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Superior Tribunal de Justiça

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1.249.740 - MS (2009/0223851-2)

RELATOR : MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO


AGRAVANTE : MUNICÍPIO DE CAMPO GRANDE
PROCURADOR : HENRIQUE A BRANDÃO RAMOS E OUTRO(S)
AGRAVADO : VALMEI ROQUE CALLEGARO
ADVOGADO : MÍRIAM CRISTINA DA SILVA LIMA
DECISÃO
Agravo de instrumento contra inadmissão de recurso especial interposto
pelo Município de Campo Grande, com fundamento no artigo 105, inciso III, alínea
"a", da Constituição Federal, contra acórdão da Quarta Turma Cível do Tribunal de
Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, assim ementado:
"APELAÇÃO CÍVEL. ARGUIÇÃO DE VIOLAÇÃO À
DIALETICIDADE. AFASTADA. MÉRITO. AÇÃO DE
INDENIZAÇÃO. ACIDENTE CAUSADO POR FALTA DE
SINALIZAÇÃO DO MUNICÍPIO. DEMONSTRAÇÃO DA OMISSÃO
ADMINISTRATIVA. DIREITO À REPARAÇÃO DOS DANOS
MATERIAIS E MORAIS. REFORMA DA SENTENÇA DE PRIMEIRO
GRAU. PROVIMENTO DO RECURSO QUE SE IMPÕE.
Merece rejeição a preliminar de naõ conhecimento do
recurso, sob a alegação de propalada infringência ao princípio da
dialeticidade, caso se mostrem presentes os fundamentos de fato e de
direito infringentes à sentença impugnada.
Comprovada a responsabilidade subjetiva por omissão
do Município, traduzida em provocação de acidente de trânsito
causado por falta de sinalização, é de rigor a recomposição material
e moral decorrente da abstenção lesiva.
Revela-se estapafúrdia a ilação do juiz sentenciante,
considerando que o motorista deveria parar em cada esquina, pouco
importando a ausência de sinalização ou o caráter preferencial da
via, conclusão distorcida e ilógica, cuja aplicação prática, além de
agredir o princípio da confiança, levaria a um verdadeiro caos no
trânsito, inadmissível na espécie.
São devidos os danos materiais correspondentes ao
valor do conserto do veículo do autor, conforme orçamento não
impugnado especificamente pelo Poder Público Municipal.
Os danos morais devem ser estabelecidos com base na
experiência e no bom senso do magistrado, mostrando-se
subserviente à realidade da vida e às peculiaridades do caso
concreto, observando o grau de culpa, a lesividade do ato e o nível
socioeconômico das parte, a fim de que não reste manifesta uma
afronta ao princípio da razoabilidade, considerado o seu caráter
compensatório, sem, contudo, visar ao enriquecimento sem causa da
vítima." (fl. 60).

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O recurso foi inadmitido ao entendimento de que se aplica, à espécie, o


óbice do enunciado nº 7 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.
Infirma o agravante os fundamentos da decisão, reiterando as razões
apresentadas em sede do recurso especial.
Tudo visto e examinado, decido.
Conheço do agravo, contudo, é de se manter o juízo de inadmissibilidade
do recurso especial.
A violação dos artigos 126, 128 e 333, inciso I, do Código de Processo
Civil, funda a insurgência recursal.
Eis a letra dos citados dispositivos:
Código de Processo Civil
"Art. 126. O juiz não se exime de sentenciar ou
despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da
lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá
à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito.
Art. 128. O juiz decidirá a lide nos limites em que foi
proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a
cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte
Art. 333 - O ônus da prova incumbe:
I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;
(...)"

