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Rev. IG, São Paulo, 13(2), 47-49, jul./dez.

ll992

SUGESTÕES PARA PADRONIZAÇÃO DA METODOLOGIA


EMPREGADA EM ESTUDOS PALINOLÓGICOS DO
QUATERNÁRIO
Jean-Pierre YBERT
Maria Léa SALGADO-LABOURIAU
Ortrud Monika BARTH
Maria Luísa LORSCHEITTER
Márcia Aguiar de BARROS
Sérgio Augusto de Miranda CHAVES
Cynthia Femandes Pinto da LUZ
Maira RIBEIRO
Rita SCHEEL
Kátia Ferraz VICENTINI

A metodologia detalhada a seguir foi defi- As pesquisas serão realizadas preferencial-


nida pelos autores durante reuniões organizadas mente em locais onde a vegetação foi nada ou
em Belo Horizonte por ocasião do 3 f? Congres- pouco perturbada pela ação do homem e para os
so da Associação Brasileira de Estudos do Qua- quais existam dados meteorológicos e fitossocio-
temário (ABEQUA) em 1991. Consiste na lógicos. Esses últimos podem ser levantados no
padronização dos métodos de coleta e dos trata- momento das coletas palinológicas.
mentos físico-quúnicos a serem aplicados na pre- Os sedimentos quatemários são geralmente
paração das amostras destinadas a estudos em
obtidos por meio de testemunhos retirados de tur-
Palinologia. É recomendada para estudos pali-
feiras, lagoas, lagos ou veredas, ou seja, emam-
nológicos relacionados com o Quatemário e de-
bientes atualmente abertos. Será, portanto,
verá ser utilizada sempre que for possível, com necessário analisar também os sedimentos de su-
a finalidade de permitir uma comparação entre
perfície dessas formações, a fim de poder ava-
os trabalhos dos diversos autores e a utilização
liar a representatividade dos espectros polínicos
dos dados publicados pela comunidade científica.
em relação à vegetação local e/ou regional; tam-
Caso as condições de conservação ou a na- bém, no caso dos lagos, essas análises servirão
tureza do material não permitirem o uso desta para avaliar as variações dos níveis lacustres.
metodologia, o autor deverá descrever detalha-
damente o seu procedimento. A amostragem dos sedimentos de superfí-
cie será efetuada da seguinte forma:
1 AMOSTRAGEM
1.1.1 Estudos não-relacionados com levantamen-
1. 1 Sedimentos de superfície tos fitos sociológicos
Os estudos palinológicos de sedimentos qua- As amostras serão retiradas nos dois centí-
temários têm como principal finalidade avaliar metros superiores do solo, debaixo da serrapi-
os climas do passado através da reconstituição lheira (quando esta existir), ao longo de transects
da cobertura vegetal e de sua evolução no tempo. estabelecidos em função do local de estudo e in-
Um dos alvos importantes recomendados pe- cluindo os diversos tipos de vegetação da região.
lo PIOB (Programa Internacional Geosfera Bios- No caso de vegetação aberta (savanas, cam-
fera) é a avaliação das biomassas vegetais em pos rupestres etc.) as amostras serão coletadas
cada época. Para chegar a essa avaliação é in- de preferência em locais onde exista uma pre-
dispensável conhecer as relações existentes en- servação melhor do pólen, por exemplo peque-
tre o conjunto esporopolínico depositado em um nas depressões, nas quais a água tende a
determinado local e o(s) tipo(s) de vegetação en- acumular-se.
contrado(s) no mesmo ou em seus arredores, tan-
to qualitativa como quantitativamente. Isso 1.1.2 Estudos relacionados com levantamentos
deverá ser feito a partir da coleta de amostras
fitossociológicos
de sedimentos de superfície, debaixo da cober-
tura vegetal, em todos os tipos de associações Vinte amostras, repartidas de maneira alea-
ocorrentes na área em estudo. tória em cada parcela do levantamento fitosso-

