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UNICESUMAR - CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS APLICADAS


CURSO DE GRADUAÇÃO EM MÚSICA

CONTRIBUIÇÃO DA MÚSICA SACRA NO CENÁRIO ERUDITO PROFISSIONAL

ELIÃ FERREIRA DOS SANTOS

MARINGÁ – PR
2019
Eliã Ferreira dos Santos

CONTRIBUIÇÃO DA MÚSICA SACRA NO CENÁRIO ERUDITO PROFISSIONAL

Artigo apresentado ao Curso de Graduação em


Música da UNICESUMAR – Centro
Universitário de Maringá como requisito
parcial para a obtenção do título de Licenciado
em Música, sob a orientação do Prof.ª. Me.
Juliana de Mello Chagas Lima.

MARINGÁ – PR
2019
FOLHA DE APROVAÇÃO
Eliã Ferreira dos Santos

CONTRIBUIÇÃO DA MÚSICA SACRA NO CENÁRIO ERUDITO PROFISSIONAL

Artigo apresentado ao Curso de Graduação em Música da UNICESUMAR – Centro


Universitário de Maringá como requisito parcial para a obtenção do título de Licenciado em
Música, sob a orientação da Prof.ª. Me. Juliana de Mello Chagas Lima.

Aprovado em: ____ de _______ de _____.

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________
Prof.ª. Me. Juliana de Mello Chagas Lima – UniCesumar (Orientadora)

__________________________________________
Prof. Dr. Lucas França Garcia – UniCesumar

__________________________________________
Prof. Me. Caio Tikaraishi Pierangelli – UniCesumar
CONTRIBUIÇÃO DA MÚSICA SACRA NO CENÁRIO ERUDITO PROFISSIONAL

Eliã Ferreira dos Santos

RESUMO

Desde os primeiros momentos da história da humanidade, religião e arte andam intimamente


ligadas. Este artigo traz uma breve evolução da música na igreja cristã, desde os primeiros
registros, passando pelo período medieval, chegando a Reforma Protestante do Século XVI,
que foi a origem da igreja cristã protestante. O trabalho faz uma explanação a respeito da
função pedagógica da música na igreja como meio para ensinar e propagar a doutrina
apostólica com salmos e hinos que contenham as verdades da fé cristã; letras e música
tornam-se recursos pedagógicos relevantes para a propagação do evangelho. São feitos
apontamentos sobre a música tradicional e contemporânea, e a necessidade de ambos os
gêneros conviverem harmoniosamente a fim de manterem a qualidade musical e o conteúdo
sacro a ser levado às congregações. E, por fim, é abordado o poderoso caráter propiciador de
inclusão social inerente à música e às manifestações musicais e, de que forma as igrejas tem
contribuído no fomento deste processo, apresentando relatos de músicos que tiveram sua
iniciação à música nas igrejas, e que hoje, ocupam cadeiras em grandes orquestras, dentro e
fora do país. Embora não se tenha uma precisão de quantidade, é altamente expressivo o
número de profissionais advindos destes locais de educação musical. Foram adotados
procedimentos de pesquisa documental (SÁ-SILVA; ALMEIDA; GUINDANI, 2009, p. 14),
para tomar conhecimento do Estatuto da Congregação Cristã no Brasil e os materiais didáticos
adotados pelo departamento musical durante o processo de ensino da música.

Palavras-chave: Congregação Cristã no Brasil, Ensino da Música, Formação de Músicos.


4

CONTRIBUITION OF SACRED MUSIC IN PROFESSIONAL ERUDITE SCENARIO

ABSTRACT

From earliest moments of mankind history, religion and art are closely linked. This article
brings a brief evolution of music in Christian church, since first records, through medieval
period, to the Protestant Reformation 16th Century, which was the origin of Protestant
Christian church. This work will explain the pedagogical function of music inside the church
as a manner to teach and propagate apostolic doctrine with psalms and hymns that contain the
truths of the Christian faith; letters and music become pedagogical resources relevant to the
spread of the gospel. Notes on traditional and contemporary music are shown, and the need
for both genres to live harmoniously in order to maintain musical quality and holy content to
be used at the congregations. Finally, he reaffirms the powerful propitiating character of
social inclusion inherent in music and musical manifestations, and in what ways churches
have contributed to the promotion of this process, presenting reports of musicians who had
their musical initiation in churches, and now they joined great orchestras, inside and outside
the country. Although there is no precision of quantity, it is very expressive the number of
professionals coming from these musical education venues. Documentary research procedures
were adopted (SÁ-SILVA; ALMEIDA; GUINDANI, 2009, p.14), to take cognizance of the
Statutes of the Christian Congregation in Brazil and didactic materials adopted by music
department during the music teaching process.

Keywords: Christian Congregation in Brazil, Teaching Music, Musicians Formation


5

INTRODUÇÃO

Este artigo começou a ser pensado, no momento em que eu, como músico evangélico,
envolvi-me com grupos musicais, orquestras, orquestras de câmaras, e em momentos de
conversas, entre os intervalos, notei que um número expressivo dos músicos, musicistas,
professores e maestros têm suas origens atreladas ao ambiente da igreja, embora não haja
números que totalizem essa informação. Mas, de acordo com Fávaro 1 (2007, p.35), “eles
representam uma gorda fatia”. Na última década, número de instrumentistas iniciaram o
processo de educação musical em igrejas protestantes passou a representar um percentual
cada vez maior nas principais orquestras nacionais.
No livro “Educação musical da criança” (1964), Violeta Gainza defende que se faz
necessário conhecer a origem e de que forma se deu o processo evolutivo da própria música, a
fim de compreender as diferentes abordagens e princípios da pedagogia musical
contemporânea. De acordo com a própria autora, os caminhos ao longo da história da
educação musical se assemelham aos da evolução da música. A música surge de forma
rudimentar e, desde os primeiros registros, é utilizada como forma de expressão e
comunicação de emoções e sentimentos, e com a evolução do homem, ela foi sendo
aperfeiçoada.
Os valores e as visões de mundo em relação à cultura e à arte influenciaram o valor e o
papel social da música em diferentes épocas e lugares. A Grécia é o primeiro lugar a agregar
valor à música e à educação musical, e mais tarde influenciaria o Ocidente, como afirma
Fonterrada (2005).
Desde os tempos mais remotos, a música foi um elemento indissociável das
cerimônias religiosas. O desenvolvimento da música acompanhou, de diversas maneiras, o
das sociedades humanas. Ligada à magia, à religião, à ética, à terapêutica, à política, ao jogo e
ao prazer também, ela constitui um dos aspectos fundamentais das velhas civilizações. A
transmissão da música foi assegurada, de geração em geração, pela imitação, e depois pelo
ensino sistemático, como é feito hoje.

