Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
A Dominação Britânica na
Índia[N256]
Karl Marx
10 de Junho de 1853
Transcrição autorizada
Primeira Edição: Escrito por Marx em 10 de Junho de 1853. Publicado no jornal New-York Daily
Tribune, n.º 3804, de 25 de Junho de 1853.
Fonte: Obras Escolhidas em três tomos, Editorial "Avante!" - Edição dirigida por um colectivo
composto por: José BARATA-MOURA, Eduardo CHITAS, Francisco MELO e Álvaro PINA, tomo I,
pág: 513-518.
Tradução: José BARATA-MOURA. Publicado segundo o texto do jornal. Traduzido do inglês.
Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo.
Direitos de Reprodução: © Direitos de tradução em língua portuguesa reservados por Editorial
"Avante!" - Edições Progresso Lisboa - Moscovo, 1982.
Não pode, contudo, restar qualquer dúvida de que a miséria infligida pelos
Britânicos ao Indostão é de uma espécie essencialmente diferente e
infinitamente mais intensiva do que a que todo o Indostão teve de sofrer
anteriormente. Não aludo ao despotismo europeu, implantado sobre o
despotismo asiático pela Companhia Britânica das Índias Orientais[N262], e que
forma uma combinação mais monstruosa do que qualquer das dos monstros
divinos que nos assustam no templo de Salsette[N263]. Este não é um traço
distintivo da dominação colonial britânica, mas apenas uma imitação dos
Holandeses, e tanto é assim que, em ordem a caracterizar o trabalho da
Companhia Britânica das Índias Orientais, basta repetir literalmente o que Sir
Stamford Raffles, o governador inglês de Java, disse da velha companhia
Holandesa das Índias Orientais.
https://www.marxists.org/portugues/marx/1853/06/10.htm#tn256 2/7
10/02/2019 A Dominação Britânica na Índia
Anéis nos dedos das mãos e dos pés eram também muito comuns. Tanto as
mulheres como as crianças usavam frequentemente braceletes e pulseiras
maciças, de ouro ou de prata, e foram encontradas estatuetas de divindades de
ouro e de prata nas casas. Foi o invasor britânico que quebrou o tear manual e
destruiu a roda de fiar. A Inglaterra começou por privar os algodões indianos do
mercado europeu; introduziu depois o fio no Indostão e, no fim, inundou de
algodões a própria terra natal do algodão. De 1818 a 1836, a exportação de fio
da Grã-Bre-tanha para a Índia cresceu na proporção de 1 para 5200. Em 1824, a
exportação de musselinas britânicas para a Índia mal chegava a 1 000 000 de
https://www.marxists.org/portugues/marx/1853/06/10.htm#tn256 3/7
10/02/2019 A Dominação Britânica na Índia
Ora, por mais triste que seja para o sentimento humano testemunhar estas
miríades de organizações sociais industriosas, patriarcais e inofensivas
desorganizadas e dissolvidas nas suas unidades [constitutivas], atiradas para um
mar de sofrimentos, e os seus membros individuais a perderem ao mesmo
tempo a sua antiga forma de civilização e os seus hereditários meios de
subsistência, não podemos esquecer que estas idílicas comunidades aldeãs, por
muito inofensivas que possam parecer, foram sempre o sólido alicerce do
despotismo oriental, confinaram o espírito humano ao quadro mais estreito
possível, fazendo dele o instrumento dócil da superstição, escravizando-o sob o
peso de regras tradicionais, privando-o de toda a grandeza e de toda a energia
histórica. Não podemos esquecer o egoísmo bárbaro que, concentrando-se
nalgum mísero bocado de terra, foi calmamente testemunha da ruína de
impérios, do perpetrar de crueldades sem nome, do massacre da população de
grandes cidades, sem lhes dedicar mais consideração do que aos acontecimentos
naturais, [sendo, afinal,] ele próprio presa indefesa de qualquer agressor que se
dignasse dar por ele. Não podemos esquecer que esta vida indigna, estagnada e
vegetativa, que esta espécie de existência passiva, desencadeava, por outro
lado, em contrapartida, forças de destruição selvagens, sem objectivos e sem
limites, e tornavam o próprio assassínio um rito religioso no Indostão. Não
podemos esquecer que estas pequenas comunidades estavam contaminadas por
distinções de casta e pela escravatura, que subjugavam o homem às
circunstâncias exteriores em vez de o elevarem a senhor das circunstâncias, que
transformavam um estádio social em auto-desenvolvimento num destino natural
nunca mutável e ocasionavam, assim, um culto da natureza brutalizador, que
exibia a sua degradação no facto de o homem, o senhor da natureza, cair de
joelhos em adoração de Kanuman, o macaco, e Sabbala, a vaca.
