne Barbosa
Ministério da Saúde da recorrência de bebês com pe-
rímetro encefálico medindo 32 cm. De uma simples
infecção sem grandes complicações, o zika tornou-se
preocupação constante para as gestantes. O surto de
Fotos: SECAP malformação cerebral atingiu até início de 2017, 1.835
casos.

Caracterizada por formação do crânio menor


que o normal e retardo no desenvolvimento neuroló-
gico e motor, a microcefalia e sua relação com o vírus
zika — transmitido pelo mosquito Aedes aegypti, o mes-
mo da dengue e da chikungunya — fizeram a Organi-
zação Mundial de Saúde (OMS) emitir alerta mundial
sobre a zika.
Prédio do BEM, rua do Egito, arquitetura moderna

18 Revista Inovação nº 29
30 / 2016
2017
Após ter encontrado a relação muito dispersos. A partir dessa reunião de
científica entre a zika e casos de micro- dados fizemos um trabalho científico que
cefalia, agora a proposta é estudar a pro- foi publicado no final do ano passado pela
porção e as consequências da síndrome no revista Doenças Emergentes”, diz.
desenvolvimento infantil. No Maranhão, o
professor do Departamento de Saúde Públi- Atualmente, são 150 crianças que
ca da Universidade Federal do Maranhão, fazem parte da pesquisa e que estão com
Antônio Augusto Moura da Silva relembra um ano e três meses. Mas já é possível
o início das pesquisas que acompanhou o apontar algumas observações. O pesquisa-
desenvolvimento de bebês que nasceram dor relata algumas conclusões dessa fase
com o perímetro cefálico normal, mas que, da pesquisa. “Além da questão da micro-
após alguns meses de vida, foram diagnos- cefalia, houve alguns casos em que a mãe
ticados com microcefalia. “No começo de teve zika e a infecção atingiu o cérebro da
2016, eu fui procurado por duas pediatras criança e também causou lesão cerebral, só
que começaram a atender crianças com mi- que a criança não teve microcefalia. Prova-
crocefalia para iniciar um projeto de pes- velmente, a gente desconfia, que isso tenha
quisa. Essas crianças estavam começando acontecido mais naqueles casos que a in-
a ser acompanhadas no Ninar (Centro de fecção foi mais tardia, mais para final da
Referência em Neurodesenvolvimento As- gravidez”, acredita.
sistência e Reabilitação de Crianças) que
foi criado pelo Governo do Estado do Ma- A pesquisa também ressalta que a
ranhão. Exatamente, para a gente tentar doença não pode ser definida apenas pela
entender como essas crianças estavam, e microcefalia. “A gente chama de síndrome
o que estava acontecendo e como essa si- congênita pelo vírus da zika, esse é o nome
tuação estava se desdobrando. A pesquisa correto, pois não chamamos mais de mi-
começou assim. E logo em seguida ficou crocefalia, porque esse aspecto é uma das
evidente que essa microcefalia era causada manifestações dessa síndrome. Agora essa
pelo vírus da zika”, relata o pesquisador. síndrome é caracterizada por uma agressão
cerebral, que é visualizada nos exames de
A pesquisa intitulada “Síndrome imagem do cérebro. Como por exemplo, to-
congênita pelo zika vírus, soroprevalên- mografia”, esclarece. O professor também
cia e análise espacial e temporal de vírus enfatiza que umas das alterações para ca-
zika e chikungunya no Maranhão” rendeu racterizar a síndrome é a presença de vários
bons frutos e foi premiada pelo Conselho nódulos de calcificação no cérebro, além
Nacional de Desenvolvimento Científico e de uma redução muito grande do volume
Tecnológico (CNPq). O trabalho também foi cerebral. “É uma síndrome muito grave e
reconhecido internacionalmente, na edição com um potencial muito grande para deixar
do dia 22 de dezembro de 2016 do jornal sequelas”, alerta.
The New York Times, que abordou o tema.
A pesquisa também demonstra que
O professor Antônio Augusto ex- uma das principais consequências é o fenó-
plica que o grupo acompanhou o cresci- tipo dessas crianças - o aspecto das cabeças
mento, especialmente da cabeça dos bebês - que é bem diferente das microcefalias re-
com microcefalia e síndrome congênita gistradas anteriormente. “É como se faltas-
pelo vírus da zika. O pesquisador conta que se um pedaço dos dois lados da cabeça da
a primeira etapa da pesquisa iniciou com criança. E, além disso, houve uma agressão
uma força-tarefa para reunir os dados que e o cérebro parou de crescer, mas a cabeça
estavam espalhados. “Essas crianças esta- continuou crescendo e houve o que chama-
vam sendo atendidas por vários profissio- mos de colapso do crânio. Como não tem o
nais. E os dados dos prontuários estavam cérebro dentro para segurá-lo, o crânio en-

Revista Inovação nº 30 / 2017 19


tra em colapso. Ele se fecha, fica grande na população. “A zika dos suscetíveis, já que muitas
uma ponta e dos lados fica uma alcançou essa dimensão porque pessoas contraíram a zika e não
depressão. É como se a cabeça ti- ninguém tinha imunidade para terão mais. Houve, assim, uma
vesse sido achatada dos lados e, esse vírus, que pegou uma po- quebra do canal de transmis-
na verdade, ela não foi achatada. pulação virgem. É uma tragédia são. “A epidemia nos pegou to-
Descrevemos isso como um fe- semelhante à chegada dos portu- talmente desprevenidos, a gente
nótipo típico de uma destruição gueses ao Brasil e seus primeiros não tinha laboratório para fazer
do cérebro provocado pelo vírus contatos com os povos indígenas diagnóstico da zika, mas hoje
da zika, que é um vírus que ata- que ocasionou uma mortalida- com o apoio da FAPEMA pode-
ca as células do sistema neural”, de maciça de índios, porque eles mos obter equipamentos impor-
exemplifica o professor Antônio transmitiram a tuberculose para tados e contratar profissionais
Augusto Silva, a partir dos apon- os indígenas e eles não tinham e bolsistas para a realização da
tamentos do estudo. Segundo imunidade. É a mesma coisa que pesquisa. Sem apoio, não se faz
ele, o quadro clínico dos bebês é aconteceu agora. Não havia me- pesquisa”, frisa o professor.
menos grave, mas eles têm apre- mória imunológica, foi um ata-
sentado problemas de desenvol- que de surpresa. Não havia de- A pesquisa também se
vimento e até crises convulsivas. fesa. Mas com o tempo estamos destaca pela importante docu-
construindo essa defesa”. mentação e pelo acompanha-
A pesquisa pretende mento do desenvolvimento das
contribuir para a compreen- Esse ano tivemos apenas crianças. “A nossa intenção é
são da epidemia causada pela quatro casos novos. E uma das fornecer um atendimento melhor
zika congênita que resultou em explicações para a redução dos às crianças, ajudar no controle
uma tragédia social. O profes- casos, de acordo com Antônio das crises convulsivas, além de
sor comenta sobre os motivos Augusto Silva, é que provavel- orientar nas medidas de preven-
da infecção ter tido um impacto mente houve um esgotamento ção”, afirma.

TRANSMISSÃO
O vírus zika é transmitido pelo mosquito Aedes Aegypti
infectado, o mesmo transmissor da dengue, da febre
amarela e da febre chikungunya. Os principais sintomas
são febre, dor nas articulações, dores musculares, dor de
cabeça, erupções na pele, diarreia – sinais semelhantes
ao da dengue, só que mais brandos. Ficou conhecido
por desenvolver microcefalia nos bebês em período
gestacional.
O vírus zika causa microcefalia e outros danos cerebrais
em bebês infectados durante a gestação. A microcefalia
é um quadro em que bebês nascem com o cérebro menor
do que o esperado (perímetro menor ou igual a 32 cm) e
que compromete o desenvolvimento da criança em 90%
dos casos.

20 Revista Inovação nº 30 / 2017


CASA DE APOIO NINAR AMPLIA ASSISTÊNCIA A
CRIANÇAS COM MICROCEFALIA E SUAS FAMÍLIAS
Israel De Napoli e Maristela Sena
Fotos: Julyane Galvão e Francisco Campos

O surgimento dos casos crianças, visto que 95% delas gundo ano de vida ela consulta-
de microcefalia congênita foi o desenvolveram uma epilepsia re- ria de três em três meses”, expli-
motor para que a doutora em fratária no primeiro ano de vida. ca Patrícia.
neurociências e professora do
Departamento de Medicina da “A criança passa por O Ambulatório come-
Universidade Federal do Mara- neuropediatra, pediatra, oftal- çou a receber crianças que não
nhão (UFMA), Patrícia da Silva mologista e pela equipe mul- tinham manifestado a microce-
Sousa, fosse convidada para di- tidisciplinar que inclui enfer- falia logo ao nascimento, mas
rigir o Ambulatório de Microce- meiro, nutricionista, terapeuta que desenvolveram alteração do
falia Congênita por Síndrome do ocupacional, fisioterapeuta e fo- distúrbio e do desenvolvimento
Zika Vírus do Centro de Refe- noaudiólogo. Lá ela faz exames neuropsicomotor e alteração que
rência em Neurodesenvolvimen- específicos, emissões otoacús- poderia evoluir para uma epilep-
to, Assistência e Reabilitação de ticas, potenciais evocados au- sia, mesmo não tendo nada ao
Crianças (Ninar), inaugurado em ditivos de tronco cerebral e o nascimento, a partir do terceiro
2016, no Hospital Infantil Dr. Ju- eletroencefalograma, além da ou sexto mês de vida. “Acom-
vêncio Mattos, no centro de São avaliação oftalmológica. Com panhamos o crescimento dessas
Luís. Atualmente o ambulatório isso nós temos um seguimento crianças e observamos que mais
acompanha 168 crianças com que foi instituído no ambulató- da metade delas eram proceden-
microcefalia congênita oriundas rio, que no primeiro ano de vida tes do interior do Maranhão. Tí-
de todo o Maranhão. Ele tem um dessa criança ela consulte todos nhamos que fazer algo para que
serviço de neurofisiologia clí- os meses comigo para podermos permanecessem em tratamento,
nica com eletroencefalograma observar sua evolução. E ficou visto que existe uma dificulda-
específico para acompanhar as estabelecido que a partir do se- de muito grande com relação ao

