Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
ECONOMIA BRASILEIRA
Uma Introdução Crítica
Editora 34 Ltda.
R. Hungria, 592 Jardim Europa CEP 01455-000
São Paulo - SP Brasil Tel/Fax (011) 816-6777
Inclui bibliografia.
ISBN 85-7326-083-1
CDD - 330.981
* Ver, a respeito, Bresser Pereira (1970, 1973, 1977, 1982). No primeiro artigo cita-
do, analiso a retomada do desenvolvimento a partir de um processo de concentracão de ren-
da da classe média para cima; no segundo, defino em termos gerais o “novo modelo”; é só
no terceiro que proponho a expressão “subdesenvolvimento industrializado”.
** Guilhermo O’Donnell (1973) fará de forma brilhante a análise dessa aliança polí-
tica, que ele denominou de “pacto burocrático-autoritário”, em vez de “pacto tecnobu-
rocrático-capitalista”.
NOTAS
sileiro foram Celso Furtado (1959a, 1961, 1962, 1964, 1966), Ignácio Rangel (1957, 1962,
1978, 1981) e Fernando Henrique Cardoso (1972).
NOTAS
1 Realizei uma ampla análise das interpretações econômicas e políticas sobre o Brasil
em “Interpretações sobre o Brasil” (Bresser Pereira, 1997a), onde estão analisadas duas in-
terpretações anteriores à crise do início dos anos 60 e ao golpe militar de 1964, quatro do
período entre 1964 e a grande crise dos anos 80, e três contemporâneas. As duas primeiras
interpretações estão essencialmente preocupadas com as causas do subdesenvolvimento, a
interpretação da vocação agrária relacionada com a teoria da modernização, enquanto a in-
terpretação nacional-desenvolvimentista atribui o atraso econômico brasileiro principalmente
ao imperialismo.
2 Para uma crítica recente da interpretação imperialista do subdesenvolvimento brasi-
volvimento e crise no Brasil — 1930-1983 (Bresser Pereira, 1984). A grande crise dos anos
80 e o desenvolvimento posterior foram por mim analisados principalmente em Crise eco-
nômica e reforma do Estado no Brasil (1996). Os dois livros complementam-se, portanto,
no plano histórico.
1 Caio Prado Jr., que em dois livros clássicos (1942 e 1945) analisou o caráter mer-
NOTAS
1 João Manoel Cardoso de Mello, na linha das idéias propostas por Caio Prado Jr. em
dos direitos republicanos”. Existe uma ampla literatura conservadora, mas muito importante,
sobre o problema, utilizando o conceito de “rent-seeking” — a captura do patrimônio pú-
blico através da busca de rendas extra-mercado utilizando-se do poder do Estado. Seus au-
tores, liderados por James Buchanan em Mancur Olson, pertencem à “escola da escolha
racional”.
NOTA
A produção industrial (setor secundário), por sua vez, crescia mais ra-
∆I > ∆A (2)
I A
NOTAS
1 Esta análise encontra-se no livro clássico de Celso Furtado (1959a), Formação econô-
mica do Brasil, que até hoje é a mais importante análise histórica da economia brasileira. Entre
para os países produtores de bens primários foi proposta originalmente por Raul Prebisch
(1949), e serviu de base para todo o pensamento latino-americano a favor do apoio do Esta-
do à industrialização. Este texto foi originalmente escrito em espanhol, mas acabou sendo
primeiro publicado em português, em Revista Brasileira de Economia, devido à intervenção
pessoal de Celso Furtado.
2 Cardoso e Faletto (1969). A mudança do comportamento das empresas multinacio-
nais, que, a partir dos anos 50, passam a investir na indústria, em vez de se limitarem ao setor
primário e aos serviços de utilidade pública, foi inicialmente assinalada por Hélio Jaguaribe
(1958). Em um trabalho de 1963 sobre os empresários industriais, eu também assinalava esse
fato novo para demonstrar que o pacto político unindo a burguesia industrial às esquerdas
contra o imperialismo havia perdido sentido (Bresser Pereira, 1963). Este trabalho consti-
tuiu a base do Capítulo IV de Desenvolvimento e crise no Brasil — 1930-1967 (Bresser Pe-
reira, 1968). Foram, entretanto, Cardoso e Faletto que tiraram todas as conseqüências desse
fato novo.
