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ISSN on-line: 1982-2014
Doi: 10.17058/signo.v42i73.7994
Recebido em 09 de Agosto de 2016 Aceito em 30 de Agosto de 2016 Autor para contato: lyssandra.torres@gmail.com
Signo [ISSN 1982-2014]. Santa Cruz do Sul, v. 42, n. 73, p. 74-85, jan./abril 2017.
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discursos por meio de estruturas de linguagem, pois, persuasão por meio da articulação de um fazer
somente assim, o sentido pode ser comunicado e persuasivo do destinador e de um fazer interpretativo
compartilhado. do destinatário. Diante disso, percebe-se que, à luz
Para analisar os mecanismos de produção da da teoria semiótica discursiva, a persuasão pode ser
significação nos textos e discursos, a Semiótica vista como um fazer persuasivo ligado à instância da
Discursiva utiliza um simulacro metodológico, enunciação – fazer o outro fazer – e que a
chamado por Greimas de Percurso Gerativo do argumentação pode se caracterizar como uma parte
Sentido (PGS). Trata-se de um modelo que serve de da persuasão, já que é estratégica, afinal é por meio
grade metodológica para a análise do plano do de estratégias argumentativas que a persuasão se
conteúdo dos textos, com base em três níveis de faz, como deixa claro um exemplo do verbete
abstração: o fundamental, o narrativo e o discursivo. Persuadir do Dicionário Houaiss eletrônico “Ex.: os
No nível fundamental, o mais simples do argumentos não persuadiram”, que revela a
percurso, a significação é representada em um “dependência” entre metodologia argumentativa e
quadrado semiótico por meio de uma oposição persuasão. Percebe-se, com isso, que pode se
semântica mínima, ou seja, baseia-se na relação realizar um estudo da argumentação como um
entre dois primitivos semióticos, a versus b, como, por programa de manipulação.
exemplo, vida versus morte, continuidade versus Dada a similaridade entre os conceitos de
descontinuidade etc; categorias semânticas argumentação e persuasão, a fronteira entre eles é
apresentadas de forma oposta no texto e que podem difícil de ser estabelecida. Os semioticistas Lopes e
apresentar um valor eufórico (positivo) ou disfórico Beividas (2007), por exemplo, afirmam que o limite
(negativo). entre os dois conceitos pode ser estabelecido da
O nível narrativo, por sua vez, trata das seguinte forma: a argumentação seria um dos modos
relações de conjunção ou disjunção entre sujeitos e de operação da persuasão, enquanto esta seria uma
entre sujeitos e objetos, gerando transformações de dimensão maior que abarcaria a argumentação como
estado. A Semiótica propõe fases para o esquema subdimensão. Valendo-se do modelo greimasiano,
narrativo canônico, a saber, a manipulação (querer, Barros (1988, p. 98), por sua vez, assim relaciona
dever), a competência (poder, saber), a performance persuasão e argumentação:
(o próprio fazer) e a sanção (julgamento). Trata-se de a Semiótica, ao pretender, no percurso
gerativo, fazer a abstração da manifestação,
um modelo de previsibilidade que dá conta da noção interessa-se antes por estabelecer os
da narratividade, a começar pela manipulação recursos e os mecanismos gerais de
argumentação, por meio dos quais o
argumentativa, que se realiza no discurso, mediante a enunciador persuade o enunciatário
ação de um enunciador que pretende conquistar a (BARROS, 1988,p. 98)
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discursiva, um procedimento discursivo, que se considerar, ao lado das projeções de pessoa, tempo e
estabelece, mas não somente, por meio de espaço, relativas ao componente sintático, as
mecanismos e estratégias enunciativas, cuja coberturas figurativas que as transformam em atores,
finalidade é o estabelecimento de contato – maior ou locais e marcos temporais, relativas ao componente
menor – entre os participantes da enunciação. Como semântico.
defende Teixeira (2006), “a argumentação se Nesse tocante, Bertrand (2003, p.37) comenta
desenvolve como uma práxis enunciativa constituída o nível figurativo da leitura em Semiótica:
(...) de um programa de manipulação que usa A significação que se forma e se atualiza na
passagem de uma figura a outra, e não em
recursos de persuasão”. cada uma delas tomada individualmente,
Apesar de a persuasão atravessar o nível pertence precisamente ao que a Semiótica
chama de nível figurativo da leitura. Uma
narrativo, seus efeitos são mais bem captados pela impressão de “realidade” se depreende como
análise do nível discursivo, quando as estruturas se tratasse de um quadro pintado
(BERTRAND, 2003, p. 37).
