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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

REFLEXÕES
SOBRE
A HISTÓRIA

MICHEL ZAIDAN FILHO

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

REFLEXÕES
SOBRE
A HISTÓRIA

MICHEL ZAIDAN FILHO

NEEPD/UFPE

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Copyright © 2017 by
Michel Zaidan Filho (org)

Todos os direitos reservados aos Autores

Impresso no Brasil
Printed in Brazil

Foto da Capa
Arquivo pessoal do Autor

Montagem de Capa
Rayanne Lima

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Laysa Souza

Revisão
Do Autor

O Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia (NEEPD) está ligado ao Centro de Filosofia e Ciências
Humanas, da UFPE; faz pesquisas acadêmicas, edita e publica estudos políticos e teóricos. Oferece Cursos de
capacitação e atualização, realiza pesquisas de intenção de voto e oferece consultorias especializadas. Endereço:
Av. Prof. Moraes rego, s/n. Cidade Universitária. Recife-PE. CEP. 50670-901. E-mail: neepdufpe@gmail.com

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Dra. Costança Marcondes César (UCP-PT)
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Dr. Marcos Silva (UFS)
Dr. Marcos André de Barros (UFRPE)
Dr. Michel Zaidan Filho (UFPE) - Presidente

Catalogação na fonte
Bibliotecária Joselly Barros Gonçalves, CRBA-1748

Z21b Zaidan Filho, Michel


Ensaios de Teoria da História (coletânea de artigos produzidos pelas monitoras da disciplina
Teoria da História, ministrada pelo prof. Dr. Michel Zaidan Filho. Michel Zaidan Filho (org.) -
Recife: Neepd-UFPE, 2017
50 páginas

Inclui referências bibliográficas.


ISBN 887-416-0682-4 (broch.)

l. Universidade Federal de Pernambuco. 2. Teoria da História. 3. Epistemologia da ciência


histórica. 4. Filosofia contemporânea. Título

378.102 CDD
(23.ed.) UFPE (BC2015-099)

Livro Rápido Editora – Elógica


Coordenadora editorial: Maria Oliveira

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ......................................................................................... 7
1. UMA NOVA INTRODUÇÃO À HISTÓRIA........................................ 9
2. A TEORIA DA HISTÓRIA AO LONGO DO TEMPO ...................19
3. PROVA E RETÓRICA NA TEORIA DA HISTÓRIA ....................23
4. LINGUAGEM E HISTÓRIA .................................................................25
5. SOBRE O CONCEITO DE ‘MÍMESIS’ NA TEORIA DA
HISTÓRIA .....................................................................................................30
6. O NOVO OLHAR DO HISTORIADOR ..............................................33
7. MARX E A HISTÓRIA ...........................................................................40
8. A TEORIA CRÍTICA E A HISTÓRIA.................................................45
9. O FIM DA HISTÓRIA?..........................................................................52
POS-MODERNIDADE E HISTÓRIA .....................................................54
ORIGEM DOS TEXTOS .............................................................................67

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

APRESENTAÇÃO

Depois de 30 anos do magistério da disciplina Teoria da


História, em várias instituições de ensino, resolvi brindar meus
alunos com uma seleção de textos – escritos ao longo desse
período – sobre a Filosofia da História. O objetivo era
apresentar um conjunto de textos que cobrisse, de forma
panorâmica, desde uma nova introdução aos estudos
históricos (disciplina do qual fui professor durante vários
anos), passando pela evolução da narrativa histórica e sua
metodologia, até chegarmos à essa época “pós-moderna” da
semiurgia ou dos “jogos de linguagem”, tipicamente
nietzschiana e neo-nomialista. Isto sem descurar da influência
poderosa tanto do pensamento marxista como da teoria Crítica
sobre a Teoria da História. Julguei oportuno acrescentar um
pequeno escrito sobre a retirada da obrigatoriedade do ensino
de História, no curso médio. Acredito que por si só tal
medida fala com eloquência sobre os tempos obscurantistas e
pragmáticos que nos foi dado viver com o golpe institucional
ocorrido no ano passado. Assim, esta pequena brochura é
também uma prestação de contas da minha atividade
acadêmica nessas últimas três décadas, como responsável pelo
ensino de teoria no departamento de História, da UFPE.

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

1. UMA NOVA INTRODUÇÃO À HISTÓRIA

“A minha matéria é o presente,


Os homens presentes, a vida presente”.
(Carlos Drummond de Andrade)

1.1. A História como Paixão

Uma famosa tese historicista afirma que cada geração


reescreve a História segundo as suas necessidades.
Independentemente do relativismo que isso implica, não se
pode negar que o trabalho do historiador serve, em primeiro
lugar, à vida, à sua vida e a de seus contemporâneos. Dessa
forma é possível dizer que a pesquisa histórica e, sobretudo, o
ensino de História é indissociável da construção da cidadania
política e social. Aliás, a própria escrita histórica só existe como
afirmação desta cidadania. Onde não há liberdade de
pensamento e de expressão, não há História, mas a supressão
da(s) memória(s), e existe apenas o discurso solitário do Poder.
Pensado desta maneira, o ensino da História só pode ser crítico,
e a atividade do historiador um exercício do pensamento
crítico, ou seja, uma atividade demitificadora por excelência, e
não apenas desmistificadora, sob pena de incorporar à
formação das pessoas novos mitos, como expressão definitiva
da verdade. Se a História pode ser concebida assim, a sala de
aula não será menos do que um espaço para a invenção, para a
criatividade, para o fomento de talentos que brotam
espontaneamente todos os dias diante do professor. Nada mais
contrário, portanto, ao espírito dessa História que uma
concepção dogmática da teoria e uma pedagogia (autoritária)
que prejulgue o resultado da aprendizagem dos alunos,

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padronizando comportamentos, atitudes e valores. Com tal


pedagogia, só produziríamos seres heterônimos, massa de
manobra para futuros regimes autoritários.
Já se disse mais de uma vez, que a História é vida. E a
crônica histórica, o cadáver da História. Esse modo de ver a
História tem a grande vantagem de conceber a atividade do
historiador como algo essencialmente dinâmico, criador,
construtivo. Alguém que constrói tanto a imagem
(caleidoscópica) do passado, como a vida presente, dos
homens presentes, como afirma o poeta. A rigor, não existe o
passado, como o cadáver da História, à espera do legista-
historiador para a realização da necropsia (crônica histórica).
Onde não há mais vida ou uma forma de interpelação qualquer
ao presente, não há História, passado histórico. Tudo que
interessa aos homens é solidário com o seu destino. Dessa
forma, até o passado só tem sentido através da interpelação
que lhe faz o presente. A História é vida ou não é História.
“Só quem deseja fortemente identifica os elementos
necessários à realização da sua vontade: porque só a paixão
aguça o intelecto e colabora para a intuição mais clara”, disse o
italiano Antônio Gramsci. Se for possível traçar aqui as linhas
de uma teoria do conhecimento histórico compatível com a
tese historicista, exposta no início desse texto, esta teoria só
pode ter como elemento-motor o desejo, a vontade, a paixão.
Nada mais estranha a esta perspectiva do que a
pseudoneutralidade do Positivismo. Quanto mais passional,
quanto mais apaixonado, mais verdadeiro. Não existe História
e historiador sem paixão. Pelos menos, história humana. Na
busca do objeto histórico, quem aparece em questão é o
próprio historiador, seus sentimentos, valores, angústias e
expectativas. Não existe História, a rigor, fora desse penoso

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(mas digno) exercício de autorreflexão. A História serve, antes


de tudo, a nós mesmos, ao responder às nossas indagações. Só
depois, aos outros.
Isto tudo não significa um duro golpe de misericórdia
na objetividade do conhecimento histórico. Mas a certeza de
que os homens buscam a História para exorcizar seus dramas
íntimos (pessoais e coletivos), dar um sentido à sua vida
(pessoal e coletiva). Neste sentido, falar de objetividade
histórica é pensar na necessária referencialidade desse
conhecimento e dessa objetividade aos homens do presente, da
vida presente. Não há objetivo humano exterior à subjetividade
humana. Os homens de cada geração põem seus próprios
objetivos, reelaboram constantemente a verdade do
conhecimento histórico. Fora disso, é pensar a História como
mera erudição, uma coleção de saberes mortos, inúteis e
definitivamente perdidos para à sociedade. (Nietzsche).
Se essa História nada nos ensinar, pelo menos realizará
uma formidável catarse político-social, humana e existencial. E
isso não será pouca coisa.

1.2. História: ciência do real ou ciência do


imaginário?

A História começou como crônica. Mas atingiu a sua


maturidade científica como explicação da realidade social. As
veleidades científicas da nossa disciplina são frutos da época
moderna. Foi com o Iluminismo que os historiadores
alimentaram a ilusão de poder captar o sentido, a direção, as
leis que determinariam o movimento da História. E neste
ponto, foram herdeiros de duas grandes influências culturais
do século XIX: o Positivismo e o Evolucionismo. Do primeiro,

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retiraram o império da causalidade, concebendo a História


como uma disciplina nomológica, por excelência. Do segundo,
a estreita analogia entre a marcha da natureza e a marcha da
História, como se esta última fosse um mero prolongamento
daquela.
Balizado por essas duas grandes influências, aparece o
Materialismo Histórico (MH) como a realização mais acabada
de uma teoria do conhecimento histórico realista, racionalista
e progressista. Isto significa dizer: um discurso positivo sobre
a História, concebido como expressão do ser social e
profundamente convencido do poder da razão em captar o
movimento da realidade (suas leis “naturais” e
“independentes” da vontade humana) e da existência de uma
racionalidade no mundo histórico, tendencialmente boa,
libertadora e humanitária.
Ao lado de outras tendências historiográficas de base
realista, o Materialismo Histórico se volta para uma explicação
daquilo que é, do ser social de cada época. Ao reconstruir as
demais instâncias da realidade social como determinações
subordinadas a uma essência primordial, a um fator único. O
faz as instituições políticas e culturais aparecerem como
realidades de segunda ordem, fantasmagóricas. Numa de suas
versões mais divulgadas, a teoria marxista passa por ser uma
filosofia da História de sabor evolucionista, determinista,
unifatorialista, cuja direção é pré-determinada. Seu ator:
Joseph Stalin.
Se a Modernidade Cultural foi responsável pelo
surgimento das grandes explicações da História, de base
realista e racionalista, hoje é possível afirmar que a ênfase não
se dirige tanto para o que é, mas para o que pode ser. Enquanto
o enfoque das teorias modernas da História ia para as

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

condições de reprodução do ser social – entendida esta como a


esfera essencial da realidade – as tendências “pós-modernas”
visam sobretudo os sonhos, as fantasias, o imaginário da
coletividade. Tal mudança tem haver tanto com as crises do
chamado “socialismo real”, quanto com as formas de
dominação do capital monopolista nas sociedades “pós-
industriais”.
A recuperação do sonho, nos paraísos
concentracionários em que se tornaram as sociedades
ocidentais é um claro alerta para a importância do elemento
crítico-utópico desaparecido dos nossos projetos de
emancipação social. E também o lembrete de que as nossas
concepções “mais científicas” de sociedade comportam sempre
uma boa dose de indeterminação histórico-social. Dessa forma,
caberia ao historiador “psicanalisar” as imagens do desejo
produzidas no imaginário social. Tais imagens poderiam
revelar as virtualidades sócias humanas inibidas pelo
desenvolvimento histórico efetivo. E antecipar (ou reatualizar)
as formas de sociabilidade mais fraternas, mais justas. A
reiteração do foco sobre a esfera da reprodução social só
ajudaria a perpetuar a memória da dominação social. Daí o
caráter mais estratégico dessa nova historiografia, mais
preocupada agora com a transgressão (ainda que fictícia) da
realidade efetiva. Neste ponto, o discurso artístico aparece sem
dúvida como a grande referência dessa modalidade de
conhecimento histórico, exatamente por ser um discurso-
limite.

