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Um amigo inesquecível

Janeiro /98.Escrito aos 13 anos

Um bicho de estimação... Um bicho de estimação.... Eu não tirava essa idéia da


minha cabeça.
Por que todos têm um bichinho e eu não tenho? Meu pensamento foi
interrompido pelo grito da minha mãe que estava na cozinha me chamando para
almoçar. Eu tentei falar sobre ter um bichinho de estimação com minha mãe, mas ela
estava tão ocupada que resolvi não interferir, e deixei para falar depois do almoço.
Depois do almoço criei coragem e falei com meus pais sobre Ter um bichinho de
estimação. Minha mãe foi logo dizendo:
- Ah! Dá muito trabalho, e aqui não tem espaço!... Pode ir esquecendo isso!
Meu pai também não gostou da idéia e disse:
- Não! E depois tem que vacinar... Aliás, qual é o bicho de estimação que você
queria?
- Um cachorro – disse imediatamente.
- É? E quem vai levá-lo para passear? – disse minha mãe.
- Tudo bem, então um gato!
- Não, não e não. O seu irmão tem alergia! – disse meu pai.

Pensei num papagaio, mas ele iria ficar me repetindo, e isso me chateia.
Comi a sobremesa e voltei para o quarto. Eu estava chateado, mas ainda tinha as
minhas esperanças.
Quando eu estava voltando da escola, reparei numa loja de animais... entrei.
A primeira coisa que vi foi um cachorro, mas este eu não poderia ter. Depois, vi
um gato siamês, e só então reparei num coelho, lindo, branco. Foi amor à
primeira vista!
Acabei esquecendo-me das horas, pois estava fascinado e apaixonado pelo
coelho. Foi quando ouvi o dono da loja dizer:
- Menino, eu já vou fechar a loja, então me dê licença.
Como perdi a noção do tempo, já são sete horas, e não sei que desculpa darei
aos meus pais.
Chegando em casa, minha mãe foi logo dizendo:
- Gerson! Antônio Gerson! Onde o rapazinho esteve até esta hora?
Mal eu ia responder, e minha mãe disse:
- Vá lavar as mãos, que já vamos jantar!