narrativas são enriquecidas discursivamente. Pelo
enriquecimento da narrativa, é nesse nível do Bertrand acrescenta que a passagem de uma
discurso, então, que se cria uma impressão de frase a outra até o fim do texto só pode ser percebida
realidade. Como o texto é analisado como o resultado “como um continuum semântico se postularmos uma
da enunciação, é nesse nível que se analisa as isotopia comum que tece uma ligação entre cada
projeções da instância da enunciação no enunciado, figura, pela recorrência de uma categoria significante
bem como as relações entre enunciador e (...) no decorrer do desenvolvimento discursivo”, isto
enunciatário, que podem ocorrer por meio dos é, se houver “desdobramento das categorias
pode ser enunciativo, quando ocorre a projeção do p.185-187) que caracterize um percurso temático,
eu-aqui-agora, isto é, quando causa um efeito de mais geral e abstrato que figurativo, porque, conforme
proximidade actorial, espacial e temporal em relação Bertrand (2003, p.40) “está aberto a um maior número
espaços e os tempos da enunciação são omitidos, Diante do exposto no que tange ao modo como
espacial e temporal. Ocorre embreagem quando a no âmbito da teoria semiótica clássica, passemos a
enunciação deseja criar determinados efeitos de uma discussão acerca de enunciação global no texto
Consoante Teixeira (2006), para tratar a estruturas realizadas sob a forma de discurso”.
necessário narrativizar o percurso do sujeito que tempo, o lugar de exercício da competência semiótica
enuncia, o que revela um forte limiar entre os níveis e a instância da instauração do sujeito (da
narrativo e discursivo. Além disso, é importante, para enunciação). A enunciação enunciada é, assim,
dar conta dos mecanismos argumentativos, apenas um simulacro do dizer do enunciador, isto é, a
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ajustamento, tendo em vista que ele requer, no texto ligam ao regime da programação, já que ruptura
sincrético, uma interação de ordem sensível, mais do perfectível não há entre eles.
que inteligível, entre enunciador e enunciatário. Quando se diz (com razão) que a
manipulação corresponde a um fazer querer
fazer, pressupõe-se evidentemente que o
4 Os regimes de sentido sujeito ao qual o manipulador se dirige não
quer de antemão fazer o que se quer que ele
faça. Se não, encontrar-se-ia em uma outra
configuração: a programação (LANDOWSKI,
A Sociossemiótica, proposta por Eric
2014, p. 92).
Landowski, constitui um dos desenvolvimentos da
Desse modo, consoante Landowski, toda
Semiótica greimasiana standard e aborda a questão
manipulação consiste em fazer outrem desviar-se de
do sentido no nível das práticas e das interações
sua trajetória para orientá-lo a um projeto de atividade
sociais (LANDOWSKI, 2014). As ideias de Landowski
que para ele está “fora do programa”. O regime da
alargaram exponencialmente as condições de
manipulação é, de modo lógico, fundado na
aplicabilidade da teoria narrativa, na medida em que
intencionalidade, visto que abrange um ideal
sua atenção se volta para as condições de
estrategista do manipulador. Trata-se de uma
emergência da significação na dinâmica dos
operação cujo princípio consiste em empreender
discursos e das práticas sociais “reais”, vividas.
procedimentos persuasivos com o objetivo de fazer
Para dar conta do sentido, Landowski propõe
que o sujeito manipulado “não possa deixar de
regimes que traduzem o sentido em interações
conformar-se ao querer do estrategista-manipulador”
sociais – programação, manipulação, acidente e
(LANDOWSKI, 2014, p. 48).
ajustamento. A teoria define transições entre esses
Como é visível, a manipulação pauta-se na
regimes de sentido, assim como prevê múltiplas
interdependência dos sujeitos por envolver estratégia
superposições e combinações possíveis,
e desenvolver em maior proporção a lógica do “fazer
apresentando-os como maneiras de estar no mundo
fazer”, semelhante ao trabalho político, bastante
ou como “formas” de vida distintas, o que não
persuasivo, que visa ao acordo de vontades por meio
permite, assim, diferenciá-los com base nos fatores
de contratos. O desafio é, assim, o de “prever” a
de superioridade ou inferioridade.
