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Introdução:
aplicações, e “o fato de ter sido aplicado à obra de filósofos com tão pouco em comum
seguindo a distinção apontada por Strawson, podemos indicar duas grandes definições do
termo, dentro das quais existem subdivisões. A primeira “denominada naturalismo estrito
considerar aqui o ceticismo muito mais como uma forma de dúvida que de recusa de
hipóteses, o cético, ao qual nos referimos é aquele que questiona, ainda que por razões
metodológicas, não aquele que nega à primeira vista, categoria na qual, tradicionalmente,
tradicional entenderemos Hume como um filósofo cético, porém, que utiliza do ceticismo
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STRAWSON, P. F., Ceticismo e naturalismo: algumas variedades. São Leopoldo, RS: Editora da
Unisinos, 2008.
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Emprego aqui as palavras “católico” e “liberal” em sentido amplo, não em seu sentido especificamente
religioso ou político; nada do que direi terá qualquer relação direta com a religião ou filosofia da religião,
nem com a política ou filosofia política. (Strawson)
para avançar no pensamento e na reflexão filosófica, mitigando ainda que não por
“naturalismo” somente após explicar a forma como consideramos que Hume mitiga seu
iniciado no livro I da mesma obra, no qual, ao final do texto, limita as pretensões da razão
da existência. Strawson defenderá em sua obra que a posição cética de Hume é mitigada
pela vida ordinária no sentido mais prático, ou seja, Hume afirma que não há argumentos
eficaz a favor da posição cética nem, na mesma medida, argumento possível contrário a
ela. Não podemos evitar a crença na existência de corpos, na existência do mundo externo
e nem mesmo podemos evitar a crença na existência de certa metafísica. O que não é
possível fazer é superar a dúvida cética por essa crença, usada na vida comum.
Tendo Hume colocado o ceticismo numa posição menor, ou tendo pelo menos de
alguma maneira mitigado o ceticismo, nos encontramos em uma posição dúbia. Afinal,
muitas das conclusões do filósofo terão um forte viés cético. O caso mais comum é o da
questão causal, que certamente o levam a uma conclusão cética. Mas será que por conta
Acredito que a resposta para essa questão esteja na própria obra de Hume.
naturalismo é visto mais como um refúgio ou uma forma de se salvar do ceticismo, mas
essa posição me parece menos provável que a seguinte: Hume na verdade considera o
serve para polir a ciência e a investigação filosófica, colocando-as em cheque sempre que
alguma vertente dogmática parecer ganhar força. De seu lado, o naturalismo serve como
forma de investigação daquilo que compõe nossa psicologia moral e nossa sociabilidade.
O que obviamente fica sujeito ao ceticismo e mesmo essa investigação, não supera a
não se contradizem, mas que possibilitam a melhor compreensão possível dos eventos no
crítico, reflexivo e que fica em constante movimento dado o caráter cético que deve
primeiro nível de pensamento ficam anuladas e suprimidas pela natureza, pela inevitável
crença na existência. Por meio dessa pré-disposição natural a própria dúvida cética pode
comum. Ao considerar porém, os dados da reflexão, a dúvida cética persiste como uma
Até então a razão parece não ter nenhum papel a desempenhar, o que certamente
não é o caso, a razão funciona, tem utilidade. Embora seja a natureza que nos dita crenças
indutivas gerais, a razão serve para formular regras para julgar sobre causas e efeitos,
ainda que este julgamento não sobreviva ao ceticismo. Um outro papel muito importante
somente conforme ditada pela natureza, seria contraditória e não haveria parâmetro de
investigação que não mais dependem tanto da dúvida cética para serem considerados
relevantes. Estes caminhos, justamente por não terem pretensões dogmáticas ou por
aceitarem perfeitamente seu caráter revisionista, podem ser investigados sem lutar frente
conceitual.
pretensões de descrever este aparato, mas não pode apelar para nenhuma espécie de
condição necessária, afinal seus argumentos não eliminam todas as outras possibilidades.
Hume, por exemplo, ao explicar nossas conexões de ideias por causalidade, contiguidade
e semelhança, não elimina qualquer outra possibilidade de explicação, como por exemplo,
um ser infinitamente superior e infinitamente ocioso, que prefere usar seus superpoderes
para realizar em cada mente humana as conexões de ideias, ao invés de ter criado
Por mais implausível que soe a ideia, não há nada na argumentação naturalista que
a invalide, assim como não há nada em todo o pensamento científico que o faça. Mas
confortável em admitir que de fato estas questões não possam ser respondidas através de
pensamento filosófico. Afinal, não importa quantas vezes o mesmo evento se repetiu:
notar ao mesmo tempo, que ainda assim, a perspectiva naturalista explica as principais
conceitual”. Estes elementos não devem ser considerados como rigidamente dedutivos.
