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FACULDADES METROPOLITANAS UNIDAS

HISTÓRIA

TARCÍSIO MOREIRA DE QUEIROGA JÚNIOR

FICHAMENTO

O TEMPO SAQUAREMA

SÃO PAULO
2014
Referência Bibliográfica:
MATTOS, Ilmar Rohloff de. O Tempo Saquarema. Editora Hucitec, São Paulo,
2004. Pp. 115-204

Luzias e Saquaremas; Liberdades e Hierarquias


“Nada tão parecido com um saquarema como um luzia no poder.”

Luzias e Saquaremas designam os partidos, Liberal e Conservador,


respectivamente, no período que se sucedeu após a abdicação de D. Pedro I. Os
nomes acima citados ganharam fama para denominar os componentes de tais
partidos. Contudo, esses “apelidos” foram denominados, num primeiro momento, de
forma pejorativa. Cabe então elucidar o surgimento de tais termos.

“Conta-se, por fim, que derrotados pelas forças do Barão de Caxias no


combate de Santa Luzia, os liberais mineiros passaram a ser chamados pelos
adversários pelo nome do local onde ocorreu o seu maior revés: santa luzias
ou simplesmente luzias.” (pág. 116)

“Relatam uns poucos que, nos idos de 1845, quando os liberais ocupavam de
novo o governo do Império e a província do Rio de Janeiro era presidida por
Aureliano de Sousa Coutinho, certo Padre José de Câe a Almeida exercia as
funções de subdelegado de Polícia na vila de Saquarema. (...) Relatam
também que Joaquim José Rodrigues Torres e Paulino José Soares de
Sousa, chefes conservadores, com grande parentela nessa localidade, onde
eram também proprietários de escravos e de terras, teriam conseguido livrar
seus protegidos dos desmandos daquela autoridade, e que, desde então, a
denominação saquarema passou a ser dada aos protegidos deles. Relatam,
por fim, que muito rapidamente a nova denominação foi estendida aos
adeptos do partido em todo o Império, de tal modo que no ano seguinte surgia
o jornal O Saquarema na província de Pernambuco, e dois anos depois o
órgão homônimo na de São Paulo. (...) Carregando sentido depreciativo, uma
vez que lembrava ‘protegido’ ou ‘favorecido’ (...) o termo parecia atender aos
anseios dos luzias, ávidos por revidar o apelido que os estigmatizava.”
(pág.118-119).
É interessante notar ambos os partidos viam os levantes populares como
crimes públicos, na classificação do Código Criminal. Outros ponto importante é
saber que desses levantes, todas as classes sociais estavam envolvidas, desde o
que chamavam de ‘flor da sociedade’ até a escória da mesma.

“O que os depoimentos de Luzias e Saquaremas nos permitem perceber, de


imediato, é que dos numerosos movimentos que abalaram o Império do Brasil
durante duas décadas, desde a abdicação de D. Pedro I, participaram tanto
‘proprietários, capitalistas, pais de família’, quanto ‘uma massa enorme de
homens ferozes, sem moral, sem religião e sem instrução alguma’, além de
‘nuvens de nagôs e minas.’” (pág. 124).

Nota-se tanto na fala dos Luzias quanto na fala dos Saquaremas a sociedade
aristocrática que configurava o brasil Imperial. As classes eram distintas, portanto,
possuíam lugares distintos, estava estabelecida uma hierarquia. Assim, percebe-se
que liberais e conservadores possuíam certa semelhança.

“Ora, a constatação dessa diferença essencial não era senão a face


complementar da identificação efetuada por Luzias e Saquaremas de uma
semelhança entre ambos, semelhança essa que conduziu mesmo, em raras
ocasiões, a acusações recíprocas de utilização de ‘gente sem qualificação’
para a consecução de seus propósitos.” (pág. 124)

“Ora, sem dúvida, era este sentimento aristocrático que referenciava os


diferentes critérios que permitiam não só estabelecer distinções – entre a ‘flor
da sociedade’ e a ‘escória da população’, no dizer do Timandro1, por exemplo
–, mas também e antes de mais nada hierarquizar elementos constitutivos da
sociedade – cada qual e todos ‘nunca deixavam de mais ou menos manter e

1 Francisco de Sales Torres Homem passou uma temporada na França em 1833 para estudar economia política

e sistemas financeiros. De volta ao Brasil, apoiou a insurreição, reprimida pelo futuro Duque de Caxias, e foi
deportado para Lisboa. Anistiado em 1848, escreveu o panfleto O libelo do povo sob o pseudônimo de Timandro,
para muitos historiadores um dos mais avançados textos do liberalismo de sua geração. A metralhadora giratória
de Torres Homem disparou não só contra o jovem monarca Pedro II e todos os Bragança que o antecederam,
mas também contra a Imperatriz Tereza Cristina, do ramo Bourbon de Nápoles, com ferinas alusões à sua
origem.
conhecer o seu lugar.’ (...) Em ambos, o sentimento aristocrático rastreando a
visão política, especialmente do momento que muitos consideram ser seu
prolongamento ou degenerescência: as rebeliões ou a guerra.” (pág. 125).

Estavam estabelecidas no Império três classes, muito bem definidas e


conhecedoras de seu lugar na hierarquia. Essas classes demonstravam muito bem o
ranço colonial e escravista que a sociedade mantivera. Assim como também
demonstra as particularidades do nacionalismo brasileiro, havia o país chamado
Brasil, mas os brasileiros, de fato, não existiam.

“’ três seguintes classes: a dos brancos e sobretudo daqueles que por sua
posição constituíam o que se chama a boa sociedade; a do povo mais ou
menos miúdo; e finalmente a dos escravos’” (pág. 126)2

Os ideais liberais estavam refletidos nessa sociedade. Influenciados por


pensadores como Thomas Hobbes, Jeremias Bentham e James Mill, a sociedade
passou a enfatizar o monopólio, tanto da mão-de-obra quanto da terra, da política e
da economia, e o monopólio sobre os homens através das administrações.
Almejava-se ter o controle sob todos os aspectos da sociedade.

“Assim, o aumento da felicidade, a restauração dos monopólios e a expansão


da riqueza constituíam-se em objetivos fundamentais para Luzias e
Saquaremas, a razão essencial que os distinguia tanto do ‘povo mais ou
menos miúdo’ quanto dos escravos. E tais objetivos acabavam por pôr em
destaque dois atributos fundamentais nesta sociedade: liberdade e
propriedade.” (pág. 128)

2 São inúmeros os depoimentos nos quais é possível resgatar a combinação particular entre
condições sociais e matrizes raciais, no Império do Brasil em meados do século XIX.

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