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MARKETING DE EMBOSCADA, PATROCÍNIO OU AMBOS: UM CASO

OCORRIDO NA COPA DO MUNDO FIFA 2014

RESUMO: Marketing de emboscada é a utilização de diversos recursos utilizados por uma


organização que não seja uma patrocinadora oficial para, a partir do prestígio e/ou visibilidade
de um evento, capitalizar recursos. Este trabalho analisa um caso ocorrido na Copa do Mundo
FIFA 2014, no qual uma empresa era patrocinadora do evento e mesmo assim foi acusada
pela CBF de se promover e obter ganhos não compatíveis. A empresa teve suas ações
consideradas como típicas do marketing de emboscada pela justiça brasileira, mas foi
absolvida. Considerando a literatura estudada sobre o assunto, este artigo apresenta uma
contribuição ao caracterizar como uma empresa patrocinadora de um evento pode utilizar-se
também de práticas classificadas como sendo de marketing de emboscada para atingir seus
objetivos mercadológicos. A partir do caso em questão, são sugeridas pesquisas futuras que
apresentem modelos de aferição de retorno financeiro para que as empresas decidam ou não
pelo patrocínio, já que mesmo diante de multas e sanções, algumas empresas optam por essa
prática. Destaca-se a relevância de pesquisas brasileiras, a respeito deste tema, em razão do
evento ocorrido no Brasil em 2014 e das Olimpíadas de 2016, que movimentam investimentos
maciços de empresas em atletas e equipes, além dos gastos dos governos e da sociedade, que
direta ou indiretamente se relacionam com o evento.
Palavras chave: Marketing de emboscada; Copa do Mundo; Marketing esportivo;

ABSTRACT: Ambush marketing is the use of various resources by an organization that is not
an official sponsor to capitalize resources from the prestige and /or visibility of an event. This
study analyzes a case occurred in the FIFA World Cup 2014 in which a company was a
sponsor of the event and even then it was accused by the CBF to promote and get inconsistent
earnings. The company had its shares regarded as typical of ambush marketing by Brazilian
justice, but was acquitted. Considering the studied literature on the subject, this article
presents a contribution to characterize how a sponsor of an event can also adopt practices of
ambush marketing to achieve their marketing objectives. From the studied case, future
research topics are suggested, in order to evidence financial returns scouting models for
companies to decide whether or not the sponsorship, since even before fines and penalties,
some companies opt for this practice. The case highlights the importance of Brazilian
research about this topic, due to the event occurred in Brazil in 2014 and the 2016 Olympics,
which handle massive investments of companies in athletes and teams, and also because of
the expenses of governments and society, directly or indirectly related to the event.
Keywords: Ambush marketing; World Cup FIFA; Sportive marketing
1. Introdução

Diante da quantidade de informações que os consumidores estão expostos diariamente, as


empresas buscam por formas eficazes de alcançarem seu público. Um dos recursos utilizados
pelas organizações, mesmo que de forma indireta, é inserir seus produtos e marcas nos
eventos esportivos. No Brasil, devido aos eventos de grande magnitude já realizados e com os
Jogos Olímpicos de 2016, esse processo pode estar mais evidente (FORTES, 2011), inclusive
com a prática do marketing de emboscada.

O patrocínio, assim como o merchandising editorial, licenciamento e outros itens são


integrantes do marketing esportivo. Com a expansão do público, participação dessas empresas
em algumas modalidades esportivas passou a ser consideradas estratégicas para as empresas,
levando-as a constituírem departamentos específicos para esse tipo de empreendimentos
(CONTURSI, 1996; PRONI, 1998). O patrocínio é a principal porta de entrada das marcas ao
universo dos megaeventos esportivos. Sandler e Shani (1989, p.10) afirmam que patrocínio
pode ser visto como a provisão de por uma organização, diretamente para um evento ou
atividade, em troca de uma associação direta com o evento ou atividade. A organização
provedora pode então usar essa associação direta para atingir seus objetivos corporativos, de
marketing ou de mídia.