1
Três de cada dez músicos da Orquestra Sinfônica do Paraná, por exemplo, frequentam alguma igreja
evangélica. Dos catorze profissionais recém-contratados pela Sinfônica de Porto Alegre, quatro são evangélicos.
Eles também representam uma gorda fatia de 35% dos músicos brasileiros da Orquestra Sinfônica do Estado de
São Paulo (Osesp). (Fávaro, 2007, p. 35).
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PRÉ-HISTÓRIA

Nenhum dado científico permite definir, nem aproximar, a ordem de aparecimento dos
fenômenos musicais, portanto, a origem da música não pode ser estabelecida. Acredita-se que
a música tenha se revelado ao homem primitivo sob duas perspectivas: como dança e
posteriormente através do canto. De acordo com a própria história das origens do homem,
pode-se imaginar uma sucessão hipotética de etapas evolutivas da música, iniciando de forma
rudimentar, através de batidas com bastões e percussão corporal, e depois o homem começa a
utilizar a voz, através de gritos e a confecção de objetos, a fim de reproduzir ritmos ou ruídos
da natureza.

ANTIGUIDADE E AS PRIMEIRAS CIVILIZAÇÕES MUSICAIS

A Antiguidade foi um longo período da história, que vai da invenção da escrita (c.
4000 a.C.) até o fim do Império Romano do Ocidente em 476 d.C. As tradições musicais mais
antigas nos remetem a Mesopotâmia – Sumérios Babilônios e Assírios, o Egito, os Hebreus e
Fenícios, entre outros. É claro que ainda diante de muitas incertezas, já que os primeiros
relatos musicais e os primeiros registros, datam de depois da catástrofe conhecida como
Dilúvio, cerca de 3600 a.C., que devasta a Mesopotâmia, e sem dúvida, regiões vizinhas e
priva-nos de documentações preciosas. Entre os povos da antiguidade destacam-se pela sua
civilização os egípcios, os árabes, os assírios, os babilônicos, os caldeus, os hebreus, indianos,
chineses, e os gregos.
(CANDÉ, Roland de. História Universal da Música. 2 ed. São Paulo. Martins Fontes, 2001)

OS HEBREUS

A Bíblia constitui a principal fonte de referência documental do povo hebreu, que tem
sua história contada a partir Abraão, e possivelmente tenham herdado as ricas culturas
musicais da Mesopotâmia, e sido influenciados pela cultura egípcia. De acordo com a Bíblia,
Davi2 após suceder a Saul no trono de Israel, procurou elevar a cultura musical do povo
hebreu e enaltecer essa prática, como podemos ler no livro dos Salmos, número 33 e verso 3,
onde ele escreve “[...] tocai bem e com júbilo”.

2
Davi/David, filho de Jessé, foi o segundo rei sobre todo o Reino Unificado de Israel. Saul fora escolhido rei
pelo povo; a Davi, Deus escolhera-o e ungira-o rei.
7

A música para os Hebreus possuía caráter religioso de adoração, guerreiro (Números


10.9), festivo (1 Samuel 18.6), por puro prazer (Isaías 5.12), terapêutico (1 Samuel 16.14-23)
e celebrações de vitória (1 Samuel 18.6). O canto dos hinos e dos salmos era executado por
dois coros que se respondem em alternância, chamada antífona. No livro 1 Samuel, capítulo
18, verso 6 e 7, está registrado que: “as mulheres de todas as cidades de Israel saíram ao
encontro do Rei Saul, cantando e dançando, com adufes, com alegria e com instrumentos de
música”, e no verso seguinte, “as mulheres dançando e cantando se respondiam umas às
outras”.

ANTIGUIDADE CLÁSSICA

Os Gregos atribuem à música origem divina, e constituem a música como a mais alta
sabedoria, dando impulso para o amplo desenvolvimento e elevação da música ao mais algo
grau de perfeição. No período clássico, a música era praticada sob dois aspectos: promover o
elevo espiritual, e por outro lado provocar no homem entusiasmo e excitação, que mais à
frente, na Idade Média, essa divisão se torna evidente, sendo representado através do profano
e religioso. Além desses dois aspectos, filósofos gregos como Aristóteles3 e Platão4, atribuem
à música um elemento formador do caráter do cidadão, ela seria o agente para chegar a
virtude e ao desenvolvimento espiritual. Sob essa perspectiva, a aristocracia das cidades
garantia o ensino da música como parte integrante da formação do jovem, no entanto, sem a
intenção de se tornarem profissionais. A teoria musical, mais que a prática musical grega,
influenciou a música da Europa ocidental na Idade Média. (GROUT, Donald J.; PALISCA,
Claude. História da Música Ocidental. 6 ed. Lisboa. Gradiva Publicações, 2014)

IDADE MÉDIA

A Idade Média, período Medieval, estende-se por aproximadamente mil anos, que vai
de 476 d.C. até o ano de 1453. A história da música no ocidente, no sentido escrito, começa
com a igreja cristã. Roma buscou características para sua música erudita na Grécia, algumas