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2.3. Uma História sem fontes?

O discurso histórico sempre se distinguiu do discurso


artístico ou filosófico pelo seu recurso às fontes. Estas sempre
foram apresentadas como a garantia da verdade do
conhecimento histórico. Segundo esse modo de ver, haveria
uma tipologia mais ou menos evidente das fontes históricas:
documentos impressos, monumentos, retratos, registros
sonoros etc. A fonte era a legítima depositária da evidência do
fato histórico. E era tão evidente – em sua morfologia – como
aquele.
Essa ciência da fonte histórica - denominada de
Heurística – vem sendo profundamente rediscutida, a par da
mudança do próprio conceito de História. Para um historiador
mais preocupado com os sonhos do que com a bruta
necessidade do corpo social, tal definição de fonte é
visivelmente insatisfatória. Em certo sentido, podemos afirmar
que o historiador cria as suas fontes. E que estas não
preexistem a ele, na medida em que só podem ser descobertas
a partir das questões que ele formula ou aponta. Ao interpelar
o real é que o historiador terá a ideias sobre que tipo de fonte
lhe servirá. Ou ainda, o que arrancar das mesmas fontes,
fazendo-as se pronunciar sobre o que lhe convém.
Essa nova postura diante da História faz com que o
historiador alargue o seu conceito de fonte para materiais não
convencionais, tais como: a literatura, a música, o cinema, os
mitos, os sonhos, as receitas gastronômicas etc. A incorporação
de tais elementos ao domínio da Heurística não só estabelece
um novo modo de relacionamento do historiador com as suas
fontes, mas também com um novo tipo de História.

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

A partir daqui, operamos com a noção de que o novo


historiador produz suas próprias fontes históricas. E que, no
limite, seria possível escrever uma (nova) História, sem fontes.
Ficção ou realidade?
Pergunta desprovida de sentido, para alguns, desde o
momento em que a realidade se tornou uma autêntica
fantasmagoria social. E uma indústria de fantasias (a indústria
cultural) passou a produzir a nossa (i)realidade cotidiana.
(Humberto Eco)

2.4 É possível periodizar a História?

Alguém afirmou certa vez que só sabe periodizar a


História, quem dela tem uma compreensão mais profunda,
mais filosófica e abrangente. No entanto, o privilégio da
periodização histórica só cabe a quem julga possuir o
verdadeiro segredo da História. Só aquele que tem o domínio
conceitual da mecânica do processo histórico saberia
periodizar a História.
Na presunção da posse de tal saber, alguns equívocos
mais ou menos graves foram cometidos. O primeiro deles é
certamente o do etnocentrismo. A mais conhecida e tradicional
das periodizações históricas (História Antiga, História
Medieval, História Moderna e História Contemporânea) tem a
Europa, ou pelo menos parte dela, como centro. A história da
humanidade é periodizada a partir da história de algumas
nações europeias: Inglaterra, França, Espanha, Portugal etc.
Ora, o que está implícito nesta maneira de periodizar é certo
ponto de vista colonialista, metropolitano, etnocêntrico,
revestido de uma falsa universalidade, que escamoteia a
dominação e desrespeita as diferenças étnicas, raciais e

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históricas. Ao ser aceita essa forma de periodização, teríamos


de aceitar a tese de que o capitalismo escreve – ainda que por
linhas tortas – toda a história universal, criando pioneiramente
uma História mundial, em lugar das várias histórias regionais
separadas. Um segundo equívoco diz respeito ao sócio
centrismo. Isto é, a utilização de um elemento-chave num
determinado sistema socioeconômico, como critério universal
de periodização da História. Dessa forma, extrai-se, por
exemplo, a técnica, a política ou a religião e se aplica,
indistintamente, a toda a história da humanidade um ou outro
desses elementos, num flagrante anacronismo histórico.
Assim, não se justificaria a interpretação da História do Egito
ou da Mesopotâmia, a partir da importância que a economia,
ou desenvolvimento tecnológico passou a ter nas sociedades
ocidentais com o advento do capitalismo.

2.4.1. Mas o que vem a ser um período histórico?


Se for possível periodizar a História, a ideia da fixação
de um período histórico determinado deve guardar certas
características: unidade, homogeneidade, descontinuidade em
relação a períodos anteriores e posteriores etc.
Excetuando-se as periodizações que tomam como
critério de fixação de seus períodos históricos, motivos
superficiais, tais como: batalhas, tratados, declarações,
episódios biográficos de supostos “luminares” do
desenvolvimento histórico, dispomos de duas maneiras de
periodizar a História: uma que podemos chamar de
“conjuntural”, e outra de “estrutural”. A periodização
conjuntural é aquela de curta duração na história de uma
sociedade. E sua dinâmica repousaria na

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

estabilidade/instabilidade do sistema de alianças das classes


sociais. Assim, cada vez que se verificasse uma variação na
correlação de forças num dada sociedade, seria possível definir
um novo período, uma nova fase. Como se percebe, tal
periodização tem mais a ver com a história política, com a
desenvoltura das classes e camadas sociais na cena política do
que com uma ruptura histórica. A periodização estrutural é a
que se refere a uma longa duração. E se elemento-motor está
nas formas de propriedade, no nível do desenvolvimento das
forças produtivas, no grau alcançado pela divisão social do
trabalho, nas relações sociais. Trata-se aqui, como se ver, de
uma espécie mais rígida de critério, mais impessoal, mais
permanente, ao longo da História. Essa forma de periodização
já produziu uma taxonomia para a periodização histórica,
organizada em torno da categoria (abstrata) de modo de
produção (articulação dinâmica e historicamente situada entre
os elementos acima mencionados). Segundo tal taxonomia,
teríamos um modo de produção asiático, um modo de
produção antigo (escravista patriarcal), um modo de produção
feudal, um modo de produção moderno (capitalista) e,
finalmente, um modo de produção comunista; com que se
encerraria a “pré-história da humanidade”. A periodização
estrutural, tal como tem sido utilizada pelos historiadores, tem
sido objeto de muitas críticas. A primeira delas é sem dúvida o
evidente anacronismo da aplicação a épocas históricas
distintas, de critérios cuja importância tem a ver, sobretudo,
com a História do capitalismo. Nesse sentido, o papel das
formas de propriedade e o desenvolvimento das forças
produtivas e das relações de produção estaria
superdimensionado – como fator decisivo – na periodização de
toda a história da Humanidade. Mais grave seria, no entanto, o

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

acento teleológico presente em tal forma de periodizar, que


faria de todo desenvolvimento histórico uma caminhada com
uma direção e um ponto de chegada pré-determinados. Isto
para não falar no determinismo implícito nessa concepção de
História. Pensada desta forma, essa periodização não passaria
de mais um subproduto de uma filosofia da História, tão
idealista e abstrata como as demais. A esse respeito, não custa
mencionar a observação crítica de Marx, apontado como o pai
dessa teoria da História: “Estas abstrações, separadas da
história real, não possuem valor algum. Podem servir apenas
para facilitar a ordenação do material histórico, para indicar a
sequencia de suas camadas singulares. Mas deforma alguma
dão, como a filosofia, uma receita ou esquema onde as épocas
possam ser enquadradas”. (A ideologia alemã).

(1991)

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

2. A TEORIA DA HISTÓRIA
AO LONGO DO TEMPO

Durante muito tempo, os estudiosos da Teoria da


História mantiveram uma compreensão unívoca da palavra
“História”, entendendo a nossa disciplina como um simples
relato (récit) dos principais fatos do passado. Estávamos na
infância metodológica dos estudos históricos. Mal sabíamos
que havia uma dúvida metódica a resolver sobre a
representação discursiva do passado. Até mesmo nossos
mestres da Antiguidade Clássica, baseados nos primeiros
narradores gregos, subestimaram a complexidade da narrativa
histórica, estabelecendo uma inaceitável comparação entre o
caráter mais filosófico da Poesia e o mais particular da História.
Isso como se e o relato dos nossos primeiros historiadores
fosse um tipo de mimeses elementar, auto evidente, que
dispensasse qualquer dúvida ou interrogação. Ao contrário, a
crítica moderna veio revelar a dimensão verdadeiramente
alegórica, polissêmica das narrativas, aparentemente,
despojadas de Heródoto, para não falar na razão pragmática de
Tucídides. Estamos de volta ao começo. O que faz uma boa
narrativa histórica?
A verdadeira crítica da razão histórica só surge em
meados do século dezenove, com o questionamento do
paradigma naturalista popularizado pelo Positivismo, e que
pretendia estender às ciências humanas o modelo das ciências
naturais. Dessa forma, a História não passaria de uma mera
extensão da metodologia generalizante da Física, Química,
Biologia etc.

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

A reação a esse naturalismo ingênuo veio da escola


alemã representada por Wilhelm Dilthey, que propôs uma
separação radical entre as ciências naturais e a sua pretensão
nomológica e universalizante, e as ciências hermenêuticas
preocupadas – sobretudo – em estabelecer o significado da
experiência humana, em todas as épocas. O historicismo seria
lembrado como a origem do discurso que inaugura o
continente da História. A contribuição metodológica de Dilthey
não foi devidamente avaliada até a chamada crise da
modernidade, que atingiu em cheio o pensamento iluminista e
seus subprodutos; particularmente as teorias de forte sabor
naturalista. Aqui, a chamada crise da racionalidade
instrumental atingiu de frente os pais fundadores do
pensamento social moderno: Durkheim, Weber e Marx. O
questionamento da razão iluminista, seja pela tradição ou pela
pós-modernidade, provocou a fenda por onde passaria tanto
uma historiografia inspirada na vontade de poder, quanto por
uma historiografia preocupada com a dimensão simbólica da
História e a Utopia. Só depois de tensionado o elegante edifício
da historiografia iluminista (e sua pretensão nomológica) foi
possível as contribuições críticas da escola alemã.
Aqui é preciso fazer uma profunda diferença entre a
concepção estratégica do discurso histórico (Foucault) que
esvaziou o universo da linguagem de toda e qualquer
pretensão de validade cognitiva, moral ou expressiva, ao
transformar a narrativa numa mera racionalização de um
imperativo de poder, com sua história das representações
discursivas: daquela outra que tomam a linguagem como meio,
por excelência, do esclarecimento e da emancipação, hoje
representada pelo filósofo alemão Jurger Habermas e a sua
Teoria da Ação Comunicativa. Ambas as correntes pretendem