constância comportamental do destinatário. Tudo é
Primeiramente, o regime de programação
questão de cálculo.
segue o princípio da regularidade, o qual remete à
Esse cálculo já não é característico do regime
constância das relações entre os efeitos (as ações, os
de acidente, pois o assentimento é o resultado da
comportamentos) e seus determinantes. Assim, esse
comunicação de dois percursos na qual não se pode
regime pauta-se em relações de causalidade
identificar nem causa (regularidade - programação) e
previstas, habituais. “É aquele da repetição do
nem finalidade (intencionalidade- manipulação). Tal
mesmo, da «rotina» e do risco mínimo”
regime funda-se no princípio da álea (ou melhor,
(LANDOWSKI, 2014, p. 17-20, 31-34). Trata-se de
aleatoriedade), do assentimento ao imprevisível, que,
um regime que se caracteriza por uma segurança,
sob a figura do «azar», é capaz de fazer fracassar ou
uma prudência, pela busca de perfeição, haja vista a
vencer qualquer programa em curso, qualquer
não previsão de ocorrência de acidentes tampouco de
manipulação, qualquer ajustamento. Queremos dizer
desvios de qualquer tipo. Como declara Fiorin (2013,
com isso que o acidente permite a negação ou a
p.438), a programação remete a algoritmos de
superação dos programas fixados de antemão, ou
comportamento, por isso é que os sujeitos têm papéis
seja, pode nos colocar, mediante certas
temáticos fixos e estereotipados, o que também
descontinuidades, “diante do sem sentido; excluindo
justifica a ausência de grandes riscos.
toda a possibilidade de antecipação” (LANDOWSKI,
A respeito do regime seguinte – o de
2014, p. 71) e caracterizando-se como uma
manipulação – há uma série de graduações que o
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ocorrência do acaso, que não cria valor e não enuncia experiência semiótica, é por isso que foi conceituado
sentido algum. como relação entre sensibilidades.
No regime do ajustamento, por sua vez, o Landowski apresenta um comparativo acerca
modo por meio do qual um ator intervém em outro dos regimes de sentido:
passa por um contato, por um sentir junto e também Os quatro regimes que descrevemos supõem
todos, por definição, uma face a face entre, no
por um fazer junto, livre de unilateralidade. Vale mínimo, dois atores e, entre eles, o
destacar que ajustamento não denota uma atuação desenvolvimento de processos muito diversos
por intermédio dos quais ao menos um dos
sobre um outro e nem uma subordinação, como dois “age” sobre o outro. Na conversação
ocorre na manipulação, na qual há planejamento para programada, o que um diz dita ao outro a
réplica prescrita pelo uso. No regime do
que o outro realize um programa preestabelecido em acidente, a irrupção do sentido, ou do sem
sentido, é tão perturbadora que o sujeito se
detalhe. Trata-se de um regime democrático, no qual
encontra estupefato ou extasiado e, em todo
“os actantes coordenam suas dinâmicas respectivas caso, desamparado. Sob o regime do
ajustamento, cada impulso de um constitui um
em função de um princípio de sensibilidade” convite para o outro amoldar-se ao seu
Landowski (2014, p. 105). movimento. E na manipulação, o fazer
persuasivo, se alcança seus fins, transforma o
Como um modo de “escapar” dessa núcleo da competência modal do interlocutor,
seu querer, e consequentemente, seu poder-
monotonia, o regime do ajustamento põe em jogo o
fazer. Assim, portanto, trata-se mesmo de
processo de contágio, que designa, sob a ótica atual, regimes de sentido e de “interação”
(LANDOWSKI, 2014, p. 95)
um caso exemplar do processo de união e que se
funda sobre as qualidades sensíveis dos parceiros da Nesse sentido, o fazer persuasivo pelo viés da
interação, isto é, de um lado, a consistência estésica Sociossemiótica pode ser compreendido pelo modo
(plástica e rítmica) dos objetos, e, de outro, a como esses regimes interagem entre si. Um
competência estésica dos sujeitos” (LANDOWSKI, enunciatário pode, por exemplo, ser convencido, por
2014, p. 39-52), que se difere da competência modal meio de estratégias, e também mobilizado, por meio
por não se instaurar na lógica da junção. Tal de um contágio – pautado no sentido sentido. Assim,
competência estésica obedece ao princípio de conforme os ideais landowskianos, há possibilidade
sensibilidade, visto que seu exercício supõe, da parte de co-presença entre os regimes: ajustamento
do sujeito, a superação do modo de leitura do mundo manipulador (“contágio” a serviço de um fazer) ou, de
baseada no reconhecimento de unidades figurativas lado oposto, a existência de uma manipulação por
pontuais e “uma disposição para capturar efeitos de ajustamento, por exemplo.