Uma prática que tem crescido é o marketing de emboscada, que é uma das grandes ameaças
ao sucesso dos esforços de patrocínio de um evento. Muitas empresas, que por diversas razões
não participaram do processo oficial (que se relaciona com investimento financeiro),
procuram obter ganhos financeiros, exposição da marca, retorno mercadológico, dentre outras
vantagens, usando da prática do marketing de emboscada. Este é um fator importante para a
organização de eventos, porque muitas ações devem ser pensadas e tomadas para inibir este
tipo de estratégia (LOIS; CARDOSO; CUNHA, 2013).

A relação entre o patrocínio e utilização de marketing de emboscada deve ser analisada na


medida em que, devido a fatores diversos, é mais vantajoso para empresa (do ponto de vista
financeiro) utilizar-se a emboscada. Esta é uma discussão ainda pouco realizada. Diante disso,
esse trabalho tem por objetivo analisar ações de marketing de emboscada da Johnson &
Johnson na Copa do Mundo FIFA 2014, de modo a evidenciar como ocorreram e como estes
atos foram coibidos/resolvidos por meio dos órgãos oficiais – CBF e FIFA.
O assunto mostra-se pertinente, uma vez que a cidade do Rio de Janeiro será sede dos Jogos
Olímpicos 2016, grande evento desportivo, que contará com participação de milhares de
atletas, juntamente com turistas e empresas, patrocinadoras ou não.

2. Referencial teórico

Diariamente, todos nós consumidores somos bombardeados por publicidades e propagandas


nos diversos meios de comunicação como televisão, revistas, jornais, etc. (WEDEL;
PIETERS, 2008; PETROL; PRADO, 2014). Este número elevado de informações
impossibilita que o consumidor as absorva por completo, e por não poder focar em cada uma
delas, acontece erosão do poder de marketing (SACHARIN, 2001; PIETERS; WEDEL, 2004;
PETROL; PRADO, 2014).

O excesso de informações, juntamente com o tempo reduzido, impede que os consumidores


reajam a todas as comunicações da maneira como os anunciantes gostariam. Isso ocorre
porque, mais nitidamente com a mídia de massa, há um processo de filtragem das
informações, por parte dos consumidores, que selecionam as que são consideradas mais
importantes (VESTERGAARD, 2000; FELTRIN, 2011).

Um dos recursos utilizados pelas empresas anunciantes para alcançarem seu público, mesmo
que de forma indireta, é inserir seus produtos e marcas nos eventos esportivos. No Brasil,
principalmente devido aos eventos de grande magnitude já realizados (Jogos Pan Americanos
e Copa do Mundo 2014) e a ser realizado (Jogos Olímpicos 2016), esse processo pode estar
mais evidente, e a relação entre a penetração midiática em múltiplos aspectos da vida social e
a espetacularização do esporte apresenta fértil campo de estudo (FORTES, 2011).

Estes grandes eventos esportivos impactam não somente a forma como empresas e
consumidores se relacionam, mas também a própria legislação. O Poder Legislativo editou
uma “Lex specialis” que regulamentou e estabeleceu limites e parâmetros para a Copa das
Confederações, a Jornada Mundial da Juventude (ambos em 2013) e para a Copa do Mundo
FIFA 2014. Conhecida como “Lei Geral da Copa” repercutiu em toda sociedade (ALMEIDA,
BARROS, 2013; ALVES, 2013).

Com a expansão do público (principalmente o televisivo, no final do século passado) várias


modalidades esportivas tornaram-se bastante assediadas por empresas, que oferecem
patrocínio, levando-as a criarem departamentos específicos para trabalharem com este tipo de
evento e com isso valorizar o esporte como espetáculo, aumentando a comercialização dos
seus produtos (PRONI, 1998). As empresas, portanto, esperam retorno do investimento
realizado nesses grandes eventos.