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

supera as contradições e lacunas do velho pensamento


iluminista, erigindo a linguagem em meio fundamental de
compreensão da realidade. Só que um demoniza e o outro tem
uma visão angelical da mesma. Um privilegia os imperativos de
poder: o outro, as pretensões de validade do discurso filosófico
e o processo argumentativo. Na visão do segundo, o conceito
mesmo de cotidianidade tem uma importância estruturadora
para a História, mas apenas como uma construção de atos de
fala comunicativos.
Uma variante desse segundo modelo é aquela
representada pelo pensamento polifacético de Walter
Benjamin, com o seu messianismo utópico cujas bases se
encontram numa certa concepção de linguagem. Esse autor
talvez seja o que mais exemplifica não só o profundo mal-estar
da modernidade, como seu racionalismo crítico e
caleidoscópico, mas por reunir numa mesma visão a
valorização da linguagem, como forma de conhecimento
histórico e o resgate da dimensão utópica do relato histórico. O
nosso pensador pressupõe uma faculdade mimética da
linguagem humana que vai muito além da sua função
pragmática ou comunicativa. A faculdade mimética é criadora,
evoca coisas e pessoas, ao chama-las pelo seu nome. Neste
ponto, a linguagem vem a ser mais do que o exercício da
dominação social ou da comunicação, e passa a ser o campo da
criação histórica, por excelência. É o que os críticos chamam de
função expressiva da linguagem.
Mas se o mundo é feito de símbolos, o método do
historiador só pode ser uma hermeutica fina, que resgate os
significados da escritura do mundo. Exegese esta de um tipo
muito especial: reconstrutiva, reescritiva da História, uma vez
mediada por uma operação crítica que desconstrua o sentido

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

aparente das palavras e liberte os significados latentes, aqueles


que foram ocultados pelo processo de transmissão da memória
histórica. Vem daí o acento utópico desse messianismo
histórico. A tarefa do historiador é salvar a História, leia-se as
esperanças e os anseios dos nossos antepassados.
Hermenêutica e utopia, essas as armas do novo historiador-
messias, em busca das significações escamoteadas ao longo do
tempo, pelo discurso competente da dominação social. Aqui,
vale apena transcrever os versos de Fernando pessoa:
“Ah! Quem escreverá a história do que poderia ter sido?
Será esta, se alguém a escrever, a verdadeira história da
humanidade.
O que há é o mundo verdadeiro e não nós.
Somos que nos supusemos ser e nunca conseguimos”.
(“Pecado original”)

(2006)

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

3. PROVA E RETÓRICA NA
TEORIA DA HISTÓRIA

Excetuando-se as antropologias filosóficas de


inspiração neokantiana ou nehegeliana, que enfatizam a
linguagem na construção do “logos” ocidental (daí, por
exemplo, a importância do mito na constituição do saber
histórico), a principal tradição dos estudos teóricos sobre a
História, deita raízes no chamado realismo epistemológico,
desde logo associado ao nome do filósofo grego Aristóteles.
Aliás, toda a filosofia grega clássica (de Sócrates a Aristóteles)
não fez outra coisa senão defender, perante os sofistas e
mitólogos, o império da razão e o mundo real contra a opinião
e o mundo das sombras.
A posição aristotélica está bem demonstrada em A
Poética e, sobretudo, na Retórica, onde aparece a questão da
prova. Na Poética, o filósofo estagirita contrapõe o relato
realista (que trata do que realmente aconteceu) produzido
pelos primeiros historiadores (Heródoto e Tucídides) ao relato
virtual e fictício dos poetas e artistas (que tratam do que
poderia ter acontecido), exaltando as características do
segundo em face da estreiteza do primeiro. Se nesse trabalho,
Aristóteles parece dar razão aos poetas e reconhecer a
superioridade da poesia diante da História, é, no entanto, na
Retórica, contra os sofistas, que aparece o realismo do autor,
ao colocar a necessidade da prova para os atos retóricos
apresentados por aqueles com o fim de agenciar o público das
assembleias e tribunais.
A posição aristotélica sobre a importância da prova na
historiografia prosperou, encontrando nos eruditos medievais
Lourenço de Valla e Mabillon, grandes aliados. E preparando a

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

seguir o apogeu da historiografia positivista, toda ela calcada


no modelo do naturalismo cientificista. Foi preciso esperar o
gênio de René descartes, Dilthey e Nietzsche, para assistir ao
nascimento da “suspeita metódica”, como cânone da
historiografia moderna. Descartes e Dilthey prepararam o
terreno para aquele que consagraria, na nossa época, a retórica
como linha mestra dos estudos históricos.
Nietzsche, ao questionar o fundamento ontológico do
mundo histórico e colocar as assertivas morais, científicas ou
históricas, no marco de uma filosofia da vontade se poder,
inauguraria o nominalismo da filosofia moderna.
Com Nietzsche, a retórica vigava-se da prova e punha
outra vez as estratégias discursivas no primeiro plano da
teoria. Estratégias sempre a serviço de imperativos de poder.
No período contemporâneo, marcado – aliás – por uma
profunda crise da razão e carente de outros paradigmas
teóricos, esse duelo entre a prova e a retórica estaria
representado pelos nomes de Michel Foucault e Carlo
Ginzburg, O primeiro se inspiraria abertamente em Nietzsche
e no legado dos sofistas, ao evacuar do campo das práticas
discursivas qualquer sinal de realidade ou referência externa.
O segundo procuraria resgatar Aristóteles, mas – sobretudo- o
da retórica, corrigindo o entusiasmo do filósofo grego pelo
conhecimento virtual e fictício dos poetas e artistas.
Ao realçar a importância da prova nos estudos
históricos, Ginzburg atingiria Hayden White e Michel Foucault,
denunciando uma modalide de nominalismo contemporâneo.
Mas o realismo de Ginzburg seria do tipo moderado,
conjectural, hipotético e individualizante, diferente da
modalidade positivista do passado.

(2006)

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REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

4. LINGUAGEM E HISTÓRIA

“Tudo seria perfeito se o homem pudesse fazer as


coisas duas vezes”, com esse pequeno ditado de Goethe seria
possível iniciar a discussão entre linguagem e história, ou a
origem, a transformação e as funções da linguagem humana
através do tempo, na obra do filósofo alemão Walter Benjamin.
O impulso ontogenético de repetir ou reconhecer as
semelhanças entre as coisas está na base dos estudos
benjaminianos da linguagem humana. A esse impulso, ele dá o
nome de mimese ou faculdade mimética. Esta faculdade é a
origem mais remota da linguagem dos homens. Ela só foi
precedida pela onomatopeia e a dança.
A manifestação mais antiga dessa faculdade mimética,
na história biográfica do indivíduo, é o jogo e a brincadeira.
Através da atividade lúdica, a criança não se limita a copiar o
mundo e as atitudes e gestos dos adultos, mas ela recria o
mundo, resinificando os objetos e as práticas culturais ao seu
redor. Neste sentido, brincar é mudar o mundo por meio das
palavras, dá-lhe um novo sentido.
A atividade mimética do ser humano – como
brincadeira – é um eterno recomeçar, recopiar, recriar a
realidade. E o prazer da criança (como do adulto criador) está
nesta repetição infinita, que não é mera repetição, mas
recriação. Originalmente o impulso mimético se contenta em
repetir, copiar ou reproduzir. Depois, ele passa a estabelecer
conexões e analogias entre as coisas, de uma forma ampla e
aparentemente sem relação de semelhança entre elas. É a
chamada semelhança não sensível ou mágica, ao pressupor
uma rede de correspondências invisível – a olho nu – entre

25
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

todos os seres e objetos. Essa rede de correspondências se


daria tanto no micro como no macrocosmo. E teria sobrevivido
até hoje na escrita e na fala, sendo, portanto o maior arquivo de
semelhanças não sensíveis existente.
A teoria benjaminiana da linguagem não se resume à
faculdade mimética, por mais importante que ela seja –
sobretudo em sua fase materialista. Essa teoria começa, na
verdade, com as especulações religiosas e místicas sobre a
origem da linguagem adamítica, a linguagem humana antes do
“pecado original”. Nesse tempo mítico, os homens chamavam
as coisas pelos seus verdadeiros nomes, fazendo as criaturas
falarem através da designação humana, traduzindo sua
essência espiritual em sua essência linguística. Cada nome,
cada coisa.
A linguagem adamítica não possuía nenhuma função
comunicativa ou pragmática: seu fim era comunicar a si
mesma. Sua função era designativa: por meio dela, eram
evocadas as coisas. Só o homem tinha esse poder de fazer as
coisas falarem através de sua linguagem. Isto porque a
linguagem humana participava da linguagem divina, aquela
que criou o mundo do nada a partir dos nomes de cada coisa.
Por participar do verbo divino, o verbo humano conservou o
poder de chamar cada coisa pelo seu próprio e dar voz à mudez
da natureza. Mas, com “o pecado original” a função designativa
da linguagem humana se perverteu e assumiu as funções
comunicativas e pragmáticas.
A linguagem dos homens perdeu a sua função mimética
e nomeadora e se tornou manipuladora e falsa. É a linguagem
do direito, da ciência e da política, que submete as coisas e as
pessoas a objetivos, interesses e propósitos distintos da sua
essência espiritual e linguística. Ao estabelecer “a vontade de

26
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

verdade” como motivação para nomear as coisas, a linguagem


humana foi submetida a uma “vontade de poder” que julga,
sentencia e condena, em tudo distinta da função nomeadora e
designativa da linguagem adamítica.
Neste ponto, o nome não passaria de mera convenção
ou código linguístico designação aleatória, acidental, sem
nenhuma relação com a essência linguística ou espiritual das
coisas. Cumpriria à linguagem da arte, da poesia, da literatura
restabelecer, talvez, a função mimética perdida ao resgatar da
linguagem corriqueira os ecos da linguagem adamítica. Daí a
sua função lúdica ou mágica.
A última fase da teoria benjaminiana da linguagem está
associada à alegoria, “o dizer o outro”, a linguagem da
alteridade semântica. Depois da fase mágica (mimeses), da fase
religiosa (a linguagem dos nomes), a fase alegórica tem, na
obra do autor, duas fontes de inspiração: a) a concepção
barroca da História; b) a teoria do fetichismo da mercadoria. a)
a concepção barroca da História (A origem do drama barroco
alemão) se apresenta como a história dos vencidos, dos
malogrados, dos sofridos, de “quem falhei ser”, como diz o
poeta português. A visão barroca da História se apoia numa
total depreciação física e espiritual do mundo humano e
natural, como mundo imperfeito, pecaminoso, finito e tendente
a morte ou a mineralização da vida.
Para esta visão religiosa e teocêntrica, o mundo
humano – sem a graça divina – não tem sentido ou razão de
existir. Sendo, dessa maneira, uma mera matéria-prima de um
eterno processo de significação nas mãos de Deus. Nada tem
direito sobre si próprio. Cada pessoa, cada coisa pode significar
qualquer coisa, qualquer pessoa, como numa cadeia infinito de
sentidos onde cada elo significa o elo seguinte, numa distinção

27
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

entre significante e significado. Tudo morre e ressuscita na


mão do alegorista divino, para expressar sempre novas
significações. Esse é o nobre destino da criatura humana, num
mundo sem Deus e a graça divina.
A segunda fonte (b) para o estudo da alegoria na obra
de Walter Benjamin são os ensaios sobre Baudelaire ou o
chamado “Trabalho das Passagens”. Este amplo painel sobre as
transformações urbanísticas de Paris, na segunda metade do
século XIX é uma análise sócio crítica (Pierre Zima) da poesia
de Charles Baudelaire, segundo a ótica das mudanças
estruturais que ocorrem na Europa, depois da Revolução de
1848. Aqui, a principal chave teórica utilizada pelo autor é a
“Teoria do Fetichismo da Mercadoria” (Marx) tomada de
empréstimo do filósofo húngaro George Lucaks. Benjamin
mostra como o valor de troca das mercadorias produzidas pelo
mercado capitalista opera uma verdadeira ressignificação das
coisas e das pessoas, a partir de seu preço no mercado. O
capital transforma relações sociais (assalariadas) em coisa
(valor de troca) e coisas (valores de uso) em seres animados. O
seu significado é dado pelo preço fixado pelas relações de troca,
nivelando tudo e a todos pelo tempo de trabalho necessário
(tempo médio) para sua produção.
A mercadoria (valor de troca) ganha vida própria nas
vitrines e magazines das “Passagens” parisienses e a força de
trabalho (os operários) vira uma grandeza abstrata, usada
como cálculo para o preço das mercadorias. O produtor só se
encontra com o seu produto na qualidade de consumidor e não
de seu criador. Essa operação dá vida às fantasmagorias da
modernidade, expressas através das “imagens do desejo” que,
ora, são a manifestação das utopias do imaginário social, ora
mitos que reforçam as carências do produto social. O

28
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

socialismo é a utopia, ainda que misture o velho com o novo. O


capitalismo é o mito que reproduz o existente e enfeitiça o
consumidor, que pode ser ao mesmo tempo vendedor e
mercadoria – como o flaneur e a prostituta.
O papel do historiador será então psicanalisar as
imagens do desejo, separando o mito da utopia, e despertar a
sociedade para a transformação social (através da luta de
classes).