Y=W+R
Y=D+O+G
NOTA
NOTAS
dos. Ver ainda Antônio Barros de Castro (1969), Tavares e Serra (1971), Paul Singer (1972,
1976), Bonelli e Malan (1976). Aníbal Pinto, economista chileno, teve influências importantes
sobre o pensamento econômico brasileiro nos anos 70. Ver especialmente seu trabalho fun-
damental sobre a heterogeneidade estrutural da economia latino-americana (Pinto, 1970) e
seus trabalhos sobre inflação estrutural (Pinto, 1978).
O Brasil não foi capaz de criar aqui uma sociedade mais justa, mas sem
dúvida criou uma sociedade mais capitalista e mais desenvolvida. Até 1930,
o Brasil era um país agrícola. Entre 1930 e 1960, industrializou-se via subs-
tituição de importações. Depois de 1960, desenvolveu um parque industrial
poderoso, integrado e tecnologicamente sofisticado. Taxas de crescimento em
torno de 7% ao ano permitiram um grande aumento na produção por habi-
tante, embora a taxa de crescimento da população também fosse excessiva-
mente grande.
É importante, entretanto, assinalar que, enquanto a taxa de crescimen-
to da produção se mantinha aproximadamente naqueles níveis, a taxa de cres-
cimento da população reduzia-se devido principalmente à diminuição da taxa
de natalidade. De fato, a taxa de crescimento anual da população caiu de
2,99% nos anos 50 e 2,89% nos anos 40 para 2,49% nos anos 70. Esta re-
dução foi possível porque a taxa de natalidade, que era de 43,2 por mil nos
anos 50, caiu para 33,0 por mil nos anos 60, enquanto a taxa de mortalida-
de caía menos acentuadamente de 14,2 por mil para 8,1 por mil. A diferença
entre essas duas taxas resulta no aumento da população. A diminuição da
natalidade deveu-se principalmente ao processo de urbanização, já que as
famílias urbanas tendem a ter menos filhos. Em 1940, apenas 37,2% da po-
pulação brasileira era urbana, enquanto em 1980 essa porcentagem já alcan-
1872 9.930 – – –
1890 14.334 2,01 – –
1900 17.438 1,98 – –
1920 30.636 2,88 – –
1940 41.165 1,49 – –
1950 51.942 2,39 44,4 20,9
1960 70.070 2,99 43,2 14,2
1970 93.139 2,89 38,7 9,8
1980 119.099 2,49 33,0 8,1
Fonte: IBGE
Obs.: As taxas referem-se aos intervalos entre as datas dos censos.
Yy = R + O + W
Yp = J + V + B
Yd = I + Cv + Cb
T=B
M=J+V
B = W = Cb
V + J = O + R = Cv + I
Gráfico I
Vemos por esse gráfico que, à medida que cresce a produtividade, a taxa
de salários permanece constante. O volume de salários e o volume de bens
de consumo dos trabalhadores cresce na proporção em que cresce a popula-
ção e, portanto, o emprego. Por outro lado, todo o aumento de produtivida-
de transforma-se em excedente apropriado por capitalistas e tecnoburocratas
na forma de lucros e ordenados, utilizados, principalmente, no consumo de
bens de luxo e, secundariamente, em investimentos.
Este processo dinâmico de concentração de renda pode ocorrer dentro
de um relativo equilíbrio entre oferta e procura agregadas porque a elevação
dos ordenados e dos lucros corresponde ao aumento da produção de bens
de consumo de luxo realizada pelo Departamento III e porque os bens de
salário que excedem o consumo “necessário” dos trabalhadores podem ser
exportados. Esse equilíbrio perverso será possível à medida que os trabalha-
reajustado em maio de 1981 no Brasil, aparecem as duas cotações. Apesar de um aumento de 46,2%, a
posição relativa do Brasil não se altera.