A LGC prevê ainda a obrigação de indenizar os danos, os lucros cessantes e qualquer proveito
obtido por aquele que praticar, sem autorização da FIFA ou de pessoa por ela indicada,
atividades de publicidade, inclusive oferta de provas de comida ou bebida, distribuição de
produtos de marca, panfletos ou outros materiais promocionais ou ainda atividades similares
de cunho publicitário; promover publicidade ostensiva em veículos automotores, estacionados
ou circulando pelos Locais Oficiais de Competição; bem como por quem promover
publicidade aérea ou náutica, inclusive por meio do uso de balões, aeronaves ou embarcações
no perímetro de 2 Km do local do evento ou em lugares que sejam claramente visíveis a partir
daqueles, (LGC, art. 16, I, II e III).

Muitas dessas ações, inclusive a referida lei, têm o objetivo de coibir o chamado Marketing de
emboscada. Marketing de emboscada é a utilização de diversos recursos utilizados por uma
organização que não seja patrocinadora oficial para, a partir do prestígio e/ou visibilidade de
outras empresas e do evento, capitalizar recursos (CARDIA, 2004; MULLI; HARDY;
SUTTON, 2004; LOIS; CARDOSO; CUNHA, 2013).

O quadro a seguir apresenta alguns conceitos do referido tema.


Autores Conceito
Sandler e Shani Uma campanha planejada por uma organização, com o objetivo de associar-se,
(1989) de forma indireta, a um determinado evento, procurando, ao menos, conquistar
algumas vantagens (reconhecimento, retornos promocionais, etc.) sob a falsa
percepção de ser um patrocinador oficial.
Townley (1992) A atividade é muitas vezes cuidadosamente planejada para tirar proveito das
fraquezas de programa comercial de um evento e lacunas reais ou aparentes na
proteção jurídica aos proprietários de eventos e patrocinadores.
Meenaghan (1994) Ação (que) visa intrometer-se na consciência pública em torno de um evento,
levando prejuízo ainda maior ao patrocinador (confusão na mente do
consumidor).
McKelvey (1994) Esforço intencional de uma empresa para enfraquecer seu concorrente em um
patrocínio oficial. Ele faz isso para confundir o público de compra para qual
empresa realmente detém direitos oficiais de patrocínio.
McDaniel e Kinney Ocorre quando as empresas colocam o anúncio para vincular a sua (s) marca
(1998) (s) em um grande evento, na mente de seu público, sem ter que comprar as taxas
de direitos autorais caros que as propriedades de eventos, muitas vezes cobram
por status oficial de patrocínio.
Cardia (2004) Pode ser bem-definido como aquela ação ou série de ações que dão uma
aparência de associação legal e direta de uma marca ou organização com um
determinado evento, de forma a usufruir de seu reconhecimento, prestígio e
benefícios como se patrocinador fosse.
Mullin, Hardy e Ocorre quando um anunciante capitaliza sobre a atenção dada a um evento
Sutton (2004) utilizando táticas para implicar uma associação oficial com aquele evento
esportivo. As táticas desleais enfraquecem a associação oficial do concorrente
com o evento, adquirida através do dinheiro de patrocínio. Ele também envolve
a usurpação por uma organização das marcas registradas, dos logos e da
clientela ou da sua organização patrocinadora. Isso ocorre quando uma
empresa não pagou para ser patrocinador oficial, mas confunde o público,
levando-o a pensar que ela é patrocinadora, associando-se indiretamente ao
evento.
Stotlar (2005) Uma estratégia promocional em que um não patrocinador quer capitalizar a
partir da popularidade ou do prestígio da propriedade de outra empresa, dando
a falsa impressão de que é um patrocinador.
Chadwick and Burton Uma forma de marketing associativo utilizado por uma empresa para
(2011) capitalizar atenção, intenções de compra ou outro benefício, gerado a partir de
associação com algum evento ou propriedade, sem que essa empresa possua
algum tipo de conexão com o evento ou a propriedade.

