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Mais aposentados no

campo do que
agricultores
Há um número desproporcional de beneficiários do INSS em relação
ao de trabalhadores rurais.
Editorial
31/03/2019 - 00:00

É compreensível, mas não aceitável, que políticos, mesmo diante


dos riscos de insolvência do próprio sistema de seguridade e, por
consequência, do Tesouro, se oponham a algumas mudanças em
nome da defesa dos mais “humildes”.

Sob esta chancela estão os atendidos pelo Benefício de Prestação


Continuada (BPC), um salário mínimo para qualquer pessoa com
65 anos ou mais que se declare de baixa renda e/ou seja
deficiente, mesmo que jamais tenha contribuído para o INSS.

Trata-se de uma ajuda de cunho social, de necessidade


indiscutível. Pela proposta original da reforma, a pessoa poderá, já
aos 60 anos, começar a receber R$ 400 e chegar ao salário
mínimo integral aos 70. Políticos se insurgem contra o que
consideram uma desumanidade, mas não se preocupam com a
lisura das informações concedidas ao INSS, no enquadramento do
beneficiário no BPC. Este é outro exemplo da clássica visão
brasileira de que dinheiro público não tem dono nem custo, e por
isso pode ser gasto sem cuidado. Sequer admite-se que a
possibilidade de garantir um salário mínimo aos 65 anos é
poderoso incentivo a que uma faixa da população deixe de
contribuir para o INSS a partir de certa idade. E também não se
reconhece a injustiça social de se pagar aposentadoria de um
salário a quem contribui ou não.

Outra incongruência é o ataque às mudanças na aposentadoria


rural, também devido a preocupações ditas sociais. O tamanho
dos números desta aposentadoria por si só justifica uma análise
das despesas.

Os segurados no campo representam 32% dos benefícios do INSS


e respondem por 52% do déficit. No ano passado, a previdência
rural arrecadou R$10 bilhões, mas gastou R$ 124 bilhões. Para
este ano, o governo projeta receita de R$ 11 bilhões e despesas de
R$127 bilhões.

Ora, apenas estes números justificam que algo deva ser feito na
arrecadação. Daí propor-se uma idade mínima, para se pedir o
benefício, de 60 anos para homens e mulheres — hoje, 60 e 55
anos —, com o aumento do tempo de contribuição de 15 anos para
20, coerente com o sentido de toda a reforma da Previdência —
mais tempo no mercado de trabalho, aumento da contribuição.
Mantém-se o recolhimento de 1,7% sobre o valor da produção ou
um mínimo de R$ 600 por ano.

Além da dimensão dos números, chamam a atenção as evidências


de fraudes. Supõe-se que muitas cometidas no período em que foi
possível obter aposentadoria com uma simples e pouco idônea
declaração de um sindicato rural que atestava a condição de
trabalhador no campo.

Há números reveladores, da Secretaria da Previdência: existem


mais de 9 milhões que recebem aposentadorias e pensões rurais;
só dos chamados aposentados especiais são 7,3 milhões, enquanto
trabalhadores autodeclarados no campo são menos de 7 milhões.
Mais aposentados do que trabalhadores deveria preocupar o
Congresso.

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