Revista Inovação nº 30 / 2017 21


tratamento fora do domicílio e famílias. Os cômodos da casa atividades do Centro de Referên-
impossibilidade dessas famílias foram adaptados para recebe- cia em Neurodesenvolvimento,
virem pra cá, imagine ter que rem móveis e equipamentos que Assistência e Reabilitação de
consultar mensalmente. Pen- serão utilizados em práticas de Crianças (Ninar).
samos na criação de uma casa oficinas, cursos e palestras aos
de apoio diferente, que também familiares e profissionais que A doutora Patrícia da
desse orientação. Não somente acompanham o tratamento das Silva Sousa, é responsável pelo
uma casa que servisse de apoio crianças. A casa oferece também Ambulatório de Microcefalia
e hospedagem a essas famílias, serviços de hospedagem e ali- Congênita no Ninar e coordena
mas uma casa que desse assis- mentação gratuitos nos dias de a Casa de Apoio Ninar, além de
tência no âmbito multidiscipli- acompanhamento no Ninar. exercer atividades clínicas em
nar e principalmente para quem neuropediatra, neurologista in-
estava sendo esquecido”, conta. As dependências fo- fantil e neurofisiologista clínica.
ram transformadas em cinco “É uma meta do Governo do Ma-
Em julho, o Governo do consultórios para atendimen- ranhão fomentar a atenção espe-
Maranhão inaugurou o projeto to multiprofissional com uma cializada a crianças com síndro-
pioneiro Casa de Apoio Ninar equipe composta por médicos, me congênita do vírus zika. As
na antiga casa de veraneio dos fisioterapeutas, fonoaudiólogos, ações não se esgotam por esses
governadores, na praia de São terapeutas, assistentes sociais, dois serviços que tem na capital.
Marcos, que agora é um centro nutricionistas, farmacêuticos, A ideia é formar profissionais
de convivência para acolhimen- educadores físicos, enfermeiros, para estruturarem ninhos de
to de crianças com problemas psicólogos e psicopedagogos. A cuidado em outros municípios
de neurodesenvolvimento e suas Casa de Apoio Ninar ampliou as do estado onde tenhamos um

22 Revista Inovação nº 30 / 2017


número grande de casos e seja referência pra
esse serviço. Por isso, a Casa de Apoio Ninar
tem essa função assistencial na imersão de
profissionais de saúde do interior do Mara-
nhão para continuar o cuidado nos seus mu-
nicípios sem ter dificuldade de deslocamento
de forma sistemática”, informa.

A Casa de Apoio Ninar vai abrigar


semanalmente 15 famílias (seis da capital e
nove do interior do estado) e cinco profissio-
nais de saúde dos municípios com especia-
lidades como pediatria, terapia ocupacional,
fonoaudiologia, fisioterapia, enfermagem e
assistência social, que acompanharão as ati-
vidades. Inicialmente, passaram pela casa 180
pacientes. “Essas famílias e profissionais pas-
sam a semana conosco na casa. Chegam na
segunda-feira e vão embora na sexta-feira.
E quando vão embora, saem com uma pro-
gramação e sugestões porque essa família vai
voltar no primeiro ano de três em três meses. EVOLUÇÃO DO ZIKA VÍRUS NO BRASIL
A intenção é que aquela criança permaneça Desde abril de 2015 o zika vírus foi identificado
pelo menos dois ou três anos conosco. Nosso como o agente etiológico de doença exantemática aguda
principal objetivo é que pais e profissionais (doenças infecciosas com manifestações cutâneas) no Brasil e,
vivenciem a maternagem e criem uma memó- a partir de outubro do mesmo ano, neuropediatras do Recife
(Pernambuco) deram o sinal de alerta sobre uma epidemia de
ria daquela criança”, diz. microcefalia com alterações radiológicas peculiares, sugestivas
de infecção congênita (calcificações, ventriculomegalia e
Além de um lugar de acolhimento desordem do desenvolvimento cortical), tendo sido afastadas
para as famílias e para as crianças, a Casa de as principais causas de infecção congênita que cursam com
Apoio Ninar será um espaço para o desenvol- calcificações cerebrais (citomegalovírus e toxoplasmose), assim
como outras causas genéticas ou ambientais.
vimento de atividades multidisciplinares que
A incidência de casos de microcefalia no Brasil
incluem avaliações médicas, oficinas, pales-
aumentou consideravelmente no segundo semestre de 2015,
tras, circuito de estimulação multidisciplinar, chegando no momento a 907 casos confirmados e 4.293 ainda
musicalização infantil e de adulto, artetera- em investigação, de acordo com o Portal Brasil. A Organização
pia, dança, dentre outras atividades. A inten- Mundial da Saúde (OMS) atualmente define microcefalia como
ção é que pais e profissionais saiam da Casa um Perímetro Cefálico (PC) igual ou inferior a 31,9cm para
meninos e igual ou inferior a 31,5cm para meninas nascidos a
de Apoio Ninar com um planejamento para
termo, isto é, a partir de 39 semanas de gestação.
saber o que fazer nos próximos três meses e
Microcefalia não é uma doença em si, mas um sinal
quando retornarem será feito um novo ciclo de destruição ou déficit do crescimento cerebral, podendo ser
de atividades para fortalecimento do vínculo. classificada como primária (de origem genética, cromossômica
ou ambiental, incluindo infecções) ou secundária, quando
“Todas as atividades lúdicas da casa, resultante de evento danoso que atingiu o cérebro em
crescimento, no fim da gestação ou no período peri e pós-natal.
as terapias que as mães vão participar em gru-
po, têm a intenção de mostrar aos familiares As sequelas da microcefalia vão depender de sua
etiologia e da idade em que ocorreu o evento, sendo que,
que eles não são diferentes e podem fazer um quanto mais precoce a afecção, mais graves serão as anomalias
monte de coisa que todo mundo pode fazer. É do sistema nervoso central (SNC). No caso da Síndrome
essa filosofia de vida que a gente quer passar Congênita do vírus zika, parecem ocorrer alterações cerebrais
da nova maneira de cuidar, fortalecendo essa também nos segundo e terceiro trimestres da gestação. A
família e criando uma memória dessa criança. microcefalia congênita pode cursar diversas alterações, sendo
as mais frequentes a deficiência intelectual, paralisia cerebral,
Porque toda criança deve ter a oportunidade epilepsia, dificuldade de deglutição, anomalias dos sistemas
de ter uma identidade na sua família”, destaca visual e auditivo, além de distúrbio do comportamento (TDAH
Patrícia Sousa. e autismo).

Revista Inovação nº 30 / 2017 23


24 Revista Inovação nº 30 / 2017
Revista Inovação nº 30 / 2017 25
ALEITAMENTO pesquisadora Carolina Abreu de Carvalho,

A
do Programa de Pós-Graduação em Saú-

MATERNO É O MELHOR de Coletiva da Universidade Federal do


Maranhão (UFMA), desenvolveu o estudo
“Fatores sociodemográficos, perinatais e
ALIMENTO PARA comportamentais associados aos tipos de leite con-
sumidos por crianças menores de seis meses: coorte

CRIANÇAS DE ATÉ SEIS de nascimento”, com o intuito de investigar fatores


associados aos leites ingeridos pelas crianças desde
fases precoces, como no primeiro semestre de vida,
MESES
Maristela Sena
a fim de identificar os fatores de risco à alimentação
adequada nesse período. A intenção é avaliar os fato-
res associados ao consumo de leite materno, leite de
Fotos: Divulgação vaca e fórmulas lácteas em crianças acompanhadas
no 1°, 4° e 6° mês de vida.
“O baixo nível socioeconômico das famílias,
a baixa escolaridade e idade materna, o retorno da
mãe ao trabalho e o uso de chupeta são alguns dos fa-
tores associados à introdução precoce de outros tipos
de leite e demais alimentos, descritos na literatura”,
explica a pesquisadora.
De acordo com Carolina Carvalho, existem
diversos estudos dedicados a avaliar os fatores as-
sociados à interrupção do aleitamento materno ex-
clusivo (AME), entretanto, poucos têm verificado os
fatores relacionados ao consumo de leite de vaca e
fórmulas lácteas para lactentes, principais substitutos
do leite materno nos primeiros seis meses de vida.

26 Revista Inovação nº 30 / 2017


Fórmulas lácteas disponíveis no mercado

“O tipo de leite consu- o risco de mortalidade infantil e çoamento de Pessoal de Nível


mido pela criança tem reflexos trazer benefícios motores e cog- Superior (Capes) e realizado no
no ganho de peso e outros aspec- nitivos. Crianças não amamen- município de Viçosa (MG), lo-
tos da saúde infantil. O consumo tadas possuem maior risco de calizado na Zona da Mata Mi-
de fórmulas lácteas é apontado inadequação de micronutrientes, neira, a 227 km da capital Belo
em alguns estudos como um fa- pois tendem a ter piores práticas Horizonte, área de 299.418 km e
tor que predispõe ao excesso de alimentares. população estimada em 76.745
peso, devido ao maior conteúdo De acordo com a II Pes- residentes. A pesquisadora reali-
de proteína em sua composição, quisa Nacional de Prevalência zou um estudo piloto na Policlí-
em comparação ao leite mater- do Aleitamento Materno nas nica Municipal de Viçosa, com
no”, diz. Capitais Brasileiras e Distrito todos os integrantes da equipe,
Segundo a pesquisado- Federal, a introdução de outros a fim de testar a aplicação do
ra, o leite de vaca, por sua vez, tipos de leite na alimentação de questionário semiestruturado.
além de possuir elevado conteú- menores de seis meses é precoce, Foram avaliadas crianças de
do de proteína e energia, apre- com prevalência de 18% no pri- mesma faixa etária e com ca-
senta insuficiente quantidade de meiro mês e 48,8% entre o quar- racterísticas similares as do pre-
ácidos graxos essenciais, vita- to e sexto mês. sente estudo, as quais não foram
minas e minerais para essa fai- Essa introdução pode incluídas na análise.
xa etária. Seu consumo também aumentar a morbimortalidade O convite para ingres-
tem sido associado ao desenvol- infantil, devido à menor inges- sar no estudo foi realizado entre
vimento de atopia, excesso de tão dos fatores de proteção pre- outubro de 2011 e outubro de
peso, anemia e micro-hemorra- sentes no leite materno e maior 2012, no único hospital da cida-
gias intestinais em menores de risco de contaminações. Por isso, de que realizava partos. As ges-
um ano. apenas em situações de absoluta tantes foram contatadas no hos-
O aleitamento mater- impossibilidade da realização do pital por um membro da equipe,
no exclusivo até os seis meses aleitamento materno, recomen- durante a internação para o par-
é recomendado como prática da-se a introdução de fórmulas to. Nesta ocasião ocorreu o con-
alimentar ideal para a saúde e infantis como substituto do lei- vite para participar da pesquisa
desenvolvimento infantil. O lei- te materno na alimentação de e o agendamento das próximas
crianças menores de um ano. consultas com as mães que acei-
te materno possui todos os nu-
trientes necessários à criança taram participar.
nesse período, além de contri- Método “Foram incluídas no es-
buir para o fortalecimento do O estudo foi financiado tudo crianças que residiam em
sistema imunológico, diminuir pela Coordenação de Aperfei- Viçosa, nascidas no único hos-