Quadro 1 – Conceitos de Marketing de emboscada


Fonte: Elaborado pelos autores (2015)

A partir destes conceitos pode-se depreender que o marketing de emboscada, muitas vezes, é
um artifício desleal com o público, com o evento e com os patrocinadores. Com o público,
por confundir a percepção do que é ou não é oficial (referente ao evento); ao evento, pois este
é usado simplesmente como uma forma de “trampolim”, não recebendo retorno pelo seu uso
indevido; e com os patrocinadores, pois patrocínios oficiais podem ser um alto investimento
financeiro e o marketing de emboscada pode reduzir o retorno desse investimento.
Segundo Cardia (2004) existem quatro motivos para uma empresa optar por esta estratégia: 1)
quando não conquista o posto de principal patrocinador e desenvolve ações para que a
concorrência não se destaque sozinha; 2) quando o valor para patrocinar o evento é elevado
para empresa, e, no entanto, a empresa insiste em participar; 3) quando, à princípio, a empresa
não iria participar e muda de ideia quando não há mais cotas para participação; e, 4) quando a
empresa acredita que o marketing de emboscada é uma estratégia legítima.

Além destes motivos citados acima, o Marketing de emboscada reúne uma série de estratégias
publicitárias definidas por: 1) associar uma marca não patrocinadora a um evento; 2) uso de
recursos que ludibriem os consumidores a crer ser um parceiro oficial; 3) utilizar de maneira
não autorizada as marcas registradas dos eventos; 4) mencionar ou remeter indiretamente a
um evento (LEONE, 2008).

As raízes do marketing de emboscada podem ser rastreadas no início dos anos de 1984.
Naquele ano, quando a Fuji Film foi a patrocinadora oficial dos Jogos Olímpicos, tendo sido
“emboscada” por sua concorrente Kodak que patrocinou a equipe de atletismo dos EUA bem
como adquiriu os direitos de ser a patrocinadora da transmissão dos jogos Olímpicos pela rede
de televisão ABC, tendo, por conseguinte, sua marca, produtos e serviços associados à
realização do evento (SANDLER; SHANI, 1989).

A primeira literatura acadêmica sobre o assunto surgiu logo depois do ocorrido. Uma das
definições mais citadas para o marketing de emboscada vem desde o período da primeira
prática, tendo sido definida como sendo o esforço planejado (campanha) por uma organização
para associar-se indiretamente com um evento, a fim de obter parte do reconhecimento e
benefícios que estão associados aos patrocinadores oficiais (SANDLER; SHANI, 1989).

Desde então, as entidades organizadoras procuram regulamentar o direito de exclusividade


dos patrocinadores com o objetivo de lhes garantir o retorno de seus investimentos enquanto
patrocinadoras oficiais dos eventos.

Entretanto, mesmo com a devida regulamentação, o marketing de emboscada não deixa de


ocorrer em grandes eventos esportivos. A título de exemplo, na Copa da África do Sul em
2010, durante o jogo entre Holanda e Dinamarca, um grupo de 36 jovens mulheres holandesas
foram expulsas do estádio por usarem vestidos de cor laranja, que, segundo a organização do
evento, fazia referência não apenas à cor do time holandês mas também era um brinde
oferecido pela marca de cerveja Bavária aos clientes que adquirissem seus produtos. Nesse
caso, a patrocinadora oficial do evento era Budweiser (UOL).
Em grandes eventos esportivos, a prática foi estudada por outros autores, como Pitt et al
(2010), que analisou as Olimpíadas de Pequim,

Um caso em particular, entretanto, merece atenção especial, já que a empresa citada pela CBF
como praticante do marketing de emboscada é uma empresa que também é patrocinadora
oficial do Mundial. Johnson & Johnson, mesmo sendo patrocinadora do evento, por meio da
FIFA, é ré em um processo judicial movido pela CBF pela suposta prática de marketing de
emboscada.

3. Procedimentos metodológicos

Para levar a termo esta proposta, foi adotada, como metodologia preferencial, análise de
situações ocorridas na Copa do Mundo FIFA 2014. Com base no relatório fornecido pela
própria instituição (CBF, 2014), pode-se constatar 92 casos referentes a empresas que, de
acordo com CBF, teriam utilizado da credibilidade da instituição e do evento, sem patrociná-
lo. Atitudes comuns àquelas que utilizam o marketing de emboscada.

