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A Fé sob escombros: esboço teológico camponês protestante pós-tragédia em Vieira View project
All content following this page was uploaded by Fábio Py Murta de Almeida on 08 December 2017.
ideas y valores • vol. lxv • n.o 161 • agosto 2016 • issn 0120-0062 (impreso) 2011-3668 (en línea) • bogotá, colombia
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produzidas com o fim de compreender o “poder do alto” para lhe julgar, con-
comportamento enigmático de Pilatos. vencendo o prefeito de sua inocência.
Voltando ao julgamento: o termo grego Contudo, os hebreus insistiram pela não
krisis, além de significar “julgamento”, soltura. Dessa forma, entregou Jesus à
também apresenta relação medicinal, po- crucificação, agindo mais “como inter-
dendo ser percebido como o momento em mediário, árbitro, e não como juiz” (43).
que o médico avalia se seu paciente viverá Nesse ponto, a questão do reino deve ter
ou morrerá. A narração do julgamento sido pertinente, visto que Pilatos manda
no evangelho de João ganha caracterís- que se coloque sobre a cabeça de Jesus
ticas dramáticas, estilhaçando-o em sete na cruz o dito “Jesus nazareno, rei dos
cenas, cada qual com um lugar vivencial judeus”, referindo-se ao crime então co-
distinto. Na primeira cena, os sacerdotes metido (44). Por outro lado, uma surpresa
levam Jesus ao pretório, não querendo encontrada no livro de Agamben é a
que entre “para não contaminar-se an- utilização do conceito teológico de Karl
tes da refeição pascal” (35). Desenrola-se Barth, teólogo reformado suíço, de pare-
o julgamento quando Pilatos pergun- doken (“entrega”). O teólogo desenvolve
ta sobre a acusação à multidão (prática esta ideia a partir dos textos paulinos,
comum em um processo romano), e os assimilando que, na tradição cristã, a
hebreus respondem que seria um crime entrega cristológica aos hebreus: “aparece
de lesa-majestade, o qual tinha como pe- como uma execução da entrega divina”
nas previstas: ou a crucificação, ou exílio (46). Apesar de a terminologia “entrega”
ou a entrega às feras. No entremeio, após no NT carregar um sentido de ensino
interpelação inesperada de Pilatos, os com aparência de negativo, “há somente
evangelistas apontam que Jesus assumia uma autêntica tradição cristã: a da en-
que seu “reino não era desse mundo” (37), trega –por parte primeiramente do Pai,
ou seja, ele detinha uma condição régia. depois de Judas e dos hebreus– de Jesus
Para além disso, diante de Pilatos, Jesus à cruz, que aboliu e realizou todas as
teria argumentado, valendo-se da verdade, tradições” (48).
possibilitando a indagação do prefeito: “O Agamben entende que o papel do
que é a verdade?” (38). Isto representaria, prefeito da Judeia não estaria ligado à
para Agamben, uma pergunta entranhada “economia da salvação”. Antes, Pilatos
de ceticismo e ironia, uma demonstração é apresentado como personagem real
do embate de ambos, pois é quando se mediante um drama histórico. Se para
tem “duas verdades diferentes ou duas a concepção cristã a história torna-se
concepções diferentes de verdade” (38). execução da economia da salvação, nos
O dado mais intrigante seria o de que textos sagrados, Pilatos é “convencido
Pilatos, durante todo o processo, não de que um rei dos judeus é, de qualquer
profere uma sentença -apenas entrega o forma, politicamente problemático” (49).
acusado. Chega a levá-lo à flagelação (pas- Neste recorte, pode-se dizer que o jul-
so inicial da crucificação), castigando-o gamento de Jesus não foi somente um
a fim de colocá-lo em liberdade. processo jurídico, mas também um mis-
Para Agamben, o comportamento de tério repleto de ambiguidades peculiares:
Jesus foi o de indicar que Pilatos teria ocorrido sem formalidades oficiais, sem
ideas y valores • vol. lxv • n.o 161 • agosto 2016 • issn 0120-0062 (impreso) 2011-3668 (en línea) • bogotá, colombia
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Referências
Agamben, G. Homo sacer. O poder sobe-
rano e a vida nua I. Belo Horizonte: * Doutor em Teologia puc-rj (ênfase em
História da Igreja), tendo sido bolsista de
UFMG, 2004.
um período sanduíche pelo psde-capes
Agamben, G. Profanações. São Paulo: no Ecole des Hautes Études en Sciences
Boitempo, 2006. Sociales (ehess) em Paris.