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Os Grandes Princípios Batistas PDF
Os Grandes Princípios Batistas PDF
Vimos um pouco da história dos batistas. Vimos também que, a rigor, não temos um
fundador da igreja batista, porque várias comunidades batistas começaram a pipocar na época do
surgimento da primeira igreja batista no mundo. Nossa origem histórica pode remontar ao pastor
John Smith e ao advogado Thomas Helwys, mas eles não criaram nossos princípios e nossas
doutrinas. Vimos, também, certa confusão dos primeiros batistas exatamente por causa de não
termos uma origem numa pessoa, mas ao redor de princípios. Os princípios já estavam lá e foram
entendidos por várias pessoas, em vários grupos. O que tornou difícil remontar a uma origem
proclamada num lugar, dia e mês, embora consideremos a igreja fundada na Holanda, em 1609,
como a primeira igreja batista. Mas sabemos que há diferenças de interpretações, o que mostra
não haver unanimidade, embora a maioria opte como optei.
Perguntemo-nos: o que direcionou os primeiros batistas? Por que eles surgiram? Vamos
examinar os pontos principais balizadores dos batistas. Eles são a linha por onde andaremos.
Examinado nosso passado histórico e nossa teologia, ouso apontar oito pontos principais, dentre
vários. São eles: a suficiência das Escrituras, a liberdade de opinião, o batismo consciente de
crentes, a segurança eterna dos salvos, as ordenanças (batismo e ceia), o sacerdócio universal
de todos os crentes, a igreja local com governo congregacional autônomo, a separação entre os
poderes civil e religioso.
Temos estas características desde o início de nossa história, no século XVII. Alguém dirá
que estes pontos são genéricos e me cobrará mais especificidade. Respondo que o ensino de
Jesus e a Bíblia são genéricos, a tal ponto que grupos como Testemunhas de Jeová e Mórmons
se dizem cristãos, embora, a rigor, não sejam. Pelo menos, o primeiro, definitivamente, não é, por
não crer na divindade de Jesus. Nós é que particularizamos e criamos minúcias. Algumas destas
minúcias são necessárias, mas outras são culturais e não podem ser vistas como princípios
teológicos universais dos batistas. Temos doutrinas que partilhamos com outros grupos, até
mesmo com a Igreja Católica, como o nascimento virginal de Jesus, sua perfeita humanidade e
sua perfeita divindade, sua morte e ressurreição, Mas estes princípios são nossas características
maiores e deles derivam algumas posturas doutrinárias. A observância ou não destes pontos é
responsável por erros que aparecem com roupagem diferente em nosso tempo. Eles se ampliam
em outros aspectos. Vamos considerá-los, portanto.
Seguimos o Sola Scriptura de Lutero. Ele rejeitou que a Tradição e o Magistério da Igreja
regessem a teologia da Igreja. Isto nos serve. Temos muito de tradição e de magistério como
formadores de nossa teologia. Por mais santo que seja um pastor, ele não pode ser a autoridade
final para a igreja, e se discordar da Bíblia, ele está errado. A Bíblia rege nossa doutrina e nossa
prática.
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Os batistas sempre nutriram profundo zelo pelas Escrituras. Quando ela fala, nós falamos.
Quando ela cala, nós calamos. Todo material que produzimos e toda postura eclesiológica devem
ser avaliados por ela. Não é se deu certo em algum lugar ou se está enchendo alguma igreja em
algum lugar, ou se foi proferida por algum teólogo ou pastor consagrado ou famoso, mas se é
bíblico. Todas as heresias nasceram de pessoas espirituais e zelosas, e não de pessoas
depravadas. Delas se pode dizer o que Paulo disse dos judeus: “têm zelo por Deus, mas não com
entendimento”. O entendimento correto das Escrituras é fundamental para uma denominação
sadia. E o fato de ela ser suficiente é básico.
Um jovem pastor de 24 anos, Roger Williams encarnou isso em sua vida. Ele começou seu
pastorado em Boston, em 1631. Logo desagradou as autoridades locais. Ele recusava o direito
dos magistrados em decretarem penalidades jurídicas por infrações religiosas. Williams achava
que igreja e Estado deviam ser absolutamente distintos, o que, aliás, os separatistas ingleses
defendiam. Ele não criou o princípio, mas levou-o às últimas conseqüências. Roger Williams
defendia bem mais que separação entre igreja e Estado. Defendia a absoluta liberdade religiosa.