Contudo, dentre os 92 casos, um se diferenciou, já que a empresa em questão recebeu


notificação judicial da CBF, mas era uma patrocinadora oficial do evento. A empresa, mesmo
com possibilidade de agir com os benefícios de uma empresa patrocinadora, optou também
pelos métodos do marketing de emboscada.

Os dados foram analisados de forma qualitativa, tendo como base os objetivos do trabalho,
que são discutir qual relação (patrocínio ou marketing de emboscada) seria mais rentável para
uma empresa. Segundo Malhotra (2001, p. 155), pesquisa qualitativa é uma “metodologia de
pesquisa exploratória, baseada em pequenas amostras, que proporcionam insights e
compreensão do contexto do problema” .

4. Apresentação e análises dos resultados

4.1. A regulamentação legal do marketing de emboscada na lei da Copa

Em razão da vultuosidade dos eventos e do poder de mídia gerados por grandes eventos
esportivos, culturais e musicais, não raro companhias não patrocinadoras procuram associá-
los a suas marcas, produtos e serviços, sem a devida recompensa financeira aos
organizadores.
Com objetivo de coibir atos como esse, e, dada a proximidade de grandes eventos no Brasil,
em 05 de junho de 2012 foi editada a Lei 12.633/2012 (também como Lei Geral da Copa ou
LGC) que dispõe sobre as medidas relativas à Copa das Confederações FIFA 2013, à Copa do
Mundo FIFA 2014 e à Jornada Mundial da Juventude 2013 que, dentre outros assuntos, trata
do chamado Marketing de Emboscada.

A presente legislação procurou definir e tipificar o que é o marketing de emboscada tendo


quantificado a pena para o caso de infração à legislação, conforme se verifica do seu teor
abaixo transcrito (BRASIL, 2012):

Marketing de Emboscada por Associação:

Art. 32. Divulgar marcas, produtos ou serviços, com o fim de alcançar vantagem
econômica ou publicitária, por meio de associação direta ou indireta com os
Eventos ou Símbolos Oficiais, sem autorização da FIFA ou de pessoa por ela
indicada, induzindo terceiros a acreditar que tais marcas, produtos ou serviços são
aprovados, autorizados ou endossados pela FIFA:

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano ou multa.

Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem, sem autorização da FIFA ou de


pessoa por ela indicada, vincular o uso de Ingressos, convites ou qualquer espécie
de autorização de acesso aos Eventos a ações de publicidade ou atividade
comerciais, com o intuito de obter vantagem econômica.

Marketing de Emboscada por Intrusão:

Art. 33. Expor marcas, negócios, estabelecimentos, produtos, serviços ou praticar


atividade promocional, não autorizados pela FIFA ou por pessoa por ela indicada,
atraindo de qualquer forma a atenção pública nos locais da ocorrência dos Eventos,
com o fim de obter vantagem econômica ou publicitária:

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano ou multa.

Entretanto, a regulamentação legal do marketing de emboscada, não parece ter inibido


algumas empresas de praticá-lo durante a Copa do Mundo 2014 no Brasil.

Um caso que repercutiu na mídia ocorreu durante a primeira partida da Copa do Mundo FIFA
2014, no jogo entre Brasil e Camarões ocorrida em 12 de junho de 2014. A discussão teve
início logo após a partida, quando a Blue Man postou no Facebook uma reprodução da
transmissão do jogo no exato momento em que o jogador Neymar mostra a barra de uma
sunga da marca, feita de lycra e que tem a bandeira brasileira pintada à mão. Segundo a
imprensa, a polêmica gerada pela exposição da sunga elevou as vendas da peça, que passou a
ser chamada de “sunga de Neymar”. Depois do ocorrido, a própria FIFA classificou o evento
como “acidental” (VEJA, 2014). Esse caso está de acordo com a classificação de Chadwick
and Burton (2011), em que o marketing de emboscada se configura como marketing
associativo, com intuito de capitalizar atenção, intenções de compra ou outro benefício.
Mesmo que a utilização da sunga em campo tenha sido desconsiderada como tal prática, a
postagem da marca na internet, utilizando-se do ocorrido, pode ter gerado retorno financeiro à
empresa, sem que ela tenha sido patrocinadora.