3
Aristóteles, em Política, menciona que: “o intuito da música era de alimentar a alma com a beleza moral,
“eles devem praticar a música ... prescrita até o ponto em que estejam aptos a deleitar-se com as melodias e os
ritmos mais belos”. O estudo da música devia estar associado ao prazer e como atividade intelectual, jamais com
o interesse de profissionalização. (Aristóteles. Política, VIII, VI, 1341a, b.).
4
Platão, alinhado ao pensamento de Aristóteles, também defendia a premissa de que era possível produzir
pessoas boas mediante um sistema público de educação cujos dois elementos fundamentais era a ginástica e a
música, onde respectivamente, como forma de disciplinar o corpo e o espírito. (Platão, República, 3.412A).
8

dessas características foram aderidas pela igreja cristã, ao mesmo tempo que outros aspectos
da vida musical antiga foram rejeitados. Dentre esses aspectos rejeitados podemos citar a
ideia de ter a música apenas pelo prazer proporcionado pela tal arte. Grandes espetáculos,
festivais, e até mesmo instrumentos foram considerados impróprios pela Igreja, pois remetiam
aos convertidos ao seu passado pagão. Antes, “ser surdo ao som dos instrumentos” do que
entregar-se a esses “coros diabólicos”, a essas “canções lascivas e perniciosas”, afirmava
Santo Ambrósio.
A rejeição à música instrumental levou a Igreja Católica por séculos utilizar a música
vocal. Em contrapartida, a teoria musical herdada da Grécia serviu por muito tempo de
referência, adaptada à cultura cristã e às exigências da música de igreja. A autoridade do clero
e dos concílios impôs inúmeras vezes seus critérios morais de discriminação entre a “boa”
música e a música “ruim”, a que elevava a alma e a que a perverte. A função essencial da
música era, sobretudo, o louvor divino.
Santo Agostinho em Confissões, exprimem este dilema:
[...] quando me lembro das lágrimas derramadas ao ouvir os cânticos da vossa igreja,
nos primórdios da minha conversão à fé, e ao sentir-me atraído, não pela música,
mas pelas letras dessas melodias, cantadas em voz límpida e modulação apropriada,
reconheço, de novo, a grande utilidade deste costume. Assim flutuo entre o perigo
do prazer e os salutares benefícios que a experiência nos mostra. Portanto, sem
proferir uma sentença irrevogável, inclino-me a aprovar o costume de cantar na
igreja para que, pelos deleites do ouvido, o espírito, demasiado fraco, se eleve até
aos afetos da piedade. Quando, às vezes, a música me sensibiliza mais do que as
letras que se cantam, confesso, com dor, que pequei. Nestes casos, por castigo,
preferia não ouvir cantar. (AGOSTINHO, Livro X, cap. 33)

Após conflitos e perseguições, o cristianismo se torna a religião oficial pelo edito de


Constantino (313). A Igreja ensinava a simplicidade como uma das principais virtudes
musicais, porém os textos em latim criavam uma barreira, tornando difícil a compreensão do
que era cantado. O repertório do cantochão, que era as melodias presente nas liturgias, missas
e ofícios, a que esse repertório pertencia, desenvolvem-se ao longo de vários séculos. O
monge beneditino, Guido D’Arezzo5, é quem se destaca nesse período no âmbito pedagógico,
foi o criador de recursos que auxiliaram a leitura e a escrita musical, das quais são usados até
hoje. Na Idade Média, a educação musical era restrita aos monastérios, e ficava a cargo dos

5
Guido d'Arezzo (Guido Areutinus; c. 995-c. 1050). Professor de música e monge beneditino italiano.
Introduziu a pauta de quatro linhas ou tetragrama, e inventou o sistema de solmização – sistema utilizado para a
leitura de partituras, que atribui e associa uma sílaba distinta a cada nota em uma dada escala musical,
independente de sua afinação verdadeira. É um método de reconhecimento auditivo, sistema ou prática de
identificar e associar tons musicais a sílabas. (HORTA, Luiz Paulo (Ed.). Dicionário de Música Zahar. Tradução
Álvaro Cabral. Rio de Janeiro. Zahar Editores, 1985).
9

monges. “[...] os mosteiros e as escolas ligados às 71 igrejas-catedrais eram instituições ao


mesmo tempo religiosos e de ensino [...]” (GROUT & PALISCA, 2007, p.77).
(GROUT, Donald J.; PALISCA, Claude. História da Música Ocidental. 6 ed. Lisboa. Gradiva
Publicações, 2014)

RENASCIMENTO E A REFORMA PROTESTANTE

O Renascimento foi um período o homem passou a repensar o papel da música.


Questões como a não participação dos fieis no canto da Igreja, o fato da música não poder
despertar nos ouvintes sentimentos, começam a ser levantadas nessa época. Houve, em
especial durante a Reforma, a necessidade de popularizar o ensino da música. A criação das
escolas públicas e o esclarecimento dos benefícios da cultura e o acesso a ela por um número
maior de pessoas, ocasionam uma nova estruturação à educação musical. Os métodos de
ensino da música começam a ser revistados, pois na concepção de Lutero era necessário
tornar acessível o conhecimento e a prática musical, que a até então apenas nos monastérios
tinha-se acesso.
O ensino da música nas escolas também recebia implementação prática, mediante a
participação das crianças no culto. Essa atividade funcionava também como uma
maneira do povo aprender como deveria proceder durante o culto. (SCHALK, 2006,
p.36).