NOTAS

BENJAMIN, Walter. Sobre a linguagem dos homens e a


linguagem em geral. Obras Escolhidas. São Paulo: Brasiliense,
1985.

––––––. A teoria das semelhanças. Obras Escolhidas. São Paulo:


Brasiliense, 1985.

––––––. A faculdade mimética. São Paulo: Brasiliense, 1985.

––––––. A origem do drama barroco alemão. São Paulo:


Brasiliense, 1985.

––––––. Alguns ensaios sobre Baudelaire. Os Pensadores. São


Paulo, 1974.

––––––. Sobre o jogo e a brincadeira. Obras Escolhidas. São


Paulo: Brasiliense, 1985.

ZAIDAN FILHO, Michel. A crise da razão histórica. Campinas:


Papirus, 1989.

______. Ensaios de Teoria. Recife: NEEPD, 2012.

(2016)

29
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

5. SOBRE O CONCEITO DE ‘MÍMESIS’ NA


TEORIA DA HISTÓRIA

Ao contrário do que pensava Platão, que proibiu os


artistas e poetas de entrarem em sua república porque só sabia
copiar a cópia do mundo das ideias, o conceito aristotélico de
‘mimeses’ não significa cópia, imitação ou reprodução da
realidade. No pensamento de Aristóteles ‘mimeses’ significa
virtualidade, mundo virtual, e não o mundo realmente
existente. O poeta, segundo o filósofo grego, tem a liberdade de
ir além do realmente existente e recriá-lo, respeitando as leis
da necessidade e da verossimilhança. O conceito aristotélico de
‘mimeses’ é importante porque aponta para o mundo dos
possíveis, das possibilidades não realizadas, mas latentes no
passado.
Essa ideia de ‘mimeses’ iria prosperar na idade
contemporânea, quando os autores revisitando os antigos,
descobriram a abertura essencial do relato histórico,
entendendo que a história não tem fim. O leitor sempre pode
acrescentar novos projetos de leitura à representação do
passado, enriquecendo-o, ampliando-o. Nesse caso, o conceito
de ‘mimeses’ tornou-se reconstrutivo, recreativo e atingiu a
escrita dos historiadores. A historiografia se deixou influenciar
por essa modalidade de ‘mímesis’, e o relato histórico deixou
de ser uma mera racionalização da epopeia do vencedor (ou
seja a apologia do fato consumado) para se tornar uma
reinvenção do passado.
Mas esse conceito de ‘mimeses’ está estreitamente
associado a um novo conceito de tempo. Ao contrário da

30
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

temporalidade homogênea e linear da historiografia moderna


(iluminista), o historiador descobriu outra modalidade de
tempo chamada de ‘transtemporalidade’. A
‘transtemporalidade’ é a possibilidade de atualizar as
promessas, os sonhos, os projetos do passado no presente, de
forma a romper os limites rígidos da organização tradicional
do calendário histórico. Transtemporalizar a história é
resgatar as histórias não realizadas, mas latentes, esquecidas,
silenciadas pela historiografia oficial. É libertá-las do
esquecimento e do silêncio imposto a elas pelo relato linear,
retilíneo que transforma a necessidade histórica em virtude.
Seguir o tempo dos cronômetros e dos calendários, seria
simplesmente condenar os mortos a uma segunda morte. E
assim sucessivamente cada vez que a história fosse recontada.
Esse conceito de tempo, que tem a ver com uma hermeutica
reconstrutiva, teve vários defensores: Proust, Bérgson,
Benjamin, Braudel, Deleuze. Para estes, o tempo não é um mero
invólucro dos acontecimentos, mas é a carne da história,
continua vivo, pulsando e clamando pela libertação do passado.
O conceito de ‘mimeis’, como reconstrução do real, e de
tempo como transtemploralidade nos leva a discutir a natureza
do signo. Que tipo de signo se adequaria a essa nova escrita da
história? – Aqui o conceito de signo vai além da mera função
semântica das palavras, ou seja, a sua obrigação de significar. O
signo adequado à essa nova historiografia seria alegórico, e não
simbólico, entendido este como o signo da escrita da
dominação social. O signo alegórico é diferente: é polissêmico,
é ambíguo, ruinoso, de difícil compreensão, pois deve ludibriar
a censura política e social, deve comunicar conteúdos
proibidos pela lei e pela moral. O signo alegórico é o que melhor
se presta a essa hermeutica reconstrutiva, pois ele protege

31
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

conteúdos que subvertem a ordem social estabelecida. É a


forma de expressão da historiografia dos vencidos, dos que não
têm voz, dos foram silenciados pela história oficial. Dessa
forma, se assemelha à linguagem expressiva, criadora,
inventiva, e não à linguagem pragmática (do poder) ou a
linguagem comunicativa (descritiva do real). A alegoria, como
forma de expressão, é o signo ideal para o resgate das histórias
não contadas, não efetivada pela luta das classes sociais. Mas
nem por isso menos importante e cheias de ensinamentos para
as gerações futuras.

(2017)

32
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

6. O NOVO OLHAR DO HISTORIADOR

“Fantasia é realidade, realidade é fantasia”.


(Noite de Varranes)

l. Hoje, como nunca, a História ocupa o centro das


atenções. Ela está com frequência nos principais meios de
comunicação de massas, acessível a milhões de curiosos. À
“semelhança de outros ramos da cultura, tornou-se matéria-
prima dessa rendosa ‘indústria cultual’ da ‘Nova República”.
Seus temas, seus métodos e seus objetos empolgam agora um
novo e crescente público.. Basta uma rápida olhadela nas capas
de seus livros, para compreender essa recente popularidade.
Mas o que explica o estrondoso sucesso dessa “nova” História”?
2. Em primeiro lugar, sua relação com a “mídia
eletrônica”, os meios de comunicação de massa: entre o real e
o imaginário, vagueia o novo olhar da historiografia. Os novos
historiadores não só invadiram o domínio da “mídia”, como se
deixaram influenciar eles próprios pela relação da “mídia” com
a sociedade. Há como quê um acordo tácito em se abordar a
sociedade (e a História), a partir de um sistema de signos, de
uma economia política da significação. Não se fala mais em
“sociedade”, “realidade objetiva”, e sim em construção
imaginária do real. O que vale é a representação, as práticas
discursivas, a simulação – mais que perfeita – do real. Herdou-
se da “mídia” a convicção de que os meios de comunicação de
massa (as mentalidades?) não só constituem uma realidade em
si mesma, mas também produzem os fatos, fazem a História. E
que, em consequência, o “em-si-mesmo” da realidade histórica
não é mais do que a matéria-prima da construção imaginária

33
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

do historiador. Ora, essa maneira de ver a História responde


por certa característica intertextual, interdiscursiva, da “nova
historiografia”, recuperando certo neokantismo comum às
filosofias da vida, da experiência, da intuição etc. Caímos, outra
vez, no domínio de uma historiografia nominalista que reduz a
História à experiência íntima do historiador e proclama
solenemente a incognoscibilidade absoluta do mundo histórico
(1)
Mas esse aspecto da “nova História” aparece também
associado ao afrouxamento das barreiras entre a História e o
Mito. Que significado pode ter o recuo de tais barreiras? – por
um lado, o combate à apologia do existente, feita indiretamente
pela pseudoneutralidade do positivismo: por outro, o combate
às “grandes sínteses” deterministas, teleológicas da História,
identificadas com bastante ênfase com um certo marxismo. O
novo historiador socorre-se do exemplo da criação literária e
artística, para resgatar a dimensão crítico-utópica do seu ofício
– sepultada pela escola positivista e certas apropriações
teóricas do materialismo histórico. A fantasia, o jogo e a ilusão
seriam, agora, o antídoto necessário a toda e qualquer
concepção triunfalista ou definitiva da História. (2) E um meio
formidável de denúncia do existente através das possibilidades
(do vir-a-ser) inibidas pelo desenvolvimento histórico efetivo.
Neste sentido, Walter Benjamin aparece, sem dúvida, como a
grande inspiração historiográfica do momento, embora seus
conceitos de “salvação” e “experiência” tenham produzido uma
grande controvérsia entre seus leitores, em busca do resgate
da memória dos oprimidos históricos.
3. O “novo” olhar do historiador recusa tanto a ideia de
uma monocausalidade na História, como a existência de um
único sentido para esta. Neste ponto, encontra-se mais perto

34
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

do relativismo dos antropólogos, A História possuiria tantas


causas quantas estaríamos dispostos a reconhecer e tantos
sentidos quantas culturas (ou sociedades históricas)
encontremos. (4) A ênfase recairia, aqui, na descontinuidade,
na ruptura, na diferença radical entre as culturas, as
sociedades, as épocas históricas. Nada de comparação, nada de
etnocentrismo. Cada cultura é o centro de si mesma, com o seu
sentido e suas causas próprias. Navegamos, assim, na mais
absoluta falta de sentido ou na multiplicidade de todos os
sentidos (e causas) possíveis. Talvez devêssemos obedecer
aqui a certo preceito “pós-moderno”: não violar com a vontade-
de-saber o doce mistério de cada fragmento da realidade. (5)
4. Ora, esse relativismo nos introduz numa outra forma
de olhar a História: o olhar etnográfico dos antropólogos. O
novo historiador é aquele que contempla com “estranheza” o
seu objeto. É esse “estranhamento” que o habilita a rever
criticamente o cotidiano da sua e de outras sociedades. (6) E de
apresentar o todo (as instituições e as macroestruturas da
História) a partir de cada fragmento da sociedade. O nosso
etno-historiador só se interessa pela dimensão micro, capilar
da História – essa esfera por onde escorre desapercebidamente
a reprodução da ser social. É oportuno acrescentar que o
privilegiamento dessa visão se dá na base de toda uma
reabilitação do cotidiano, nas sociedades “pós-industriais” –
não mais pensado exclusivamente como a instância primordial
da alienação social.
5. Esse olhar antropológico nos conduz, por sua vez, a
duas temáticas de eleição dos novos historiadores: a história
do cotidiano e a história das mentalidades. E aqui é necessário
fazer uma precisa distinção entre aqueles que realizam, a
propósito de uma micro historia, um verdadeiro

