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O Credo, comentado por Bento XVI 1

O CREDO
COMENTADO POR

BENTO XVI

Na grande maioria dos textos seleccionados, seguimos a escolha apresentada na publicação


ilustrada “Creio em um só Deus, comentado pelo Papa Bento XVI” da Bertrand Editora, Lisboa
2007. Substituímos um ou outro texto, que nos pareceu mais adequado e acrescentamos alguns
excertos da Encíclica Spe Salvi, sobretudo nos artigos relacionados com a esperança cristã.
O Credo, comentado por Bento XVI 2

Creio
Credo

“Em todas as labutas do nosso tempo, a fé deve ter deveras a prioridade. Há duas gerações, talvez ela ainda
pudesse ser pressuposta como uma coisa natural: crescia-se na fé; ela, de certa forma, estava simplesmente
presente como uma parte da vida e não tinha que ser procurada de modo particular. Precisava de ser plasmada
e aprofundada, mas era vista como uma coisa óbvia. Hoje parece ser natural o contrário, isto é, que no fundo
não é possível crer, que de facto Deus está ausente.

Contudo, a fé da Igreja parece ser uma coisa do passado longínquo. Assim, até cristãos activos têm a ideia que
convém escolher para si, do conjunto da fé da Igreja, as coisas que ainda se consideram possíveis hoje. E
principalmente activamo-nos para cumprir através do compromisso pelos homens, por assim dizer,
contemporaneamente também o próprio dever em relação a Deus.

Mas isto é o início de uma espécie de "justificação mediante as obras": o homem justifica-se a si mesmo e ao
mundo em que desempenha aquilo que parece claramente necessário, mas falta a luz interior e a alma de tudo.

Por isso, penso que seja importante consciencializar-se de novo do facto que a fé é o centro de tudo "Fides tua
te salvum fecit" (“a tua fé te salvou), diz o Senhor repetidas vezes àqueles que curou. Não é o contacto físico,
não é o gesto exterior que decide, mas o facto que aqueles doentes acreditaram. E nós podemos ainda servir o
Senhor de modo vivaz unicamente se a fé se torna forte e se faz presente na sua abundância.

Gostaria de ressaltar neste contexto dois aspectos fundamentais.

Primeiro: a fé é sobretudo fé em Deus. No cristianismo não se trata de um peso enorme de coisas diferentes,
mas tudo o que o Credo diz e que o desenvolvimento da fé realizou, existe unicamente para tornar mais claro à
nossa vista o rosto de Deus. Ele existe e vive; n'Ele cremos; diante d'Ele, e na sua perspectiva, no ser-com-Ele e
por Ele é que vivemos. E em Jesus Cristo, Ele está, de certa forma, corporalmente connosco.

O outro aspecto é que não podemos inventar nós próprios a fé compondo-a de pedaços "sustentáveis", mas que
cremos juntamente com a Igreja. Não podemos compreender tudo o que a Igreja ensina, nem tudo pode ser
apresentado em cada vida. Mas é importante que sejamos crentes no grande Eu da Igreja, no seu Nós vivente,
encontrando-nos assim na grande comunidade da fé, naquele grande sujeito, no qual o Tu de Deus e o Eu do
homem verdadeiramente se encontram; no qual o passado das palavras da Escritura se torna presente, os
tempos se compenetram reciprocamente, o passado é presente e, abrindo-se para o futuro, deixa entrar no
tempo o esplendor da eternidade, do Eterno. Esta forma completa da fé, expressa no Credo, de uma fé em Igreja
e com a Igreja como sujeito vivente, no qual o senhor age esta é a forma de fé que deveríamos procurar pôr
deveras no centro das nossas actividades1”.

