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A MANIÇOBA

A maniçoba, árvore típica da caatinga, produz um látex de grande qualidade. Além de


pneus, até meados do século XX sua borracha natural era usada para produzir luvas cirúrgicas
por conta de seu potencial de evitar rejeição durante operações. Entre 1900 e 1940, famílias
de diversas localidades do Nordeste brasileiro foram ganhar a vida na extração de maniçoba,
em uma região do Piauí onde hoje está o Parque Nacional da Serra da Capivara, declarado
Patrimônio Mundial da Humanidade pela Unesco e maior sítio arqueológico da América Latina.
Imerso em uma crise financeira que se estende há anos, o parque inaugurou recentemente a
Trilha Caminho dos Maniçobeiros, com o objetivo de preservar a memória desses trabalhadores
em diálogo com os vestígios pré-históricos.
O circuito turístico inclui visita aos locais em que essas famílias costumavam habitar:
abrigos formados por paredes de taipa (pedra, paus e barro amassado) e tocas de rocha
adaptadas para moradia.
O modo de vida e trabalho dos maniçobeiros começou a ser investigado, na década de
1970, por pesquisadores da Fundação Museu do Homem Americano (Fundham), que administra
o Parque da Serra da Capivara. A arquiteta Elizabete Buco, pesquisadora da Fundham, ressalta
a importância da preservação dessa memória: “Resolvemos tirar do papel e mostrar o que o
parque ainda guarda sobre esses homens que faziam das tocas suas moradias, convivendo com
vestígios arqueológicos, reocupando a área e construindo um novo espaço, com novos
simbolismos e manifestações culturais”.
Naquele período, a extração do látex de maniçoba no Nordeste só perdia em quantidade
para os seringais da Amazônia. Ainda assim, “a demanda era tão grande que o governo
brasileiro incentivava a extração e o cultivo de toda árvore que produzisse borracha”, observa
Ana Stela de Negreiros Oliveira, pesquisadora do Iphan no Piauí. Os maniçobeiros extraíam
látex de forma diferente: enquanto na seringueira as incisões eram feitas no tronco da planta,
na maniçoba o látex era retirado da raiz, com auxílio de um instrumento pontiagudo criado por
eles, a léga.
Mas as relações de trabalho de seringueiros e maniçobeiros se assemelhavam: eram
ambos explorados ao contrair dívidas com seus patrões, que monopolizavam o acesso a
produtos alimentícios. Isto explica por que as famílias utilizavam os abrigos pré-históricos como
moradias. “Muitas vezes a pintura rupestre fazia parte da decoração da casa”, conta Ana Stela.

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