É neste cenário dos séculos XV e XVI que os reformadores luteranos se encontram,


utilizando dos ideais renascentistas, com discernimento, retém o que era necessário. A prática
adotada pelos reformadores, inclui uma nova estética musical, aliando-a ao texto, à clareza
sonora e à expressão musical. O reformador Martinho Lutero vê a música como ferramenta
pedagógica e como forma de comunicar a doutrina. Agindo diretamente com as instâncias
públicas, defende o ensino da música como parte integral da educação das crianças, da
formação de professores e ministros. Seu desejo era que de forma ativa, a congregação
participasse dos cultos, e a música seria o elo que os uniria, portanto afirmava: “antes que um
jovem seja admitido no Ministério, ele deve praticar música na escola”.
O hinário protestante, livro de canto contendo melodias escritas em estrofes vem a ser
uma das primeiras publicações do protestantismo, e com o advento da imprensa, esses
escritos, teóricos e composições, difundem-se na Alemanha e Europa com mais rapidez, e
conduzem a um grande desenvolvimento musical. O hinário ganha força, e mais tarde não se
10

detém apenas à Igreja Luterana; movimentos que surgem posteriormente, passam a organizar-
se da mesma forma.
Conteúdos musicais da Reforma Protestante e de épocas posteriores, dedicados ao
ensino e à didática da música, chegaram até nossos dias. Esses materiais além do canto,
incluem composição e teoria, revelando alto grau de qualidade musical e de conhecimento de
quem o escrevia. Historiadores alemães, descrevem nesse período que: “Onde há um órgão, a
música vocal é acompanhada por cinco ou seis instrumentos de cordas, alguns dos quais não
eram sequer conhecidos nessas cidades antes da Reforma”. (GROUT, Donald J.; PALISCA,
Claude. História da música ocidental. 2014, p. 277).
Com base nisso, chega-se a um consenso de que a Reforma Protestante foi um
momento importante da história que corroborou para o desenvolvimento da linguagem
musical, tal como a conhecemos hoje. A Igreja Protestante incentivou e motivou a
aprendizagem, a interpretação e a construção de novos instrumentos. É nesse momento que se
formam as escolas paroquiais de música, onde as crianças podiam estudar a música desde os
primeiros anos.
Para Candé (2001), a Igreja Protestante tem forte representação no cenário musical,
uma vez que o catolicismo se dedicou a representar as divindades através da pintura e
escultura, e o protestantismo firmou-se na música. Grout e Palisca (2014, p. 526), dentre os
compositores protestantes, faz referência o alemão Johann Sebastian Bach, considerado o
maior representante do período Barroco, além de músico, compôs grandes peças corais. A
liberdade decorrente da Reforma Protestante, proporcionou que ao longo da história
surgissem outros períodos, que trouxeram desenvolvimento significativo a música profana e
religiosa.
O Classicismo é um movimento que surge logo após o período Barroco, e deixa sua
contribuição à música instrumental no âmbito religioso, uma vez que esta passa a ser
executada em orquestras, ou no órgão. Com o desenvolvimento da música e do instrumental, a
orquestra em consequência disso tem seu nível elevado. As orquestras que no início eram
formadas por instrumentos de cordas, passa a contar instrumentos de sopro, porém sem uma
estrutura definida.
O Romantismo é outro movimento que se estende do fim do século XVIII e início do
século XIX, que agrega valor à história musical, os desenvolvimentos ao longo deste trajeto,
amplia no nível técnico vocal, aliado ao virtuosismo instrumental, outrora combatido,
possibilitando sua exploração por parte de quem compunha nesse período, a citar Ludwig van
Beethoven, que também compôs algumas obras sacras.
11

IGREJA CRISTÃ NA CONTEMPORANEIDADE

Após o advento da Reforma, as igrejas protestantes por agregarem valor à música em


seus cultos, dão ênfase à educação musical, ainda que informalmente. Muitas igrejas
evangélicas organizam escolas de música que atendem aos seus congregados, em várias faixas
etárias. Freitas (2008, p.25), escreve que: “as instituições religiosas, têm grande influência e
importância no aprendizado musical e formação de músicos”.
A música foi a única expressão de arte preservada pela Reforma Protestante, ocorrida
no século XVI, período em que foi abolido a representação de animais e pessoas, considerada
idolatria. Para os protestantes, a música aproxima de Deus.
Educadores musicais, tem buscado através de pesquisas, compreender como a música
está presente nessas instituições, e de que forma elas têm contribuído no cenário musical
(Blazina, 2013; Lorenzetti 2014; Martinoff, 2010).
No século XIX, com a chegada de missionários de origem norte-americana ao Brasil,
tem-se preocupação de se ensinar música aos féis. Sarah Kalley com seu esposo, doutor
Robert Kalley, fundam a primeira Igreja Evangélica. Sarah dava aula de músicas, no intuito
de melhorar o canto congregacional, e juntamente com seu marido, foram os responsáveis
pela publicação em 1861 do primeiro hinário evangélico no Brasil, denominado Salmos e
Hinos.
Considerando que a formalização do ensino de música ganha novos rumos em 18 de
agosto de 2008, onde a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional tem seu texto alterado
por meio da lei ordinária 11.769 (Brasil, 2008), e dispõe que a música deverá ser conteúdo
obrigatório, mas não exclusivo da disciplina de Artes.
Portanto, compreende-se a relevância de um estudo como esse onde será apresentado
como objetivo dessa pesquisa os aspectos relevantes sobre o ensino da música em um
contexto sociocultural especifico, na Congregação Cristã no Brasil, apresentando como se dá
esse processo e quais são os meios utilizados como metodologias de ensino de música.

A CONGREGAÇÃO CRISTÃ NO BRASIL

A Congregação Cristã é uma comunidade religiosa inteiramente fundamentada na


doutrina e Fé apostólicas contidas no Novo Testamento da Bíblia Sagrada. A origem da
Congregação Cristã no Brasil está atrelada ao italiano Louis Francescon, seu fundador, e um
pequeno grupo de evangélicos italianos que, na cidade de Chicago nos Estados Unidos da
12