“"Permanecei firmes na fé". A exortação encerrada nestas palavras dirige-se a todos nós que formamos a
comunidade dos discípulos de Cristo, dirige-se a cada um de nós. A fé é um acto humano muito pessoal que se
realiza em duas dimensões. Crer significa antes de tudo aceitar como verdade aquilo que a nossa mente não
compreende totalmente. É preciso aceitar o que Deus nos revela sobre si mesmo, sobre nós mesmos e sobre a
realidade que nos circunda, também a invisível, inefável, inimaginável. Este acto de aceitação da verdade
revelada, alarga o horizonte do nosso conhecimento e permite-nos alcançar o mistério no qual a nossa
existência está imergida. Não se concede facilmente um consentimento a este limite da razão.

E é precisamente aqui que a fé se manifesta na sua segunda dimensão: a de se confiar a uma pessoa não a uma
pessoa ordinária, mas a Cristo. É importante aquilo em que cremos, mas ainda mais importante é aquele em
quem cremos”2.

1
DISCURSO NO ENCONTRO COM OS BISPOS DA SUÍÇA Terça-feira, 7 de Novembro de 2006
2
HOMILIA DURANTE A CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA NO PARQUE DE BŁONIA, Cracóvia, 28 de Maio de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 3

Em um só Deus
in unum Deum

“Existe um único Deus, que é o Criador do céu e da terra, e por isso é também o Deus de todos os homens. Dois
factos se singularizam neste esclarecimento: que verdadeiramente todos os outros deuses não são Deus e que
toda a realidade onde vivemos se deve a Deus, é criada por Ele. Certamente a ideia de uma criação existe
também algures, mas só aqui aparece perfeitamente claro que não um deus qualquer, mas o único Deus
verdadeiro, Ele mesmo, é o autor de toda a realidade; esta provém da força da sua Palavra criadora. Isto significa
que esta sua criatura Lhe é querida, precisamente porque foi desejada por Ele mesmo, foi «feita» por Ele. E
assim aparece agora o segundo elemento importante: este Deus ama o homem.

A força divina que Aristóteles, no auge da filosofia grega, procurou individuar mediante a reflexão, é certamente
para cada ser objecto do desejo e do amor — como realidade amada esta divindade move o mundo —, mas ela
mesma não necessita de nada e não ama, é somente amada. Ao contrário, o único Deus em que Israel crê, ama
pessoalmente. Além disso, o seu amor é um amor de eleição: entre todos os povos, Ele escolhe Israel e ama-o —
mas com a finalidade de curar, precisamente deste modo, a humanidade inteira. Ele ama, e este seu amor pode
ser qualificado sem dúvida como eros, que no entanto é totalmente agape também”3.

3
ENCÍCLICA DEUS CARITAS EST, 9.
O Credo, comentado por Bento XVI 4

Pai
Patrem

“Na realidade, os cristãos continuam a crer, não obstante todas as incompreensões e confusões do mundo
circunstante, «na bondade de Deus e no seu amor pelos homens» (Tt 3, 4). Apesar de estarem imersos como os
outros homens na complexidade dramática das vicissitudes da história, eles permanecem inabaláveis na certeza
de que Deus é Pai e nos ama, ainda que o seu silêncio seja incompreensível para nós”4.

“Perante os riscos que a humanidade vive em nossa época, é dever de todos os católicos intensificar, em todas
as partes do mundo, o anúncio e o testemunho do «Evangelho da paz», proclamando que o reconhecimento da
verdade plena de Deus é condição prévia e indispensável para a consolidação da verdade da paz.

Deus é amor que salva, Pai amoroso que deseja ver os seus filhos reconhecerem-se mutuamente como irmãos,
procurando responsavelmente pôr os seus vários talentos ao serviço do bem comum da família humana. Deus é
fonte inesgotável da esperança que dá sentido à vida pessoal e colectiva. Deus, e só Ele, torna eficaz qualquer
obra de bem e de paz.

A história demonstrou amplamente que, fazer guerra a Deus para extirpá-Lo do coração dos homens, leva a
humanidade, assustada e empobrecida, para decisões que não têm futuro. Isto deve impelir os crentes em Cristo
a fazerem-se testemunhas convictas de um Deus que é inseparavelmente verdade e amor, colocando-se ao
serviço da paz numa ampla colaboração ecuménica e com as outras religiões e ainda com todos os homens de
boa vontade”5.