Revista Inovação nº 30 / 2017 27


pital-maternidade da cidade, que relacionadas à criança e à mãe 247 crianças sem prematurida-
não possuíam má-formação con- foram obtidas através de questio- de e que possuíam todos os re-
gênita ou síndromes; e que não nários semiestruturados. gistros das variáveis de interesse
eram de gestações múltiplas. A Para o leite de vaca e no 1°, 4° e 6° mês. Ao longo do
criança estar internada em Uni- fórmulas lácteas contabilizou-se estudo, apesar dos esforços rea-
dade de Terapia Intensiva Neo- o consumo independentemen- lizados pela equipe para o com-
natal foi considerado critério de te da ingestão de leite materno, parecimento das mães, tais como
exclusão. Especificamente para considerando-se, portanto, a in- ligações relembrando o acompa-
este manuscrito, a prematuridade trodução desses tipos de leite na nhamento mensal, 204 mães não
também foi adotada como cri- alimentação infantil. Para o leite participaram do seguimento em
tério de exclusão. Houve perdas materno, avaliou-se apenas o seu todos os meses. Do 1° para o 4°,
por alta hospitalar precoce ou consumo de forma exclusiva ou 124 mães não compareceram e
recusa e também por mães que predominante (quando além do do 4° para o 6°, 80 mães falta-
no hospital aceitaram participar leite materno, são consumidos lí- ram. Portanto, houve uma perda
do estudo, mas que não compa- quidos como água e chás). de 46,3% ao longo do acompa-
receram à primeira consulta”, co- nhamento.
“As variáveis socioeco-
menta Carolina Abreu de Carva- A fim de verificar a
nômicas foram a renda familiar,
lho. existência de diferenças entre as
idade materna, escolaridade ma-
Optou-se por trabalhar terna, escolaridade do chefe de crianças acompanhadas e não
com o 1°, 4° e 6° mês, a fim de família e trabalho materno. A acompanhadas, elas foram com-
se observar os fatores associados idade da mãe foi categorizada paradas quanto a suas caracte-
aos desfechos precocemente (no utilizando-se o ponto de corte de rísticas sociodemográficas, de
1° mês); no 4° e 6° mês, pois são 19 anos completos, para definir nascimento, número de consultas
momentos cruciais para o desma- mães adolescentes e adultas. O pré-natal e uso de chupeta. Não
me visto o retorno das mães ao chefe de família foi aquele que foi observada presença de viés de
trabalho; e, no caso do 6° mês, possuía maior renda no domicí- seleção devido a perdas diferen-
por também ser a idade limite da lio”, informa a pesquisadora. ciais.
recomendação do aleitamento “Ao longo dos meses ob-
Comparou-se a distri-
materno exclusivo. servou-se a redução do consumo
buição das perdas de acordo com
Uma vez que não obte- os tipos de leite consumidos, as de leite materno de forma exclu-
ve-se um tamanho amostral ini- variáveis socioeconômicas e de siva ou predominante. Destaca-
cialmente, calculou-se o poder nascimento, número de consul- -se que já no primeiro mês, quase
do estudo. Para tanto, utilizou-se tas pré-natal e uso de chupeta. 25% das crianças não se encon-
o programa OpenEpi (Dean AG, No início do seguimento nenhu- travam mais em aleitamento ma-
Sullivan KM, Soe MM. OpenEpi: ma mãe estava trabalhando, por terno exclusivo ou predominante.
Open Source Epidemiologic Sta- isso não foi possível comparar a Em contrapartida, o consumo de
tistics for Public Health). Consi- distribuição da variável trabalho leite de vaca apresentou compor-
derando-se um intervalo de con- materno entre acompanhados e tamento ascendente, assim como
fiança de 95% e as estimativas de não acompanhados. o de fórmulas lácteas. Essa evo-
risco para a variável uso de chu- lução demonstrou a diminuição
A análise de regressão
peta e leite materno, fórmula lác- do consumo de leite materno de
foi realizada para avaliar os fa-
tea e leite de vaca, obteve-se um forma exclusiva ou predominan-
tores relacionados aos tipos de
poder de 99% para o estudo dos te ao longo dos meses, e a adoção
leite consumidos pelas crianças.
fatores associados ao consumo de do leite de vaca como principal
Os consumos de leite de vaca,
leite materno, 94% para fórmula substituto na alimentação dessas
fórmulas lácteas e leite materno
lácteas e de 79% para o leite de crianças”, afirma a pesquisado-
foram considerados variáveis de-
vaca. ra.
pendentes. O consumo de leite de
Conforme mostra a pes- vaca e fórmulas lácteas, e o não Observou-se que no 1°
quisa, a primeira entrevista com consumo de leite materno de for- mês de vida, crianças que usa-
as mães foi realizada no primeiro ma exclusiva ou predominante vam chupeta tiveram 1,90 vezes
mês de vida, na ocasião da va- foram definidos como situações mais risco de não consumir leite
cinação, na Policlínica Munici- de risco. materno de forma exclusiva ou
pal de Viçosa, local de referên- predominante. No 4° mês, filhos
cia para imunização infantil da de mães que trabalhavam apre-
cidade. As entrevistas seguintes Resultados sentaram 1,73 vezes mais risco
foram realizadas no 4° e 6° mês. No início do estudo fo- de não consumir leite materno de
As informações sobre os tipos de ram acompanhadas 460 crianças forma exclusiva ou predominante
leite consumidos pelas crianças, do município, entretanto, para e em crianças que usavam chupe-
as variáveis socioeconômicas, as este estudo foram selecionadas ta esse risco foi 1,77 vezes maior.

28 Revista Inovação nº 30 / 2017


O consumo de leite de vaca deve ser evitado no primeiro ano de vida da criança

Finalmente, no 6° mês, crianças materno na alimentação dessas promover maior ganho de peso
cujas mães trabalhavam, apre- crianças ao longo do tempo”, as- e adiposidade. Existem evidên-
sentaram 1,70 vezes mais risco segura a pesquisadora. cias de que o consumo de leite
de não ingerir leite materno de O uso de chupeta foi o de vaca antes do primeiro ano de
forma exclusiva ou predominan- fator de risco que mais se asso- vida está associado ao desenvol-
te, e as que usavam chupeta, 1,42 ciou ao não consumo de leite vimento de anemia ferropriva,
vez mais risco. materno de forma exclusiva ou devido a sua menor biodisponi-
De acordo com Carolina predominante, ao consumo de bilidade de ferro em comparação
Carvalho, os resultados da análi- fórmulas lácteas e de leite de ao leite materno, além de poder
se de regressão dos fatores asso- vaca. Em segundo lugar, destaca- causar micro-hemorragias intes-
ciados ao consumo de fórmulas -se o trabalho materno no quar- tinais, agravando quadros des-
lácteas no 1° mês mostram que to e sexto mês, coincidindo com sa deficiência. O leite de vaca é
apenas o uso de chupeta asso- o momento em que geralmente também um alimento muito aler-
ciou-se ao maior consumo de encerra-se a licença maternida- gênico, devido à grande quanti-
fórmulas lácteas, permanecendo de e as mães devem retornar ao dade de proteínas em sua com-
significante após a realização trabalho, reduzindo seu contato posição, podendo causar atopia
da análise ajustada. Em crianças com o bebê. quando consumido precocemen-
que usavam chupeta o risco de O uso de chupeta mos- te”, enfatiza Carolina Abreu de
consumir fórmulas lácteas foi trou-se fator de risco para ausên- Carvalho.
1,81 vez maior que naquelas que cia de aleitamento materno ex- Os resultados do estudo
não usavam. clusivo ou predominante e para permitiram a identificação de
“A evolução do consu- o consumo de leite de vaca e crianças com risco para a intro-
mo dos leites e fórmula, anali- fórmulas lácteas em todos os me- dução de outros tipos de leite e
sados neste estudo, identificou ses, exceto no primeiro mês para consequente interrupção do alei-
a diminuição do consumo de crianças que consumiam leite de tamento materno. Além disso,
leite materno de forma exclusi- vaca e no sexto mês para as que geram subsídios para a realiza-
va ou predominante e o aumento consumiam fórmula láctea. ção de ações educativas que de-
da ingestão de leite de vaca ao “A introdução precoce vem ser implementadas desde a
longo dos meses de acompanha- de leite de vaca aumenta a vul- fase pré-natal, a fim de orientar
mento. Esses resultados revelam nerabilidade ao desenvolvimento as mães sobre as melhores práti-
a adoção do leite de vaca como de obesidade e outras doenças cas de amamentação.
o principal substituto do leite crônicas na infância, pois pode

Revista Inovação nº 30 / 2017 29


UNIVERSO LITERÁRIO projeto de pesquisa “Livros digitais, sistemas

O
hipermidiáticos e partilha literária para leito-
res infantis” foi desenvolvido a partir de uma

INFANTIL NO
parceria entre o Programa de Pós-Graduação
em Design e o Departamento de Biblioteco-
nomia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e o

COMPUTADOR
Departamento de Comunicação e Arte da Universidade de
Aveiro, Portugal. O trabalho foi financiado pelo Edital da
Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento
Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA) 44-2013
Asmynne Barbosa
APCINTER.
Fotos: Divulgação
A pesquisa é uma continuação da investigação
“Informação e Comunicação em Plataformas Digitais”, da
professora adjunta do Departamento de Biblioteconomia
e Pós-Graduação em Design da UFMA Cássia Furtado,
iniciada por ocasião do doutorado e realizada na Univer-
sidade de Aveiro. Durante o curso, a equipe coordena-
da pela professora Lídia Oliveira, pesquisadora do Center
for Research in Communication, Information and Digital
Culture – CIC Digital, desenvolveu a Portal Biblon, uma
biblioteca digital de literatura para crianças.
O objetivo da Portal Biblon é incentivar a for-
mação de rede social em torno do texto literário. A pro-
fessora Cássia Furtado explica que o projeto contava com
a participação de alunos da Educação Básica de Portugal
e quando retornou ao Brasil, continuou o trabalho, des-
ta vez envolvendo alunos da Rede Pública Municipal de
São Luís. E o primeiro passo foi sensibilizar a Secretaria
de Educação do Município de São Luís, que recebeu com