NOTAS
1 Para uma discussão teórica sobre as relações entre salários, ordenados e lucros no
processo de desenvolvimento capitalista, ver Lucro, acumulação e crise (Bresser Pereira, 1986).
2 Há um grande número de trabalhos e pesquisas sobre a concentração de renda no
Brasil. Ver os livros organizados sobre o assunto, particularmente Pinto (1967), Tolipan e
Tinelli (orgs.) (1975), Camargo e Giambiagi (orgs.) (1991) e o número 20(3) de Pesquisa e
Planejamento Econômico. Ver também Hoffman (1972), Fishlow (1975), Fiszbein e Ramos
(1993), Barros e Mendonça (1993) e Lauro Ramos (1993).
3 Ramos (1993:71).
NOTAS
NOTAS
economia, na medida em que o custo do álcool sempre foi menor do que o da gasolina. So-
bre o grande equívoco de política econômica que constituiu o Proálcool, ver Mello e Fonse-
ca (1981), Mello e Pelin (1984), Barzelay (1986), Borges, Freitag, Hurtienne e Nitsch (1988).
O trabalho clássico sobre a agro-indústria canavieira é de Tamás Szmerecsányi (1979).
4 Ver “A destruição da taxa de lucro e da renda da terra na agricultura”, em que Nakano
1 A literatura brasileira sobre política industrial e tecnológica é muito extensa. Foi espe-
cialmente importante nos anos 70. Ver, entre outros, Figueiredo (1972), Erber, Araújo Jú-
nior et al. (1974), Bonelli (1976, 1996), Rattner (1988), Araújo Júnior (1992), Coutinho e
Ferraz (orgs.) (1994), Suzigan (1996), Suzigan e Villela (1997), Tauile (1988, 1997), Erber
e Cassiolato (1997).
M—M
M—D—M
Nesse caso, também as crises gerais são pouco prováveis porque o di-
nheiro é exclusivamente um meio de troca. É uma mercadoria como as ou-
tras que, por seu valor universal e divisibilidade (o ouro, especialmente), e
útil como meio de troca.
Nos dois casos anteriores, o objetivo de quem troca é o valor de uso da
mercadoria que pretende adquirir. As mercadorias são trocadas de acordo
com a quantidade de trabalho nelas incorporada e ninguém realiza lucro.
Apenas os dois saem ganhando porque a divisão do trabalho (que é a base
das trocas) permitiu que cada um se especializasse e produzisse de forma mais
eficiente (com menor custo ou, o que vem dar no mesmo, com menor quan-
tidade de trabalho) a sua própria mercadoria.
D — M — D’