4
ENCÍCLICA DEUS CARITAS EST, 38.
5
MENSAGEM PARA A CELEBRAÇÃO DO DIA MUNDIAL DA PAZ 1 DE JANEIRO DE 2006, n.11
O Credo, comentado por Bento XVI 5

Todo-Poderoso
Omnipotentem

“O mundo precisa de Deus. Nós precisamos de Deus. De qual Deus? Na primeira leitura, o profeta dirige-se a um
povo oprimido dizendo: "A vingança de Deus virá" (Vulg. 35, 4). Podemos intuir facilmente como o povo imagina
essa vingança. Mas o mesmo profeta revela depois em que ela consiste: na bondade restabelecedora de Deus. A
explicação definitiva da palavra do profeta, encontramo-la n'Aquele que morreu na Cruz: em Jesus, o Filho de
Deus encarnado que aqui nos olha com tanta insistência.

A sua "vingança" é a Cruz: o "Não" à violência, "o amor até ao fim". É este o Deus do qual temos necessidade.
Não faltamos ao respeito pelas outras religiões e culturas, nem ao respeito profundo pela sua fé, se
confessarmos em voz alta e sem meios-termos aquele Deus que opõe à violência o seu sofrimento; que perante
o mal e o seu poder eleva, como limite e superação, a sua misericórdia. A Ele dirigimos a nossa súplica, para que
Ele esteja no meio de nós e nos ajude a ser suas testemunhas credíveis. Amem”6!

“Este é o sinal de Deus: Ele mesmo é amor. Quantas vezes nós desejaríamos que Deus se mostrasse mais forte.
Que atingisse duramente, vencesse o mal e criasse um mundo melhor. Todas as ideologias do poder se
justificam assim, justificando a destruição daquilo que se opõe ao progresso e à libertação da humanidade. Nós
sofremos pela paciência de Deus. E de igual modo todos temos necessidade da sua plenitude. O Deus, que se
tornou cordeiro, diz-nos que o mundo é salvo pelo Crucificado e não por quem crucifica. O mundo é redimido
pela paciência de Deus e destruído pela impaciência dos homens7”.

“O poder de Deus é diferente do poder dos poderosos do mundo. A maneira de agir de Deus é diferente de
como nós a imaginamos e de como gostaríamos de a impor também a Ele. Neste mundo, Deus não entra em
concorrência com as formas terrenas do poder. Não contrapõe as suas divisões a outras divisões. Deus não envia
a Jesus, no monte das oliveiras, doze legiões de anjos para o ajudarem (cf. Mt 26, 53). Ele contrapõe ao poder
rumoroso e prepotente deste mundo o poder inerme do amor, que na Cruz e depois sempre de novo no
decorrer da história se submete, e contudo constitui a novidade divina que depois se opõe à injustiça e instaura
o Reino de Deus8”.

6
HOMILIA DURANTE A CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA NA ESPLANADA DE NEUE MESSE (NOVA FEIRA) München, 10 de Setembro de 2006
7
HOMILIA NO INÍCIO DO PONTIFICADO Praça de São Pedro Domingo, 24 de Abril de 2005
8
DISCURSO NA VIGÍLIA DE ORAÇÃO COM OS JOVENS NA ESPLANADA DE MARIENFELD Sábado, 20 de Agosto de 2005
O Credo, comentado por Bento XVI 6

Criador do Céu e da Terra


Factorem coeli et terrae

“O que existe na origem? A razão criadora, o Espírito Criador que tudo realiza e suscita o desenvolvimento, ou a
Irracionalidade que, privada de qualquer razão, estranhamente produz um cosmos ordenado de maneira
matemática e também o homem, a sua razão. Mas ela, então, seria apenas um resultado casual da evolução e
por conseguinte, no fundo, também uma coisa irracional.