30 Revista Inovação nº 30 / 2017


muito entusiasmo a proposta da nhecer as formas de acesso e uso O contato das crianças
pesquisa. das tecnologias de informação e com a tecnologia dos computa-
comunicação digital.” dores, de forma lúdica e atrativa,
Em seguida, selecionaram
colabora para o aprendizado das
as quatros escolas que integrariam Como resultado imediato
ferramentas tecnológicas e con-
o projeto. A primeira foi a Unida- do projeto é destacado o contato
duz à inclusão digital, o que pro-
de de Ensino Básico (UEB) Sá Valle das crianças com os livros digitais.
porciona o desenvolvimento da
com a participação de alunos do 2º A pesquisa mostrou que os alunos
literacia informacional e literária,
ao 7º ano do Ensino Fundamental, da Rede Pública Municipal fazem
além da inclusão social. O Por-
de cinco turmas de cada ano, tota- maior uso da internet para a prá-
tal Biblon continua também a ser
lizando 875 alunos e 32 professo- tica de jogos, assim aponta-se que
usado por alunos das escolas por-
res. A UEB Maria Rocha também eles podem também usar o tempo
tuguesas. Dessa forma, conforme
participou com alunos do 2º ao 7º na web para atividades interessan-
explica a pesquisadora, o uso do
ano, totalizando 144 alunos e 23 tes, prazerosas em contato com o
Biblon pelos alunos maranhenses
professores. A terceira escola foi a universo mágico da literatura in-
tem contribuições importantes a
UEB Antonio Ribeiro em que par- fanto-juvenil. Projetos envolven-
oferecer para a comunidade da
ticiparam das atividades alunos da do a leitura de livros de literatura
língua portuguesa com o propósi-
2º ao 5 º ano, sendo 3 turmas de infantil trazem contribuições para
to de preservar a língua, a memó-
cada ano, total 324 alu-
ria literária e promover
nos e 22 professores. E
a última, a UEB Japiaçu, O contato das crianças com a a herança cultural entre
crianças com mesma
onde o projeto contou
com alunos da 2º ao 5º
tecnologia dos computadores, de raiz linguística. “Enfim,
ano, totalizando 116 alu- forma lúdica e atrativa, colabora favorecer a intercultu-
ralidade entre crianças e
nos e 14 professores. para o aprendizado das ferramentas adolescentes, que têm o
Desta forma, a pesquisa
fez intervenção em qua-
tecnológicas e conduz à inclusão português como língua
nata. E de maneira indi-
tro escolas, com total de digital, o que proporciona o reta, o projeto traz con-
1459 alunos de 2º a 7º ano desenvolvimento da literacia tribuições para o apren-
do Ensino Fundamental e dizado das crianças, uma
91 professores. “Destaca- informacional e literária, além da vez que, quanto mais se
mos que o projeto reuniu inclusão social. ler, melhor se ler, melhor
pesquisa, mas também se fala e também melhor
envolveu atividades de se escreve”, conclui.
extensão. De início fazen-
melhorar a qualidade e motivação O projeto “Livros digitais,
do oficina com os professores da
para o hábito de ler e desenvolvi- sistemas hipermidiáticos e partilha
escola, visando integrá-los no pro-
mento do vocabulário das crian- literária para leitores infantis” re-
jeto e mostrar os recursos ofereci-
ças. cebeu a visita técnica da professora
dos pelo Portal Biblon, de modo a
Lídia Oliveira que, na oportunida-
incentivar o uso da plataforma”, Experiências como a do
de, conheceu as escolas e partici-
esclarece a pesquisadora. Portal Biblon que integram o livro
pou de reuniões com os educado-
em formato de papel e digitalizado,
O trabalho com os alu- res (das UEBs e da UFMA). O papel
a literatura impressa e na web, tra-
nos consiste no uso do laboratório da FAPEMA foi importante para a
zem maior motivação para leitura
de informática da escola, onde os concretização da pesquisa. A pro-
e oferecem momento de interação
mesmos acessam o portal para fa- fessa Cássia Furtado enfatiza que
de múltiplas linguagens simulta-
zerem leituras e interagirem com “sem o patrocínio da Fundação o
neamente. “É muito compensador
outros usuários por meio de co- projeto dificilmente seria implan-
ver o entusiasmo das crianças ao
mentários, fotos e vídeos. Tudo tado. Além de financiar oficinas
usarem o computador para fins
gira em torno de atividades com e a própria investigação, damos
lúdicos. Além de ‘lerem’ os livros
os livros que formam o acervo ênfase às reuniões com a equipe
digitais, tornam-se produtores de
da biblioteca digital. A professo- internacional do projeto, a fim de
conteúdo, uma vez que postam
ra Cássia Furtado informa ainda aproveitar a experiência dos pes-
comentários, fotos e vídeos sobre
que, “em paralelo, foi realizada a quisadores portugueses com temas
o texto lido. Destacamos que te-
investigação com a comunidade como leitura, livros digitais, parti-
mos também áudio-livros na pla-
escolar, professores e alunos, ob- lha em rede social, e outros”.
taforma, onde podem ver imagens
jetivando conhecer o uso e com-
e ouvir o enredo. Ainda temos os
petência da mesma em relação aos Link para acessar o site do projeto:
livros interativos que possibilitam www.portal-biblon.com
computadores, internet, informa-
aos alunos atividades pós-leitura”,
ção digital, com a intenção de co-
ressalta a professora Cássia.

Revista Inovação nº 30 / 2017 31


FATORES
mortalidade infantil é um dos principais

A
indicadores de desenvolvimento socioeco-
nômico dos países. Compreendem-se óbitos

SOCIOECONÔMICOS em menores de um ano, apresentando dois


componentes principais: a mortalidade neo-

E PRESENÇA DOS natal precoce (MNP) e tardia (MNT), e a pós-neonatal


(MPN). A MNP refere-se ao período do tempo do nas-
cimento até 6º dia de vida; a MNT do 7º ao 27º dia; e
SERVIÇOS DE a MPN inicia-se no 28º, estendendo-se até o 364º dia
de vida.

SAÚDE NA ATENÇÃO No período do nascimento e nos primeiros


meses de vida, as crianças ainda possuem um sistema

BÁSICA REDUZEM imunológico imaturo. Ao se associar este fator às de-


sigualdades de direitos como as formas de acesso aos
serviços de saúde diferenciados, saneamento básico,
MORTALIDADE alimentação e nível socioeconômico materno, eviden-
ciam-se diferentes probabilidades de a criança morrer

INFANTIL NO BRASIL E antes do primeiro ano de vida a depender do local de


nascimento.

NO MARANHÃO
Leandro Alves
A pesquisadora do Departamento de Saúde
Pública da Universidade Federal do Maranhão (UFMA),
Erika Bárbara Abreu Thomaz, desenvolveu o estudo
Fotos: Divulgação “Atenção básica em saúde e mortalidade infantil no
Brasil ao longo do século XXI: uma abordagem com
ênfase no Maranhão”, financiado pelo Edital Fapema
nº 008/2016 - PPSUS. A pesquisa investiga o efeito de
fatores socioeconômicos e dos serviços de saúde na
atenção básica sobre a redução da mortalidade infantil
e de seus componentes no Brasil e no Maranhão.

32 Revista Inovação nº 30 / 2017


Cuidados clínicos asseguram a transiçao da criança nas fases de desenvolvimento

“O estudo tem como ob- de 162 a 115 óbitos por mil nas- diminuição não é igual. Ela não
jetivo avaliar as tendências nos cidos vivos. Nas duas décadas se- tem a mesma velocidade de de-
indicadores de mortalidade in- guintes, houve queda de 58,3%, clínio entres os diferentes com-
fantil no Brasil, segundo regiões passando de 115 para 48 óbitos ponentes da mortalidade infan-
e unidades federativas, com ên- por mil nascidos vivos. No perío- til”, ressalta Erika Bárbara.
fase no Maranhão. Além de ana- do de 1990 a 2008, observou-se O estudo representa um
lisar a associação dos diferentes redução ainda maior (63%), pas- recorte da avaliação externa do
componentes da estrutura das sando de 47,1 para 17,6 óbitos Programa Nacional de Melhoria
Unidades Básicas de Saúde e dos por mil nascidos vivos, conside- do Acesso e da Qualidade da AB
processos de trabalho na atenção rada uma das maiores reduções (PMAQ-AB), coordenada pelo
básica com as taxas de mortali- registradas no mundo. Ministério da Saúde em parceria
dade infantil e seus componen- Os indicadores têm re- com universidades e institutos
tes”, explicou a pesquisadora. duzido numa velocidade menor de pesquisa públicos do Brasil,
O estudo também bus- e em alguns locais permanecem vinculado à Política Nacional de
cou identificar metas a partir da constantes. Por isso a intenção Atenção Básica (PNAB).
estimativa de insumos e produ- de se discutir os primeiros cui- O programa foi vincula-
tos para selecionar a unidade to- dados infantis no decréscimo das do à política no ano de 2011, já
madora de decisão eficiente no taxas de MI e considerar as es- obteve dois ciclos completos do
município de São Luís. E estimar tratégias voltadas para as linhas PMAQ e está iniciando o tercei-
a taxa de mortes infantis evitá- de cuidado da atenção à saúde ro. Cada ciclo do PMAQ envol-
veis a partir de mudanças na es- da criança. ve algumas etapas. Uma dessas
trutura e no processo de trabalho “Nós temos verificado etapas é a avaliação externa que
no município de São Luís. que a mortalidade infantil no faz parte de um monitoramento
De acordo com dados Brasil tem diminuído ao longo de como que está o serviço de
da pesquisa, a velocidade de re- das últimas décadas, acompa- saúde no nosso país. A pesqui-
dução da taxa de MI no Brasil nhando uma tendência que é sadora Erika Bárbara representa
tem variado com o tempo. Hou- mundial da diminuição no nú- a UFMA e coordena a avaliação
ve acréscimo de 29,01% entre os mero de óbitos em relação aos das unidades de atenção básica
anos de 1930 e 1970, passando nascidos vivos. No entanto, essa do estado do Maranhão.