sentido oriundos das qualidades plásticas próprias O modo da interação (programação, acidente,
manipulação, ajustamento) é sempre o
aos objetos apreendidos em sua presença imediata” resultado de um tipo de relação entre os
(LANDOWSKI, 2004, p. 96-99). actantes sustentada por uma determinada
dinâmica a partir da qual esta competência
O contágio, estudado no âmbito do regime de relacional de base se estabelece. Esta
dinâmica é regida pelos mesmos princípios
ajustamento, apresenta um princípio fundamental de
gerais que definem os regimes, de tal modo
inerência entre aquele que sente e aquele que é que podemos admitir a configuração, por
exemplo, de uma programação programada,
sentido, “de tal forma que não pode mais haver nem uma programação acidental, uma
determinação causal, nem um ‘antes’ pressuposto por programação por manipulação, uma
programação por ajustamento e assim
um ‘depois’, mas somente coação, concomitância” sucessivamente. Por esse caminho, admitir
uma manipulação por ajustamento é tratar,
(LANDOWSKI, 2004, p. 33), o que o coloca na ordem
em outros termos, de um tipo de relação
da simultaneidade e o define como uma orientada pelo princípio da intencionalidade e
pela lógica transacional de um contrato, mas
transformação dinâmica e recíproca em ato, ou que lança mão, para operar o seu fazer-fazer,
melhor, ajustamento recíproco. Neste ponto, vale de uma dinâmica fusional, ou seja, de um tipo
qualquer de contrato ou de uma modalidade
salientar que o contágio não existe antes da de “contágio” (FECHINE, 2013, p. 605).
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A Persuasão Sensível no Texto Sincrético 81
O contágio, por caracterizar-se por um fazer Fonte: Revista Natura - Ciclo 04 de 2014, p. 48-49.
sentir, é um fenômeno peculiar da persuasão
Esse anúncio da Natura se estende por duas
sensível, sobre a qual falaremos no próximo tópico.
páginas e apresenta as imagens de três produtos: de
um sabonete e um desodorante-hidratante, do lado
5 A persuasão sensível na publicidade de
direito, e um spray corporal, do lado esquerdo,
cosméticos
acompanhadas de textos com informações sobre
características e preços de cada um deles.
De acordo com os postulados da
Se tomarmos como ponto de partida para a
Sociossemiótica, a persuasão não se baseia apenas
análise a dimensão topológica do plano da expressão
em um fazer o outro fazer, mas também em um
do anúncio, veremos que a distribuição das figuras
fazer sentir. É por conta dessa lógica da união do
dos produtos no lado direito e esquerdo não é
fazer sentir que podemos falar em uma espécie de
ingênua. É consabido que, ao abrir as páginas de
persuasão sensível que se efetiva entre sensível e
uma revista (ou catálogo de produtos) qualquer, o
inteligível, sobretudo no sincretismo de linguagens,
leitor tende a focalizar sua atenção, inicialmente, no
que se caracteriza pela apresentação de linguagens
lado direito da página, para depois explorar o lado
complexas ou, como prefere Beividas (2006), por uma
esquerdo2. Assim, aquilo que deve ser focalizado,
constelação de semioses. Queremos dizer, com isso,
bem como a ordem em que deve ser focalizado, fica,
que compreendemos o texto sincrético como um
em certa medida, condicionado pela forma
locus favorável para o surgimento de estratégias de
programada de manusear e ler a própria revista. Em
persuasão fundadas na dimensão sensível do
relação ao catálogo da Natura, acontece exatamente
discurso em interação com a dimensão inteligível,
isso. A organização espacial das imagens e
logicamente. Essa persuasão sensível pode ser
informações nela contidas insere o enunciatário numa
caracterizada como um mecanismo discursivo que
lógica de interação baseada na regularidade pelo
articula as dimensões sensível e inteligível do
hábito de ler esse tipo de revista e encontrar uma
discurso e é regulada no discurso pelos regimes de
previsibilidade na sua diagramação (pela disposição
sentido. Arriscamo-nos a definir essa expressão como
de imagens no centro da página, pelo destaque visual
um conjunto de estratégias que, de alguma maneira,
dado aos novos produtos e às promoções, pela
organizam o simulacro da sensorialidade nas
apresentação repetida de preços e produtos etc.).
interações discursivas.