O Estado não tem direito de impor sua fé a ninguém. As pessoas têm o direito de escolher a sua
fé e até mesmo não professar fé alguma. Cada pessoa é responsável por sua vida e por suas
decisões. O homem não pode ser tutelado nem pela igreja pelo Estado. Por isso também que
nunca podemos apoiar ditadura alguma. E toda e qualquer intolerância, seja racial, social,
religiosa, ideológica ou política deve ser rejeitada por nós.
Expulso de Boston, num inverno rigoroso, e tendo sido salvo pelos índios, Roger Williams
fundou uma pequena colônia, na Baía de Narragansett, com algumas de suas ex-ovelhas da
Igreja Episcopal, que o acompanharam. No documento de fundação da colônia se definiram como
postulados a tolerância religiosa e a liberdade de opinião. Isto é motivo de satisfação para nós, ao
mesmo que se torna um lembrete sobre como devemos proceder. A primeira comunidade que
estabeleceu como princípio a liberdade religiosa absoluta foi fundada por um homem que veio a
se tornar batista e que, em 1639, fundou a primeira igreja batista em solo americano. A liberdade
de expressão é um fundamento muito caro aos batistas. A riqueza da Igreja de Cristo está na sua
diversidade. Isto se verifica até mesmo na chamada dos doze, feita por Jesus. Eles eram pessoas
diferentes. Pescadores, cobradores de impostos, um guerrilheiro (aceitando a tese de Oscar
Cullman de que Judas Iscariotes quer dizer “Judas, o homem do punhal”). Um colaboracionista
com Roma, o poder dominante, e um revolucionário, contra o poder dominante, portanto. Ambos
chamados por Jesus.
Esta liberdade de opinião permite que a CBB abrigue diferentes correntes escatológicas.
Ela guardou o princípio batista. Outros grupos batistas exigem uma postura específica. Não é o
nosso caso. Abrigamos diversas tendências porque este ponto não é fundamental, mas
secundário.
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Liberdade de expressão é uma conseqüência inevitável de não termos um papa ou alguém
“infalível”, que todos temos o Espírito Santo, que somos todos falíveis, também. É a aplicação do
sacerdócio universal de todos os salvos. Todos temos acesso a Deus, todos temos o Espírito
Santo, nenhum de nós é mais conectado a Deus que os demais, para ter o monopólio de Deus. O
autoritarismo teológico é uma agressão em si, e também uma agressão à nossa história.
É obvio que temos divergências. Aliás, o capítulo X do livro de Faircloth e Torbert, Esboço da
História dos Baptistas, se intitula “Livres Para Divergir”. E mostra algumas das divergências
históricas entre os vários grupos batistas. Mas como alguém já disse, um bom princípio a se
observar aqui é: “Nas pequenas coisas, diversidade; nas questões capitais, unidade; em todas as
coisas, caridade”. Divergências no cristianismo aparecem cedo, como vemos em Atos 15, e nas
cartas de Paulo, todas elas escritas para resolver problemas na vida das igrejas (talvez as
exceções sejam Efésios e Filipenses). Mas é atitude cristã saber viver com divergências. E
também uma marca do espírito batista.
Prefiro este termo à batismo de adultos, porque batizamos crianças e adolescentes. Não
batizamos bebês. A idéia de que o batismo tinha poder salvador se arraigou lentamente na igreja.
Pelo quarto século, o sacramentalismo impôs a ceia e o batismo como sacramentos que deviam
ser ministrados para trazerem graça espiritual. O batismo passou a ser algo praticado para se
alcançar a salvação. Mas desde o segundo século que a prática de batizar crianças se
institucionalizara na igreja. Segundo O Didaquê, obra ainda do primeiro século, a igreja primitiva
usava a imersão e a afusão como métodos de batismo. Parece que as crianças (não no Novo
Testamento, pois não temos notícia de batismo infantil neste período) eram submetidas à afusão
e, mais tarde, à aspersão.