35
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

“esmigalhamento” da sociedade (7) produzindo “uma poalha


de anedotas”, de dados dispersos, de instantâneos, que nada
têm a ver com o verdadeiro cotidiano, e aqueles que trabalham
com a ideia de que “ o cotidiano só tem valor histórico e
científico no seio de uma análise dos sistemas históricos, que
contribuem para explicar o seu funcionamento”. (8) há,
portanto, cotidianos e cotidianos. Um pode levar a iluminar – a
partir de fragmentos de uma dada sociedade – uma totalidade
histórica determinada; o outro se constitui em forma de
entretenimento literário que nos desvia do essencial.
6. E a tão falada história das mentalidades, o que dizer
dela? – Aqui também há mentalidades e mentalidades. Uma
coisa é erigir estas últimas em instância autônoma e
independente da sociedade ou numa espécie de infraestrutura
substitutiva – como fazem alguns historiadores e filósofos (9)
Outra coisa é toma-la “no seu quadro material e econômico
(como) uma análise das principais obras no seu meio cultural
ou no seu enquadramento sociocultural”. (10) Ou ainda, uma
possibilidade seria trata-la a partir da “reconstrução analítica
da diferença” Entre o passado e o presente do historiador, tal
como fez Carlo Ginzburg, estudando a mentalidade de um
moleiro medieval (11) Outra coisa muito diferente seria fazer
projeções anacrônicas para épocas passadas, de questões bem
atuais (tais como, o homoxessualismo, o feminismo etc.(12)
Haveria que acrescentar, ainda, sobre a chamada
história das mentalidades, duas importantes observações
críticas feitas, aliás, por um novo historiador: primeira, a
ênfase recorrente na insistência nos elementos inertes,
obscuros de uma determinada visão de mundo. As
sobrevivências, os arcaísmos, a afetividade, a irracionalidade
tc. Ou a tendência em ver estas “mentalidades coletivas” de um

36
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

ponto de vista interclassista, sem distinguir as classes, o


gênero, o grau de escolaridade etc. (13)
6. Ao discutir a pertinência, o estatuto, o âmbito de
validade da “nova” História (com seus métodos, problemas e
objetos) o que está em tela é, na verdade, a falência ou não do
projeto da modernidade. Será que com estes novos temas e as
novas abordagens, já nos transportamos para um outro
terreno, a pós-modernidade, diante do fracasso da razão em
abordar de forma crítica essas novas questões (o sonho, o
prazer, o imaginário social) ou será possível repensar ainda
esses temas do ponto-de-vista de uma nova racionalidade?
(14) – Até o momento, a historiografia tem sido a história de
um certo tipo de razão – a razão estratégica, a razão técnica, a
razão do poder. Será que a única alternativa válida a essa
historiografia é a apologia do fragmento e da desrazão, ou será
que ainda é possível pensar o órgão do conhecimento histórico
a partir de outra forma de razão?

NOTAS

(1) Sobre isso, veja LE GOFF, Jacques. “História, o historiador


e os mass media”. In Reflexões sobre a História. Porto,
Edições 70, 1982
(2) Cf. DUBY, George. “O historiador, hoje”. História e Nova
História. Lisboa, Teorema, 1966
(3) Sobre isso, remetermos o leitor às observações feitas em
trabalho anterior: Imaginário e História. (Uma introdução
ao conceito de Historia de Walter Benjamin). Razão e
História, Brasília, UnB, 1988.

37
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

(4) Cf. ARIÉS, Felipe. “uma nova educação do olhar”. História e


Nova História; também VEYNE, Paul. “A história
conceitual”. In GOFF, Jacques. Nova história, Rio, Francisco
Alves, vol.1
(5) Cf. SCEVICENKO, Nicolau. “O enigma pós-moderno”. Pós-
modernidade. Campinas, Ed. Da Unicamp, 1988,
(6) Cf. LE GOFF, Jacques. “A história do cotidiano” in. História
e Nova História. Pág. 74 e ss.
(7) Cf. LE GOFF, Jacques. “A história – uma nova paixão”. In A
Nova História. Lisboa, Edições 70, 1977, pag.12, criticando
a fragmentação da História e reafirmando a necessidade de
uma” História total”.
(8) Cf. LE GOFF, Jacques. “A História do cotidiano”, in História
e Nova História, pag.79.
(9) Cf. as judiciosas observações de CARDOZO, Ciro Flamarion.
“Uma Nova História?” in Ensaios racionalistas. Rio,
Campus, 1988, P.99
(10) Cf. LE ROY LANDURIE. E. “Os caminhos da Nova
História”. In História e Nova História. Pag.52
(11) Cf. GINZBURG, Carlo. O queijo e os vermes. São
Paulo, Companhia das Letras, 1987, cujo prefácio á edição
italiana é uma excelente exercício de crítica metodológica à
chamada “História das mentalidades”. O autor faz uma dura e
pertinente crítica ao “irracionalismo” de Michel Foucault.

38
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

(12) Cf. GINZBURG, Carlo. O queijo e os vermes, pag.31.


(13) Cf. HABERMAS, J. A teoria da razão comunicativa.
Madrid, Taurus, 2 volumes.

(1989)

39
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

7. MARX E A HISTÓRIA

Quando em 1859 Karl Marx avaliou sua carreira


intelectual, condenou ao silêncio todas as suas obras
precedentes, exceto quatro. Afirmou que na Miséria da
Filosofia (1847) havia exposto pela primeira vez os aspectos
fundamentais de suas opiniões científicas, ainda que a sua
exposição fosse polêmica. E deu a entender que o mesmo podia
dizer-se do Manifesto do Partido Comunista (1848), do
Discurso sobre o Livre Comércio, do mesmo ano, e de uma série
incompleta de artigos intitulada Trabalho Assalariado e
Capital, publicada em 1849. Não mencionou os Manuscritos
Econômicos-filosóficos (1844), A Sagrada Família (1845), nem
as Teses sobre Feuerbach (1845), e falou – sem dizer o título –
do manuscrito de A Ideologia Alemã (1846) como um trabalho
que ele e Engels abandonaram alegremente à crítica roedora
de ratos.
Na verdade, o silêncio tácito de Marx sobre a existência
das suas obras filosóficas, àquela altura de sua evolução
intelectual, era um índice da presença de uma forte
ambiguidade que vincará sua produção teórico-política até o
fim da vida. Ambiguidade que pode ser expressa na dicotomia:
determinismo (causalidade) versus luta de classes
(objetivação). Instâncias de determinação ontológica da
sociedade que ora aparecem lado a lado; ora aparecem
isoladas, ora sobrepostas. Neste sentido, basta observar a
exposição lapidar da abertura da primeira parte do Manifesto:
“a história de todas as sociedades que existiram até nossos dias
tem sido a história da luta de classes”. E o prefácio à edição
alemã de 1883, onde Engels, explicando o “pensamento

40
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

dominante e essencial do Manifesto”, afirma: “que a produção


econômica e a estrutura social que necessariamente decorre
dela, constituem em cada época histórica a base da história
política e intelectual desta época; que por conseguinte (desde
a dissolução do regime primitivo da propriedade comum da
terra) toda a história tem sido a história da luta de classes”.
Isto, sem falar na polêmica exposição do famoso prefácio à
Contribuição à Crítica da Economia Política que sugere com
todas as tintas uma concepção da história como processo
(natural) sem sujeito, onde as classes entrariam tão somente
para “fazer o seu papel”, desde antes inscrito nas contradições
que lavrariam na base material da sociedade.
Essa ambiguidade – sempre presente no pensamento
de Marx – tem-se constituído num equilíbrio difícil de ser
mantido em face das tensões que o arrastam ora numa direção
ora noutra, transformando-o ou num discurso (positivo) do
método das Ciências Sociais e Históricas ou numa concepção
do mundo como outra qualquer.
De fato, em diversos momentos da produção teórica de
Marx podemos perceber essa tensão dialética. Ela está
presente, por exemplo, na previsão de que “algum dia a Ciência
histórica se incorporará à Ciência natural” (quando, então,
“haverá uma só Ciência”), posto que “a História mesma é uma
parte real da História natural, da conversão da natureza em
homem”; na defesa da busca da “lei dos fenômenos” como
tarefa precípua da ciência; ou, como está em O Capital, na
afirmação do ponto de vista de que o “desenvolvimento da
formação econômica da sociedade é assimilável à evolução da
natureza e à sua história”.
À primeira vista, um fio comum parece aproximar esses
dois momentos da evolução teórica de Marx: a relação entre

41
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

natureza e sociedade. Ou como diria ele: “Dar uma base à vida


e outra à ciência é, pois, de antemão, uma mentira”. Contudo,
tal aproximação é apenas aparente. No primeiro momento, está
implicada sua dialética da sociabilidade cuja mediação
fundamental é dada pelo trabalho (atividade vital, processo
vital, atividade produtiva etc.). Nesta ontologia dialética do
social, o homem (ou sociedade) e a natureza (o mundo
exterior) são puras abstrações vazias de qualquer sentido,
quando vistos em separado. Só existe natureza para o homem
e só existe o homem num processo de objetivação natural. Ou,
como diz Marx: a sociedade é pois a plena unidade essencial do
homem com a natureza, a verdadeira ressurreição da natureza,
o naturalismo realizado do homem e o realizado humanismo
da natureza. E essa dialética de sociabilidade – cuja definição
mais completa é a práxis – se materializa através do
fundamento ontológico da sociedade: o trabalho. É pelo
trabalho que o subjetivo se objetiva e o objetivo se subjetiva.
Daí as palavras de Marx: “para o homem socialista toda a
chamada história universal não é outra coisa, que a produção
do homem pelo trabalho humano, o dever da natureza para o
homem tem assim a prova evidente, irrefutável, de seu
nascimento de si, de seu processo de originação”.
Aparecem assim configuradas neste momento uma
ontologia do ser social, nucleada pelo trabalho (entendido este
como objetivação de ser genérico do homem), e uma
epistemologia cujo eixo é a dialética do subjetivo e o objetivo,
consubstanciada na práxis.
Outro é o momento do discurso do método
apresentado no Prefácio e no Posfácio de O Capital. Ali, a
relação entre natureza e a sociedade escapa à dialética da
sociabilidade, tal como expusemos acima, e resvala para o

42
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

terreno do evolucionismo e do positivismo, ao subsumir o


desenvolvimento da sociedade no da natureza, e ao silenciar
sobre a importância da mediação do trabalho (no intercâmbio
homem/natureza), substituída pela busca da “lei do
fenômeno”.
É preciso dizer que, no Prefácio e Posfácio de O Capital,
Marx se apresenta com um mero continuador e corolário da
economia política, como ciência implantada por Smith e
Ricardo. Aqui, o discurso econômico-científico se refere à
realidade que é apreendida nas formas positivas (as famosas
“leis econômicas do movimento da sociedade moderna”) que
são análogas em tudo às leis da natureza, denominadas por
Marx como leis naturais, que se impõe com necessidade de
bronze.
Colocado nestes termos, o discurso do método da
Crítica da Economia Política se separa dos pressupostos
ontológicos (negativos) da teoria social, e aquilo que, à luz de
tais pressupostos, não passava de objetivação fetichizada das
relações sociais humanas, que escapa ao controle dos próprios
homens – numa sociedade alienada e alienante, como a
burguesa – aparece como leis materiais ou objetivas que
devem ser tratadas como tal pela ciência da Economia Política.
Ao transformar a ontologia (dialética) do ser social
num discurso (positivo) do método da Economia Política, a
Crítica da Economia Política se transforma em Economia
Política se transforma em Economia Política “marxista”, com o
prejuízo de todo o vigor negativo-crítico – inspirado na
ontologia marxista. E a categoria filosófica fundamental do
trabalho – como autocriação humana – é substituída pela busca
de nexos causais que expliquem o “movimento da sociedade”.