América, no ano de 1904, passou a se reunir em suas casas, buscando a guia Divina para
seguir os ensinamentos bíblicos cristãos, dentro da simplicidade da Fé apostólica. No Brasil, a
obra inicia em junho de 1910.
A esse grupo, desprovido de qualquer denominação e sem qualquer propaganda ou
forma especial de comunicação, foram se agregando muitas outras pessoas, sentindo-se
movidas por Deus. Dessa mesma maneira, se formaram em diversos países grupos imbuídos
dos mesmos sentimentos e compreensão da Palavra de Deus.
Com o aumento do número de pessoas professando os mesmos princípios de adoração
a Deus e não havendo locais particulares em que fosse possível reunir-se foi necessário
adquirir-se locais para esse fim, havendo, a partir de então, a necessidade de se criar
instituição com personalidade jurídica para poder legalizar as reuniões e titularizar a
propriedade desses imóveis e, por isso, se denominou essa entidade de Congregação Cristã,
isto é, simples reunião de pessoas, sem qualquer formalismo ou personalismo, apenas
imbuídas dos mesmos valores espirituais cristãos de adoração a Deus.
A organização da Congregação Cristã no Brasil é simples, hierarquicamente formada
pelo corpo ministerial – anciães, diáconos e cooperadores do oficio ministerial; cujas funções
são explicitadas no capítulo III do Estatuto da Igreja6; e também representada pela
administração, e em ambos, não há remuneração ou retribuição pelo exercício dessas
atividades ou pela ministração de serviços espirituais ou sacramentos.
A Congregação Cristã no Brasil não faz qualquer tipo de propaganda de sua doutrina,
nem se utiliza de qualquer meio de divulgação pública de seus princípios de fé. Quem tiver
interesse espiritual de conhecer sua doutrina, deverá frequentar seus cultos em qualquer de
suas igrejas.

O HINÁRIO

No início, os cultos, os hinos e a pregação não eram feitos na língua vernácula, e


conforme aconteciam as conversões, a mistura de povos espanhóis, portugueses e brasileiros
facilitou a interculturação e a aprendizagem da língua, e até mesmo os que não eram
descendentes de italiano compreendiam a língua.
Datado de 1914, o primeiro hinário se chamava “Inni e Salmi Spirituali”, que significa
“Hinos e Salmos Espirituais”, era completamente em italiano e possuía, ao todo, 313 hinos.

6
Estatuto da Congregação Cristã no Brasil, registrado sob nº de ordem 18.282, no livro A de Registro de Pessoa
Jurídicas, em 28 de abril de 1995 no 1º Cartório de Títulos e Documentos da Capital.
13

Nota-se a preocupação em aprimorar os cânticos desde a primeira edição do hinário, uma vez
que no prefácio deste, pedia aos fiéis que fossem fazer o uso dos cânticos, procurassem
aprender os hinos de acordo com a música, e assim chegar ao objetivo, que é cantar e
salmodiar com sabedoria e graciosamente de coração para o Senhor. O hinário 1, passou por
diversas modificações ao longo de sua utilização, como a tradução de parte dos hinos para o
português, acréscimo de novos hinos e também hinos direcionados as Reuniões dos Menores7.
Também foram impressas novas versões, sempre trazendo recomendações a congregação no
modo de cantar os hinos, orientado a cantar com alegria, como está escrito em Salmos 47 –
“Cantando alegre ninguém se cansará, mas cantando em Adagio8, cansa a muitos”, e
recomenda: “[...] então será excelente se cada igreja se ocuparem a aprender um pouco de
música [...], cantai louvores com inteligência”. (Inni e Salmi Spirituali, 1914 – Prefácio
Hinário nº1).
Nasce, em 1944, o primeiro hinário em língua portuguesa: “Hymnos e Psalmos
Espirituaes”, denominado Hinário nº 2, com 275 hinos, sendo 25 deles para as Reuniões dos
Menores, e ao final dos hinos cantava-se “Amém”. Grande parte das melodias sacras
pertenciam a autores de outras nacionalidades, bem como as poesias, quer originais ou
traduzidas, eram frutos de membros da Congregação Cristã no Brasil. Nessa época, devido a
campanha de nacionalização do presidente Getúlio Vargas, foi intensificada a repreensão as
nacionalidades ligadas as potências do eixo: alemães, italianos e japoneses, e por isso fez-se
necessário fazer um hinário totalmente em português.
Em 1948, a convite do irmão Louis Francescon, a irmã Anna Spina, tinha como
missão aprimorar e facilitar as poesias, as melodias, as métricas musicais do próximo hinário.
Sob o atual nome de “Hinos de Louvores e Súplicas a Deus, nasce o terceiro hinário da
Congregação. Continha 330 hinos e as mudanças realizadas representavam um salto na
qualidade musical e poética do hinário. A reforma ortográfica ocorrida nesse período
corroborou também para esta mudança no hinário.
Em 1965, é lançado o Hinário nº. 4, mantendo o nome “Hinos de Louvores e Súplicas
a Deus”, aprimorando a versão anterior, suprimindo e acrescentando hinos. Foi o hinário com
o maior tempo em uso oficial pela Congregação, quase 48 anos. Continha 450 hinos,
mantendo a sequência numérica, acrescido de 7 coros. No prefacio deste hinário, estava
escrito: “Mantivemos, como nas edições anteriores, a maioria dos hinos que o Senhor tem

7
Reunião dos Menores, hoje chamado de Reunião de Jovens e Menores, são cultos geralmente aos domingos de
manhã ou à tarde, direcionados a jovens e crianças.
8
Adagio é um andamento musical lento.
14