Na janta, minha mãe contou que eu tinha chegado tarde em casa. Meu pai
disse:
- O que você, na sua idade, estava fazendo depois da aula?
- Pai, eu estava voltando do colégio quando vi uma loja de animais e acabei
me esquecendo das horas, pois vi o bicho de estimação que eu queria.
- Qual? – perguntaram meus pais ao mesmo tempo.
- Um coelho.
Minha mãe falou:
- Ah! Tenho mais o que fazer!....
Meu pai ficou num silêncio dos mortos, num mistério. Ele nem deve Ter
ligado, pensei comigo mesmo.
Um dia, nosso vizinho, o Senhor Luís, ia viajar e pediu ao meu pai que
cuidasse da tartaruga que ele tinha, enquanto viajava. Chegando em casa, meu
pai cobriu a tartaruga com um pano. Ao chegar do colégio, vi a caixa de papelão
com o pano em cima e perguntei:
- O que tem dentro desta caixa?
Meu pai disse que era um coelho. Ia levantando o pano quando vi a cabeça
da tartaruga, esticando. Levei um susto e pensei que era uma cobra. Só depois de
meu irmão tirar o pano, percebi que era a tartaruga do Senhor Luís.
Fiquei muito decepcionado e pensei que nunca teria o coelho que eu tanto
queria.
Na sexta-feira, o nosso vizinho chegou da viagem e foi na minha casa pegar
a tartaruga.
Cada dia que passava eu mais insistia e pedia:
- Ah! Eu queria tanto ter um coelho!...
Meu pai, de tanto me ouvir falar em coelho, resolveu jogar no bicho, e jogou
no coelho. E não é que ele ganhou!?... Pouco, mas ganhou.
Quando um dia voltei da aula, triste e desiludido, vi a mesma caixa de
papelão em que estava a tartaruga, e pensei:
Ah! Essa é a tartaruga do Senhor Luís. Tanto meu pai insistiu que resolvi
abrir a caixa. E olha só o que apareceu... O coelho que eu tanto sonhava! Pulei
de alegria.
Meu pai comprou o coelho com o dinheiro que ele ganhou no jogo do bicho.
Eu estava me explodindo de alegria. Mas teve um problema: Qual seria o
nome do coelho?
Meu irmão Geraldo disse que podia ser Rex, mas achei que esse nome é para
cachorro e não coelho. Pensei no nome Ninja, mas não combinava com ele. Meu
irmão mais velho, o Acleusso, arriscou Fucinho. E não é que eu gostei? Assim,
ficou sendo o nome do meu coelho.
No colégio, contei aos amigos sobre meu animal de estimação, e todos
acharam estranho coelho ser animal de estimação. Eu sei que muita gente prefere
cachorros, gatos, e até peixes, mas eu prefiro meu coelho, pois com ele eu brinco
e me divirto todos os dias.
Eu o pegava no colo, o acariciava, pulava e corria com o Fucinho. Ele era
mais que um animal de estimação, era um amigo, um companheiro de todas as
horas. Às vezes, quando eu estava triste, recorria ao meu coelho, pois ele sempre
me alegrava.
Com o passar do tempo, mais bonito e gordinho ele ficava. Adorava comer
cenouras, mas não dispensava uma boa alface. Acho que era por isso que ele era
tão gordinho; dava até vontade de apertá-lo.
No colégio, eu dizia a todos:
- Davi, eu tenho um coelho. Pedro, eu tenho um coelho. E mais blá, blá, blá...
Rodrigo dizia que eu só falava sobre o meu coelho, e me esquecia de prestar
atenção ao jogo de futebol. Mas alguns até queriam conhecê-lo, e eu dizia todo
empolgado:
- Ah! Ele é branquinho... Modéstia à parte, é o mais lindo coelho do mundo.
Ganhei de Kátia, minha melhor amiga da classe, um laço vermelho, e coloquei-o
no Fucinho.
Na aula de hoje a professora passou uma redação com o tema
“profissão”. Escrevi que queria ser fazendeiro e teria uma criação de coelhos,
com coelhos brancos, pretos e cinzas. Minha professora me deu dez, e eu saí a
mostrar minha nota.
Como eu me divertia com o meu coelho... Mas tinha uma coisa que meus
pais não permitiam: era dormir com o Fucinho. Em minha casa havia um buraco
onde ficava a bomba d’água, meu pai colocou meu coelho lá e fechou com uma
tábua. De noite aconteceu uma coisa engraçada, bem de noite, mais ou menos à
meia-noite.
Fucinho tinha passado pela tábua. Eu estava dormindo quando de repente
senti umas mordidinhas na unha do meu pé; acordei para ver o que era, e
imaginem quem era!? Ora, era o meu coelho! Deitei-o e coloquei-o no meu
travesseiro, e dormimos. De manhã meu pai me viu dormindo e pensou: como
esse coelho conseguiu fugir? À noite, meu pai colocou três tijolos em frente à
tábua, para o coelho não sair.
Eu não conseguia dormir, pois me lembrava de ontem, quando havia
dormido com Fucinho, mas como eu já sabia que o meu coelho sair, resolvi eu
mesmo ir lá pegá-lo.
Ao amanhecer, quem me viu dormindo com Fucinho foi minha mãe, e
disse que se esse coelho saísse de noite outra vez ia para a panela.
Depois daquele aviso de minha mãe, resolvi não dormir mais com o
Fucinho.
Meses depois recebi a notícia de que minha tia Vanessa havia chegado
de viagem e passaria alguns dias em minha casa. Chegando em minha casa, a
primeira coisa que ela viu foi meu coelho. Depois de conversar e de lanchar,
falei do meu coelho para minha tia. Acho que ela não gostava de coelho, pois
nem fazia conta dele.
Quando o Geraldo chegou deu uns espirros, minha tia não falou nada,
mas de noite, quando meu pai chegou, ela falou que o Geraldo estava espirrando
por causa do meu coelho, e se continuasse assim meu irmão ia ficar com
bronquite.
Depois disso meu pai não sabia o que fazer, e minha mãe falou que
também ficou sem saber o que fazer. Mas tanto a tia Vanessa insistiu que meus
pais resolveram arrumar um lugar para o meu coelho morar.
Cada dia eu ficava mais triste, parecia que eu nunca mais teria nenhuma
razão de dar um sorriso.
Um tio do meu pai se ofereceu para cuidar do meu coelho, mas eu não
queria. Meu pai disse que esse era o único jeito.
Era em Santíssimo, Bangu, na casa do tio do meu pai. Tinha uma cabana
perto da casa, um cachorro preso pela corrente, várias árvores frutíferas, como
pé de laranja, banana, manga e jaca. Lá também tinha uma churrasqueira.
Chegando lá, vi no dono da casa um sorriso misterioso. Nesta hora,
minha mão ficou parada, parecia que ela não queria que eu desse o coelho. Ele
pegou o Focinho pelas orelhas e botou-o dentro de um quarto escuro.
Meu pai falou para eu ir comer churrasco, mas eu não estava com fome.
Dei um abraço no Focinho e fui-me embora.
Cada dia que passava eu ficava com mais saudade. Esperei segunda-feira,
terça, quarta, quinta, sexta e sábado, para chegar domingo, pois nesse dia eu iria
visitar o meu coelho.
No domingo eu estava muito contente, pois ia visitar o Fucinho.
Chegando lá, o dono da fazenda olhou para mim diferente, estranho, e deduzi
que algo de ruim tinha acontecido. Mas deixei para perguntar depois de brincar
com o meu coelho.
Não o encontrei lá, e assustado fui perguntar ao moço. Atrapalhado,
culpou o cachorro de ter atacado o coelho, e matado. Perguntei quando
aconteceu isso e ele falou que há pouco tempo. Mas perto do cachorro não havia
pêlo, sangue ou algum outro vestígio de que meu coelho tinha sido atacado.
Triste, passei pela churrasqueira e vi atrás dela o pêlo do meu coelho num
baldinho do lixo; ainda estava lá o lacinho que pus nele. Chorei e falei com meu
pai, e ele tentou me consolar.
Eu não agüentava a tristeza, e fui-me embora, deixando-os saboreando e
comentando a gostosura da carne de coelho.
Já não podia acariciar o meu coelho, pular ou correr com ele. No
colégio, eu não falava mais sobre o meu coelho.
Quando eu fui dormir, peguei o travesseiro e lembrei-me das noites que
Fucinho dormia encima do meu travesseiro. Depois desse dia meu travesseiro
ficou sendo o Fucinho.
Hoje já tenho 13 anos, na época lembro-me, que tinha mais ou menos
dez.
Como consolo ganhei de um amigo um hamster, mas essa já é outra
história.
Fucinho é e sempre será o meu amigo inesquecível.

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