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ciológico, serão retiradas nos dois centímetros Havendo um número suficiente de datações,
superiores do solo debaixo da serrapilheira antes de iniciar os estudos palinológicos, a ma-
(quando esta existir). Essas amostras serão mis- lha de amostragem será estabelecida de tal ma-
turadas, constituindo uma única, que represen- neira que seja mantido um intervalo de tempo
tará o tipo de vegetação em questão. constante (VINCENS, 1992).
O procedimento será o mesmo em vegeta- A superfície, o volume e o peso de cada
ções abertas, procurando-se os locais mais fa- amostra serão medidos para o cálculo dos flu-
voráveis para a conservação do pólen. xos polínicos (concentração, input e influxo).

1.1.3 Amostras de sedimentos lacustres 2 PREPARAÇÃO DAS AMOSTRAS


As amostras lacustres poderão ser coletadas Todas as amostras de superfície e quaterná-
com um testemunhador do tipo "Mondsee", ao rias serão tratadas pela mesma metodologia pa-
longo de transects, de uma margem a outra do ra evitar distorções entre os espectros polínicos
lago. Um desses deverá ser orientado paralela- e permitir a comparação dos dados atuais e fós-
mente à direção dos ventos dominantes, de tal seis, bem como dos resultados de diferentes
modo que se possa levar em conta o transporte autores.
do pólen flutuante na superfície e que tende a se A preparação das amostras será feita de mo-
acumular na beira do lago oposta à direção do do a poder avaliar a freqüência relativa e abso-
vento. O número de amostras será definido em
luta dos palinomorfos, seja por mensurações de
função da extensão do lago. As amostras serão volumes (COUR, 1974) ou por introdução de es-
tomadas fora das embocaduras e desembocadu-
poros ou pólen exótico (STOCKMARR, 1971;
ras de rios e, quando for o caso, na proximida- SALGADO-LABOURIAU & RULL, 1986).
de dos pontos de testemunhagem de sedimentos Deve-se procurar usar sempre o mesmo volume
quaternários. Serão retiradas no primeiro ou nos ou peso úmido de sedimento em um perfil.
dois centímetros superiores do sedimento la-
custre.
2.1 Roteiro para tratamento químico:
- Introdução do pólen exótico;
1.2 Sedimentos quaternários - HCl a 10% se o sedimento for carbonatado
Em todos os casos, perfis ou testemunhos, e se forem utilizadas pílulas de Lycopodium;
devem-se reservar amostras para outros fins, tais - Lavagem com água destilada;
como análises sedimentológicas, isotópicas, geo- - KOH a 10% em fervura durante 5 min;
químicas e de outros microfósseis (ostracódios, - Peneiramento com malha de 200 a 250JLm e
diatomáceas etc.). guarda do resíduo para o estudo de macror-
As amostras destinadas a análises isotópi- restos vegetais;
cas de carbono serão secadas o mais rápido pos- - Lavagem com água destilada;
- Ácido acético concentrado (duas vezes);
sível depois de serem separadas, para evitar o
desenvolvimento de fungos. A temperatura de - Acetólise em fervura durante 4 min;
secagem não deverá ultrapassar 400C. - Lavagem com água destilada;
- HF a 40% durante uma noite. Pode-se subs-
As amostras de superfície ou de testemunhos tituir ou complementar o uso do HF pela se-
destinadas à análise palinológica serão guarda- paração por densidade com cloreto de zinco
das úmidas em câmara fria, dentro de sacos plás- ou bromofórmio (D=2) se a amostra estiver
ticos hermeticamente fechados. Algumas gotas muito pobre em palinomorfos ou se perma-
de solução de fenol a 1% podem ser adiciona- necerem muitos resíduos minerais;
das à amostra para evitar a contaminação por - Lavagem com água destilada;
fungos modernos. - HCl a 10% em fervura durante 15 mino Re-
A distância vertical entre as amostras de per- petir a operação até o líquido ficar limpo;
fis ou de testemunhos, destinadas a análises pa- - Lavagem com água destilada;
linológicas, será no máximo de dez centímetros, - Montagem das lâminas.
procurando-se manter constante esse intervalo.
Observação: toda lavagem e eliminação de subs-
Essa distância poderá ser reduzida em casos es-
tâncias químicas será feita através de centri-
peciais de mudanças litológicas ou do conjunto
fugação.
("assemblage") palinológico. Cada amostra te-
rá de preferência uma espessura (profundidade 3 CONTAGEM
estratigráfica) de um centímetro, mas poderá ser
ampliada para dois centímetros quando o sedi- Será sempre efetuada em um mínimo de três
mento for muito pobre em palinomorfos. lâminas.