A idéia do batismo como sacramento deve nos alertar. Com muita facilidade as pessoas
transferem para objetos, gestos e ritos, alguns poderes especiais (no seu entendimento). Muitas
vezes sacramentamos formas e ritos. Já ouvi gente dizer que o Cantor Cristão é inspirado e que
nunca deveríamos ter um novo hinário, que não é inspirado. Inspirado, para nós, é só a Bíblia.
Nenhum material pode ser visto como sagrado. Isto traz problemas, pelos desdobramentos
posteriores. O Cantor Cristão é bom, e mais seguro que uma multidão de corinhos aguados,
bobinhos, e sem conteúdo que nos empurram em nossos cultos, mas não é inspirado.
A adoção do cristianismo pelo poder civil levou muita gente a se batizar, mas sem
nenhuma convicção religiosa. A igreja recebeu membros incrédulos, não regenerados. Mas
submetidos a um ritual chamado batismo. Este é um problema quando as linhas entre o poder
civil e a igreja são tênues ou são apagadas. A igreja deixa de ser igreja.
Esta insistência no batismo somente de crentes fez com que o rótulo de “anabatistas” fosse
aplicado a muita gente que nada em comum tinha com os anabatistas. E algumas pessoas o
aplicam aos primeiros batistas. Mas este era um termo genérico, como é hoje o termo
“evangélico” que para nossa “bem informada” mídia engloba todo mundo que não seja católico.
Mas os anabatistas remontam a 1490, sendo Conrado Grebel, um ex-cooperador de Zuínglio, seu
fundador. Discordou de Zuínglio por não aceitar o batismo infantil. Com os anabatistas, os
batistas tinham em comum o batismo apenas de regenerados, uma Igreja composta apenas de
regenerados, a supremacia das Escrituras e a liberdade civil e religiosa. Mas discordavam deles
no seu pacifismo radical, sua omissão como cidadãos (alguns anabatistas viam o Estado como
demoníaco) e sua proibição de juramentos, inclusive em tribunais, além de pontos de vista
teológicos sobre encarnação e hipnose da alma e a necessidade da sucessão apostólica para o
batismo. Mas voltemos à visão sobre o batismo consciente de crentes.
Neste aspecto do batismo, os batistas devem aos menonitas. De 1609 até 1638, os
batistas praticavam apenas a afusão. No contato com os menonitas aprenderam o batismo por
imersão. Em 1638, a Igreja de Spilsbury declarou que só aceitaria o batismo por imersão. Em
1644, sete igrejas batistas assumiram uma declaração doutrinária, chamada de “Confissão de
Londres”, em que a forma de batismo era por imersão, aceitando a declaração da Igreja de
Spilsbury. Desde então, esta vem sendo a prática dominante em nosso meio.
Esta é outra herança teológica preciosa dos batistas. A Declaração Doutrinária afirma: “O
preço da redenção eterna do crente foi pago de uma vez por Jesus Cristo, pelo derramamento do
seu sangue na cruz”. Chamo a sua atenção para as expressões “redenção eterna”, “pago de uma
vez” e “pelo derramamento de seu sangue na cruz”. A salvação é eterna. Não é temporária nem
parcial. O assunto foi resolvido de uma vez por todas na cruz. Cristo não deu uma entrada e
deixou as prestações para pagarmos. Pagou tudo, de uma vez. Seu sacrifício foi suficiente, único,
irrepetível e perfeito. E o preço pago por ele foi seu próprio sangue. No processo da salvação,
não somos o agente, mas Jesus Cristo o é. E sua obra é perfeita. A salvação não depende de
nós, mas dele. Ele não rejeita o pecador que vem a ele, nem se arrepende de nos ter salvado.
“Mas conheci muita gente que esteve na igreja e hoje está excluída!”, dirá alguém. A antiga
Confissão de Fé, substituída pela Declaração Doutrinária, trazia o item XI, “Da Perseverança dos
Santos”. Nele se diz: “Cremos que só são crentes verdadeiros aqueles que perseveram até o fim;
que a sua ligação perseverante com Cristo é o grande sinal que os distingue dos que professam
superficialmente”. Um verdadeiro salvo persevera na fé: “Saíram dentre nós, mas não eram dos
nossos; porque, se fossem dos nossos, teriam permanecido conosco; mas todos eles saíram para
que se manifestasse que não são dos nossos” (1Jo 2.19).