Nós cristãos dizemos: "Creio em Deus Pai, Criador do céu e da terra" creio no Espírito Criador. Nós cremos que
na origem está o Verbo eterno, a Razão e não a Irracionalidade. Com esta fé não precisamos de nos esconder,
não devemos recear que nos encontramos com ela num beco sem saída. Sentimos alegria em poder conhecer
Deus”9!

“Porque estais na terra? Respondemos: estamos na terra, porque o Criador nos colocou como coroamento da
obra da criação. O Deus omnipotente, em conformidade com o seu desígnio inefável de amor, criou o cosmos,
tirou-o do nada. E depois de ter feito esta obra, chamou o homem à existência, criado à própria imagem e
semelhança (cf. Gn 1, 26-27). Concedeu-lhe a dignidade de filho de Deus e a imortalidade.

Mas sabemos que o homem se perdeu, abusou do dom da liberdade e disse "não" a Deus, condenando-se desta
forma a uma existência na qual entram o mal, o pecado, o sofrimento e a morte. Mas também sabemos que o
próprio Deus não se resignou a essa situação e entrou directamente na história do homem, a qual se tornou
história da salvação. "Estamos na terra", estamos radicados nela, dela crescemos. Aqui praticamos o bem nos
vastos campos da existência quotidiana, no âmbito da esfera material, e também na espiritual: nas relações
recíprocas, na edificação da comunidade humana, na cultura. Aqui experimentamos a fadiga do viandante a
caminho rumo à meta pelas estradas complicadas, entre hesitações, tensões, incertezas, mas também na
profunda consciência que mais cedo ou mais tarde este caminho chegará ao fim. E é então que nasce a reflexão:
só isto? A terra na qual "nos encontramos" é o nosso destino definitivo”10?

9
HOMILIA NA SOLENE CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICANO ISLINGER FELD Regensburg, 12 de Setembro de 2006
10
HOMILIA DURANTE A CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA NO PARQUE DE BŁONIA Cracóvia, 28 de Maio de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 7

De todas as coisas visíveis e invisíveis


Visibilium omnium et invisibilium

“Ao homem é concedida uma altíssima dignidade, que tem as suas raízes no vínculo profundo que o une ao seu
Criador: no homem, em cada homem, em qualquer estádio ou condição da sua vida, resplandece um reflexo da
própria realidade de Deus11”

“A cultura moderna enfatizou legitimamente a autonomia do homem e das realidades terrenas, desenvolvendo
assim uma perspectiva querida ao Cristianismo, a da Encarnação de Deus. Mas como afirmou claramente o
Concílio Vaticano II, se esta autonomia leva a pensar que "as coisas criadas não dependem de Deus, e que o
homem as pode usar sem as relacionar com o Criador", então dá-se origem a um desequilíbrio profundo, porque
"a criatura sem o seu Criador perde o sentido" (Gaudium et spes, 36). É significativo que o documento conciliar,
no trecho citado, afirme que esta capacidade de reconhecer a voz e a manifestação de Deus na beleza da criação
seja característica de todos os crentes, seja qual for a religião a que pertencem.

Disto podemos concluir que o respeito pleno da vida está ligado ao sentido religioso, à atitude interior com a
qual o homem se coloca em relação à realidade, se se considera dono ou preservador. De resto, a palavra
"respeito", deriva do verbo latino respicere-guardar, e indica o modo de ver as coisas e as pessoas que conduz a
reconhecer nelas a consistência, a não se apropriar delas, e a respeitá-las, ocupando-se delas. Em última análise,
se as criaturas forem privadas da sua referência a Deus, como fundamento transcendente, elas correm o risco de
estar à mercê do livre arbítrio do homem que pode dispor delas como vemos, fazendo delas um uso
desatinado”12.

