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Neil Levy
Uma evidência de ordem superior é uma evidência sobre como crenças foram formadas.
Frequentemente moderamos nossa confiança em nossas crenças à luz de evidências de
ordem superior. Por exemplo, você pode achar os argumentos a favor de reservar passagens
aéreas para Las Vegas nesse momento atraentes, mas hesitar à luz do fato de que você está
realmente bêbado. O fato de que você está bêbado é uma evidência de ordem superior: é uma
evidência de que você pode não estar processando bem as evidências de primeira ordem.
Talvez o cenário de ir a Las Vegas não pareça tão atraente pela manhã.
Epistemólogos apontam que às vezes podemos rapidamente nos apegar às nossas crenças
diante da discordância, pois a melhor explicação de porque ela discorda de mim é que ela não
é competente nessa matéria, ou ela estar brincando, ou me trolando. Um convite para falar em
um espaço crível é uma evidência de que a pessoa é competente e é sincera. Ele portanto
fornece uma pesada evidência de ordem superior.
Um convite para falar confere credibilidade porque seleciona pessoas, dentre a grande
multidão de falantes potenciais, como a pessoa que devemos ouvir. A credibilidade decorre
tanto do fato da seleção quanto do prestígio do espaço para o qual são selecionadas para
falar. A autosseleção não confere credibilidade alguma. Se eu subo em um palanque na
esquina do Hyde Park eu me autosselecionei, e nenhuma credibilidade extra é conferida a mim
(se alguma coisa é, falar nesse tipo de espaço confere uma evidência de ordem superior
negativa: as pessoas podem pensar que eu sou um pirado e me levarem menos a sério). O
quão forte seja a evidência de primeira ordem conferida por um convite depende do prestígio
do espaço – ser convidado para dar uma palestra TED confere muita credibilidade já que a
organização é tão prestigiada – e de fatos sobre como se supõe que o processo de seleção
funciona.
Para ver como isso se desenrola na prática, considere a controvérsia sobre o documentário
Root Cause (2019) [“Causa Raiz”, em tradução livre], que vende a desacreditada ideia de que
tratamentos de canal radicular causam câncer. O documentário está disponível na Netflix e na
Amazon. Recentemente, em uma entrevista ao The Guardian, a pesquisadora de mídia Erica
Austin da Universidade do Estado de Washington disse que, diferente do YouTube onde o
conteúdo é gerado pelo usuário, estar disponível nesses sites confere credibilidade ao
documentário. Estar no YouTube é como subir no meu palanque: nenhuma credibilidade extra
é conferida a mim pela autosseleção. Mas ter sido selecionado pela Netflix ou Amazon confere
alguma credibilidade. É claro, a Netflix e a Amazon não são muitos seletivas, e a credibilidade
conferida é quase mínima. Ser convidado para falar em uma universidade confere muito mais
credibilidade.
É claro que o convite é apenas prima facie evidência de ordem superior. Se descobrirmos que
ela foi convidada somente porque fez uma grande doação à escola, ou porque ela é prima do
decano, essa evidência é enfraquecida consideravelmente. É esse tipo de consideração – não
um argumento racional – que rebate evidências de ordem superior. Rebatemos evidências de
ordem superior usando abordagens que muitos argumentos do discurso aberto deploram,
porque elas não abordam evidências de ordem superior. Um ataque ad hominem (ele está
sendo financiado pela indústria do petróleo; ele é um racista) ou ataques à credibilidade
daqueles que forneceram a ele uma plataforma não abordam seus argumentos, mas eles são
frequentemente respostas apropriadas a evidências de ordem superior.
Neil Levy é um pesquisador sênior do Centro Oxford Uehiro para Ética Prática e professor de
filosofia na Universidade Macquarie em Sidnei. Ele é o autor de Consciousness and Moral
Responsibility (2014). Ele mora em Sidnei.