A salvação é obra exclusiva de Jesus Cristo. Nós não a produzimos. Nós a aceitamos. A salvação
está relacionada com o caráter do nosso Salvador. Ela não depende de nossos esforços. Quando
se pensa na possibilidade da perda da salvação, assume-se que há esforços humanos que
podem derrubar o que Cristo fez. E coloca-se a salvação como algo que podemos ter ou deixar
de ter com base no que fizemos ou deixamos de fazer. Ela deixa de ser obra da graça. Esta
concepção batista torna a igreja uma instituição que, espiritualmente, está segura para sempre,
pela sua fé em Cristo. Ela não é clube onde a pessoa entra e sai. Ela é face visível do reino
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invisível, a ponta do iceberg. Envolver-se com a igreja local, sendo-se regenerado, é estar na
Igreja Militante, a Universal.
Há coerência batista quando se analisa esta doutrina junto com a do batismo apenas para
regenerados. Não há como alguém realmente batizado vir a se desviar. Se a pessoa foi
regenerada pelo poder do Espírito Santo e foi batizada, então está segura. Isto nos recorda que o
batismo não é para simpatizantes do evangelho, mas para regenerados pelo evangelho. Temos
batizado muitos simpatizantes do evangelho, que, um dia, não sendo convertidos, irão embora.
Quando o batizado é um regenerado, permanecerá na fé. Se a pessoa morreu para vida anterior,
como voltará a viver nela? E é também, para nós, a garantia de que a verdadeira igreja estará
preservada, pois será sempre de regenerados. Ao mesmo tempo, é uma advertência para quem
se chega a uma igreja batista: está assumindo um compromisso para sempre. Ser membro de
uma igreja batista é um sinal, uma declaração, de conversão a Jesus Cristo e a expressão do
desejo de se unir ao seu povo. Ao mesmo tempo é uma declaração de que se está assumindo um
compromisso com Cristo e o seu evangelho para sempre. A identidade de um batista é forte, aqui:
ele é um salvo para sempre e por completo.
Sacramento é o ato religioso que santifica ou confere graça a quem o recebe. Ordenança é
o reconhecimento de quem uma determinada ordem foi atribuída a alguém. Há uma diferença
muito grande entre os dois. A idéia do batismo e da ceia do Senhor como sacramentos data do
quarto século. E veio um desdobramento: por serem ritos mágicos, eles necessitam de uma
classe especial de pessoas. Por isso, com o sacramento veio logo o surgimento de um clero.
Para a Igreja Católica, os sacramentos são sete: batismo, confirmação, eucaristia, penitência,
extrema-unção, ordem e matrimônio. São elementos que conferem graças.
Os batistas entendem que Jesus deixou duas celebrações que as igrejas devem observar:
o batismo e a ceia. Não transmitem graça, mas são atos de celebração da fé. O batismo celebra e
testemunha nossa conversão a Cristo e proclama a disposição de uma vida com ele. A ceia
celebra a morte vicária de Cristo e anuncia sua volta. Alguns outros pequenos grupos batistas
adotam, ainda o lava-pés. Mas são poucos.
Já falei um pouco sobre batismo. Abordamo-lo aqui apenas pelo ângulo de não ser um
sacramento. Falo, então, da ceia. A postura católica é a da transubstanciação: o pão e o vinho
se transformam no corpo e no sangue de Cristo. Isso se dá quando do ofertório, na missa,
quando o padre oferece os elementos a Deus. Eles são transformados. Por isso, não chame o
momento de dízimos e ofertas de “ofertório”. A menos que haja lá algum padre que esteja
transformando os elementos no corpo e sangue de Cristo. Os batistas não têm “ofertório”. Têm
“devolução dos dízimos”. “Devolução” porque dízimo não se paga nem se dá. Devolve-se. Não é
nosso, é de Deus e veio à nossa mão por algum momento.
Considerar objetos como sagrados leva a santificá-los. Aí surgem duas irmãs gêmeas: a
idolatria e a superstição. Por isso reafirmemos: não temos sacramentos e repudiamos a
espiritualização de símbolos e de gestos. O transmissor de graça é o Espírito Santo. Ele habita
em nós, se somos convertidos. Se alguém não é, pode se afogar nas águas do Jordão, ficar com
barriga d’água de tanto beber água ungida pela oração do pastor, que isso não adiantará nada. A
fé deve ser posta em Deus e não em coisas nem em gestos nem em ritos. Um batista que preze
sua identidade não se envolverá com o fetichismo neo-sacramentalismo pentecostal.