S = Yd - C + Gc
Y = C + Gc + I + Gi
S = I + Gi
I=R
Uma causa clássica das crises econômicas que não ocorreu no Brasil foi
o estrangulamento dos lucros causado pela elevação dos salários no auge do
ciclo econômico (1961 e 1973). Para que isso ocorresse, seria necessário sin-
dicatos muito mais poderosos do que os de que dispomos. A taxa de lucro
vem caindo no Brasil desde 1974, mas não devido à elevação dos salários e
sim à queda dos investimentos. Por outro lado, a relação inversa também é
verdadeira: caindo a taxa de lucro, cai a taxa de investimentos privados. Esse
fenômeno pode ser observado no Quadro XIV. A taxa de acumulação de
capital cai menos acentuadamente do que a taxa de lucros porque as empre-
NOTA
1 Sobre o “milagre”, ver especialmente Paul Singer (1973, 1976) e Bacha (1976).
Saldo
Ano Exportações Importações Saldo (ou déficit) Dívida Dívida/
(US$ milhões) (US$ milhões) (ou déficit em transações externa exportações
comercial correntes líquida
É fácil também entender por que é correto afirmar que o Brasil, confor-
me mostra o Quadro XV, endividou-se de maneira explosiva nos anos 70 e
na primeira metade dos anos 80, tornando a relação dívida líquida/exporta-
ções cada vez maior (dívida líquida é igual à dívida externa total menos as
reservas em ouro e moeda estrangeira). Nos anos 70, o endividamento deri-
vou de uma política deliberada do governo; na primeira metade dos anos 80,
da elevação brutal dos juros internacionais. Em qualquer hipótese, todo esse
endividamento, que megulhava o país na crise fiscal, serviu em grande parte
para comprar coisas inúteis aos trabalhadores. Importavam-se, sem dúvida,
matérias-primas e máquinas e não bens de luxo, mas esses insumos eram em
seguida utilizados para a produção daqueles bens de luxo para consumo da
burguesia e da média e alta tecnoburocracia.
A relação dívida externa líquida/exportações é um indicador da capaci-
dade de pagamento das dívidas de um país. O índice 2 é freqüentemente con-
siderado um limite. Desde 1977, esse limite foi ultrapassado, revelando o sério
problema representado pelo endividamento externo brasileiro. A única for-
ma de voltarmos a melhorar essa relação é obtermos saldos em nossa balan-
ça comercial.
NOTA
1 Nos anos 90, torna-se dramático o problema causado por elevadas taxas de juros,
usadas como política de estabilização pelo governo, dadas as dificuldades em se fazer uma
política fiscal de corte de gastos. Em muitos casos, o único instrumento que resta ao Minis-
tério da Fazenda e ao Banco Central para manter o equilíbrio da moeda e do balanço de
pagamentos é a taxa de juros.
1986 65,0
1987 415,8
1988 1.037,6
1989 1.782,9
1990 1.476,6
1991 480,2
1992 1.157,8
1993 2.708,2
1994 1.093,9
1995 14,8
1996 9,3
Fonte: FGV/RJ.
V = Yp
M
MV = Yp
1 Esta distinção entre fatores aceleradores e mantenedores está presente no básico so-
Sobre a inflação inercial a partir dos anos 70 e só debelada pelo Plano Real em 1994, ver
principalmente Arida (1983), Lara Resende (1984, 1985, 1988), Lara Resende e Arida (1984),
Bresser Pereira e Nakano (1983, 1984a, 1984b), Nakano (1989), Silva (1983), Bacha (1988),
Lopes (1984a, 1984b, 1986) e Modiano (1985, 1988), Holanda Barbosa (1987), Cardoso
(1988, 1991). O trabalho pioneiro sobre o assunto é de Simonsen (1970). O melhor livro
recente sobre inflação brasileira, reunindo, entre outros, artigos de Bonomo, Cisne, Holanda
Barbosa, Nakano, Toledo e Werlang, foi organizado por Rosa Maria Oliveira Fontes (1993).
Ver também os trabalhos recentes de Simonsen (1995), Oliveira Lima (1996) e Pastore (1997).
NOTA
1Estas foram esperiências de populismo econômico, que pode ser praticado tanto por
governos de esquerda quanto de direita, quando estes decidem ignorar as limitações econô-
micas e gastar mais do que o Estado pode financiar com segurança.
NOTA
Anos % Anos %
1 Trabalhos pioneiros sobre a crise financeira e fiscal do Estado foram escritas por
Rogério F. Werneck nos anos 80 e depois reunidas em livro (1987). O primeiro trabalho é
de 1983. Eu venho analisando a crise fiscal desde 1987 (Bresser Pereira, 1987, 1990). No
primeiro, analiso a crise do Estado a partir da mudança no padrão de financiamento dos
investimentos. No segundo, formulo a interpretação da crise fiscal do estado como uma alter-
nativa, de um lado, à teoria da dependência, que a Grande Crise dos anos 80 tornara superada,
e, de outro, ao “consenso de Washington”, através do qual se expressou a interpretação
neoliberal. Completei essa análise em Bresser Pereira (1993 e 1996a). Ver também os traba-
lhos importantes de Fábio Giambiagi (1991, 1997), Mônica Baer (1993), Lídia Goldenstein
(1994) e Otaviano Canuto (1994).