Mas como uma estrutura interpretativa coerente e que se apoia na regularidade de certos
dados, são partes que se sustentam mutualmente e depende umas das outras, podendo ser
inteligíveis e revisáveis.
Essa visão sobre o naturalismo e o ceticismo, como vimos, não é estabelecida sem
uma dose de críticas, mas é importante ressaltar, como aponta Straud, que o desafio do
cético ao ser enfrentando, sempre recua mais um nível, não importando a forma de
questão continua presente, tem sua utilidade reflexiva, mas não se apresenta mais como
descrever fenômenos sem com isso se tornar dogmático ou se abalar pelo ceticismo, visto
medida comezinhos. Tal ocorrência não se dá por considera-los vãos, sem sentido ou
mesmo impraticáveis, mas porque o compromisso investigativo tem seu locus alterado.
Afinal, agora temos compromissos que não podem ser evitados, são demandas naturais e
originárias de nossa constituição orgânica, ainda que essa mesma constituição não passe
como no caso de Moore, que afirma: “eis aqui duas mãos”. O que obviamente não passa
perguntado se realmente existem coisas físicas, pois a experiência de Moore não revela
subjetividade para se validar a existência das coisas, do mundo e das relações causais.
existência de algo, sem que com isso se garanta nem a real existência corpórea de Moore
Na obra de Hume, um dos momentos céticos mais claro aparece na quarta parte
do primeiro livro do Tratado, onde o filósofo faz uso de um argumento em que pretende
mostrar que “tudo é incerto, e que nosso julgamento em coisa alguma possui nenhuma
medida de verdade e falsidade” (HUME, 2006, p. 123 [I 4, 1.7]), o que pode ser
se refere ao que já foi dito, à saber, a filiação de Hume ao ceticismo, sendo considerado
um dos grandes nomes do ceticismo moderno, o que de certa maneira é justo, afinal, de
fato não há nada que garanta a validade ou a verdade no sentido mais rígido daquilo que
julgamos.
pensamento de Hume passa a ser interpretada não mais como uma fuga do ceticismo para
o naturalismo, numa tentativa de refutar esse tipo de argumento cético, mas sim explicar
está totalmente em ajuste com as explicações naturalistas e com a questão cética. A ponto
de Hume poder alegar que enfatizar o argumento cético é uma maneira de confirmar sua
ideia sobre as crenças naturais, pois o fato das crenças não poderem ser eliminadas por
que a demanda natural dada pela natureza não exclui a razão mas se impõe como uma
notórias quando consideramos que a crença não pode ser um simples ato de pensamento,
pois, seria destruída por completo pela dúvida cética. Hume reconhece que o argumento
cético pode ser aplicado ao seu próprio discurso da crença (cf. HUME, 2006, p. 123 [I 4,
1.8]), mas isso não abala a necessidade prática e os usos efetivos da perspectiva
naturalista.
Conclusão
aprofundamento nas questões mais importantes. O que Hume nos fornece é um ponto de
equilíbrio, entre a demanda natural que nos impele a crer e sobre a qual podemos
O uso que Hume faz do naturalismo é por um lado instrumental e por outro social,
Ao mesmo tempo o uso do ceticismo tem dupla função, a primeira refrear toda e qualquer
as origens e do conhecimento humano e como ele opera. Uma saída prática que atende a
as imposições da natureza.
Bibliografia:
HUME, David. Tratado da Natureza Humana. Trad. de Deborah Danowski. 2.ed. rev. e
ampl.. São Paulo: Editora UNESP – Imprensa Oficial do Estado, 2009.
___________. An Enquiry concerning Human Understanding. ed. Tom L. Beauchamp.
Oxford: Oxford University Press, 1999.
MOORE, G. E. Escritos Filosóficos. Trad. Paulo Mariconda. São Paulo: Nova Cultural,
1989.
STROUD, B. Hume. Londres: Routledge, 1995.
STRAWSON, P. F. Ceticismo e Naturalismo: algumas variedades. São Leopoldo: Editora
Unisinos, 2008.