Revista Inovação nº 30 / 2017 33


Pesquisa avaliou Unidades Básicas de Saúde (UBS) em 21 municípios maranhenses

O projeto foi apro- à nossa população”, destaca a família, a proporção de parto


vado pelo Comitê de Ética pesquisadora. normal e a visita domiciliar do
da Universidade de Pelotas Outro aspecto a ser agente comunitário de saúde,
(UFPel). Todas as pessoas en- considerado no estudo é o rol menor é a taxa de mortalidade
trevistadas assinaram o Termo de serviços ofertados. Segun- infantil. Assim como quanto
de Consentimento Livre e Es- do Erika Bárbara, muitos são menor é a taxa de desempre-
clarecido. Trata-se de um es- os serviços de excelência que go, menor também é a taxa
tudo retrospectivo e analítico, o Brasil tem oferecido para a de mortalidade infantil”, diz a
do tipo ecológico, com análises população, o que tem impac- pesquisadora.
estratificadas pelas 27 unida- tado diretamente na redução A pesquisa é vincu-
des federativas e 19 regiões de da mortalidade infantil da lada à avaliação das Unidades
saúde do Maranhão. população. A pesquisa mostra Básicas de Saúde (UBS) do es-
“Durante a pesquisa que a atenção básica em saúde tado do Maranhão. “Já foram
a gente conseguiu observar tem um forte impacto na re- feitas duas avaliações. Uma no
que tem havido um aumento dução da mortalidade infantil ano de 2012 e outra no ano de
considerável da oferta de ser- em seus diferentes componen- 2014. Agora em 2017, faremos
viços de saúde para a popula- tes. uma terceira avaliação. Nós vi-
ção brasileira, inclusive para a “Nós verificamos que sitamos os 217 municípios do
população do Maranhão. Isso existe sim uma relação entre a Estado e em cada um desses
é um ponto muito favorável. qualidade do serviço ofertado municípios visitamos as UBS.
Hoje nós temos no Maranhão, na atenção básica, na atenção Nelas observamos a estrutura,
uma proporção muito grande primária em saúde e a taxa de acessibilidade, a farmácia da
da população coberta de estra- mortalidade infantil no nos- unidade, o número de salas.
tégia de saúde da família. Nós so país. Percebemos também, Nós verificamos uma lista de
estamos avançando na rede com os resultados do trabalho, itens relacionados à estrutura
de serviço de saúde ofertados que quanto maior a renda da física e predial daquela uni-

34 Revista Inovação nº 30 / 2017


dade. Além disso, fazemos en- mais diversos contextos exis- ca tão delicada, é fundamental
trevistas com os coordenadores tentes no país a partir da ado- a organização dos sistemas de
das equipes de saúde da famí- ção regular e sistematizada de saúde para a oferta de interven-
lia daquela UBS para avaliar modelos de risco geoespacial ções, como foco na promoção da
seus processos de trabalho estão pela estratégia de saúde da fa- saúde.
de acordo com as diretrizes da mília. No momento, a pesqui-
PNAB e SUS”, conta a pesquisa- “Estudos sobre os de- sadora está escrevendo um arti-
dora. terminantes dos óbitos infantis go intitulado “Características da
O estudo utiliza dados evitáveis são altamente relevan- Atenção Básica em Saúde estão
provenientes de três tipos de tes para os gestores, profissio- associadas à redução das taxas
técnica de coleta: a observação nais e pesquisadores em saúde. de mortalidade neonatal tardia
sistemática da unidade básica de Porém, a maioria dos trabalhos no Brasil?”. Segundo Erika Bár-
saúde e entrevistas com os pro- brasileiros realizados são limita- bara, esse primeiro artigo mos-
fissionais e usuários. Também há dos a cidades das regiões mais tra que a gestão municipal deve
um comparativo entre investir na visita domici-
os dados do primeiro e liar da equipe de saúde da
segundo ciclo de ava-
Nós verificamos que existe sim família, na ampliação da
liação para constatar uma relação entre a qualidade cobertura da estratégia
melhorias na estru- do serviço ofertado na atenção de agente comunitário de
tura, no processo de saúde e no aumento de
trabalho e na satisfa- básica e primária em saúde e a partos vaginais.
ção do usuário. Além taxa de mortalidade infantil no “Essa pesquisa pode
da coleta de dados do
sistema de informação
nosso país. Percebemos também, dar diretrizes de onde o
gestor deve investir, gas-
do SUS, como o Siste- com os resultados do trabalho, que tando menos para conse-
ma de Informação de quanto maior a renda da família, guir uma maior redução
Mortalidade (SIM).
“Nós fizemos
a proporção de parto normal da mortalidade infantil.
Observamos que onde
um levantamento de e a visita domiciliar do agente se pode gastar menos é
dados e selecionamos comunitário de saúde, menor é a exatamente nessas três
os óbitos infantis e os ações: a ampliação da
óbitos nos diferentes taxa de mortalidade infantil. Assim visita domiciliar, a am-
componentes: óbito como quanto menor é a taxa de pliação da cobertura da
neonatal, precoce tar- desemprego, menor também é menor estratégia de agente co-
dio, o óbito pós-neo- munitário de saúde e a
natal e o óbito infantil o número de óbitos. ampliação do número de
como um todo. Fize- partos vaginais. Nós já
mos diferentes análi- percebemos que o Minis-
ses para ver o que estava rela- tério da Saúde está aumentando
cionado. Que ações da atenção desenvolvidas do país, em gran- o recurso de financiamento para
primária em saúde poderiam de parte fazem uso apenas de o parto vaginal e reduzindo o
impactar na redução dos óbitos estatística descritiva, restringin- valor do pagamento para o par-
infantis, na primeira semana ou do a capacidade de análise das to cesárea. É claro que o servi-
no primeiro mês de vida? Uti- causas associadas ao desfecho ço vai preferir o parto cesárea,
lizamos diferentes técnicas de em questão. Essas especificida- porque recebe mais dinheiro. Só
análises estatísticas, desde des- des têm limitado a capacidade que isso está gerando resultados
critivas, que são as mais sim- de analisar fatores atrelados aos terríveis para o serviço. A taxa
ples, até a análise de regressão”, indicadores de mortalidade in- de parto cesariana no nosso país
ressalta Erika Bárbara. fantil no país”, afirma a pesqui- é uma das maiores do mundo e
sadora. isso tem consequência do au-
A pesquisa pode forne-
cer subsídios para a melhoria da São necessárias inter- mento da mortalidade tanto da
qualidade dos serviços ofertados venções capazes de minimizar mãe quanto da criança”, adverte
e para maior equidade no aces- os riscos ambientais sobre os in- a pesquisadora.
so aos serviços, principalmente dicadores de mortalidade infan-
na atenção à saúde infantil nos til. Para lidar com uma temáti-

Revista Inovação nº 30 / 2017 35


ASSISTÊNCIA E esquisadoras do Departamento de

P
Enfermagem da Universidade Fede-
ral do Maranhão (UFMA), membros

CONTROLE NO PRÉ-NATAL do Núcleo de Estudo e Pesquisa em


Educação e Saúde da Mulher, são au-

IDENTIFICAM SÍNDROME
toras do estudo “Síndrome hipertensiva na ges-
tação: estudo com mulheres internadas em um
serviço de referência de São Luís/MA”. O objeti-

HIPERTENSIVA EM vo foi conhecer as condições socioeconômicas e


obstétricas das mulheres e levantar aspectos da

MULHERES GESTANTES
assistência no pré-natal e as condutas instituídas
na consulta. De acordo com a coordenadora da
pesquisa, a professora Claudia Teresa Frias Rios,
Israel De Napoli o estudo também investigou o conhecimento das
Fotos: Israel De Napoli mulheres sobre sua doença e o tratamento rea-
lizado, as condutas instituídas na internação, a
prevalência da Doença Hipertensiva Específica da
Gravidez (DHEG) e suas complicações e a carac-
terização dos tipos de parto e sua predominân-
cia.
A pesquisa descritiva com abordagem
quantitativa foi realizada na Unidade Materno
Infantil do Hospital Universitário da Universida-
de Federal do Maranhão (HUUFMA), nos setores
de Internação Obstétrica e Alojamento Conjunto,

36 Revista Inovação nº 30 / 2017


no período de julho a dezem- de gráficos e tabelas no pro- durante a internação, sendo que
bro de 2015. Foram estudadas grama Excel. Segundo Claudia destas, 99,1% fizeram uso de
mulheres internadas com diag- Teresa Frias, a prevalência de metildopa. 76,3% informam ter
nóstico de hipertensão na ges- SHG entre as gestantes inter- recebido orientação da enfer-
tação, independente da idade. nadas no HUUMI foi de 11%, magem sobre a importância da
Como critério de exclusão fo- com predominância entre mu- redução do sal na dieta e sobre
ram indicadas aquelas que não lheres jovens, na faixa etária de o exame de urina das 24 horas
apresentassem condições físicas 25 a 34 anos, correspondendo e 86,27% disse ter sua pressão
e/ou mentais apropriadas para a 71,08%, pardas (58,82), com aferida só por profissionais des-
responder ao formulário. união estável, ensino funda- sa categoria.
“O tamanho da amos- mental completo e procedente As principais compli-
tra foi determinado pela média da capital, que possuíam bai- cações maternas apresentadas
de internação por hipertensão xa renda familiar, 1-2 salários foram eclâmpsia, em 3,20% (6)
na gestação no primeiro semes- mínimos (43,63%) e exerciam das pacientes; síndrome HELLP
tre dos anos de 2013 e 2014, funções domésticas. (2 pacientes), e 1 óbito mater-
respectivamente, 135 e 129, “A maioria primiges- no. As perinatais foram prema-
correspondendo a 132 mulhe- ta com início do pré-natal no turidade e baixo peso e 3 Rns,
res. Porém a nossa amostra 1º trimestre, realizou mais de de pacientes com Eclampsia,
constou de 204 mulheres in- seis consultas em uma USB’s, evoluíram para óbito. Na aná-
ternadas no período estudado. recebeu orientações para nor- lise referente ao tipo de parto
Os dados foram coletados uti- malizar a pressão arterial e realizado, ficou evidenciado o
lizando-se como instrumento afirmou que mudou os hábitos predomínio da cesariana.
um formulário semiestruturado de vida após o diagnóstico da Conclui-se que os re-
e a coleta de dados ocorreu no SHG. 88,3% sentiu confiança sultados deste estudo se asse-
turno vespertino”, informou a no atendimento prestado pela melham aos de outros estudos
coordenadora. equipe multiprofissional duran- realizados no país e de outros
Os dados coletados fo- te internação”, disse. países da América Latina e que
ram armazenados em um banco Conforme a pesquisa, nos casos de hipertensão na
de dados por meio do programa 84,9% das entrevistadas confir- gestação, em qualquer uma de
EpiInfo versão 7.0, sendo pos- maram o uso de medicação e de suas formas, mesmo tendo rea-
teriormente exibidos em forma dieta para o controle da pressão lizado pré-natal, um número

Equipe multidisciplinar faz atendimento pré-natal como ação preventiva à hipertensão

Revista Inovação nº 30 / 2017 37


significativo das mulheres po- de parto para esse grupo, princi- especialista Lívia Cristina Frias
dem apresentar a SHG, neces- palmente naquelas que evoluem da Silva e seis acadêmicos de
sitam de internação e mesmo sem nenhum tipo de complica- Enfermagem, Jéssica Salazar de
usando metildopa, podem evo- ção. Melo, Géssica Wendy dos Pra-
luir para a eclampsia ou apre- Vale observar no con- zeres Oliveira, Natany Sampaio
sentar outra complicação, acar- texto geral, o bom atendimento Santos, Rafael Silva dos Santos,
retando prejuízos também para prestado durante a internação, Rayssa Alessandra Godinho de
seus Rn’s. minimizando os agravos e re- Sousa e Renata Karine Dominice
“É importante que pro- sultados insatisfatórios, como de Souza.
fissionais de saúde diretamente óbitos materno e fetal. “Cabe O projeto de pesqui-
ligados à assistência no ciclo destacar que esta pesquisa foi sa teve aprovação da Comissão
grávido puerperal busquem ofe- descritiva não usando análises Científica do Hospital Universi-
recer uma atenção de qualidade estatísticas multivariadas para tário (COMIC), sob o parecer nº
para minimizar essas compli- buscar associações entre cau- 013/2015, e do Comitê de Ética
cações e reduzir os índices de sas e desfechos, mas teve uma em Pesquisa da Universidade
mortalidade materna e fetal”, amostra significativa e apre- Federal do Maranhão por meio
afirmou Claudia Frias. senta dados atuais e relevantes do Certificado de Apresentação
A pesquisadora ressal- sobre o evento ‘hipertensão na para Apreciação Ética (CAAE). A
ta que, em relação à cesárea, é gestação’, que podem ser úteis pesquisa deu origem a cinco tra-
necessária maior conscientiza- para novos estudos”, ressal- balhos de conclusão de curso da
ção dos profissionais obstetras tou. graduação e uma da residência
na aplicação de rigorosos crité- Além da coordenadora médica, dois bolsistas do PIBIC
rios clínicos para a sua indica- Claudia Teresa Frias Rios, par- com trabalhos apresentados na
ção em casos de hipertensão na ticiparam do estudo as profes- 27ª SEMIC e outro a ser apre-
gestação, uma vez que já está soras Luzinéa de Maria Santos sentado na 8ª JOINP.
comprovado que a via vaginal Frias e Rita da Graça Carvalhal
é muitas vezes a melhor opção Frazão Corrêa, a enfermeira/