E teriam sido violados, porque:


"(...)
Não se está afirmando a negativa de apreciação da
prova pelo Juízo que, ao cumprir o dever de dizer o direito ao caso
concreto, pode dar mais valor a uma ou outra prova.
Mas sim que, no caso, diferentemente do que propugna
no decisório ora hostilizado, inexistem provas conclusivas da culpa
municipal enquanto sobejam provas documentais pela manutenção
das razões que em sentença primária concluíram pela culpa exclusiva
do autor/recorrido reconhecendo a inexistência de responsabilidade
municipal.
Era necessário ficar evidente pelas provas a
pertinência das razões pugnadas no decisório. Entretanto, os
argumentos de apelação não sustentam a tese acolhida pelo Tribunal
a quo.
Ao contrário, as provas existentes em autos dão conta
da efetiva culpa do apelante.
(...)" (fls. 27/28).

E para a certeza das coisas, é esta a letra do acórdão impugnado:


"(...)
Documento: 7342119 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJ: 01/12/2009 Página 2 de 5
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Nada obstante a independência entre as esferas penal
e cível, conforme as provas emprestadas já obtidas em procedimento
criminal que culminou na absolvição do réu, há exaustiva prova
testemunhal e fotográfica comprovando que a omissão do Poder
Público em sinalizar o indigitado cruzamento citado alhures,
constitui o motivo precípuo do acidente em questão.
Nesse sentido os bem lançados fundamentos
prolatados pelo Desembargador Paschoal, à época juiz da 3ª Vara
Criminal, na sentença absolutória referente ao mesmo incidente (...)
Como se percebe, as fotos do local e o depoimento do
próprio irmão da vítima fatal apontam claramente para a absoluta
impossibilidade de um homem médio de inferir que o cruzamento
exigia parada. Ao revés, a desídia do Poder Municipal levaria
qualquer um na mesma situação a pressupor tratar-se de
preferencial, autorizando a continuação em velocidade regular na
pista.
Bem por isso, revela-se totalmente estapafúrdia a
ilação do juiz sentenciante, considerando que o motorista deveria
parar em cada esquina, pouco importando a ausência de sinalização
ou o caráter preferencial da via, conclusão distorcida e ilógica, cuja
aplicação prática, além de agredir o princípio da confiança, levaria a
um verdadeiro caos no trânsito, inadmissível na espécie.
Assim, comprovada a responsabilidade subjetiva por
omissão do Município, traduzida na ilicitude de não ter feito nada
para impedir o dano, prestando serviço insuficiente em patamar
inferior ao padrão legal exígel para o caso (...) é de rigor a
recomposição decorrente da abstenção lesiva.
(...)" (fls. 15/16).

Pela simples leitura do acórdão a quo, verifica-se que o Tribunal de


origem, com base nos elementos probatórios dos autos, reconhece presente a
existência do dano, do nexo causal e a responsabilidade do recorrente, encontrando-se,
ainda, devido e bem fixado o valor da condenação em danos materiais e morais, em
decisão fundamentada e apoiada na razoabilidade de sua jurisprudência. Logo, a
insurgência especial, tal como posta, requisita necessário exame dos aspectos
fáctico-probatórios, hipótese que é vedada em sede de recurso especial, a teor do
enunciado nº 7 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça:
"A pretensão de simples reexame de prova não enseja
recurso especial."