NOTAS
1 Analisei esta crise como sendo essencialmente uma crise do Estado em uma série de
trabalhos, depois reunidos no livro A crise do Estado (1992). Meu primeiro trabalho sobre
o assunto data de 1987 (“Mudanças no padrão de financiamento do investimento no Brasil”).
2 Nos anos 80 e início dos anos 90, produziu-se uma enorme literatura sobre a dívida
externa. Destaco aqui Batista Jr. (1983, 1987, 1988), Arida, org. (1982), Bresser Pereira, org.
(1989), Cardoso e Fishlow (1988), Carneiro e Werneck (1990) e Baer (1993). Sobre minha
experiência pessoal na negociação da dívida, antecipando o Plano Brady, ver Bresser Pereira
(1995).
Entre 1979 e 1994, a inflação foi o sintoma mais agudo da crise enfren-
tada pela economia brasileira. Essa inflação resistiu a inúmeros plano de estabi-
lização: desde planos ortodoxos, que pretenderam reduzir a inflação por meio
do controle estrito da emissão de moeda, até planos heterodoxos, que lança-
ram mão de mecanismos não convencionais de estabilização, como o congela-
mento de preços. Nesse período, houve pelo menos doze planos de estabilização
fracassados no objetivo de conter a inflação, para, afinal, em 1994, com o Plano
Real, conseguir-se o controle da inflação. O Gráfico II exibe a enorme oscila-
ção da inflação entre 1986 e 1994, quando os planos de estabilização mais
expressivos foram adotados. A primeira queda, em 1986, foi a do Plano Cru-
zado; a segunda, em 1987, correspondeu ao Plano Bresser; a terceira, em 1989,
ao Plano Real; a quarta, em 1990, ao Plano Collor I; a quinta, em 1991, ao
Plano Collor II; finalmente, a sexta, em 1994, correspondeu ao Plano Real.
Os demais planos de estabilização não aparecem em termos gráficos porque
não lograram reduzir a taxa de inflação. Em certos casos, como foi o do Plano
Delfim I e Delfim III, a taxa de inflação, na verdade, dobrou depois do plano.
Gráfico II: Taxa de Inflação Mensal (IGP-DI), janeiro 1986 a junho 1995
Afinal, por que o Brasil foi incapaz de estabilizar a economia entre 1979
e 1994? Foi devido à falta de apoio político por parte da sociedade e dos
políticos para que se fizesse o ajuste fiscal necessário? Ou teria sido a falta
de competência técnica dos economistas brasileiros, que não entenderam e
não tomaram as medidas corretas para conter uma inflação crônica do tipo
inercial como a brasileira? Cada uma desses questões corresponde a uma teoria
para explicar o fracasso da estabilização. A explicação convencional afirma
que os planos de estabilização fracassaram porque as equipes de economis-
tas que se encarregaram dos planos de estabilização não contaram com apoio
político suficiente para os programas de estabilização (hipótese política). A
explicação alternativa é a de que essas mesmas equipes demonstraram inca-
pacidade em lidar com a inflação inercial (hipótese de ineficiência ou incom-
petência dos economistas).
Na verdade, essas hipóteses são complementares. Quando o fracasso em
estabilizar é recorrente, não se pode afastar a hipótese de incompetência das
equipes econômicas, e de que as políticas de estabilização por elas adotadas
não foram as mais adequadas para resolver os problemas a que se propunham,
ou que forma ineficientes, isto é, os seus custos foram muito elevados. Por
outro lado, dada a crise fiscal do Estado, a falta de ajuste fiscal indica que
não houve apoio político suficiente para estabilização, que a sociedade de-
monstra uma certa acomodação em relação à inflação. Em outras palavras,
isso indica que a hipótese política também faz sentido.