Assistência pré-natal proporciona a redução de óbito materno e fetal

38 Revista Inovação nº 30 / 2017


Revista Inovação nº 30 / 2017 39
MÉTODO CANGURU m todo o mundo nascem anualmente

E
20 milhões de bebês prematuros e com
baixo peso (menores de 2,5kg). Destes,

HARMONIZA RELAÇÕES um terço morre antes de completar


um ano de vida. O Método Canguru –

ENTRE FAMÍLIA E EQUIPE


Atenção Humanizada ao Recém-Nascido de Baixo
Peso – é uma estratégia que busca reverter esta
realidade.

MÉDICA NAS UNIDADES O Método Canguru buscar melhorar a


qualidade da atenção prestada à gestante, ao re-

NEONATAIS
Israel De Napoli
cém-nascido e à sua família, promovendo, a partir
de uma abordagem humanizada e segura, o con-
tato pele a pele (posição canguru) precoce entre a
mãe/pai e o bebê, de forma gradual e progressiva,
Fotos: Israel De Napoli
favorecendo o vínculo afetivo, estabilidade térmi-
ca, estímulo à amamentação e o desenvolvimento
do bebê.
O Método Canguru é, portanto, uma tec-
nologia de saúde que vem mudando o paradig-
ma da assistência neonatal no Brasil, pois amplia
os cuidados prestados ao bebê para além de suas
necessidades biológicas na perspectiva da clínica
ampliada.

40 Revista Inovação nº 30 / 2017


Essa abrangência deri- de cuidado em saúde, enten- suas angústias e dúvidas e dar
va da compreensão de que o su- dendo que a integralidade do a eles um painel de seus direi-
cesso do tratamento de um re- cuidado aos recém-nascidos e tos, deveres e os meios para al-
cém-nascido internado em UTI suas famílias envolve integra- cançar os recursos necessários
Neonatal não é determinado ção com equipes multiprofis- para atender suas necessidades,
apenas pela sua sobrevivência sionais trabalhando de forma sejam quais forem, em relação
e alta hospitalar, mas que para interdisciplinar. aos seus filhos”.
cada bebê deve ser construído Além do aspecto as- “O ‘esclarecendo dú-
um projeto de cuidado singular sistencial, a presença de alunos vidas’ acontece em forma de
envolvendo pais, irmãos, avós e de pós-graduação multiprofis- roda de conversa e trata-se de
redes de apoio familiar e social. sional, estende esse olhar para uma prática adotada pela equi-
A Política Nacional de Huma- formação centrada no aluno, pe da Unidade Neonatal do
nização (PNH) e a Política de que visa colocá-los em contato Hospital Materno Infantil da
Atenção Humanizada ao Re- com aspectos da prática nos di- Universidade Federal do Mara-
cém-Nascido de Baixo Peso - ferentes ambientes onde a aten- nhão, baseada nos pressupostos
Método Canguru buscam trans- ção em saúde é exercida, seja da Política de Humanização –
formar as relações entre família no hospital, seja nas unidades ‘Humaniza SUS’, com as mães
e equipe médica com o objetivo básicas de saúde. e pais na primeira etapa do Mé-
de minimizar o isolamento e De acordo com a mé- todo Canguru, com a finalida-
conflitos nas Unidades Neona- dica e coordenadora do proje- de de esclarecer dúvidas sobre
tais (UTIN). to, Marynea Silva do Vale, “as condições clínicas, evolução, e
Dentre as ações do Mé- ações envolvem sempre a di- demais questionamentos que
todo Canguru, a reunião “Es- mensão de capacitação e edu- possam surgir sobre a criança”,
clarecendo Dúvidas”, realizada cação permanente dos estudan- informa Marynea Vale, que é
no Hospital Universitário Ma- tes e profissionais, assim como mestre em Pediatria e Ciências
terno infantil da Universidade a família, onde, a preocupação Aplicadas à Pediatria.
Federal do Maranhão (UFMA), não é transmitir informações Segundo a coordena-
acontece para incorporar os as- ou orientações, mas, principal- dora, qualquer profissional de
pectos psicossociais às práticas mente, escutar as famílias sobre saúde que esteja na roda de

Equipe de profissionais de saúde ouve dúvidas de grupo de pais

Revista Inovação nº 30 / 2017 41


conversa, envolve os familiares As etapas necessárias relação ao seu bebê, enquanto
e inicia uma discussão com a para a realização do esclare- a equipe vai respondendo com
participação dos presentes, res- cendo dúvidas são: preparar o vocabulário simples e claro, de
pondendo-se individualmente ambiente para receber as famí- forma a esclarecer os questio-
ou coletivamente às dúvidas lias, distribuindo as cadeiras em namentos. Caso seja identifica-
que surgirem. A participação do círculo, em número suficiente da uma situação específica de
médico é essencial para esclare- para as pessoas presentes que um bebê e sua família, é reali-
cer temas relacionados a diag- podem ser os pais, avós, tias zada intervenção individualiza-
nóstico e tratamento. “A comu- ou qualquer outro membro da da, ao final da reunião.
nicação em saúde é um “As famílias sentem-
dos pilares do cuidado -se acolhidas pela atenção
adequado e seguro; é As ações envolvem sempre recebida e expressam suas
um processo de duas a dimensão de capacitação dúvidas, que são respon-
vias, que requer tanto e educação permanente dos didas de forma simples e
fala quanto escuta efe- clara e irão somar às in-
tiva na medida em que
estudantes e profissionais, formações técnicas pas-
as famílias possuem assim como a família, onde, a sadas à beira do leito. A
suas próprias crenças preocupação não é transmitir partir desse canal de diá-
sobre saúde e doença. logo e compartilhamento,
informações ou orientações, percebe-se fortalecimento
Nesse contexto, requer
que os profissionais mas, principalmente, escutar na relação entre equipe e
de saúde percebam a as famílias sobre suas família, com aumento da
perspectiva a partir da angústias e dúvidas. confiança na assistência,
qual as famílias estão maior adesão ao trata-
se expressando e quais mento e menor nível de
as suas reais necessidades em família ampliada que queira estresse”, aponta Marynea Silva
relação ao seu filho, conside- obter informações sobre o re- do Vale.
rando ainda que existe uma co- cém-nascido internado. Todos No estabelecimento desse vín-
municação verbal e não-verbal, os familiares e pessoas da rede culo é necessário ainda, tentar
onde devem ser valorizados ex- social de apoio a estas famílias corrigir com clareza e simpli-
pressões, gestos, contato visual são convidadas a participar. O cidade, conceitos distorcidos e
e posturas corporais”, enfatiza grupo é estimulado a expressar aproveitar para fazer educação
a coordenadora. suas dúvidas e demandas em em saúde que possam melho-

Acolhimento dos pais e irmãos faz parte do processo de desenvolvimento do recém-nascido

42 Revista Inovação nº 30 / 2017


O bebê ganha peso e vigor na posição canguru

rar indicadores de morbidades “Nosso objetivo é pro- pessoas além dos pais tenham
que refletem a manutenção das porcionar às famílias e à rede acesso a informações através
taxas de prematuridade e mor- social de apoio um momento do contato direto com a equipe,
talidade infantil neonatal pre- para esclarecimento de dúvidas reduzindo problemas de comu-
coce. sobre o quadro clínico do seu nicação e facilitação na resolu-
Com base nessa pers- recém-nascido internado e so- ção imediata de insatisfações”,
pectiva de esclarecer as dúvidas bre as normas de funcionamen- afirma a coordenadora.
de pais e familiares a respeito to das Unidades de Internação.
O estudo teve como objetivo
do recém-nascido que se en- Esclarecer dúvidas sobre o tra-
relatar a experiência do “Es-
contra na UTI neonatal, torna- tamento realizado pela equipe
clarecendo Dúvidas” como
-se indispensável a construção médica, diagnósticos, resulta-
momento de oportunizar uma
e fortalecimento do vínculo de dos de exames, procedimentos
aprendizagem efetiva, ajudan-
confiança entre família e equi- realizados e prognósticos mé-
do as famílias a conhecerem
pe multiprofissional, entre o dicos, estimular a verbalização
de queixas e proporcionar aco- melhor as condições de saúde
recém-nascido e a equipe mul-
lhimento às queixas e sugestões dos seus filhos, sendo uma fer-
tiprofissional e até mesmo en-
tre família e o recém-nascido, das famílias e atender as famí- ramenta eficaz na educação em
auxiliando na participação dos lias conforme critérios estabe- saúde além de ação educativa
pais no cuidado do bebê, que é lecidos pela Norma de Atenção aos pais e a equipe multiprofis-
fundamental para reduzir esse Humanizada ao Recém-Nas- sional de uma UTI Neonatal.
estresse do momento. cido, permitindo que outras

Revista Inovação nº 30 / 2017 43


44 Revista Inovação nº 30 / 2017
convivência com uma sociedade bastan-

JOGO ELETRÔNICO A
te marcada pelas intervenções feitas pelo
homem na natureza é cada vez mais co-
mum. Os impactos ambientais, a escassez

ENSINA CRIANÇAS dos recursos naturais, as alterações no


clima e outros problemas, oriundos dessas mudan-
ças, há muito tempo preenchem o cenário brasileiro

COMO DESCARTAR LIXO e mundial.