O Departamento Jurídico da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) divulgou um relatório


contendo as medidas que foram tomadas para proteger os direitos dos patrocinadores durante
a Copa do Mundo 2014 e o período que a antecedeu. Segundo a CBF, trata-se, muito
provavelmente, do maior programa de proteção já desenvolvido no Brasil em relação a uma
marca, durante tão curto espaço de tempo (CBF, 2014).

O relatório divulgado pelo Departamento Jurídico da Confederação Brasileira de Futebol


(CBF, 2014) informa que foram impetradas cinco ações judiciais (das quais duas já foram
arquivadas) e 92 notificações extrajudiciais, que foram suficientes para resolver o litígio entre
a CBF e as empresa notificadas.

4.2. O caso Johnson & Johnson e a Confederação Brasileira de Futebol

Conforme se verifica pelo relatório do Departamento Jurídico da CBF (CBF, 2014), foi
proposta uma ação judicial em desfavor da Empresa Johnson & Johnson (Autos nº 0198416-
18.2014.8.19.0001) que tramita perante a 5ª Vara Empresarial da Comarca do Rio de Janeiro
(TJRJ, 2014).

Pelas informações constantes no sítio eletrônico do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro,


especificamente em pesquisa realizada quanto ao processo judicial acima referenciado, as
campanhas publicitárias que estão sendo discutidas na ação judicial referem-se a campanhas
inspiradas na seleção brasileira, dentre as quais, uma denominada ´SEU LUGAR NA COPA´,
por meio da qual alguns consumidores foram sorteados para assistir a partida de abertura da
Copa do Mundo de Futebol e ganhar R$ 100.000,00 a cada gol feito pela seleção brasileira de
futebol durante essa partida. Além desta, foi realizada outra campanha publicitária
denominada ´CARINHO INSPIRA´, na qual são mostradas imagens de torcedores vestindo
camisas com layout similar ao da seleção brasileira, e outra chamada de ´SELEÇÃO DO
CARINHO´, na qual o ex-jogador Raí convoca consumidores para integrar a seleção. Por fim,
lançou a campanha ´MINHA PRIMEIRA COPA´, em que foram distribuídas camisas
personalizadas similares à da seleção brasileira para os consumidores que adquiram os
produtos da Johnson & Johnson.

Para subsidiar a decisão liminar de 13.06.2014, a magistrada responsável pelo processo


entendeu que a empresa, de forma disfarçada, pretendia associar seus produtos à seleção
brasileira, e, consequentemente, à marca da CBF. Dessa forma, aproveitou-se do prestígio da
mesma em decorrência da grande evidência proporcionada pela Copa do Mundo de Futebol.
Essa prática é entendida por Sandler e Shani (1989), Townley (1992), McDaniel e Kinney
(1998) como sendo típicas do marketing de emboscada.

Como resultado da decisão liminar, a Johnson & Johnson foi compelida a cessar a fabricação
e a distribuição das camisas objeto da campanha promocional ´MINHA PRIMEIRA COPA´,
fazendo o imediato recolhimento de todas as camisas que estiverem no mercado, sob pena de
multa diária de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais); suspender a veiculação dos anúncios
´CARINHO INSPIRA´ e ´SELEÇÃO DO CARINHO´, em qualquer mídia, bem como a
imediata retirada de materiais digitais e impressos que façam referência à Seleção Brasileira,
sob pena de multa diária de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais); e não vincular qualquer
campanha publicitária, em qualquer mídia, associando a sua empresa e seus produtos à
seleção brasileira de futebol ou aos seus respectivos símbolos (camisa, escudo e marcas), sob
pena de multa diária de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).