Seguindo essa linha de raciocínio, poderíamos
Para analisar como esse fenômeno se
pensar que o anúncio em tela estaria privilegiando os
manifesta em textos sincréticos, escolhemos, diante
produtos apresentados no lado direito, o sabonete e o
dos limites propostos para este artigo, uma peça
desodorante-hidratante, de modo que a atenção do
publicitária de cosméticos da Revista Natura,
enunciatário se voltasse preponderantemente para
referente a uma edição de 2014:
eles. Entretanto, se observarmos atentamente a
Figura 1 – Revista Natura
diagramação do anúncio, veremos que a disposição
das figuras dos produtos escolhidos no lado direito e
esquerdo reproduz a ordem lógica, o script ou “roteiro
cognitivo” da higiene pessoal, em que primeiro se usa
o sabonete (banho), em seguida, o hidratante-
2
Essa estratégia de diagramação de jornais e revistas é
amplamente estudada e utilizada na área de comunicação,
mídia e publicidade, para, dentre outras coisas, medir e
gerenciar o nível de atenção de leitores e consumidores sobre
notícias, produtos e serviços divulgados na mídia impressa. (cf.
HURLBURT, 2002 e SILVA, 1985).
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desodorante (cuidado com a pele pós-banho), e, por quanto pela dimensão cromática do anúncio, pois as
fim, o spray corporal refrescante (perfumação pós- cores dos produtos não são excludentes, mas sim
banho). Diante disso, podemos supor que essa graduais, compondo um matiz de tonalidades da
organização espacial de elementos do plano da mesma cor (rosa) que se distribui por todas as
expressão cria uma isotopia discursiva que reflete um imagens dos produtos. No plano da linguagem verbal,
modo de colocação em discurso dos conteúdos o enunciado “prolongando a sensação gostosa do
escolhidos pelo enunciador para exercer seu fazer banho” reforça esses efeitos de sentido, pois ilustra
persuasivo sobre o enunciatário. Dessa forma, a bem a valorização da duratividade, ao serem
interação entre enunciador e enunciatário, via texto mencionadas somente as fases incoativa (“banho”) e
sincrético, deixa de ser simplesmente uma interação cursiva (expressão gerundiva “prolongando”),
programada, um conjunto de comportamentos deixando omissa a fase terminativa do processo.
previsíveis e estereotipados, e passa a ser vista Ainda na dimensão plástica do plano da
também como um regime de sentido fundado na expressão, convém mencionar a diferença de
manipulação. Nesse regime, a persuasão ocorre não enquadramento e mudança de cor na apresentação
só pelo recurso à previsibilidade e à regularidade, das informações verbais dos produtos: enquanto as
mas também por estratégia. A finalidade agora é informações qualitativas (características subjetivas
convencer o enunciatário da verdade (ou da dos produtos) são apresentadas sobre um fundo de
falsidade) do discurso enunciado para fazê-lo agir, cor cinza e enquadradas por retângulos (retas) e
mediante o princípio semiótico de intencionalidade círculos (curvas), as informações quantitativas
instalado no discurso enunciado, como propõe (descrição, referências e preços dos produtos) são
Landowski. Por conseguinte, a organização apresentadas sem enquadramento ou enquadradas
diagramática dos elementos do plano da expressão em um fundo de cor vermelha. Essa oposição de
do anúncio consiste não somente em uma sequência cores e enquadramentos é significante na medida em
de apresentação de produtos e informações, mas em que aponta para outra estratégia do enunciador para
uma estratégia de persuasão do enunciador para captar a atenção do enunciatário, ao destacar uma
fazer que o enunciatário acompanhe o processo de informação pela escolha de uma determinada cor ou
fazer a higiene pessoal em todas as suas fases, tipo de enquadramento e ao criar regularidades
incoativa (início), cursiva (meio) e terminativa (fim). plásticas que diferenciam o tipo de informação. Isso
Ora, como podemos observar, trata-se de uma ocorre, por exemplo, nos dois textos que
3
aspectualização , que, neste caso, valoriza a acompanham a imagem do spray corporal, no lado
duratividade do processo, criando efeitos de sentido esquerdo do anúncio: se, no quadro cinza, o
de integração e continuidade que, em última enunciador valoriza a dimensão sensível do discurso
instância, podem levar o enunciatário-consumidor a pela linguagem verbal, ao reforçar o apelo sensorial,
comprar não somente um, mas os três produtos de sinestésico do produto (“O spray corporal é ideal para
higiene pessoal. Esses efeitos de sentido são criados, ser usado em abundância no corpo inteiro,
na dimensão plástica do plano da expressão, tanto proporcionando uma sensação de frescor e
pela imagem de um líquido que se espraia desde o prolongando a sensação gostosa do banho”), no
lado direito até o lado esquerdo da peça publicitária, quadro vermelho, por sua vez, a cor e o tipo de
enquadramento, juntamente à linguagem verbal,
3 ganham destaque, estabelecendo uma tensão entre
Tradicionalmente, a noção de aspecto vem sendo tratada
como uma questão referente ao tempo, cuja marca mais as dimensões inteligível e sensível do discurso.