11
DISCURSO AOS PARTICIPANTES NO CONGRESSO INTERNACIONAL PROMOVIDO PELA PONTIFÍCIA ACADEMIA PARA A VIDA Segunda-feira, 27 de
Fevereiro de 2006
12
HOMILIA DURANTE A VISITA À PARÓQUIA DE SANTA ANA NO VATICANO Domingo, 5 de Fevereiro de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 8

Creio em um só Senhor
Et in unum Dominum

“Nós cremos no amor de Deus — deste modo pode o cristão exprimir a opção fundamental da sua vida. Ao início
do ser cristão, não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma
Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo. No seu Evangelho, João tinha
expressado este acontecimento com as palavras seguintes: « Deus amou de tal modo o mundo que lhe deu o
seu Filho único para que todo o que n'Ele crer (...) tenha a vida eterna » (3, 16). Com a centralidade do amor, a fé
cristã acolheu o núcleo da fé de Israel e, ao mesmo tempo, deu a este núcleo uma nova profundidade e
amplitude13”

“Cristo repropõe no meio de nós, de modo visível, o "Deus invisível"; n'Ele vemos o rosto de Deus através da
natureza comum que os une. Em virtude desta sua altíssima dignidade, Cristo precede "todas as coisas", não só
por causa da sua eternidade, mas também e sobretudo pela sua obra criadora e providente: "porque n'Ele foram
criadas todas as coisas, tanto as celestes como as terrestres, tanto as visíveis como as invisíveis... e tudo n'Ele
subsiste" (vv. 16-17).

Aliás, as coisas foram criadas "para Ele" (v. 16). E assim, São Paulo indica-nos uma verdade muita importante: a
história tem uma meta, uma direcção. A história orienta-se rumo à humanidade unida em Cristo, ao homem
perfeito, ao humanismo perfeito. Por outras palavras, São Paulo diz-nos: sim, há progresso na história. Há por
assim dizer uma evolução da história.

Progresso é tudo o que nos aproxima de Cristo e assim nos aproxima da humanidade unida, do verdadeiro
humanismo. Desta forma, no interior destas indicações esconde-se também um imperativo para nós: trabalhar
pelo progresso é o que todos nós queremos. Podemos fazê-lo, trabalhando pela aproximação dos homens a
Cristo; podemos fazê-lo, conformando-nos pessoalmente a Cristo, caminhando deste modo na linha do
progresso autêntico”14.

13
ENCÍCLICA DEUS CARITAS EST, 1
14
AUDIÊNCIA GERAL Quarta-feira, 4 de Janeiro 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 9

Jesus
Iesum

“A Deus jamais alguém O viu. O Filho Unigénito, que é Deus, está no seio do Pai, foi Ele quem O deu a
conhecer», lê-se no final do prólogo do quarto evangelho (Jo.1,18). Quem é Deus sabemo-lo através de Jesus
Cristo: do único que é Deis. É mediante Ele que entramos em contacto com Deus”15.

“Por meio de Jesus nós lançamos, por assim dizer, um olhar sobre a intimidade de Deus. No seu Evangelho, João
expressou-o assim: "A Deus, jamais alguém O viu. O Filho unigénito, que é Deus e está no seio do Pai, foi Ele
quem O deu a conhecer" (Jo 1, 18). Todavia, Jesus não nos deixou somente olhar na intimidade de Deus; com
Ele, Deus também como que saiu da sua intimidade e veio ao nosso encontro. Isto acontece sobretudo na sua
vida, paixão, morte e ressurreição; na sua palavra. Mas Jesus não se contenta com vir ao nosso encontro. Ele
quer mais. Deseja a unificação. Este é o significado das imagens do banquete e das bodas. Nós não devemos
somente conhecer algo dele, mas através dele mesmo temos o dever de ser atraídos a Deus. Por isso, Ele deve
morrer e ressuscitar. Porque agora já não se encontra num determinado lugar, mas o seu Espírito, o Espírito
Santo, já emana dele e entra nos nossos corações, unindo-nos deste modo com o próprio Jesus e com o Pai com
o Deus Uno e Trino”16.