preparado desde o princípio desta obra em nosso país, porém com as alterações que se fizeram
necessárias, acrescentando também outras melodias e poesias”.
Neste hinário foram corrigidos erros de português, de prosódia, de acentuação, de
harmonia, foram tiradas passagens, contratempos, arpejos e ornamentos que induziam os
músicos a florear livremente, tirando o sentido sacro dos hinos, ficando apenas os hinos 93,
125 e 420, e foi tirado alguns hinos chamados alguns hinos chamados excessivamente pela
irmandade, e foram acrescentados 7 coros. O hinário 4 também passou por diversas
mudanças, em 1975, o hino 376 tem a melodia alterada, pois a antiga era o hino nacional da
Alemanha, o que causava constrangimento para irmãos descendentes de judeus. Em 1976
foram acrescidos os 12 pontos de doutrina no hinário. Em 1980, foram introduzidos os sinais
de arcadas para os violinos. Em 1985 foram introduzidos os sinais de respiração.
Em 1992 foi feito o hinário de organistas, com marcações de dedilhados, e adaptações
na voz do tenor e baixo. Em 2002 foram escritos os hinários para instrumentos transpostos em
Si bemol e Mi bemol e foi registrado no ministério da educação e cultura.
Por fim, em 2013, é lançado o Hinário 5, contando com diversas revisões poéticas,
musicais e numéricas, mantem “Hinos de Louvores e Súplicas a Deus”, com 480 hinos, sendo
50 de jovens e menores e 6 coros. O prefácio foi mantido o mesmo do hinário 4. Os trabalhos
para a organização deste hinário levaram aproximadamente cinco anos. Foram retiradas
cacofonias e referências a lugares, mantendo fidelidade ao texto bíblico, e feito uma revisão
harmônica, trazendo mudanças principalmente na voz do baixo, que tinham muitas notas
repetidas, hinos referentes a Salmos, possuem a mesma numeração do Salmo, 19 novos hinos
- música e poesia, 9 hinos buscados no Hinário 1, um hino voltou do Hinário 3, quatro hinos
ganharam novas melodias, diminuição de hinos muito longos, Hinário especial para cordas,
com arcadas para violinos, violas e violoncelo, ligaduras e clave de dó para as violas, no
Hinário para organistas, teve acréscimo de pedaleira, ligaduras entre outras adaptações.
De acordo com o Censo realizado pelo IBGE em 2010, a Congregação Cristã ocupa a
posição de terceira maior denominação evangélica no Brasil.

O ÓRGÃO

O órgão foi o primeiro instrumento da CCB, foram trazidos dos Estados Unidos em
1932 dois órgãos, e nesta ocasião, o irmão Louis Francescon incentivou que fosse instituída a
parte musical na Congregação Cristã. Em algumas regiões também eram utilizados o
Harmônio, instrumento semelhante ao órgão, que por ação do ar, vibra as palhetas, emitindo o
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som. Na congregação do Brás-SP, também existiu um piano, porém no final dos anos 50 o
ministério achou por bem tirá-lo, mantendo apenas o órgão como instrumento harmônico e de
execução cabendo apenas as mulheres.
O órgão de tubos também se fez presente em uma das congregações, sendo utilizado
até o final da década de 60, e no início da década de 70 os órgãos de tubos foram substituídos
por órgãos eletrônicos, os quais eram mais práticos, menores, de menor custo e de mais fácil
manutenção. Na década de 60, iniciou na Congregação Cristã a prática do prelúdio musical,
executado ao órgão, apresentado no Manual de Orientação Orquestral como Meia Hora.
Conforme Tópico de Ensinamento de 2017, “A finalidade dos hinos executados pela
organista [...] durante a meia hora, tem por objetivo que a irmandade permaneça em silencio,
em santa meditação e comunhão com Deus, enquanto espera o início do santo culto”. (Tópico
da Reunião Anual de 2017).
A execução da Meia Hora acontece 30 minutos antes do início do culto, os hinos são
tocados em velocidade mínima indicado no hinário, num andamento que permita a
compreensão do que está sendo tocado, por isso o andamento recomendado pelo Manual de
Orientação Orquestral, é apresentado como cantabile, ou seja, cantável, apropriado para ser
percebido e compreendido, e não inquietar, mas alentar.

ORQUESTRAS

Em 1910, ano de fundação da Igreja, não havia orquestras formadas, porém, algumas
salas de oração possuíam harmônio, instrumento musical de teclas, com funcionamento
semelhante ao órgão. No entanto, com o progresso e crescimento da igreja, viu-se a
importância da formação de um conjunto musical, com o objetivo de auxiliar a irmandade no
cantar dos hinos.
A fim de apresentar essa necessidade, em maio de 1932, o ancião 9 Louis Francescon,
convoca uma reunião com a participação do ministério e um grupo de jovens. A partir de
então, muitos se interessaram em iniciar os estudos musicais, formando-se, assim, as
primeiras orquestras na Congregação Cristã no Brasil. A partir de então, houve grande
progresso da parte musical, e atualmente contamos com orquestras em, praticamente doas as
Casas de Oração, com um número cada vez mais crescente de músicos e organistas,

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De acordo com a CCB, no Cristianismo primitivo, existia a figura do Presbítero que era originalmente um
dirigente de uma congregação local, título usado em denominações cristãs. Porém na CCB o ancião: "São
homens experientes e responsáveis que demonstram fé e conduta exemplar".
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totalizando aproximadamente meio milhão de músicos, em todo o mundo. Com o passar do


tempo, foi sendo estruturada a parte musical, com os encarregados de orquestra regionais, que
tinham como função coordenar o ensino musical e organizar os ensaios de música.
Periodicamente são realizados exames para admissão de novos músicos, com provas teóricas
e práticas.
A Congregação Cristã dá importância à execução musical nos seus cultos, prezando
sempre pelo estilo sacro, com o objetivo de adoração, veneração, louvor e reverência a Deus:
O estilo sacro no qual são escritos os nossos hinos, exige a execução sóbria,
pura e exata daquilo que está na partitura (hinário). Não devemos alterar esse
estilo. (Tópico 1 da Reunião Anual de 2015).

A orquestra da Congregação Cristã é composta geralmente por um órgão eletrônico, e


mais 22 instrumentos musicais permitidos, de acordo com o Manual de Orientação Orquestral
– MOO 2018, p. 9). Os instrumentos são assim divididos em naipes: cordas, madeiras e
metais, e na orquestra são dispostos de acordo com a família que pertencem, e não à voz que
ele executa – soprano, contralto, tenor e baixo.
As orquestras são compostas por homens e mulheres com divisões de tarefas por
gênero, as mulheres executam o órgão e os homens os demais instrumentos, cordas ou sopro.
A orquestra, como já citado neste artigo, é de fundamental importância também na
liturgia do culto, sendo responsável por auxiliar a irmandade no cântico dos hinos, e antes do
início do culto. Também cabe à execução do Hino do Silêncio, hino que deve ser entoado no
mesmo sentimento dos hinos executados pela organista, com a finalidade de manter a
comunhão da igreja preparando-a para o santo culto. O Hino do Silêncio deve ser apenas
tocado, a congregação não canta, a orquestra deve executá-lo de forma homogênea e
uniforme, o mais suave possível, tocado em andamento médio, como orientado no hinário.