43
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

A par dessa conversão metodológica, a ontologia do ser


social, vai-se transformar numa ontologia do ser em geral,
inspirada numa apreciação positivista do resultado das várias
ciências da natureza; surgindo então o materialismo dialético.
Nesta etapa, a dialética da sociabilidade, nucleada pelo
trabalho, vira nas mãos de Engels uma dialética da natureza em
geral, cujo motor é uma contradição abstrata que, além de ser
profundamente abrangente, não serve para nada. Aqui,
decididamente a relação entre natureza e sociedade se
consuma numa naturalização da história – cuja expressão
maior é o materialismo histórico, entendido como aplicação da
ontologia do ser em geral à sociedade e à história, e cujos
principais traços característicos se resumem em ser uma teoria
setorial fatorialista, evolutiva e determinista. Sobre isto, vale
chamar atenção para a formulação russa dessa teoria
especializada: o Tratado Materialismo Histórico, de Bukhárin;
Os Princípios do Marxismo de Plekhânov; e Materialismo
Dialético e Materialismo Histórico, de Stálin.
A essa altura, o legado de Marx será prisioneiro do
dilema de se tornar ou um discurso do método das ciências
sociais e históricas em geral – completamente dissociado de
seus pressupostos ontológicos originais -, ou uma “visão do
mundo” como tantas outras – desprovida de vigor crítico e sem
nenhuma validade científica.

(1984)

44
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

8. A TEORIA CRÍTICA E A HISTÓRIA

As relações entre o marxismo e a modernidade sempre


foram marcadas por uma boa dose de ambiguidade. Embora o
pensamento marxista seja herdeiro direto da filosofia clássica
alemã, particularmente da filosofia hegeliana, o contato de
Marx com a economia política liberal e o socialismo francês fez
desse pensador alemão um autor iluminista, que não só usou a
metodologia das ciências empíricas de seu tempo (vide a teoria
do reflexo e a teoria da evolução), como defendeu – em muitas
ocasiões – o legado da modernidade das críticas de filósofos
conservadores e utópicos. O próprio Marx definiu o seu
socialismo como científico – ou seja, amparado nas conquistas
intelectuais da modernidade – em oposição aos diversos tipos
de socialismo anteriores a ele. Mas onde essa ambiguidade se
coloca com muita força é, sem dúvida, no primeiro volume d’ O
CAPITAL. Aí, o autor tenta conciliar a teoria (filosófica) da
alienação com a crítica da economia política burguesa,
utilizando para isso a dialética hegeliana (ou o seu conteúdo
racional), como ele mesmo diz. Os autores positivistas que mais
tarde escreveram sobre a contribuição marxiana às ciências
humanas aconselharam abertamente o abandono dos
pressupostos filosóficos d’ O CAPITAL se quisesse salvar o
conteúdo científico da crítica da economia política burguesa
(sobre isto, veja-se a crítica de Lúcio Colleti, o autor mais
representativo dessa

45
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

corrente).

46
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

Infelizmente, essa ambiguidade só fez prosperar na


tradição marxista. Engels, o companheiro de Marx, pretendeu
dar uma base científica à sua dialética da natureza, sem se dar
conta dos pressupostos filosóficos da sua empreitada
intelectual. E Lênin pretendeu atacar, em vão, o agnosticismo e
o positivismo de sua época, lançando mão da teoria do reflexo,
em MATERIALISMO E EMPIRIOCRITICISMO. Todos aqueles que
se enfrentaram com a dura tarefa de compreender o método de
Marx tiveram que fazer uma opção entre se manter fiel ao
espírito utópico e crítico do marxismo ou capitular diante da
ciência positiva da segunda metade do século XIX. Gente da
estatura filosófica de Georg Lukács, que preferiu ficar com a
ontologia do ser social e a dialética da história, ou como Lúcio
Colleti que recomendou o abandono da filosofia clássica alemã,
ilustra bem esse dilema. Antônio Gramsci foi um bom exemplo
dessa ambiguidade filosófica, quando afirmou que o marxismo
era um historicismo radical e criticou a ideia (engelesiana) de
uma dialética sem história (a dialética da natureza). E Jean-
Paul Sartre tentou o impossível: conciliar a ideia de projeto
com a de estrutura, em A CRÍTICA DA RAZÃO DIALÈTICA.

47
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

Foi preciso esperar o movimento de renovação teórica


e metodológica da chamada “Escola de Frankfurt” para se ter
uma retomada clara do legado filosófico (hegeliano) da
dialética marxista. Sobretudo a crítica da razão instrumental
(científica) e a formulação de um outro projeto de razão, a
razão “negativa”, que se opunha ao momento da síntese (da
totalização) da razão dialética, mantendo o fragmento e o
momento da negatividade no percurso da dialética.
Horkheimer, Adorno, Marcuse e Benjamin, autores que
desenvolveram um estilo de reflexão avesso a qualquer
tentativa de sistematização do pensamento filosófico. Uma
verdadeira dialética da ambiguidade, como diria mais tarde o
crítico francês Pierre Zima (La Ambivalence Romanesque chez
Baudelaire, Proust et Kafka).

48
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

Desses autores, de longe o mais criativo e original,


inquieto e inspirador foi Walter Benjamin e seu sistema de
contradições em aberto. Como seria possível conciliar o legado
do judaísmo libertário da Europa Central (apoiado numa clara
recusa às promessas libertadoras da modernidade cristã) com
uma crença na revolução socialista, de Marx, Engels e Rosa
Luxemburgo?
É aqui onde se situam as aporias de um pensador
crítico e utópico que nunca deixou de se expressar através de
categorias filosóficas, como se a filosofia da práxis fosse uma
escatologia de base profana. Na verdade, Benjamin nunca
concordou com a ideia de que a redenção humana fosse da
ordem do profano (o telos messiânico) e o tempo da redenção
(Kairós) fosse o tempo cronológico. O anjo da História vem
exatamente para interromper (implodir o continum da
história) o tempo dos calendários e inaugurar uma nova

49
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

temporalidade messiânica (o tempo do agora, o tempo da


recognoscibilidade). Walter Benjamim se negou a conceder à
política realista, mundana, dos compromissos, qualquer
propósito sensato: como também se recusou a aceitar uma
ciência positiva da História. A visão judaica (e libertária) do
autor o levou a desconfiar sempre da História iluminista, com
seus reis-filósofos de bússola na mão. Neste ponto, a imagem
do “Ângelus Novus” e a sua montanha de ruínas que sobe até
os céus deve nos ensinar algo de muito importante sobre esta
concepção messiânica da História: o processo social da
humanidade não comporta só avanços e progressos, em
direção a um hipotético ponto Ômega, mas também contém
uma boa dose de retrocessos, barbárie e sofrimento. A dialética
benjaminiana utiliza livremente a linguagem e os
experimentos da vanguarda estética do século XX para
denunciar a tragédia desse mesmo século: os campos de
concentração e os genocídios de minorias. Provavelmente
nunca se utilizou tantas referências da cultura moderna para
se criticar impiedosamente a modernidade. Sob esse aspecto, o
marxismo de Walter Benjamin seria um duro crítico da
equação entre progresso técnico e progresso moral, ou que o
mero progresso técnico levasse automaticamente a redenção
da humanidade. E o fascismo foi talvez a melhor comprovação
desse equívoco: socialmente regressivo e economicamente
progressista.
Os comentadores e intérpretes da obra benjaminiana
opõem trabalhos e ensaios (e períodos) na trajetória do autor:
trabalhos como ensaios: O Narrador, As teses sobre o conceito de
História, A filosofia da Linguagem, Experiência e Pobreza, a
outros como “A obra de Arte na era de sua reprodutibilidade
técnica, a faculdade mimética, O autor como produto etc. Como

50
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

se houvesse dois autores num só corpo e numa só cabeça. Por


muito que se tente fazer, é inegável que essas ambiguidades e
contradições nunca foram solucionadas pelo autor. E nisso
consiste sua grandeza. Basta lembrar a famosa tese do
autômato e do anão, onde um simboliza a técnica, a ciência
positiva, o pensamento iluminista moderno: e o outro a
teologia, a fé, a utopia, a paixão. Haveria, por certo, um maior
desmentido do que esse para os que fizeram de Benjamin o
defensor unilateral da técnica e da ciência, sem levar em
consideração os perigos que uma tal posição acarretaria para a
humanidade?

Tal como Marx utilizou os pressupostos da filosofia


clássica alemã para realizar a sua fecunda crítica à civilização
burguesa-moderna, Walter Benjamin nunca abandonou os
pressupostos mágicos, românticos e messiânicos em sua
recusa a aceitar a modernidade capitalista. É onde reside a sua
enorme grandeza. (2016)

51
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

9. O FIM DA HISTÓRIA?

Quando o “muro do Berlim” ruiu, talvez


apressadamente demais, houve uma onda de euforia neoliberal
que pretendeu retificar a história contemporânea, extirpando
dela as páginas dedicadas à experiência socialista. Numa
leitura canhestra – influenciada por Alexandre Kojeve- da
filosofia da História de Hegel, apareceu um profeta nissei
chamado Francis Fukuyama que prognosticou o fim da
História, com isso querendo dizer que a democracia liberal e a
economia de mercado eram o ponto final da evolução política
e social da humanidade. Como disse então Eric Hobsbawn,
aquela era uma profecia de vida muita curta, logo depois veio a
guerra do Golfo e a roda da História continuou a girar.
Agora, apareceu no Brasil um estadista de Belo Jardim
cuja primeira medida é o fim da História, outra vez. 0 que tem
certos políticos para acertar logo a História, quando detém um
pouco de poder nas mãos? – Numa leitura freudiana, o gesto
poderia ser interpretado com o assassinato simbólico dos
professores de História do atual ministro. Lembre-se que ele
manteve uma polêmica azeda com seus mestres, na época da
escola parque do Recife, chamando-os de “subversivos”. É
como se vingasse deles, agora, retirando a disciplina do
currículo do ensino médio. Mas essa seria uma interpretação
rasa, superficial.
A retirada da obrigatoriedade do ensino de História, no
ensino médio, faz parte de um plano arquitetado pelo lobby dos
empresários do ensino, interessados no aligeiramento do perfil
do alunado. Para esses “educadores pragmáticos” a História
não tem a menor serventia para a formação de uma força-de-

52
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

trabalho barata e dócil, destinada a um mercado de locação de


serviços desregulamentado. Como, aliás, a Filosofia, a
Sociologia e as Artes. Para que tanta coisa (a formação
humanística), quando se trata de produzir “massa de manobra”
para a exploração desse capitalismo (rentista) selvagem? –
Deixa para os filhos da burguesia, da alta classe média, dos
herdeiros dos grandes impérios industriais, que precisam sim
de uma formação integral, ampliada, de perfil crítico, inventivo.
E que podem pagar – caro – por isso. É o reforço da divisão
social entre que manda e quem obedece. Quem tem e quem não
tem capital social, capital simbólico, capital intelectual.
A história já foi prisioneira de inúmeras práticas
discursivas. A mais conhecida é a história genealógica, de
Nietzsche e Foucault. A história, como mera racionalização de
uma vontade de poder ou de potência. Mas ela não só serve
para isso. A história é vida e não um cadáver embalsamado
para contemplação de eruditos. A história é o domínio dos
possíveis, da virtualidade, daquilo que ainda não é, mas pode
vir a ser. É essa a concepção de História que precisamos. Não a
história antiquária, ou a da erudição balofa e vazia. Não a
história como racionalização da epopeia do vencedor. A
história que está viva é a história das nossas utopias, dos
nossos sonhos, dos projetos de alteridade social.
Essa história nenhum avicultor poderá matar ou
suprimir. Pode reescrever ao sabor de suas conveniências
políticas. Mas ela sempre viverá, como ideia reguladora, a guiar
o ideal de justiça, de beleza, de verdade dos homens e mulheres
de boa vontade.

