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2019
CCBB BH
Em uma tarde de julho de 2019, a pesquisadora e curadora Beatriz Lemos conduziu umaesta edição
do Laboratório de Crítica no CCBB BH, dentro do programa CCBB Educativo - Arte & Educação,
nos convidando os participantes ao debate em torno de três textos por ela chamados de “textos
obra”. Trata-se de textos que instauram uma relação bastante específica com a palavra, que
apresentados em formato não-acadêmico, tramam estratégias discursivas que correm por fora de
uma gramática colonizada. Palavras que costuram a presença de seus autorxs/artistas - Thiago
Florêncio, Castiel Brasileiro e Jota Mombaça -, iluminando formas de performatividade nas quais
estão embutidas uma co-presença entre vida, corpo e palavra.
Veja bem: trata-se de três corpos a quem não resta outra alternativa a não ser uma outra presença,
localizada de um lado muito demarcado do abismo construído a partir de uma colonização que não
cessa de se efetuar. Então, se Thiago, Castiel e Jota não escrevem, se não colocam seus corpos
diante do olhar do outro, se não encenam essa corporalidade a partir de uma gramática outra,
ninguém o fará. Suas palavras são insubstituíveis e precisamos cada vez mais destas palavras hoje.
Portanto eEstamos diante de escritasuma que se constituem comoé grito, diário, manifesto, vômito
e, despacho. Conforme destaca a artista e escritora Jota Mombaça, Sse toda palavra está
mancomunada com uma certa inteligibilidade já dada1, cada palavra escrita por estes outros corpos
é um parto. Em seus termos, éÉ sobre originar ________: “tornar presentes coisas que estão
ausentes e ausentes coisas que estão presentes”2.
O autor francês Georges Didi-Huberman usa a luz como interessante metáfora para ilustrar essa
condição: "eExiste uma feroz luz do poder que insiste em fazer desaparecer a menor e mais ínfima
imagem ou lampejo de contrapoder”, diz.3. Por outro lado, conforme nos lembra Beatriz Lemos,
Eexistem também contra-luminosidades que requerem seu direito à aparição, apesar dessa luz que
a tudo nivela. Sob esta luz não há Eeu e Vvocê, portanto não haveriaá outro.
Nos termos da pesquisadorae Beatriz Lemos, essa grande luz é a razão branca, colonizadora
branca, cisgêenera e, patriarcal. Embora poderosa hHá uma guerra em curso contra essa grande
luz, e essa guerra exige que criemos obras que materializem um certo tipo de coreografia capaz de
nos libertar. Essa coreografia diz Castiel Brasileiro dispõe de movimentos antes destinados ao
aprisionamento - como, por exemplo, a própria linguagem, Deve ser possível “obras de liberdade
[…] coreografias de libertação com movimentos que nos aprisionam”4. Commented [1]:
novamente peço que reveja a entrada da citação
Superando aA linguagem comoé estratégia de aprisionamento,. Qpropõe-se que possamos
reconduzir a linguagem na direção de outros corpos, reconhecer em nós mesmos essas alteridades,
1
MOMBAÇA, Jota. O mundo é meu trauma. IN: PISEAGRAMA, Belo Horizonte, n. 11, 2017.
2
FLORENCIO, Thiago. Nativo ausente e escrita-despacho. IN: Revista Vasantes. v. 02, n. 01, 2018.
3
DIDI_HUBERMAN, Georges. Sobrevivência dos vagalumes. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011.
4
Não consegui encontrar essa referência do texto da Castiel.
escrever para ser outro. Nada mais importa a não ser a luta pelo direito de ser outro, apesar e além
dos abismos.
Em seu livro “Algo Infiel” Guilherme Gontijo Flores e Rodrigo Tadeu Gonçalves dizem que u“Uma
performance exige outra performance porque o dom é performativo. ‘Eu te dou isto’, diz o poeta; e
ao ouvinte não cabe resposta fácil como ’não quero’; o poeta retorna : ’eu já te dei’, algo aconteceu,
performou-se no momento de uma entrega. ‘Está dado’. O que fazer com o que se deu?”.5
Essa corporalidade é precisamente a inevitável reação ao que o mundo coloca diante de mim. Se
realiza no encontro entre meu corpo e as outras materialidades. É o peso das minhas
experiênciasMas, "o que entender aqui pela palavra 'corpo'? […] É ele que eu sinto reagir, ao
contato saboroso dos textos que amo; ele que vibra em mim, uma presença que chega à opressão.
O corpo é o peso sentido na experiência que faço dos textos. Meu corpo é a materialização daquilo
que me é próprio, realidade vivida e que determina minha relação com o mundo. Dotado de uma
significação incomparável, ele existe à imagem de meu ser: é ele que eu vivo, possuo e sou, para
o melhor e para o pior.”6 . Commented [5]:
novamente sugiro rever modo de entrada da citação; como se
trata de um trecho longo, pode ser interessante reescrever
Dizer que tenho um corpo, que ele está aqui e nada pode substituí-lo é uma responsabilidade que parte dele e citar diretamente algum trecho
só cabe a mim - só eu sinto o peso do meu corpo,esse peso bem como o peso das outras
materialidades que o atravessam na extensão da minha existência. É isto: minha existência é
atravessamento entre meu corpo e as matérias com as quais ele se depara. Minha escrita é um
testemunho intransferível sobre esse atravessamento.
5 FLORES, et. al. Algo infiel: corpo performance tradução. Florianópolis: Cultura e Barbárie, São Paulo: n-1 edições,
2017.
6 ZUMTHOR, Paul. Performance, recepção, leitura. São Paulo: EDUC, 2000.
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Ação realizada no dia 29 de maio de 2019, em Belo Horizonte (MG), como parte do Programa CCBB
Educativo - Arte & Educação. Laboratório de Crítica é um espaço de reflexão sobre arte, incluindo as
esferas do jornalismo cultural, da memória e do patrimônio. Ministrado por profissionais de diversas áreas,
visa potencializar a instituição como espaço de formação e pesquisa para estudantes de arte, jornalismo,
curadoria e história.
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Sobre a convidada
Beatriz Lemos é
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Links relacionados:
https://piseagrama.org/o-mundo-e-meu-trauma/
http://www.periodicos.ufc.br/vazantes/article/view/32919
https://www.academia.edu/33753944/Algo_infiel_corpo_performance_tradu%C3%A7%C3%A3o_2
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