Essa realidade chama atenção para a im-
portância de se trabalhar uma educação voltada ao
Leandro Alves
Fotos: Divulgação ensino de boas práticas acerca do comportamento do
próprio homem, sua maneira de relacionar-se com o
meio ambiente e das ações que consigam amenizar
esses problemas ocasionados por ele mesmo.
No contexto dos problemas ambientais,
destaca-se o lixo, como um dos mais preocupantes
e mais presentes no dia-a-dia das pessoas. Todos os
dias milhões de toneladas de lixo são despejados em
lixões ou aterros sanitários e torna-se cada vez mais
crescente a má distribuição desses resíduos sólidos,
vista que sua maior parte é composta por materiais
recicláveis e que poderiam ter tido outros destinos.

Revista Inovação nº 30 / 2017 45


O principal agente as pessoas a praticar a coleta ainda estaria com o Recicle no
causador dos impactos am- seletiva de maneira correta e papel, não estávamos com ele
bientais é a falta de informa- a entender a utilidade das li- pronto, em fase de negociação.
ção, dado que, uma parcela da xeiras coloridas. “Resolvemos A FAPEMA nos trouxe suporte
população ainda não se cons- trazer essa ideia em forma de financeiro para uma ideia que
cientizou de que ela também é jogo. O Recicle é um game para tínhamos a consciência de que
parte integrante do meio am- mobile, para dispositivos mó- possuía grande capacidade e
biente, o que indiretamente veis, onde ele ensina crianças, que tem enorme aderência na
afeta sua qualidade de vida. a partir de dois anos de idade, sociedade atual. Não conse-
Em São Luís, o questionamen- todo processo de reciclagem, guiríamos apenas com a mão
to sobre o correto descarte se-
a melhor forma de fazer reci- de obra que tínhamos. Com o
letivo do lixo e sobre a recicla-
clagem e o descarte seletivo do apoio da FAPEMA, consegui-
gem em si, levou o diretor da
lixo”, explica o diretor. mos montar uma equipe e em
agência de publicidade e pro-
paganda Casa de Ideias, Mar- O projeto recebeu fi- dois anos de trabalho desen-
celo Jereissati Hage Nicolau, nanciamento da FAPEMA. volver esse trabalho maravi-
a desenvolver um aplicativo “Sem o apoio da FAPEMA o lhoso que está aí”, destaca o
sobre reciclagem, que ensina Recicle não existiria. A gente diretor.

APRENDIZADO COM AUTONOMIA


A proposta com o jogo eletrônico educativo e, obviamente, vamos conseguir reduzir
é a de exploração autodirigida, ao invés da também a quantidade de lixo gerado
instrução explícita e direta. A ideia é que a pela população e prorrogar a vida útil da
criança aprenda mais quando estiver livre natureza”, ressalta.
para ela mesma descobrir os caminhos, ao O diretor conta que hoje sua casa se tornou
invés de ser conduzida. um ponto de coleta seletiva no bairro em
“O jogo eletrônico é voltado às crianças, um que mora e a cada 15 dias troca os resíduos
público que tem muito acesso ao celular. recicláveis arrecadados no ECOCEMAR,
Hoje você consegue educar um adulto, mas repassando o benefício arrecadado para
ele ainda tem resistência. O público infantil redução dos curtos de energia elétrica
não; é um público limpo! A criança é livre da Fundação Antonio Brunno, entidade
de vícios e preconceitos. Com as crianças filantrópica, sem fins lucrativos, que acolhe
crescendo com a ideia do uso consciente do pacientes carentes e portadores de câncer
lixo, do reuso e do descarte consciente, que que vêm de cidades do interior e não têm
é uma prática pouco realizada no Brasil, condições financeiras para se manterem na
a gente vai conseguir evoluir bastante capital durante o tratamento.

46 Revista Inovação nº 30 / 2017


Segundo Marcelo Ni- da casa de um deles, que está fica por dentro das vantagens
colau, as pessoas ainda não cheio de lixo. Eles não têm da coleta seletiva e suas especi-
criaram consciência e às vezes ideia de como reciclar o lixo ficações de materiais, com ên-
olham a lixeira, sabem a cor, encontrado para ajudar a pre- fase nos prejuízos causados ao
mas, não se atentam em ler e servar o meio ambiente. Então, meio ambiente e os benefícios
jogam o lixo em qualquer uma o grupo decide montar uma pe-
da coleta seletiva do plástico,
delas. Por outro lado, até ten- quena usina de reciclagem no
próprio quintal. O aplicativo é o primeiro material a ser reci-
tam colocar o lixo no lugar
correto, mas se deparam com composto por um cenário ini- clado. Do segundo ao quinto
a lixeira de plástico cheia de cial contendo uma esteira, che- nível, o jogador aprende os be-
papel e a de papel cheia de me- gando ao máximo a cinco es- nefícios da coleta seletiva dos
tal, o que é comum em todo lu- teiras rolantes paralelas, onde o outros materiais, como o papel,
gar. Por isso, a importância do objetivo é separar todo o lixo o metal, o vidro, e também os
game é despertar a consciência existente, obedecendo ao crité- resíduos orgânicos. Cada nível
da coleta seletiva nas pessoas. rio da coleta seletiva: plástico, tem dez subníveis com diferen-
papel, vidro e orgânico.
tes dificuldades e velocidades
A dinâmica do jogo crescentes. Ao final de cada
CONHECENDO O RECICLE
segue em cinco níveis diferen-
nível o jogador ganha bônus e
tes. O primeiro, onde o jogador
O jogo mostra uma pontuação extra de acordo com
ler a história das personagens
turma de amigos que montam até o ponto da montagem da seu desempenho.
uma brincadeira no quintal primeira esteira. Em seguida,

A prática do consumo consciente é uma maneira eficiente


para reduzir a quantidade de lixo que você produz. A dica
é comprar e consumir somente aquilo que for necessário.
De acordo com Marcelo Nicolau, o Recicle contribui para
a conscientização da população, sobre a preocupação
de reciclar o lixo e não poluir mais o meio ambiente.
Atualmente, há uma negociação em andamento com
uma grande empresa para que ela possa doar o jogo de
maneira gratuita para a Secretaria de Estado do Meio
Ambiente e Recursos Naturais (SEMA).

Revista Inovação nº 30 / 2017 47


48 Revista Inovação nº 30 / 2017
Revista Inovação nº 30 / 2017 49
NA ESTANTE

Leandro Alves
Fotos: Divulgação

DITADURA E DEMOCRACIAS NO MUNDO


CONTEMPORÂNEO: RUPTURAS E CONTINUIDADES
Monica Piccolo (Organizadora)
Editora UEMA
569 páginas
O livro é organizado pela Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em História, Ensino
e Narrativas (PPGHEN) da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), Monica Piccolo
Almeida, e reúne artigos de pesquisadores de diversas instituições no Brasil cujas pesquisas
têm como foco central: os regimes ditatoriais, como os militares na América Latina nas
décadas de 1960 a 1980, o processo de transição rumo à democracia e, ainda, as rupturas e
continuidades entre as ditaduras que se encerraram nas últimas décadas do século XX e os
regimes que a sucederam. Dividido em duas partes, a primeira, intitulada “As engrenagens
ditatoriais”, é composta por trabalhos que se debruçam sobre os mais diversos mecanismos
de dominação pelas ditaduras do século XX. A segunda parte, “Transição em foco” é forma-
da por trabalhos que investigam o processo de transição em suas múltiplas facetas.

Por que o processo de estabelecimento voltados para as realidades do centro-sul dades importantes quando comparadas a
e consolidação da democracia no Brasil do país não dão conta das diversidades outras realidades históricas, como no Chile
se revela cada vez mais frágil, correndo regionais. Muitos temas da história políti- e em Portugal. No caso chileno, Alende foi
inclusive o risco de sofrer um retrocesso ca recente do Maranhão ainda não foram destituído por um golpe militar, em 11 de
com a ameaça de golpe militar? investigados. Ao mesmo tempo, há artigos setembro de 1973, extremamente violen-
Não vejo, hoje, ameaça de um golpe mili- que tratam das realidades ditatoriais no to, levando à morte do presidente e dan-
tar. O que temos presenciado é uma onda Chile e em Portugal. Assim, em seu con- do início a uma das mais cruéis ditaduras
conservadora, que se refletiu nos movi- junto, o livro possibilita uma ampla com- na América Latina, sob o domínio de um
mentos a favor do impeachment da Pre- preensão dos regimes ditatoriais em suas único militar, o Pinochet. Não havia alter-
sidente Dilma e, principalmente, nos votos dimensões política, econômica e cultural. nância dos militares no poder, como aqui
responsáveis pela eleição de um Parla- Destacam-se, também, os artigos que têm no Brasil. Em Portugal, a instauração do
mento extremamente conservador. O con- a imprensa escrita como corpus documen- Estado Novo, regime político autoritário
servadorismo a que me refiro também está tal. Essa perspectiva metodológica possibi- que vigorou em Portugal durante 41 anos,
presente na atuação do Supremo Tribunal lita a construção de um novo olhar sobre ou seja, desde a aprovação da Constituição
Federal que, em 2015, por exemplo, apro- os regimes ditatoriais, principalmente no de 1933 até a Revolução de 25 de abril de
vou a continuidade das investigações de Maranhão. 1974, também ficou conhecido como sa-
caixa 2 da chapa Dilma-Temer nas eleições Devido à imensa extensão territorial do lazarismo em função de ter sido centrado
de 2014, mas que agora, absolveu a mes- Brasil, a ditadura e a repressão política na figura de Antonio Salazar, que perma-
ma chapa a partir da exclusão dos depoi- aconteceram de diferentes formas nas neceu no poder até 1968, quando foi afas-
mentos presentes nas delações premiadas regiões. O que as pesquisas revelaram tado por doença e substituído por Marcelo
da Odebrecht em nome da “defesa da es- sobre as diversas realidades estudadas? Caetano. No Brasil, a destituição de João
tabilidade política e institucional do país”, Goulart pelo golpe civil-militar (a partici-
Sem sombra de dúvida, os aparelhos de re- pação dos civis, principalmente dos em-
sem levar em consideração que a partici- pressão tiveram uma atuação mais intensa
pação da Odebrecht constava na petição presários, é hoje muito destacada entre os
no centro-sul do país, principalmente no historiadores) deu início a um regime que
inicial do PSDB. A questão que se coloca Rio de Janeiro e São Paulo, regiões onde
é: atuar no sentido da destituição de um se apresentava como “democrático”, sob
também foram mais intensos os movimen- o argumento, por exemplo, de manuten-
governo petista não gera instabilidade ins- tos contestatórios. No entanto, havia uma
titucional? A atuação do Supremo acabou ção das eleições, ainda que indiretas para
capilaridade do aparelho repressor que se a Presidência da República e diretas para
gerando grande frustração nacional. estendeu às várias partes do país, como o legislativo. No entanto, nos três casos
Qual a importância das pesquisas publi- aqui no Maranhão. Assim, pesquisas que em questão, ocorreu um profundo cercea-
cadas no livro “Ditaduras e Democracias procuram iluminar as especificidades re- mento das liberdades políticas, principal-
no Mundo Contemporâneo: Rupturas e gionais são fundamentais para que os regi- mente através da atuação de sofisticados
Continuidades” para o momento político mes ditatoriais possam ser compreendidos aparelhos de repressão e da ampliação
que o Brasil vive? em sua complexidade e que os sujeitos his- das atribuições do poder executivo, em
Os artigos que compõem a coletânea ana- tóricos que tiveram papel de destaque, no detrimento dos demais poderes. Se pen-
lisaram os regimes militares em diversos apoio ou na oposição ao regime ditatorial, sarmos comparativamente o processo de
momentos históricos, distintas áreas de possam ter suas trajetórias reconhecidas, Transição, no caso português deu-se atra-
atuação e muitos deles estão voltados es- como um importante contributo para a vés de um movimento revolucionário, ao
pecificamente para as particularidades do reconstrução da memória histórica recente passo que no Brasil prevaleceu a chamada
período ditatorial no Maranhão, área ain- do Maranhão. “Transição Pactuada”, com a aprovação da
da carente de pesquisas acadêmicas. As- Quais as semelhanças e as diferenças Lei de Anistia e com a derrota da Emen-
sim, o livro se constitui em um importante entre os regimes ditatoriais vividos pe- da Dante de Oliveira (movimento Diretas
passo para novas pesquisas sejam desen- las populações do Chile e de Portugal, Já). No caso chileno, o regime instaurado
volvidas, além de destacar aspectos dos quando comparadas à realidade ditato- em 1973 chegou ao fim com a derrota de
regimes ditatoriais que ainda podem ser rial brasileira? Pinochet no referendo em 1988, com o re-
identificados nos dias atuais. Os estudos A ditadura brasileira apresenta especifici- torno da democracia em 1990.