(2017)

53
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

POS-MODERNIDADE E HISTÓRIA

Ninguém hoje mais duvida de que vivemos uma


profunda crise de paradigmas nas Ciências. Crise relacionada
com os impasses da própria modernidade. Se o modernismo é
ou não um projeto inconcluso, como diz Habermas (1) na sua
tentativa de salvar o patrimônio crítico e utópico da
modernidade, pelo menos todos concordam com a ideia de que
seu legado responde por grande parte dos problemas ora
enfrentados pela humanidade. (2) Outra questão é, contudo,
saber se estamos diante de um novo paradigma científico, de
outras formas de sociabilidade, enfim, de uma Pós-
modernidade, anunciadora de rupturas e transformações em
relação à época moderna. Quanto a isto, já não há tanta
concordância assim. Mas há indícios da emergência (ou da
necessidade, quando menos) de novos paradigmas para o
pensamento e a sociedade ocidentais. (3) Vejamos em que se
baseiam aqueles que defendem o advento de uma (nova) era
pós-moderna (incluindo-se ai uma mentalidade pós-
moderna).
Os teóricos do pós-modernismo tematizam na
verdade a chamada “sociedade de consumo”. Fazem-no,
entretanto, a partir de uma perspectiva semiológica, ou seja, a
partir de um sistema de signos. (4) Na ótica desses pensadores,
a sociedade pós-industrial deve ser considerada, sobretudo,
como uma “semiurgia” geral, secundarizando um primordial
substrato ontológico (a economia, por exemplo) que
determinasse, em última instância, o processo de significação.
Tal sociedade seria comandada pelo império do signo, da
informática, dos meios de comunicação de massa. (5)

54
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

Ora, essa onipotente “semiurgia” seria responsável por


toda uma “cultura do simulacro”, cujo principal efeito seria a
elisão da realidade. Ou seja, baseada num modo de produção
em série, possibilitado pelos modernos meios de reprodução
tecnológica, a sociedade “pós-moderna” já não operaria mais
com o “real-em-si mesmo”, mas sempre com a cópia, o
simulacro – mais que perfeito- dessa realidade, produzindo
uma irrealidade cotidiana. (6)
Essa teoria semiológica da sociedade contemporânea
(a “sociedade do simulacro”) implica numa série de
consequências para o pensamento historiográfico
contemporâneo.
Em primeiro lugar, ela corrói o substrato ontológico
do conhecimento histórico, na medida em que o real é
subsumido a um processo de significação sem referente ou
autorreferenciado, como dizem os teóricos da comunicação de
massas. (7) Dessa forma, instaura-se o reino da fantasia no
fazer do historiador. Se já não determinação ontológica sobre
o conhecimento, é impossível fixar um sentido, uma
racionalidade para “esse real”. Aliás, nessa operação cognitiva
tanto o sujeito como o objeto são sempre mediados por um
processo de significação. Não há escapatória. Essa “abertura”
de sentido da realidade nos encaminha para duas conclusões:
primeiro, a relatividade do conhecimento, a necessária
pluralidade de visões, a derrota da Verdade e da Unidade , em
toda linha: segundo, o caráter fragmentário, ruinoso, falho,
incompleto, esfacelado do real. Característica que
desautorizaria qualquer possibilidade de síntese, de
totalização, de esgotamento gnosiológico desse mesmo real. A
imagem de um mundo-em-fragmentos, desprovido de sentido
tem seu correlato na dessubstancialização do sujeito.

55
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

Com isto, entramos na segunda consequência dessa


“economia política do signo”, que caracterizaria a sociedade
contemporânea: a elisão do próprio sujeito. Se a realidade
não passa de um processo de simulação hiper-real - o indivíduo
não pode ser menos (nem mais) – será uma justaposição
vertiginosa das imagens produzidas pela indústria cultural
capitalista (8) Se já não é mais possível falar em “realidade
objetiva”, muito menos em “razão”, “racionalidade”,
“autonomia do sujeito do conhecimento”. Ora, a única
possibilidade compatível com o fantástico “caleidoscópio de
fragmentos” a que foi reduzida a realidade, só pode ser a
imagem de um androide desmemoriado e programado pelos
meios de comunicação.
Essa análise sumária das consequências
epistemológicas da pós-modernidade para o campo do
historiador responde por uma visão historiográfica que tem na
alegoria e na citação, suas principais marcas. E por esta razão,
o pensador alemão Walter Benjamin tem sido apontado, mais
de uma vez, como o precursor da historiografia “pós-moderna”
(9). Se o seu famoso ensaio “A obra de arte na era da sua
reprodutibilidade técnica”. Tem sido invocado como reflexão
antecipatória sobre a “cultura do simulacro” (10) (em
surpreendente contraste com o otimismo tecnológico do autor
manifestado nesse mesmo ensaio), seus trabalhos sobre a
expressão alegórica e o conceito de uma história messiânica
tornaram-se então a base, o ponto de partida, para uma
interpretação irracionalista da cultura e da História.
As concepções benjaminianas da alegoria provêm de
duas fontes: a visão barroca da História; e certa leitura dos
textos de Marx, notadamente da “teoria do fetichismo da
mercadoria”. (11)

56
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

Em Origem do Drama barroco alemão, Walter


Benjamin afirma:
“Enquanto que, no símbolo, com a idealização do acaso,
o rosto transfigurado da natureza se revela de modo fugaz, à
luz da salvação, na alegoria, a facies hipocrática da História,
se apresenta aos olhos do contemplador como uma paisagem
arcaica petrificada. A História com tudo o que desde o início ela
tem de extemporâneo, sofrido, malogrado, se exprime num
rosto – não, numa caveira. E como lhe falta toda a liberdade
“simbólica” de expressão, toda harmonia clássica da forma,
tudo o que é humano – essa figura, de toda a mais sujeita à
natureza, expressa não apenas a natureza da existência
humana em geral, mas a historicidade biográfica do indivíduo,
de modo altamente significativo sob a forma de um enigma. O
cerne da visão alegórica, da exposição barroca, mundana da
história enquanto história do sofrimento do mundo é este: ela
é significativa apenas nas etapas de sua decadência. Tanta
significação, tanta sujeição à morte, porque é a morte que cava
mais profundamente a linha dentada de demarcação entre
corpo e significação. Mas se a natureza desde sempre esteve
sujeita à morte, também desde sempre ela foi alegórica. Assim,
significação e morte se realizam no tempo do desabrochar
histórico, do mesmo modo como na condição pecaminosa da
criatura sem a graça, elas se entrelaçam estreitamente.”
E ainda:
“Cada personagem, cada coisa, cada relação pode
significar outra qualquer ad libtum. Tal possibilidade profere
um julgamento aniquilador, porém justo, contra o mundo
profano: este é caracterizado como um mundo em que o
pormenor pouco importa”. (12)

57
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

Essa exposição contém o essencial da visão barroca da


História. Segundo ela, o mundo é visto como estigmatizado pela
“Queda”. Dessa forma, é o reino da deficiência, da obscuridade,
da dor e do sofrimento humano. Sendo tão imperfeito assim,
ele só pode ser expresso através da alegoria – que aí aparece
como uma linguagem cifrada (obscura) desse mundo lacunoso
e deficitário. A visão barroca da História é a visão alegórica de
um mundo estigmatizado pelo pecado e pelo sofrimento. E que
só encontra a sua redenção na morte, na mineralização da
vida. Isto porque é através da morte, da petrificação da vida
que o alegórico consegue expressar a significação (teológica)
da existência humana num mundo sem a presença de Deus.
Assim, o alegorista mata a significação natural de cada palavra
(tal como a morte faz com a vida), destrói as conexões
tradicionais de sentido, e recria, arbitrariamente, o sentido de
cada palavra, de cada coisa, numa intertextualidade infinita:
cada significado pode ser usado para significar outro
significado. Nada no mundo humano tem direito sobre si
próprio. Tudo morre e ressuscita, sob o olhar do alegorista,
para expressar sentidos imprevisíveis. Esta é a redenção
possível da vida humana sob o pecado: matéria prima de um
eterno processo de alegorização.
Mas há, na obra de Walter Benjamin, outra fonte para
o estudo da alegoria. Se nos primeiros escritos, é da visão
barroca da História que devemos extrair o essencial da
linguagem alegórica, o mesmo já não acontece nos últimos
estudos de Benjamin, notadamente nos trabalhos sobre
Baudelaire. Aqui, a referência fundamental é Marx, sobretudo
o da “Teoria do fetichismo da mercadoria”. Segundo Benjamin:
“A visão alegórica funda-se sempre sobrea
desvalorização do mundo aparente. A desvalorização

58
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

específica que representa a mercadoria é a base da intenção


alegórica em Baudelaire.” (13)
Na apropriação benjaminiana do texto de Marx, a
forma-mercadoria comparece como o meio de desrealização
das coisas e das pessoas. Para Benjamin, o valor-de-troca opera
uma geral e completa desvalorização da utilidade habitual dos
objetos (valores-de-uso), nivelando a todos como mercadoria.
Naturalmente, esse processo (reificador) atinge os próprios
homens, e o mundo da cultura, que também são transformados
em valores-de-troca. (14) Vem aqui à tona a questão do
fetichismo, na medida em que o mundo das mercadorias –
como mundo dos valores-de-troca – passa por ser uma
autêntica fantasmagoria social (alienação), uma vez que não é
mais do que as relações sociais transfiguradas em coisas.
Coisas em que os homens se projetam (ou admiram), como
consumidores, como se as coisas fossem algo estranho a eles.
Nesta maneira de ver a sociedade, alegoria e fetichismo se
entrelaçam: um é a base do outro. O alegorista barroco é
substituído, nos tempos modernos, pelo mercado capitalista
que fixa as significações de cada coisa (preço) transformada em
valor. E os homens, também metamorfoseados em coisas,
contemplam aquela significação – como se as mercadorias não
fossem produzidas por eles. O caráter alegórico da
modernidade estaria relacionado assim com o poder
desrrealizador do valor-de-troca e na fantasmagoria social
criado pelo processo de reificação. Dessa forma, a expressão
alegórica (em sua acepção moderna e não barroca)
corresponderia à alienação real da sociedade moderna (e
burguesa).
A outra característica da historiografia “pós-moderna”
seria o recurso da citação, da intertextualidade infinita.