O pastor não é um sacerdote. Sua oração vale tanto, aos olhos de Deus, como a oração do
zelador da igreja, desde que este seja crente. A oração do crente é ouvida por causa da graça de
Deus, da mediação de Jesus e da intercessão que o Espírito faz por nós, junto à Trindade. A
identidade batista é fortemente marcada por esta concepção teológica: o sacerdócio universal de
todos os salvos, em conseqüência do livre acesso que todos nós temos à presença divina.
No entanto, esta doutrina tão valiosa está sendo diluída em nosso meio. Isto sucede por
causa do entendimento de que temos um clero e um laicato. Todos nós somos ministros, pois
todos somos servos. E todos somos leigos, porque todos somos povo (é este o sentido da
palavra “leigo”, alguém do povo). Não temos clero nem laicato, como batistas. Somos todos
ministros e somos, todos, povo. Mas isto tem sido esquecido, porque, cada vez mais, a igreja
mergulha no Antigo Testamento e não no Novo. Usamos os termos do Novo com a conotação do
Antigo. Muita gente prega o Antigo Testamento sem analisá-lo pelo Novo Testamento. Assim, o
pastor do Novo Testamento passa a ter a conotação do sacerdote do Antigo Testamento. É o
“ungido”, o detentor de relação especial com Deus que os outros não têm. Só ele pode realizar
certos atos litúrgicos, como se fosse o sacerdote do Antigo Testamento. Por exemplo, batismo e
ceia só podem ser celebrados por ele. Assumimos isto, mas não é uma exigência bíblica.
Convencionamos isto.
No meio carismático isto é mais forte. Os pastores tornam a igreja dependente deles. Só
eles têm a oração poderosa, a corrente de libertação só pode ser feita por eles e na igreja, só
eles quebram as maldições, etc. O sentido teológico do sacerdote hebreu permeia o sentido
teológico do pastor neotestamentário. Isto convém ao pastor neopentecostal. Ele se torna um
homem acima dos outros, incontestável, líder que deve ser acatado. Tem uma autoridade
espiritual que os outros não têm. Ele tem uma linha vermelha com Deus. Ora, se há algo que
aprendemos sobre a liderança nos dois Testamentos, é que o Antigo elitiza a liderança e o Novo
a democratiza. Para o neopentecostal, o Novo Testamento, a mensagem da graça e a
eclesiologia simples, despida de objetos, palavras e gestual sagrados não são interessantes.
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Assim, ele se refugia no Antigo Testamento. Por isso há igrejas evangélicas com castiçais de sete
braços e estrelas de Davi no lugar da cruz. Outras desfraldam a bandeira de Israel (e omitem a
brasileira), guardam festas judaicas, e têm incensários em seus salões de cultos. Há evangélicos
que parecem frustrados por não serem judeus. A liturgia pomposa do judaísmo é mais atraente e
permite mais manobra ao líder que se põe acima dos outros. E com isso, os membros da igreja
são os ajudantes do obreiro.
Tudo isto pode ser resumido no expediente de um boletim de uma igreja batista dos
Estados Unidos. Lá constava: “Ministros da Igreja: todos os crentes. Auxiliar dos ministros: o
Pastor da Igreja”. Deus não deu a tarefa de fazer a obra aos pastores, a não ser a tarefa de
serem pastores. A tarefa de fazer a obra foi dada à Igreja como um todo. E o Espírito foi dado a
todos e não apenas aos pastores.