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O DITO E O INTERDITO NO CASO DOS MENINOS EMASCULADOS DO
MARANHÃO: UMA ANÁLISE DOS DISPOSITIVOS DE PRODUÇÃO DE VERDADES
Valdira Barros
EDUFMA
169 páginas
A capacidade reflexiva da autora permeia o trabalho na íntegra, traduzindo a
qualidade científica de um texto que servirá como elemento de um dossiê de
um passado que não pode – nem deve – ser esquecido. As palavras que aqui
foram escritas têm pressa em serem lidas; os interditos revelados e colocados em
suspense entrarão para a pauta da discussão; o trajeto metodológico ratificará
as ambivalências entre a mão direita e a mão esquerda do Estado, a famigerada
dualidade entre Estado Social e o Estado Punitivo em um contemporâneo contexto
de descasos, indiferença e estigmatização do outro.

O LIVRO ESCOLAR NO MARANHÃO IMPÉRIO (1821 – 1889)


Samuel Luis Velázquez Castellanos
EDUFMA, Café & Lápis
488 páginas
A produção científica maranhense em História da Educação nos últimos anos tem-
se ampliado de forma significativa para trazer à tona aspectos pouco trabalhados
até então, a exemplo da Cultura Material Escolar, da instrução pública e das
instituições de ensino. No caso específico desta obra, escrito com esmero científico e
acadêmico por Samuel Castellanos, o foco central são os livros escolares que foram
produzidos e que circularam por escolas públicas, bibliotecas e outros espaços
no Maranhão oitocentista. Assim, este trabalho se constitui em leitura relevante
para todos os pesquisadores do campo da História, da História da Educação e
de outras áreas do conhecimento. A pesquisa desenvolvida pelo autor envolveu
uma diversidade de fontes documentais e bibliográficas coletadas em diferentes
instituições de memória brasileiras e estrangeiras, privilegiando as correspondências
entre professores e inspetores da instituição pública a diversas autoridades da
Província do Maranhão, assim como regulamentos, decretos e leis.

A ESCOLA LILAH LISBOA DE ARAÚJO – O ENSINO DE MÚSICA NO


NORDESTE E NO MARANHÃO
Ana Neuza Araújo Ferreira
EDUFMA
208 páginas
O livro é uma pesquisa histórica sobre o ensino de música no Nordeste do Brasil, com
ênfase na instituição Escola de Música do Estado do Maranhão ‘Lilah Lisboa de Araújo’
(EMEM). A obra narra a trajetória da instituição ao longo de quarenta anos de atividade
ininterrupta. A narrativa contextualiza o ensino de música no Nordeste brasileiro através
das principais formas de manifestação musical que ali se desenvolveram, a saber, música
religiosa, música nas casas de educandos artífices, bandas de música, atividades musicais
nos teatros, nas escolas, conservatórios e escolas de música, e universidades. Além
disso, trata especificamente do ensino de música no estado do Maranhão, seguindo os
mesmos critérios estabelecidos para os demais estados do Nordeste. O seu destaque é o
estudo detalhado da instituição, desde a sua estrutura física aos diversos segmentos que a
compõem, quais sejam, gestores, corpo docente e técnico-administrativo e corpo discente.

Revista Inovação nº 30 / 2017 51


SÁBIAS PALAVRAS

SAÚDE DA CRIANÇA:
DESAFIO CONSTANTE E
RESPONSABILIDADE DA
FAMÍLIA, COMUNIDADE E
PODER PÚBLICO

infância é um período do desenvolvi-

A
mento humano no qual grandes po-
tencialidades se iniciam e se proces-
sam. Portanto, a humanidade deve à
criança o melhor dos seus esforços
para garantir de forma plena o desenvolvimen-
to destas potencialidades. Nessa perspectiva, no
século XX ocorreram iniciativas marcantes que
chamam a atenção para a responsabilidade com a
vida e a saúde das crianças, tendo destaque a De-
Liberata Campos Coimbra claração dos Direitos da Criança de Genebra em
Enfermeira, Professora Permanente dos 1924; a Declaração dos Direitos da Criança pelas
Programas de Pós-Graduação em Saúde Nações Unidas em 1959; e no Brasil, o Estatuto
Coletiva, Enfermagem e do Mestrado da Criança e do Adolescente (ECA) em 1990, que
Profissional em Saúde da Família da
abordam princípios e direitos fundamentais para
Universidade Federal do Maranhão (UFMA)
a manutenção da vida das crianças.
O Estatuto acima citado dispõe que a
criança deve gozar de todos os direitos funda-
mentais inerentes à pessoa humana, ter as opor-
tunidades para seu desenvolvimento físico, men-
tal, moral, espiritual e social, em condições de
liberdade e de dignidade. Reconhece que é dever
da família, da comunidade, da sociedade em geral

52 Revista Inovação nº 30 / 2017


e do poder público assegurar a o risco de uma criança morrer Entretanto, a meta de
efetivação dos direitos referen- antes de completar um ano de garantir a toda criança brasi-
tes à vida, à saúde, à alimenta- vida em um determinado lugar leira o direito à vida e à saúde
ção, à educação, ao esporte, ao e período. No Brasil, os óbitos ainda não foi alcançada e con-
lazer, ao respeito, à liberdade infantis diminuíram muito nas tinua sendo um grande desafio
e à convivência familiar e co- últimas décadas, passando de diante da ameaça de implan-
munitária. Garante ainda que 47,1 a cada mil nascidos vivos, tação de políticas de cunho
nenhuma criança será objeto em 1990, para 15,6 em 2010 neoliberal, que favorecem a
de qualquer forma de negligên- (BRASIL, 2012). No Maranhão, persistência das desigualdades
cia, discriminação, exploração, por suas características de de- regionais e sociais inaceitáveis.
violência, crueldade e opres- sigualdades sociais, marcadas Além disso, quando se analisa
são. Para tanto, se faz neces- pelo atraso, este indicador tam- a mortalidade infantil observa-
sário a efetivação de políticas bém vem diminuindo significa- -se que os riscos das mortes em
sociais públicas que permitam tivamente, embora ainda seja crianças com menos de um ano
o nascimento e o desenvolvi- um dos maiores do país, pas- acontecem principalmente no
mento sadio e harmonioso, em sou de 48,7 a cada mil nasci- período neonatal, ou seja, antes
condições dignas de existência dos vivos para 27,8 no mesmo da criança completar um mês
(BRASIL, 1990). período acima, chegando em de vida. Essas mortes nesse pe-
Embora o ECA considere crian- 2014 a 24,8 a cada mil crianças ríodo se dão por causas evitá-
ças pessoas menores de doze nascidas vivas, segundo dados veis por falta de ações dos ser-
anos de idade, as menores de de pesquisa que analisou indi- viços de saúde, como a atenção
cinco anos e, especialmente, cadores de saúde da Atenção adequada durante o pré-natal,
as menores de um ano, des- Básica no Estado (COIMBRA, parto e ao recém-nascido (RN),
tacam-se como a parcela de CALDAS, SOEIRO, 2017). que, infelizmente, fazem parte
usuários dos serviços de saúde A melhoria nesse indi- da realidade social e sanitária
de maior importância nos paí- cador vem acontecendo graças de nosso País e do nosso esta-
ses em desenvolvimento, sendo à implantação de políticas so- do.
esta população a primeira a ex- ciais como a redistribuição de Dessa forma, é im-
perimentar os impactos de mu- renda feita pelo Programa Bol- perativo o reconhecimento de
danças nas comunidades como sa Família que ajudou na dimi- todos, família, comunidade e
as consequências das desigual- nuição da pobreza, ampliação poder público da necessida-
dades sociais que o mundo ex- da cobertura da Estratégia Saú- de de maiores investimentos
perimenta há séculos e que se de da Família no âmbito do Sis- no desenvolvimento da saúde
agravou com o advento do ca- tema Único de Saúde e a outros das crianças, especialmente no
pitalismo. fatores. primeiro ano de vida, para que
O padrão de adoeci- A Estratégia Saúde da seus direitos sejam efetivados
mento e morte da população Família constitui-se em uma por meio dos serviços de saú-
infantil é amplamente utilizado das principais políticas ado- de, nutrição, educação, serviços
como indicador da qualidade tadas pelo Brasil, a partir da sociais e de proteção infantil
de vida de todo um conjunto de década de 1990 e sua expres- com a criação de ambientes
indivíduos, passando a ser con- siva expansão de cobertura, acolhedores para que as famí-
siderada uma parcela da popu- desponta como responsável lias possam proporcionar uma
lação prioritária de intervenção pela redução da mortalidade vida digna às suas crianças pe-
por parte de seus governos nos infantil nos últimos anos com quenas. É importante também
diferentes níveis em todo o o aumento do acesso da popu- se compreender que as inter-
mundo, principalmente as me- lação infantil às ações de saúde venções a favor da vida e saúde
nores de um ano de idade. como incentivo ao aleitamento das crianças repercutirão dire-
Dentre esses indicado- materno exclusivo, ao uso da tamente na estabilidade e pros-
res destaca-se o Coeficiente de Terapia de Rehidratação Oral, e peridade de futuras gerações.
Mortalidade Infantil, que traduz à imunização, por exemplo.

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