explícita estaria na categoria verbal. Contudo, a semiótica
expande essa definição para os três componentes básicos da Dessa maneira, o destaque visual dado pela
enunciação, que são o tempo, a pessoa e o espaço. “Podemos
caracterizar o tempo através de sua duração, o lugar através de vivacidade da cor vermelha reforça a manipulação
um percurso e o ator através de um processo de transformação,
com o posicionamento do observador em qualquer ponto da
pela dimensão sensível do texto, assim como a aba
escala, seja no início, no meio ou no fim” (GOMES, 2011).
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A Persuasão Sensível no Texto Sincrético 83
dobrada no canto do quadro, que cria uma sinestesia que enquanto a forma verbal “levante” solicita uma
entre os canais sensoriais tátil e visual e transforma o ação pragmática do enunciatário, um fazer (levantar a
quadro numa espécie de nota (cujo efeito de sentido aba), a forma verbal “conheça” requer outro tipo de
é poder ser destacável) para chamar a atenção do resposta, de natureza cognitiva, da ordem do saber.
enunciatário para descontos e promoções; já a Vale notar que, na própria sintaxe, a conjunção “e”,
manipulação pela dimensão inteligível do discurso, excede seu valor de adição e adquire valor
ainda no quadro vermelho, ocorre pela linguagem consecutivo (de efeito ou de resultado). Ou seja, não
verbal, devido à forma verbal “Economize”, no se trata apenas de um comando ou de um pedido,
imperativo, que ganha nuance de subjetividade. Do mas de uma estratégia argumentativa que lança o
ponto de vista semiótico, o verbo no imperativo enunciatário numa manipulação por sedução, cuja
consiste em uma debreagem enunciativa, que modalidade de base é o querer (querer cheirar). Em
instaura a presença da enunciação no enunciado, decorrência disso, a força persuasiva da sequência
criando o efeito de apelo e de interlocução com o de verbos, repousa, em termos modais, em um “saber
enunciatário, ao mesmo tempo em que estabelece fazer querer” do enunciador e um possível “querer
uma tentativa de manipulação por tentação (se você saber fazer” por parte do enunciatário. Outro aspecto
comprar, economiza dinheiro). que merece destaque é o papel argumentativo do
As estratégias de persuasão, de caráter mais complemento do verbo conhecer (“fragrância de
sensível, convocam para o texto sincrético mais um frutas vermelhas”) e do sintagma preposicionado que
regime de sentido, o ajustamento. A interação por o segue (“da Natura Todo Dia”). Supomos que o
ajustamento, como já vimos, requer estratégia verbo logicamente previsível, esperado no enunciado,
diferenciadas de persuasão/argumentação, fundadas, seria o verbo sentir ou cheirar e não o verbo
em última instância, numa lógica de “união” entre conhecer, já que para conhecer uma fragrância é
sujeitos ou entre sujeitos e objetos, cujo foco não é preciso cheirá-la, senti-la primeiro. Ora, a escolha do
mais somente fazer o outro (dever, querer, poder) verbo conhecer não é fortuita, pois indica que o cheiro
fazer, mas, sobretudo, fazer o outro sentir. Ou seja, da fragrância já não é mais pura percepção olfativa,
trata-se de uma persuasão sensível, que coloca em pois o aroma está organizado de acordo com o
cena, de um lado, uma competência estésica por universo de valores do sintagma preposicionado
parte dos participantes para sentir e, do outro, uma “Natura Todo Dia” (não se trata de um aroma de
consistência estésica dos objetos, que possibilita uma frutas vermelhas qualquer, mas o da Natura). Por
comunicação não mais cognitiva, mas, sim, de ordem isso, ao levantar a aba para sentir o cheiro da
afetiva e sensorial. fragrância, a presença do verbo conhecer já organiza
Na peça publicitária em questão, a presença semioticamente, pela ordem do saber, a
de uma aba transparente e destacável, localizada na sensorialidade olfativa, a percepção do enunciatário.