A FORMAÇÃO MUSICAL NA CONGREGAÇÃO CRISTÃ NO BRASIL

Estudos realizados na área de Educação Musical indicam a importância do ensino de


música em contextos não escolares, considerados pelos estudiosos como ensino informal.
Keith Swanwick, pesquisador e educador musical, entende que a música deve ser entendida
com base num contexto cultural. Segundo Swanwick (2003, p. 37), “todo músico tem um
‘sotaque’”, fazendo referência a particularidades locais, culturais e educacionais, ou seja, uma
linguagem musical em determinado contexto social. Portanto, é de muita relevância estudar
como se dá o ensino da música nos diversos espaços sociais, dentre tantos que desempenham
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tal tarefa, a Congregação Cristã no Brasil, está em constante aprimoramento, tendo sua
importância nesses espaços educacionais.
A música na Congregação Cristã no Brasil tem ampla aceitação pelos fiéis. A
formação se faz por meio do ensino musical gratuito e coletivo, ministrado dentro das
próprias casas de oração. Mesmo em locais com menos recursos e distantes das grandes
cidades sempre é possível encontrar grupos de músicos e orquestras capazes de executar de
forma adequada todos os 480 hinos contidos no Hinário 5.
A Congregação Cristã no Brasil, por muito tempo utilizou-se do termo “escolinha”
para fazer referência ao ensino da música. Entretanto, com o tempo, passou a ser denominado
GEM – Grupo de Estudos Musicais, uma vez que se trata de uma educação não formal, pois
ocorre fora dos espaços escolares. Porém, o ensino ocorre através de métodos, sistematizados,
com avaliações, controle de frequência, todos os processos que demandam em um ensino
convencional.
O currículo das aulas de música na Congregação Cristã no Brasil é chamado de
programa mínimo. O programa mínimo como currículo inclui o material didático adotado pela
Igreja, bem como o repertório musical a ser executado no fim do processo. O ensino da
música possui duas frentes: a formação de músicos para a orquestra em todos os naipes, e
também a formação de organistas, que executarão juntamente com a orquestra. A iniciação
musical em ambos se dá através do Método de Teoria e Solfejo, diferenciando nos métodos
sugeridos no programa mínimo.
O ensino da música na Igreja nos grupos de estudo, segue um período letivo, que
geralmente vai de fevereiro a novembro, respeitando as férias escolares. As aulas de teoria e
solfejo, acontecem em grupo para obter um melhor aproveitamento, motivação e prática de
tocar em conjunto, respeitando as particularidades de cada aluno.
A sistema de ensino adotado pela igreja, é diferente do convencional, como escolas ou
conservatórios musicais, que trazem o ensino da teoria e prática musical de forma individual,
e para isso utilizam meios rígidos de seleção, que na maioria das vezes excluem iniciantes ou
pessoas que nunca tiveram um contato com a música. O ensino em grupo, ou coletivo, pode
ser definido com a prática de aprender juntos, aprender com o outro:
“[...] a metodologia do ensino coletivo que mostra que na prática coletiva é
possível compartilhar conhecimento, espaço e que a interação e diferença
são partes importantes do aprendizado” (TOURINHO, 2007, p. 1).

Fica evidente que para o ensino coletivo, a forma de selecionar e alfabetizar o aluno
musicalmente é diferente, pois, primeiramente, os alunos são selecionados a partir do seu
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interesse em aprender, uma vez que a observação e a socialização são fatores fundamentais
para a construção do conhecimento.
O ensino em grupo possibilita uma maior interação do indivíduo com o meio
e com o outro, estimula e desenvolve a independência, a liberdade, a
responsabilidade, a auto compreensão, o senso crítico, a desinibição, a 19
sociabilidade, a cooperação, a segurança e, no caso específico do ensino da
música, um maior desenvolvimento musical como um todo (CRUVINEL,
2005, p. 80).

A partir do momento que o candidato à música, inicia nos grupos de estudo, o término
do conteúdo programático dependera de seu desempenho, e conforme este for avançando nos
módulos, é direcionado ao grupo que se encontra na mesma fase do candidato.
Quando o aluno chega ao 6º módulo do Método de Teoria e Solfejo, ele inicia os
estudos com o instrumento pretendido. As aulas com o instrumento, acontecem utilizando o
método especifico de cada instrumento, bem como o hinário. Conforme o aluno vai
concluindo as etapas propostas, inicia tocando apenas nos cultos de ensaio, se for jovem ou
solteiro, nos cultos de Jovens e Menores, após Culto Oficial, e por último a Oficialização, que
é quando o candidato a música, conclui o conteúdo programático mínimo, e tem a permissão
para tocar em qualquer lugar do país, e fora dele também, nas casas de oração da
Congregação.
O propósito da Igreja em ensinar música é preparar o candidato para a execução dos
hinos com perfeição, louvando a Deus através da música e auxiliando a irmandade no cantar
dos hinos e, não de formar músicos profissionais, conforme está escrito no Prefácio do
Método de Teoria e Solfejo – MTS 2º Edição.
Até meados de 2008, a Congregação Cristã no Brasil aplicou o método do italiano
Paschoal Bona. Este método tinha por finalidade específica facilitar a interpretação da leitura
das várias formas rítmicas, e apesar de conter um ABC musical nas primeiras páginas, exigia
um conhecimento prévio do aluno sobre elementos básicos da música, a fim de analisar e
interpretar o método com facilidade.
Em 2009, passa-se a utilizar Método de Teoria e Solfejo 1º Edição, contendo noções
elementares de teoria musical com aplicação ao método P. Bona (1816-1878), até então
utilizado e aos “Hinos de Louvores e Súplicas a Deus”. O MTS 1º Edição, tinha o objetivo de
facilitar a aprendizagem nos grupos de estudos musicais da Congregação Cristã no Brasil. O
método trazia uma abordagem progressiva de aprendizado, organizado em módulos
sequenciais, que ao fim deles, permitia ao candidato a música, adquirir conhecimentos
teóricos, solfejo e divisão musical que lhes serviriam de base para interpretação dos métodos
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musicais de seu instrumento, e principalmente, a interpretação dos hinos contidos no Hinário