Ocorre que posteriormente, em 26.06.2014, a decisão foi revogada pela própria magistrada
que concedeu a liminar. Segundo consta na decisão que revogou a liminar, a magistrada
entendeu que a Jonhson & Johnson do Brasil Indústria e Comércio, por ser patrocinadora
oficial da FIFA, que promovia o evento internacional da COPA DO MUNDO, é natural que
os melhores frutos deste patrocínio sejam colhidos exatamente neste período. Entendeu ainda
que não ocorreu o uso indevido de propriedade intelectual da CBF que autorizasse a
manutenção da decisão liminar.

5. Considerações finais - marketing de emboscada ou patrocínio?

De acordo com os artigos 32 e 33 da lei 12.633/2012, a empresa Johnson & Johnson não teria
cometido o ilícito ato do marketing de emboscada, como constatou a magistrada
posteriormente ao revogar a liminar concedida, já que como patrocinadora, poderia sim
usufruir do direito de imagem e alcançar ganhos financeiros.
Entretanto, ao utilizar-se da estratégia citada, de forma isolada, utilizou-se de recursos comuns
às práticas de marketing de emboscada, citadas por Sandler e Shani (1989), Townley (1992),
McDaniel e Kinney (1998), Mullin, Hardy e Sutton (2004). Mesmo sendo patrocinadora do
evento, a empresa optou por agir desta forma.

Uma contribuição teórica desse artigo consiste na identificação de uma situação de marketing
de emboscada não prevista na literatura estudada. Empresas patrocinadoras não utilizam-se de
práticas consideradas como marketing de emboscada, justamente por gozar de espaço e
visibilidade do evento. No entanto, houve situações em que a Jonhson & Johnson, mesmo
sendo patrocinadora oficial da Copa do Mundo FIFA 2014, chegou a ser notificada
judicialmente por realizar ações típicas de marketing de emboscada. Dessa forma, podem
existir situações nas quais empresas praticam as duas formas concomitantemente.

Caso o marketing de emboscada seja mais rentável que o patrocínio propriamente dito,
mesmo com todas as regulamentações que busquem proteger o direito legítimo dos
patrocinadores, algumas questões na relação entre os players devem ser revistos. A Johnson e
Johnson talvez tenha vislumbrado essa possibilidade, justamente por poder analisar a questão
pelos dois lados. Colheu, portanto, os frutos do patrocínio e das ações que podem ser
consideradas como de marketing de emboscada.

A definição do que é realmente o Marketing de emboscada é fundamental. Resta saber se a


definição desse conceito cabe ao legislador, ao mercado ou aos acadêmicos. Caso seja função
do Estado (Poder Legislativo), outra questão que deve ser respondida é se essa proteção legal
deve ser destinada apenas a grandes eventos como a Copa do Mundo ou poderia ser extensiva
a eventos de menor porte. E, no que diz respeito às proteções financeiras dos patrocinadores,
qual o papel do Estado nessa equação? Caso seja o mercado, ou talvez a academia, importante
também definir quais parâmetros essa definição irão amparar essa definição.

Se mesmo diante de uma multa, ou sanção financeira, uma empresa considerar mais vantajoso
economicamente a utilização do marketing de emboscada, é importante que seja clarificada
qual a vantagem para uma empresa ser patrocinadora de um evento e arcar com
compromissos financeiros mais altos se pode, a um custo muito menor, aferir resultados
significativos.

Como agenda para futuras pesquisas, sugere-se que sejam realizadas pesquisas qualitativas
que comparem o investimento das empresas patrocinadoras e seu retorno, com o capital gasto
pelas empresas que utilizam do marketing de emboscada e seu retorno. Pode-se utilizar, como
contexto prático, as Olímpiadas Rio 2016, caso ocorra alguma situação desse tipo. Além
disso, pesquisas de caráter qualitativo-quantitativo, que apontassem formas de medir
previamente qual atitude é mais rentável: patrocínio ou marketing de emboscada, podem ser
realizadas. Com isso, empresas e eventos podem se acertar para melhorar a relação entre
empresas, eventos e sociedade. Caso o marketing de emboscada seja mais rentável e atraente
para as empresas que o patrocínio formal, a relação entre patrocinadores e empresas deve ser
revista para sobrevivência desse tipo de evento.

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