Este é outro princípio batista inegociável. E é onde devo contextulizar um pouco mais
porque temos problemas sérios nesta área. Entendo que vivemos um tempo bem diferente do
vivido há 20 anos. As estruturas denominacionais passam por um processo de desgaste junto às
igrejas. Sua imagem está afetada. Isto é conseqüência até mesmo de um dado cultural, a pós-
modernidade, momento social em que vivemos e em que as estruturas são questionadas e
deixadas de lado, e o individualismo é cada vez mais acentuado. Para piorar, em algumas de
nossas instituições denominacionais houve má gerência, e isto atingiu as demais. Em outras,
houve açodamento de pessoas que confundiram as coisas e conseguiram, com suas atitudes,
criar uma postura refratária por parte das igrejas. Zelosas pelo seu trabalho, algumas pessoas
começaram a pressionar as igrejas e a reclamar das não colaboradoras, muitas vezes insinuando
não serem batistas ou serem desengajadas da doutrina batista por não contribuírem
financeiramente para a instituição. Em outras vezes, a luta por poder, nos bastidores, em nada
difere da luta que se vê no mundo. Esta confusão, para mim, se deu porque se ignorou o fato de
que a estrutura é serva das igrejas e existe em função delas e não o oposto. Nem mesmo chamo
nossas instituições de denominação porque denominação, no meu entendimento, são as igrejas e
as doutrinas que elas sustentam. Chamo de estrutura e as vejo como pára-eclesiásticas, ou seja,
elas existem para caminharem ao lado das igrejas. Por isso, entendo que as estruturas precisam
rever seus métodos e seu discurso. Não devem cobrar das igrejas, mas mostrar sua
competência, sua administração com lisura, e como estão levando a obra das igrejas à frente.
Parece-me surrealista que alguns vejam as igrejas como adversárias da denominação. Elas são a
denominação!
As igrejas têm diminuído sua colaboração para a estrutura, tanto em finanças como em
envolvimento. Por isso, vez por outra se lêem artigos em que alguém reclama da autonomia da
igreja local e critica as que não estão cerrando fileiras com a estrutura. Seria bom fazer com que
as igrejas todas assumissem o programa da estrutura e bem como os ônus decorrentes da
funcionalização do programa.
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A autonomia leva à pulverização, mas a centralização leva à uniformidade nos erros. Cito
um trecho de um batista insuspeito, José dos Reis Pereira. Poucos batistas foram tão engajados
na obra como ele. Certa vez, em uma carta, ele me disse que estava com 24 atribuições
denominacionais. Reis Pereira foi uma vela que se gastou dos dois lados. Eis o texto: “Os
Batistas Gerais decaíram à proporção em que uma forte tendência centralizadora triunfava entre
eles. Vitoriosa essa tendência a autonomia das igrejas locais foi sacrificada. E é um outro
princípio batista, esse da autonomia da igreja local” (Breve História dos Batistas, p. 81).
Centralizar o poder e fortalecer o centro não melhorará a situação. Reis diz que a história já
provou isso. Deve-se fortalecer e melhorar a base, que são as igrejas. Se estas forem fortes e
sadias, a denominação será forte e sadia.
Não se pode negar a autonomia da igreja local, até mesmo porque o Novo Testamento só
mostra uma instituição, que é ela, e desconhece as que criamos. O que criamos não é antibíblico,
mas é abíblico. Não é errado, mas existe para funcionalizar e vitalizar a igreja local. O que
devemos fazer é mostrar que as igrejas do Novo Testamento viviam em cooperação, que se
ajudavam, como Paulo mostra em suas cartas. Autonomia e cooperação não são antônimos. As
igrejas se engajavam em projetos comuns, mas tudo partia delas. Até mesmo o envio de
missionários. Os missionários eram enviados pelas igrejas e eram missionários das igrejas e
nunca enviados por uma instituição. Sei que os tempos são outros, as circunstâncias culturais são
outras, mas me parece que muitas vezes olhamos pelo lado errado do binóculo. A pedra de toque
do processo batista é a igreja local. Somos congregacionais desde nossa origem: o governo
pertence à congregação local e ela não está sujeita a nenhuma outra instância. E cooperação,
sim. Mas sacrifício ou abandono da autonomia da igreja local, nunca!
Esta doutrina nos permite declarar que a maior e mais rica igreja batista vale tanto quanto
a menor e mais pobre. E o que se faz em nome dos batistas precisa do aval moral das igrejas
para ter credibilidade entre elas. Não se trata apenas de autonomia da igreja local, mas de sua
soberania. As estruturas precisam se compatibilizar com as igrejas. Até mesmo por um fator
muito simples: precisam delas para sobreviver.