De fato, em cada um dos planos, essas hipóteses foram mais ou menos
relevantes para explicar os seus insucessos. Nos planos de estabilização du-
rante o Governo Sarney (1985-1989), houve uma clara falta de apoio políti-
NOTA
1
Sobre o fracasso dos planos de estabilização, ver Bresser Pereira (1996a). Ver tam-
bém Lopes (1989).
Crise é sinal de que é necessário mudar. O Brasil não passou pela mais
grave crise econômica de sua história (1979-1994) sem ter sofrido grandes
transformações. Durante o período da crise, principalmente após 1987, quan-
do começou a se verificar que a crise estava relacionada com uma grave crise
fiscal do Estado, uma série de reformas estruturais passaram a ser realizadas.
As reformas econômicas, como a privatização, a abertura comercial, o
ajuste fiscal, implicaram em uma verdadeira embora incompleta reforma do
Estado. Foram orientadas para o mercado na medida em que tenderam a
valorizar o sistema de preços como instrumento de coordenação e de alocação
de recursos da economia. Foram reformas do Estado na medida em que re-
cuperavam suas finanças e mudavam sua forma de intervenção.
Estas reformas foram, de um lado, conseqüência da crise do Estado —
ou seja, da crise fiscal, da crise do modelo de substituição de importações, e
da crise da forma burocrática de administrar o Estado. De outro, foram o
resultado das grandes alterações no campo social, político e ideológico que
ocorreram simultânea e correlacionadamente. As transformações sociais es-
tiveram relacionadas com um enorme aumento da classe média e do univer-
so de pessoas que conseguiram completar um curso de nível superior. As
mudanças ideológicas e políticas foram marcadas pela crise do populismo e
do nacional-desenvolvimentismo, ou seja, de uma concepção segundo a qual
o desenvolvimento econômico deveria voltar-se primordialmente para o mer-
cado interno, basear-se no aumento da demanda agregada por meio de au-
mento dos salários (keynesianismo bastardo), e ser conduzido pelo Estado,
por meio de investimentos diretos e subsídios que não levavam em conside-
ração o déficit público, visto também como uma forma de estimular a deman-
da (novamente keynesianismo bastardo). Em seu lugar, surgiu com força o
neoliberalismo — o liberalismo econômico radical — defendendo a total re-
tirada do Estado da área econômica e social. Finalmente, uma mudança eco-
nômica fundamental foi a globalização da economia, ou seja, o aumento brutal
da competição internacional devido à redução dos custos dos transportes e
das comunicações. A globalização reduziu os monopólios internos e limitou
a capacidade dos estados nacionais de promover políticas econômicas e sociais.
Ajuste fiscal. Na segunda metade dos anos 80, após o colapso do Plano
Cruzado, o déficit público, que anteriormente costumava ser visto como algo
“bom”, passou a ser combatido por amplos setores da sociedade brasileira.
NOTAS
1 Este equívoco foi cometido por um dos melhores economistas brasileiros, Antônio
Barros de Castro, que publicou em 1985, com um assistente, A economia brasileira em mar-
cha forçada. Sua argumentação era tão convincente que a incorporei na segunda edição, de
1985, deste livro. O erro de Castro foi subestimar a crise fiscal, da qual eu logo em seguida
me daria conta.
2 Sobre minha experiência no Ministério da Fazenda, em um momento de crise aguda
sem precedentes em função do colapso do Plano Cruzado, ver Bresser Pereira (1992 e 1995).
3 Sobre a abertura comercial, ver Canuto (1994b), Moreira e Correia (1997), Nassuno
(1998).
4 Sobre a privatização no Brasil, ver Pinheiro (1996), Alves (1996) e Paula (1997).
5 Sobre a reforma administrativa de caráter gerencial em curso no Governo Fernando
NOTAS
Gesner de Oliveira (1996), João Paulo Reis Velloso (org.) (1994, 1996), Bresser Pereira
(1996a), Batista Jr. (1996).