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A contagem dos palinomorfos será efetua- A soma polínica constará de todos os grãos
da até chegar à saturação. A curva de saturação, de pólen ou somente dos elementos regionais que
que define a relação entre o número de grãos permitirão chegar às interpretações climáticas,
contados e o número de novos taxa encontrados, quando for possível diferenciá-los. Os elemen-
será estabelecida para cada amostra em função tos locais indicadores de ambientes úmidos se-
dos elementos que entram no cálculo da soma rão considerados à parte e definidos por cada
polínica. Caso um tipo de pólen apresente uma pesquisador em função do conhecimento que ele
percentagem muito elevada, será eliminado da tem de sua área de trabalho e da possibilidade
soma para a construção da curva. de determinar com exatidão esses taxa. A per-
centagem de cada um dos elementos locais será
4 APRESENTAÇÃO DOS DIAGRAMAS calculada em função da soma polínica.
4.1 Freqüência absoluta Para permitir a comparação entre os diagra-
mas de diversos autores, o número total de grãos
As freqüências absolutas serão calculadas de pólen, componentes da soma polínica, será
em relação à unidade de volume de sedimento indicado para cada nível analisado, em uma co-
ou, na sua falta, em relação à unidade de peso luna colocada à direita do diagrama.
seco.
O diagrama apresentará também a coluna li-
Cada diagrama apresentará, à esquerda, a tológica à esquerda, junto com os resultados de
coluna litológica juntamente com os resultados datações por C14.
das datações por C14 e, a seguir, a curva de ca-
Além desses diagramas de freqüências ab-
da palinomorfo.
solutas e relativas, os autores poderão apresen-
4.2 Freqüência relativa tar outros diagramas percentuais, baseados em
características especiais, para atender a diversas
As percentagens serão calculadas sobre a so- interpretações, tais como a avaliação da batime-
ma polínica. tria dos lagos, a evolução de uma turfeira etc.

5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COUR, P. 1974. Nouvelles techniques de détec- len for palaeoecological analysis of sedi-
tion des flux et des retombées polliniques: ments. Rev. PaI. PaI., 47: 97-103.
étude de Ia sédimentation des pollens et des STOCKMARR, J. 1971. Tablets with spores
spores à Ia surface du sol. Pollen et Spores, used in absolute pollen analysis. Pollen et
16: 103-142. Spores, 13(14): 615-621.
SALGADO-LABOURIAU, M.L. & RULL, V. VINCENS, A. 1992. Compte rendu de Ia réu-
1986. A method of introducing exotic pol- nion ECOFIT du 23 Janvier 1992. (Inédito).

Endereço dos autores:


- Jean-Pierre Ybert, Ortrud Monika Barth, Márcia Aguiar de Barros, Sérgio Augusto de Miranda Chaves, Cynthia Fer-
nandes Pinto da Luz, Rita Scheel- Laboratório de Palinologia, Departamento de Botânica, m, CCS, UFRJ, 21.949-900,
Ilha do Fundão - Rio de Janeiro, Brasil.
- Maria Léa Salgado-Labouriau, Maira Ribeiro e Kátia Ferraz Vicentini - Laboratório de Geologia Geral, Instituto de
Geociências, 70.910, UnH, Brasília, Brasil.
- Maria Luísa Lorscheiner - Departamento de Botânica, UFRGS, 90.040, Porto Alegre - RS, Brasil.

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