Este item amplia a liberdade da igreja. Ela não está subordinada ao Estado e ela e o
Estado têm esferas diferentes. A igreja é cidadã deste mundo e sujeita-se a leis de justiça e de
bom senso. Mas deve dizer: “Mas Pedro e João, respondendo, lhes disseram: Julgai vós se é
justo diante de Deus ouvir-nos antes a vós do que a Deus” (At 4.19). A lealdade última da igreja é
para com Deus e sua Palavra. Sua pátria mais amada é a celestial. O Estado também está sob a
lei da justiça divina. No Antigo Testamento, Iahweh escolheu Israel, mas é Senhor de todas as
nações e toda a terra. Devemos nos lembrar disto.
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militar, achavam que King era um comunista, um agitador. Que miopia! E perda de senso de
história!
Uma igreja batista não é da direita nem da esquerda nem mesmo do centro. É de cima.
Seus valores são espirituais e celestiais. Uma igreja batista faz parte da igreja de Cristo, que é
multirracial, multi-étnica, multigeográfica. Sou brasileiro e não me envergonho disto. Digo como
Fernando Pessoa: “minha pátria é a língua portuguesa”, ou seja, tenho uma identidade lingüística.
Amo meu idioma, dizendo como Olavo Bilac: “em que da voz materna ouvi: ‘meu filho’”. Foi na
língua portuguesa, no Brasil, que ouvi minha mãe, Nelya Werdan, uma filha de suíços, me
chamar de “filho”. Foi neste país, o Brasil, que duas famílias estrangeiras, os portugueses Gomes
Coelho e os suíços Werdan Suhett me deram origem. Mas, mais que brasileiro e descendente de
portugueses e suíços, sou cidadão do reino do céu. Os princípios do reino celestial devem reger
minha vida.
Deus não é brasileiro nem tem nacionalidade alguma. Devemos ser patriotas, mas
devemos discordar do Estado quando este invade área que não é sua. Não lhe compete nos ditar
fé ou perspectivas religiosas. Pagamos impostos, servimos ao exército, damos nossa parcela
para este país. Mas não o sacralizamos nem o deificamos. O culto ao Estado produziu a
aberração chamada “Cristãos Alemães”, que queria uma igreja germânica, de raça pura. Mas não
admitimos a ingerência do Estado em nossa vida. Nem transigimos nossos padrões por causa do
Estado. As casas de prostituição pagam taxas e são estabelecidas legalmente, mas a prostituição
é pecado. O que é legal nem sempre é moral. O casamento de homossexuais pode ser tolerado
civilmente, mas é pecado. Uma batista deve dizer como Lutero: sua consciência é cativa da
Palavra de Deus.
Somos cidadãos como todos os demais e não devemos esperar tratamento especial. É
errado igrejas batistas pedirem ônibus às prefeituras e órgãos públicos para fazerem piqueniques.
Se não têm dinheiro para alugar um ônibus, não andem de ônibus! Vão a pé ou não façam
piquenique! Se nos incomoda ver dinheiro público sendo usado para levantar estátuas a Iemanjá
em cidades da orla marítima, deveria nos incomodar também o uso de dinheiro público para
monumentos à Bíblia. O poder civil não pode patrocinar nenhuma religião! Nem a nossa!
Nunca fomos subversivos. Mas não podemos ser coniventes com um Estado desumano,
corrupto, desvalorizador do homem. Nosso norte são os valores da Palavra de Deus. Olhamos
para eles e seguimos nossa jornada. O que se desvia deles, isso recriminamos. Não é se nos
beneficia, mas se é um princípio bíblico.
CONCLUSÃO
Terminei a listagem e comentários dos princípios batistas que me parecem os pilares de nossa
postura. Podem ser óbvios, mas assumi-los ou negá-los trazem desdobramentos, que também
procurei aqui mostrar. A questão mais importante me parece ser esta: temos um passado nobre.
Não surgimos de um racha por causa de liderança, de voracidade por dinheiro ou por esquisitice.
Surgimos ao redor de princípios. Que nossos ancestrais sustentaram por séculos. Muitos deram
suas vidas por eles. Hoje, observá-los parece fácil. Mas nem sempre o fazemos. Por
conveniência, porque nos atrapalham, porque impedem alguns planos nossos. Mas são princípios
batistas que formam nossa identidade. Que