59
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

Traço, aliás, comum a todas as formas de expressão artística


“pós-moderna”. Mas como entender a recurso da citação na
concepção benjaminiana da História?
Nas “Teses sobre o conceito de História”, diz o autor:
“A História é objeto de uma construção cujo lugar não
é o tempo homogêneo e vazio. Mas um tempo saturado de
‘agoras’. Assim, a Roma antiga era para Robespierre um
passado carregado de ‘agoras’, que ele fez explodir do
continuum da História. A revolução Francesa se via como uma
Roma ressurreta. Ela citava a Roma antiga como a moda cita
um vestuário antigo. A moda tem um faro para o atual, onde
quer que ele esteja na folhagem do antigamente. Ela é um salto
de tigre em direção ao passado. Somente, ele se dá numa arena
comandada pela classe dominante. O mesmo salto, sob o livre
céu da história, é o salto dialético da Revolução, como o
concebeu Marx.” (17)
Antes, porém, de explicitar o sentido da citação no
pensamento benjaminiano, será conveniente situar o nosso
autor no campo das teorias da História. A filosofia da História,
de Walter Benjamin, trava em verdade um combate filosófico
em duas frentes: de um lado, contra o historicismo: do outro,
contra o positivismo. Dessa forma, ela se estrutura em torno de
duas grandes questões: em primeiro lugar, o tema da memória;
em segundo, a concepção messiânica do tempo histórico. Se
com a discussão do resgate da experiência histórica dos
dominados (através da rememoração voluntária do passado)
Benjamin procura se afastar dos riscos da empatia historicista,
com a sua visão circular da História, nosso autor se afasta
decididamente do evolucionismo do marxismo vulgar da 3ª
Internacional Comunista.

60
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

O tema da memória se liga estreitamente à questão da


experiência. Benjamin parte aqui da distinção entre
experiência e vivência. Enquanto a primeira diz respeito ao
tipo de vida nas sociedades pré-capitalistas, tipificadas
essencialmente por uma sociabilidade comunitária – baseada
em atividades artesanais – a segunda se refere ao capitalismo
e sua dinâmica traumatológica – baseada na fábrica, na divisão
técnica do trabalho e na produção-em-série. Enquanto a
atividade artesanal possibilita o nascimento da tradição, onde
o coletivo e o individual se fundem, dando origem a um fundo
anímico comum e transmissível às futuras gerações, a
sociabilidade egoística e anômala do capitalismo produz um
homem sem história, desmemoriado. A atividade psíquica do
indivíduo se resume em interceptar os choques e as tensões da
vida moderna, habilitando-o a sobreviver na “selva de pedra” –
que é a cidade – mas o condenando a errar como um autômato
na História, sem passado e sem futuro.
A proposta benjaminiana de análise histórica seria a de,
na ausência das condições sociais que possibilitam a
experiência (a sociabilidade comunitária), evocar
deliberadamente esse a memória (involuntária) sepultada pelo
desenvolvimento do capitalismo, de forma a tornar acessível
ao homem moderno o fundo anímico onde se alojam as
lembranças e esperanças associadas a outro tipo de sociedade.
Vem daí o caráter “reconstrutivo” dessa teoria da História: o
historiador dialético seria aquele capaz de recuperar as
virtualidades inibidas pelo desenvolvimento histórico, a
partir da evocação deliberada de certa memória histórica – a
memória (involuntária) – onde estão depositados os registros
da derrota, o testemunho da frustração. Só quem sabe ler

61
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

alegoricamente as cifras dessas esperanças derrotadas,


contidas no exercício da rememoração, pode salvar a História.
O tema da memória involuntária se vincula
necessariamente ao da salvação. O historiador dialético,
segundo o nosso autor, é o messias que vem libertar os
oprimidos históricos de todos os tempos através do resgate de
uma certa tradição (a dos vencidos). Isto nos conduz a duas
ordens de questões: primeiro, a concepção que Benjamin
expõe do tempo histórico; segundo, o conceito mesmo de
salvação. Aqui, nos movemos na frágil linha que separa a
religião da História.
Se o principal objetivo de Walter Benjamin é a salvação
alegórica dessa memória involuntária, soterrada pelo processo
de transmissão (a historiografia das classes dominantes) da
obra histórica, impõe-se a necessidade de repensar
criticamente a temporalidade da História. Neste sentido, o
autor busca acertar as contas com a maneira do historicismo e
o positivismo conceberem o tempo histórico. Na ótica dessas
correntes, o tempo da História é visto como ‘homogêneo e
vazio”, como um tempo ‘linear”. É como se fosse possível
pensar a História como um receptáculo vazio onde fossem
encaixados os fatos históricos, dentro de uma direção pré-
determinada. Dessa forma, a História é concebida como um
acúmulo de vitórias que caminha inexoravelmente para a
realização da humanidade. Essa marcha de vitória a vitória, de
triunfo a triunfo, é assimilada ao desenvolvimento necessário
da História, como se necessidade histórica e realização fossem
sinônimos. Ora, diz Benjamin, essa maneira de ver a História
não é mais do que um exercício de racionalização da epopeia
do vencedor, que não cessa de vencer enquanto não for
denunciada em sua herança a marca da dominação Essa

62
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

denúncia exige do historiador uma outra visão do tempo


histórico – uma visão messiânica da História, consubstanciada
naquilo que se chama “o agora da recognoscibilidade”.
Para Walter Benjamin, o tempo histórico deve ser
pensado não como uma linearidade “homogênea e vazia” que
nos conduziria necessariamente á perfeição – sobretudo
através do mero progresso tecnológico – mas como uma
ruptura messiânica do calendário histórico, destinado a
salvar o passado. O tempo da História é circular e não retilíneo,
porque o presente (o tempo do historiador dialético) É VISADO
pela memória das gerações passadas, que o incumbem de
libertá-las. A tarefa do historiador não é, portanto, estudar o
passado para prever o futuro. Mas o contrário, explodir o
“continum” da História presente (vista como um acúmulo de
ruínas por onde passa incólume o vencedor) para libertar as
esperanças do passado, que não cessam de clamar pela
chegada da hora messiânica de sua salvação.
Podemos agora entender perfeitamente o sentido da
citação na obra benjaminiana. Citar, nessa singular acepção
historiográfica, significa extrair, romper, chocar. Ou seja,
combater o risco da empatia historicista com o legado do
dominador. Retirar traumatologicamente do contexto
histórico da dominação de classe, as esperanças truncadas, os
gritos emudecidos ao longo da História, para reatualiza-los no
presente, seja através da reconstituição da memória dos
vencidos ou da construção histórica propriamente dita. (18)
Outra maneira de conceber essa característica
interxtual da historiografia benjaminiana é reduzi-la ao
ecletismo, a mero pastiche ou paródia debochada de
acontecimentos passados. (19) Desse modo, o efeito
traumatológico da citação histórica seria neutralizado por uma

63
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

acepção frívola, superficial, irreverente, que aproximaria o


pensamento (sutil e complexo) de Walter Benjamin da moda,
de um estilo...”pós-moderno”, como aliás o fazem alguns
críticos de arte. (20)
Se a alegoria e a citação constituem ou não
características de uma (nova) história “pós-moderna”, como
querem alguns, isso não é tão importante quanto ao fato de,
recrutados por uma modalidade de racionalismo crítico,
poderem contribuir para diagnosticar a crise (e os limites) do
pensamento moderno ( e da própria modernidade) e ajudarem,
assim, a construir um novo paradigma para a razão depurado
de resíduos e irracionais. Essa, sim, é que seria a nova historia
de verdade.

NOTAS

(1) Cf. HABERMAS, Jurger. “A modernidade: um projeto


inconcluso”. Revista de ciências sociais. Lisboa. 1975

(2) Para muitos, os ideais de emancipação humana


(identificados com o programa do Iluminismo)
resultaram em sociedades concentracionárias,
governadas por uma espécie de poder onipresente,
onisciente, como o Panóptico, de Michel Foucault.
Sobre isso, veja Vigiar e Punir. Petrópolis, Vozes

(3) Cf. HABERMAS, Jurger. Teoria de la accion


comunicativa. Buenos Aires, Taurus, 1980, 2 volumes.

(4) Cf. BAUDRILLAC, J. Para uma crítica da economia


política do signo. Lisboa, Martins Fontes, sd.

64
REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA

(5) Cf. FERREIRA, Jair. O que é o Pós-moderno. São Paulo,


Brasiliense, 1984

(6) Cf. ECO, HUMBERTO. Viagem pela irrealidade


cotidiana. Rio, Nova fronteira, 1984.

(7) Cf. MELO, Hyguna Bruzzi de. A cultura do simulacro.


São Paulo, Loyola, 1988

(8) Cf. Baudrillac, Jean. La societé des consummations.


Ses mythes, ses estrutures. E PEIXOTO, Nelson
Brissac. “Novos sinais e imagens no apocalipse”.
Correio Brasiliense, 29/5/88
(9) Cf. SCEVCENKO, Nicolau. “O enigma pós-moderno”.
Pós-modernidade. Campinas, Editora da Unicamp,
1988.

(10)Cf. MELO, Hygina Bruzzi de. A cultura do Simulacro.


São Paulo, Loyola, 1983

(10) Cf. ROUANET, Sérgio Paulo. As razões do


Iluminismo. São Paulo, Companhia das Letras, 1987.

(11) Cf. BENJAMIN, Walter. Origem do Drama


Barroco alemão. São Paulo, Brasiliense, 1986.

(12) Cf. GAGNEBIN. Jean-Marie. Walter Benjamin –


os cacos da História. São Paulo, Brasiliense, 1984.

(13) Cf. BENJAMIN. Walter. “Trabalho das


Passagens”. Belo Horizonte, Imprensa oficial. 2009

(14) Cf. ROUANET, Sergio Paulo. Ob. Cit. Pp.85 e ss.

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(16)Cf. SCEVCENKO, Nicolau. Ob. Cit.


(17) Cf. BENJAMIN. Walter. “Teses sobre o conceito de
História”. Obras escolhidas. V.1. São Paulo,
Brasiliense, 1985.

(18) Cf. ZAIDAN. Michel. A Crise da razão histórica.


Campinas, Papirus, a989

(19) Cf. TEIXEIRA COELHO, J. Moderno e Pós-


moderno. Porto Alegre. L &PM. 1986

(20) Cf. TEIXEIRACOELHO, j. IDEM, P. 40

(1989)

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ORIGEM DOS TEXTOS

1. “Uma nova introdução à História” foi publicado


originalmente no livro: A História como Paixão. Recife,
Editora Universitária da UFPE, Recife, 1993. 3ª edição revista e
atualizada.
2. “A teoria da História ao longo do tempo” foi
originalmente uma conferência ministrada na PUC de Salvador
e publicada no livro: para Pernambuco falando o mundo.
Recife, LivroRápido, 2004
3. “Prova e Retórica na teoria da História” foi
orginalmente uma conferência ministrada no departamento de
História da UNICAP e publicada no livro: Educação,
multiculturalismo e globalização. Recife, NEEPD, 2006
4. “Linguagem e História” foi originalmente publicado
na revista Política Democrática, n. 33, junho/2012,
republicado em Leituras em Walter Benjamin. Recife,
NEEPD, 2016
5. “O uso do conceito de mimese na teoria da História”.
Ensaios de teoria da História. Recife, NEEPD, 2016
6. “O olhar do novo historiador” foi originalmente
publicado no livro: A Crise da razão histórica. Campinas,
Papirus, 1989

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7. “Marx e a História” foi originalmente publicado em


Presença. (Revista de Cultura e Política). São Paulo, n.4,
1984 e republicado no livro: A História como Paixão. Recife,
editora Universitária da UFPE, 1983, 3ª edição.
8. “A teoria crítica e a História” foi publicado
originalmente publicado em Leituras em Walter Benjamin.
Recife, NEEPD, 2016
9. “Pós-modernidade e História” foi originalmente
publicado no livro: A Crise da razão histórica. Campinas,
Papirus, 1989
10. “O fim da História?” foi originalmente
publicado no livro: Ensaios de Teoria da História. Recife,
NEEPD, 2017

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