1 Na verdade, o que se alcançou foi uma união aduaneira incompleta, já que diversas
exceções ainda foram mantidas. Para a história de como surgiu a idéia da desgravação auto-
mática e linear das tarifas, ver o relato de minha experiência no Ministério da Fazenda em
1987 (Bresser Pereira, 1992).
2 Sobre o caráter “anti” do nacionalismo, ver Lima Sobrinho (1963). Historiador e
jornalista, Barbosa Lima Sobrinho é até hoje, com mais de cem anos, o mais notável repre-
sentante do nacionalismo no Brasil.
3 Ver Bresser Pereira e Thorstensen (1992) e Thorstensen, Nakano, Faria Lima e Sato
(1994).
ABREU, Marcelo de Paiva, org. (1990) Ordem e progresso: cem anos de política econômica
republicana. Rio de Janeiro, Editora Campus.
ALMEIDA, Rômulo (1985) Nordeste: desenvolvimento social e industrialização. Rio de Janei-
ro, Paz e Terra.
ALVES DOS SANTOS, Antônio Carlos (1996) A economia política da privatização. São Paulo,
Fundação Getúlio Vargas, Tese de Doutorado, setembro 1996.
ANDRADE, Manuel Correia de (1963) A terra e o homem do Nordeste. São Paulo, Livraria
Editora Ciências Humanas, 1980, 4ª edição. Primeira edição, 1963.
ARAÚJO, José Tavares (1992) “Mudança tecnológica e competitividade das exportações bra-
sileiras de manufaturados”. Rio de Janeiro, UFRJ, Instituto de Economia Industrial.
ARIDA, Pérsio (1983) “Neutralizar a inflação, uma idéia promissora”. Economia e Perspec-
tiva (Conselho Regional de Economia de São Paulo), setembro 1993.
________, org. (1982) Dívida externa, recessão e ajuste estrutural. São Paulo, Editora Paz e
Terra.
________, org. (1986) Inflação zero: Brasil, Argentina, Israel. Rio de Janeiro, Editora Paz e
Terra. Trabalhos apresentados originalmente no seminário patrocinado pelo Institute
of International Economics, Washington, novembro 1984.
BACHA, Edmar L. (1973) “Sobre a Dinâmica de Crescimento da Economia Industrial Subde-
senvolvida”. Pesquisa e Planejamento Econômico 3(4) dezembro, 1973.
________ (1976) Os mitos de uma década. Rio de Janeiro, Editora Paz e Terra.
________. (1988) “Moeda, inércia e conflito: reflexões sobre as políticas de estabilização no
Brasil”. Pesquisa e Planejamento Econômico 18(1), abril 1988.
BACHA, Edmar L. e TAYLOR, Lance (1980) Models of Growth and Distribution for Brazil.
Washington, Banco Mundial.
BAER, Mônica (1993) O rumo perdido. São Paulo, Editora Paz e Terra.
BAER, Werner (1995) A economia brasileira. São Paulo, Editora Nobel.
BARAN, Paul e SWEEZY, Paul (1966) Capitalismo monopolista. Rio de Janeiro, Zahar Edito-
res, 1968. Publicado originalmente em inglês, 1966.
BARBOSA LIMA SOBRINHO, Alexandre (1963) Desde quando somos nacionalistas. Rio de Janeiro,
Editora Civilização Brasileira.
BARROS, José Roberto Mendonça de e GOLDENSTEIN, Lídia (1997) “Avaliação do processo de
reestruturação industrial brasileiro:”. Revista de Economia Política, 17(2), abril 1997.
BARROS, Ricardo Paes de e MENDONÇA, Rosane Silva Pinto de (1993) “A evolução do bem-
estar e da desigualdade no Brasil desde 1960”. In BARROS e MENDONÇA, orgs. (1993).
BARROS, Ricardo Paes de e MENDONÇA, Rosane Silva Pinto de, et al. (1993) Desenvolvimento
econômico, investimento, mercado de trabalho e distribuição de renda. Rio de Janei-
ro, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social — BNDES.
BARZELAY, Michael (1986) The Politicized Market Economy. Berkeley, University of California
Press.