4.
A música na Congregação esteve sempre em constante aprimoramento, tanto na forma
de se ensinar, quanto na execução dos hinos, buscando sempre conservar o estilo sacro dos
hinos. No ano de 2012, com a chegada do Hinário 5, tem-se um salto na escrita musical de
diversos hinos, exigindo dos músicos, uma abordagem mais completa, além dos
conhecimentos teóricos e de solfejo, traz uma nova abordagem a linguagem rítmica,
expressões, com a finalidade de melhor executar os hinos.
Em 2014, é publicado Método de Teoria e Solfejo 2º Edição, substituindo
definitivamente o método P. Bona e suas 98 lições de solfejo. O MTS 2º edição é totalmente
voltado ao Hinário 5, e trouxe em seu contexto, uma nova abordagem na forma de se ensinar a
música, passando do ensino individual, para o coletivo, através dos Grupos de Estudos
Musicais, afinal na Congregação, a formação dos músicos, visa a execução em conjunto.
O Método de Teoria e Solfejo 2º Edição, possui o conteúdo apresentado de forma
objetiva, que garante um aprendizado efetivo. Os conceitos apresentados são cumulativos, e
repetem-se no decorrer dos módulos, a fim de garantir a assimilação e a perfeita execução dos
hinos.
No ano de 2017, com o objetivo de auxiliar os encarregados de orquestra, músicos e
candidatos ao estudo da música, é publicado o Manual de Orientação Orquestral. O manual
apresenta informações a respeito dos instrumentos permitidos nas orquestras da Congregação
Cristã no Brasil. Estão incluídas as características destes instrumentos, informações a respeito
de suas respectivas tessituras e extensões sonoras, e suas relações com o respectivo
cruzamento de vozes, por meio de uma visão técnica e em conformidade com as “Instruções
de Utilização do Hinário” que constam no hinário intitulado Hinos de Louvores e Súplicas a
Deus, na edição de julho de 2012. No manual também contém sugestões para auxiliar na
formação de orquestras equilibradas tendo como base a proporcionalidade das famílias dos
instrumentos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Igreja Evangélica é tida como o berço de músicos eruditos, e nesse cenário a


Congregação Cristã no Brasil e a Assembleia de Deus são as que mais formam
instrumentistas. Diante disso, torna-se evidente que o ensino musical iniciado nas instituições
religiosas tem influência na vida dos músicos profissionais, bem como professores.
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Foi nos bancos da igreja evangélica Congregação Cristã no Brasil que o


violinista Davi Graton, 30, teve as primeiras lições de música. "Comecei a
tocar para servir a Deus, não pensava em seguir carreira", diz Graton, que
hoje é concertino da Osesp (Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo),
considerada a melhor do país. (FANTINI, DÉBORA – Folha de São Paulo
09/07/2006)

Em pesquisa realizada no campos da UniCesumar com músicos que atuam na


Orquestra Filarmônica, para levantamento de dados a serem apresentados no trabalho de
conclusão de curso, Souza (2015), revela que 29% dos músicos entrevistados teve sua
iniciação musical em alguma Igreja Evangélica, 13% iniciou seu aprendizado musical em
Igrejas, porém não participa atualmente como músico em Igrejas, e 35% não teve iniciação
musical em Igrejas, mas participa, ou participou como músico em alguma instituição
evangélica, totalizando 77% dos entrevistados, que atuam como profissionais na área da
música, tiveram de alguma forma e em algum momento relação com as Igrejas Protestantes.
O fagotista Lucas Renan Traiba Muniz, natural e residente em Rio Claro, São Paulo,
incentivado pelo pai, iniciou-se musicalmente na Congregação Cristã no Brasil, e aos 12 anos
de idade, adquiriu seu primeiro instrumento. Conforme avançava no estudo do instrumento,
Lucas sentia-se instigado em buscar mais sobre o instrumento, e em uma trajetória difícil,
passou por grandes experiências e oportunidades de aprendizado e aperfeiçoamento no seu
instrumento, o fagote, tendo a chance de estudar no Conservatório de Tatuí, participar de
festivais importantes, e de ter aulas com maestros destaques no instrumento, no qual podemos
citar o Maestro Ernst Mahle. As dificuldades eram grandes, pois, havia grande resistência em
um músico evangélico, seguir carreira profissional, porém o instrumentista, buscou conciliar a
vida profissional com sua dedicação à Igreja também, como relata:
O meu maior objetivo como músico, fagotista, é além dos meus ideais e
projetos terrenos, fazer o dia-dia das pessoas ao meu redor melhor, com o
som do meu instrumento. Se for para quebrar o silêncio, que seja com boa
música, que toca os céus e a alma! (MUNIZ, LUCAS RENAN TRAIBA,
2019)

Diante do exposto, pode-se concluir, afirmando que Congregação Cristã no Brasil,


entre outras Igrejas tem grande contribuição para a formação de músicos profissionais, pois,
proporcionam experiências musicais aos fiéis que culminam na decisão destes músicos e
musicistas em se tornarem profissionais.
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REFERÊNCIAS

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arte. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. p.24.

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Congregação Cristã no Brasil, 2012.

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Monografia (Licenciatura Plena em Educação Artística – Habilitação Música) – Instituto
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12/05/2019

Disponível em: <http://www.hinologia.org/renascimento-reforma-e-a-musica-rev-silas-


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Disponível em: <http://teoriadamusica.com/blog/o-orgao-foi-primeiro-instrumento-da-ccb/>


Acesso em 22/05/2019

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