https://www.marxists.org/portugues/marx/1853/06/10.htm#tn256 5/7
10/02/2019 A Dominação Britânica na Índia
Início da página
Notas de rodapé:
(1*) Em francês no texto: deixai fazer, deixai andar. Fórmula utilizada pelos economistas
burgueses que preconizavam o livre-cambismo e a não interferência do Estado nas relações
económicas. (retornar ao texto)
[N257] Mongóis: conquistadores de origem turca que penetraram na índia no início do século XVI
provenientes da parte oriental da Ásia Central e que fundaram em 1526 no Norte da índia o
império dos Grão-Mongóis (do nome da dinastia reinante neste império). Na primeira metade do
século XVIII este império desapareceu em consequência das constantes lutas internas e do
reforço das tendências separatistas feudais. (retornar ao texto)
https://www.marxists.org/portugues/marx/1853/06/10.htm#tn256 6/7
10/02/2019 A Dominação Britânica na Índia
[N258] 258 Religião do Linga: culto do deus Siva espalhado entre a seita do Sul da índia dos
lingaístas (de “linga”, símbolo de Siva), que não reconhecia as distinções de casta, os jejuns, os
sacrifícios, as peregrinações. (retornar ao texto)
[N259] Jaganata (Juggernaut): uma das reincarnações do deus hindu Vixnu. Os sacerdotes do
templo de Jaganata recebiam grandes rendimentos das peregrinações em massa e encorajavam
a prostituição das mulheres que viviam no templo. O culto de Jaganata compreendia ritos
pomposos e dava lugar a um desencadeamento de fanatismo que se manifestava em suicídios e
mutilações voluntárias. Nos dias das grandes festas alguns dos fiéis lançavam-se debaixo das
rodas do carro que transportava a estátua de Vixnu-Jaganata. (retornar ao texto)
[N260] Heptarquia: termo adoptado pela historiografia inglesa para designar o regime político da
Inglaterra no início da Idade Média, quando o país estava dividido em sete reinos anglo-saxónicos
(séculos VI-VIII); por analogia Marx aplica aqui este termo para designar a fragmentação feudal
do Decão (Índia Central e Meridional) antes da sua conquista pelos muçulmanos. (retornar ao
texto)
[N261] Brâmanes: uma das quatro castas mais antigas da índia, à qual pertencia primeiro e
fundamentalmente a camada privilegiada dos sacerdotes; mais tarde, tal como as outras castas
indianas, abarcava, além dos sacerdotes, pessoas de diferentes profissões e origens sociais, sem
excluir camponeses e artesãos empobrecidos. (retornar ao texto)
[N262] Companhia das Índias Orientais: companhia comercial inglesa, instrumento da política
colonial inglesa na índia, na China e noutros países da Ásia, fundada em 1600. A lei adoptada em
1853 restringia os direitos monopolistas da companhia para dirigir a índia. A companhia foi
definitivamente liquidada em 1858. (retornar ao texto)
[N263] A ilha de Salsette, situada a norte de Bombaim, era célebre pelos seus 109 templos
budistas construídos em grutas. (retornar ao texto)
Inclusão
https://www.marxists.org/portugues/marx/1853/06/10.htm#tn256 7/7