A propósito:
"PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO.
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO DE
INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS.
COMPLICAÇÕES DO PARTO. CONSEQÜÊNCIAS IRREVERSÍVEIS
PARA A CRIANÇA. AFERIÇÃO DO FATO DANOSO E DO NEXO
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CAUSAL. ART. 333, I, DO CPC. SÚMULA 07/STJ. REEXAME DE
MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. ACÓRDÃO FUNDADO EM
ANÁLISE DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA DO
STF. ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
(...)
4. In casu, restou assentado no acórdão proferido pelo
Tribunal a quo, verbis: 'A autarquia previdenciária, ora Apelante
principal, detém a responsabilidade objetiva, nos termos do art. 37, §
6º da CF, consistente na obrigação de indenizar terceiro em razão de
procedimento lícito ou ilícito de agente seu, bastando para tanto a
mera relação causal entre o comportamento e o dano sofrido, salvo
se comprovada a responsabilidade exclusiva da vítima'
5. A análise da existência do fato danoso, e o
necessário nexo causal entre a suposta conduta comissiva e os
prejuízos decorrentes da mesma implica em análise
fático-probatória, razão pela qual descabe a esta Corte Superior
referida apreciação em sede de recurso especial, porquanto é-lhe
vedado atuar como Tribunal de Apelação reiterada ou Terceira
Instância revisora, ante a ratio essendi da Súmula n.º 07/STJ,
verbis: 'A pretensão de simples reexame de prova não enseja
Recurso Especial'
6. Precedentes: AgRg no REsp 723893/RS DJ
28.11.2005; AgRg no Ag 556897/RS DJ 09.05.2005; REsp
351764/RJ DJ 28.10.2002.
7. In casu, assentou o Tribunal a quo, verbis: '(...) Na
hipótese, restou demonstrada a relação de causalidade entre o evento
danoso e o comportamento do agente público causador do dano,
ensejando, pois, a responsabilidade objetiva da autarquia
previdenciária, juntamente com o correspondente dever de indenizar,
sem que se possa falar em culpa da vítima pela ocorrência do fato.
Os relatórios juntados com a inicial demonstram que o menor, ao
nascer, sofreu danos físicos e seqüelas advindas da atuação dos
prepostos da Ré. Assim, provado o nexo de causalidade entre o dano
ocorrido e a prestação do serviço público, a procedência do pedido
indenizatório é medida que se impõe, devendo a autarquia/Apelante
arcar com a responsabilidade por ato de seu agente.'
8. A conclusão do Tribunal de origem, in casu, restou
fundada no conjunto probatório carreado nos autos, afirmando a
existência de relação entre o prejuízo experimentado pelo particular
e o ato omissivo ou comissivo da pessoa jurídica de direito público.
Consectariamente, analisar a existência de ofensa ao art. 333, inc. I,
do Código de Processo Civil implicaria o revolvimento de matéria
fática-probatória, o que é interditado a esta Corte Superior.
9. Recurso especial não conhecido." (REsp
1106829/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA,
julgado em 19/05/2009, DJe 29/06/2009 - nossos os grifos).

"CIVIL. INDENIZAÇÃO. TRÂNSITO. ACIDENTE.


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MORTE. DANOS MATERIAIS E MORAIS. PRESSUPOSTOS
FÁTICOS. SÚMULA 7/STJ. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA.
QUANTUM INDENIZATÓRIO. RAZOABILIDADE.
PENSÃO MENSAL. REDUÇÃO.
1 - Não há se falar em violação ao art. 535 do CPC,
porquanto as questões submetidas ao Tribunal de origem foram
suficiente e adequadamente delineadas, com abordagem integral do
tema e fundamentação compatível.
2 - Aferir a existência de provas suficientes para
embasar condenação por danos morais demanda revolvimento do
material fático-probatório, soberanamente delineado pelas instâncias
ordinárias, esbarrando, pois, a pretensão recursal, no óbice da
súmula 7/STJ.
3 -Admite o STJ a redução do quantum indenizatório,
quando se mostrar desarrazoado, o que não sucede na espécie, em
que houve morte decorrente de acidente de trânsito, dado que as
Quarta e Terceira Turmas desta Corte têm fixado a indenização por
danos morais no valor equivalente a quinhentos salários mínimos,
conforme vários julgados.
4 - Pensionamento mensal devido às respectivas mães,
pela morte dos filhos em acidente causado por caminhão dirigido por
preposto dos recorrentes, em valores equivalentes a 2/3 dos
rendimentos das vítimas, até a data em que completariam 25 anos de
idade, reduzido, então, para 1/3 até a data em que atingiriam 65
anos. Precedentes desta Corte.
5 - Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta
parte, provido." (REsp 713.764/RS, Rel. Ministro FERNANDO
GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 04/03/2008,
DJe 10/03/2008).

Pelo exposto, nego provimento ao agravo.


Publique-se.
Intimem-se.
Brasília, 27 de novembro de 2009.

Ministro Hamilton Carvalhido , Relator

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