15
DISCURSO NA CATEDRAL DE REGENSBURG, 12 de Setembro de 2006
16
HOMILIA NA VIGÍLIA DE PENTECOSTES Sábado, 3 de Junho de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 10

Cristo
Christum

“Na cruz Cristo grita: "Tenho sede" (Jo 19, 28): revela assim uma sede ardente de amar e de ser amado por todos
nós. Unicamente se conseguirmos compreender a profundeza e a intensidade deste mistério, nos apercebemos
da necessidade e da urgência de o amar por nossa vez "como" Ele nos amou”17.

“A profissão de fé de Pedro constitui o fundamento inabalável da Igreja. Com Pedro, dizemos a Jesus: "Tu és
Cristo, o Filho do Deus vivo". A Palavra de Deus não é apenas palavra. Em Jesus Cristo, ela está presente no meio
de nós como Pessoa. Esta é a finalidade mais profunda da existência deste edifício sagrado: a igreja existe
porque nela encontramos Cristo, o Filho do Deus vivo. Deus tem um rosto. Deus tem um nome.

Em Cristo, Deus fez-se homem e entrega-se-nos no mistério da Santíssima Eucaristia. A Palavra é carne. Ela
entrega-se-nos sob as aparências do pão e, assim, torna-se verdadeiramente o Pão de que vivemos. Nós,
homens, vivemos da Verdade. Esta Verdade é Pessoa: ela fala-nos e nós falamos-lhe. A Igreja é o lugar de
encontro com o Filho de Deus vivo e, deste modo, constitui o lugar de encontro entre nós. Esta é a alegria que
Deus nos concede: que Ele se fez um de nós, que nós podemos tocá-lo e que Ele vive connosco. O júbilo de Deus
é realmente a nossa força”18.

17
MENSAGEM PARA A XXII JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE (1 DE ABRIL DE 2007)
18
HOMILIA DURANTE A CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA PARA A DEDICAÇÃO DA IGREJA DE SANTA MARIA ESTRELA DA EVANGELIZAÇÃO Roma,
10 de Dezembro de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 11

Filho Unigénito de Deus, nascido do Pai antes de todos os séculos:


Deus de Deus, Luz da Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro
Filium Dei unigenitum et ex Patre natum ante omnia saecula:
Deum de Deo, lumen de lumine, Deum verum de Deo vero…

“Com efeito, ninguém jamais viu a Deus tal como Ele é em Si mesmo. E, contudo, Deus não nos é totalmente
invisível, não se deixou ficar pura e simplesmente inacessível a nós. Deus amou-nos primeiro — diz a Carta de
João citada (cf. 4, 10) — e este amor de Deus apareceu no meio de nós, fez-se visível quando Ele « enviou o seu
Filho unigénito ao mundo, para que, por Ele, vivamos » (1 Jo 4, 9). Deus fez-Se visível: em Jesus, podemos ver o
Pai (cf. Jo 14, 9)”19.

“Nós cremos em Deus. Afirmam-no as partes principais do Credo e ressalta isto sobretudo a sua primeira parte.
Mas agora segue-se imediatamente a segunda pergunta: em que Deus? Pois bem, cremos precisamente naquele
Deus que é o Espírito Criador, Razão criativa, da qual tudo provém e na qual também nós temos a origem. A
segunda parte do Credo diz-nos mais. Esta Razão criativa é Bondade. É Amor. Ela tem um rosto. Deus não nos
deixa vacilar no vazio. Mostrou-se como homem. Ele é tão grande que pode permitir-se de se fazer
pequeníssimo. "Quem me vê, vê o Pai", diz Jesus (Jo 14, 9).

Deus assumiu um rosto humano. Ama-nos a tal ponto que se deixa pregar na Cruz, para levar os sofrimentos da
humanidade até ao coração de Deus. Hoje, que conhecemos as patologias e as doenças mortais da religião e da
razão, as destruições da imagem de Deus por causa do ódio e do fanatismo, é importante dizer com clareza em
qual Deus nós cremos e professar convictos este rosto humano de Deus. Só isto nos liberta do receio de Deus
um sentimento do qual, em definitiva, nasceu o ateísmo moderno. Só este Deus nos salva do medo do mundo e
da ansiedade perante o vazio da própria existência. Só olhando para Jesus Cristo, a nossa alegria em Deus
alcança a sua plenitude, se torna alegria remida”20.