parte superior esquerda do anúncio, contendo o Ainda temos o sintagma nominal preposicionado
enunciado “Levante a aba e conheça a fragrância de “fragrância de frutas vermelhas”, que cria um
frutas vermelhas de Natura Todo Dia”, pode ser simulacro sinestésico composto por três ordens
considerada uma estratégia de persuasão sensível sensoriais, o olfato (fragrância), o paladar (frutas) e a
que coloca o enunciatário sob o regime de visão (vermelhas), cuja mistura intensifica a
ajustamento. Analisemo-la. manipulação pela dimensão sensível do discurso.
O texto verbal da aba começa com os verbos Como se vê, trata-se de uma estratégia de persuasão
imperativos “levante” e “conheça”. Ambos, por que opera com os conteúdos sensíveis das duas
estarem debreados enunciativamente, criam o efeito linguagens, a verbal e a não verbal.
de sentido de interlocução, de aproximação, entre A persuasão sensível, entretanto, não para por
enunciador e enunciatário. Vale observar, contudo, aí. O comando para levantar a aba e conhecer o
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aroma de frutas vermelhas exige do enunciatário a os privados, quanto os públicos, que circulam no
interação sensorial com a matéria física do texto, isto espaço contemporâneo, e reivindicar seu lugar nas
é, é preciso tocar e cheirar a página, que nada mais é Ciências da Linguagem”, como bem assinala
do que um simulacro da fragrância do produto. Vê-se AMOSSY (2011, p. 130).
que a estratégia de persuasão não se resume a um
fazer o outro fazer, pois se trata, agora, de uma Referências
comunicação por “contágio”, cujo objetivo é também
fazer o outro “ajustar-se” para sentir. AMOSSY, Ruth. L`argumentation dans le discours.
Troisième édition. Paris: Armand Colin, 2000.
pela lógica do fazer o enunciatário fazer, mas também FECHINE, Yvana. Ainda faz sentido assistir à
programação de TV? Uma discussão sobre os
pela lógica de fazê-lo sentir. É possível, então,
regimes de fruição na televisão. In: OLIVEIRA,
falarmos da presença de uma verdadeira “retórica Ana Cláudia de (org.). As interações sensíveis.
Ensaios de Sociossemiótica a partir da obra de
polissensorial” no texto sincrético aqui analisado.
Eric Landowski. São Paulo: CPS e Estação das
Esse termo, cunhado por Fontanille (2005), é usado Letras e das Cores, 2013, p.589- 614.
para designar a forma de gerenciar as
FLOCH, Jean – Marie. Les formes de l’mpreinte:
heterogeneidades sensoriais, regrar tensões e Brandt, Cartier-Bresson, Doisneau, Stieglitz,
Strand. Périgueux, Pierre Fanlac, 1986, p.218-233
resolvê-las em figuras significantes.
Sendo assim, a noção de argumentação, de FIORIN, José Luiz. O sujeito na semiótica narrativa e
discursiva. Todas as Letras: São Paulo, v. 9, n. 1,
um ponto de vista semiótico, deixa de ser concebida
p. 24-31, 2007.
apenas como a tentativa de modificar ou reforçar,
______________. Para uma definição das linguagens
pelos recursos da linguagem, a visão de mundo do
sincréticas. In: OLIVEIRA, Ana Cláudia de;
enunciatário e passa a ser concebida como tentativa TEIXEIRA, Lúcia. (Org.). Linguagens na
comunicação: desenvolvimentos de semiótica
de fazer o outro aderir não somente a uma tese, mas
sincrética. São Paulo: Estação das Letras e Cores,
também a modos de pensar e de sentir. Isso permite 2009, p.33-38.
à argumentação, tomada como sinônimo de arte de
______________. Estruturas narrativas. In:
persuadir, “tratar do vasto leque de discursos, tanto OLIVEIRA, Ana Claudia de (Ed.). As interações
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A Persuasão Sensível no Texto Sincrético 85
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