19
ENCÍCLICA DEUS CARITAS EST, 17
20
HOMILIA NA SOLENE CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA NO ISLINGER FELD Regensburg, 12 de Setembro de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 12

Gerado não criado, consubstancial ao Pai


Genitum non factum consubstancialem Patri

“Cristo é proclamado "primogénito (gerado antes) de todas as criaturas" (v. 15). Cristo precede toda a criação
(cf. v. 17), sendo gerado desde a eternidade: por isso "foi nele que todas as coisas foram criadas, nos céus e na
terra" (v. 16). Também na antiga tradição hebraica se afirma que "todo o mundo foi criado em vista do Messias"
(Sanhedrin 98b)”21.

“A Palavra de Deus, ao contrário, estimula-nos com determinação à maternidade e exorta-nos a comprometer-


nos com todas as nossas forças em prol de uma elevada medida de humanidade. Ao escrever à comunidade de
Éfeso, são Paulo exortava os cristãos a não se comportarem como os pagãos, "no vazio da sua mente,
obscurecidos no pensamento e alienados da vida de Deus" (4, 17-18).

Os verdadeiros discípulos do Senhor, pelo contrário, longe de permanecerem na condição de crianças, levadas
de um lugar para outro por qualquer vento de doutrina (cf. Ef 4, 14), esforçam-se por chegar à estatura do
"homem perfeito, à medida completa da plenitude de Cristo" (Ef 4, 13). Por conseguinte, o homem perfeito
segundo o qual se mede o humanismo autêntico é Jesus Cristo, Filho de Deus, entregue pelo Pai à humanidade
para restabelecer a sua imagem deturpada pelo pecado. É com Ele que todos os homens se devem confrontar; é
para Ele que, com a ajuda da graça, eles devem tender com todo o seu coração, com toda a sua mente e com
todas as suas forças, para realizar plenamente a sua existência e para responder com alegria e entusiasmo à
excelsa vocação inscrita no seu coração (cf. Gaudium et spes, 22)”22.

21
AUDIÊNCIA GERAL Quarta-feira, 7 de Setembro de 2005
22
MENSAGEM AOS MEMBROS DAS PONTIFÍCIAS ACADEMIAS POR OCASIÃO DA X ASSEMBLEIA PÚBLICA Terça-feira, 15 de Novembro de 2005
O Credo, comentado por Bento XVI 13

Por Ele todas as coisas foram feitas


Per Quem omnia facta sunt

“Cristo é o princípio de união ("todas as coisas n'Ele subsistem"), o mediador ("por meio d'Ele"), e o destino final
para o qual converge toda a criação. Ele é "o primogénito de muitos irmãos" (Rm 8, 29), ou seja é o Filho por
excelência na grande família dos filhos de Deus, na qual nos insere o Baptismo”23.

“O pão não é simples e somente o nosso produto, uma coisa feita por nós; é fruto da terra e portanto também
dom. Porque o facto que a terra dá frutos, não é merecimento nosso; só o Criador lhe podia conferir a
fertilidade.

E agora podemos alargar um pouco mais esta oração da Igreja, dizendo: o pão é fruto da terra e, ao mesmo
tempo, do céu. Pressupõe a sinergia das forças da terra e dos dons do alto, isto é, do sol e da chuva. E também a
água, da qual temos necessidade para preparar o pão, não a podemos produzir nós. Num período, no qual se
fala da desertificação e sentimos sempre de novo denunciar o perigo de que homens e animais morram de sede
nestas regiões sem água neste período damo-nos conta da grandeza do dom também da água e de quanto
somos incapazes de o obter sozinhos. Então, olhando mais de perto, vemos este pequeno pedaço de Hóstia
branca, este pão dos pobres, como uma síntese da criação. Céu e terra, assim como a actividade e o espírito do
homem, concorrem.

A sinergia das forças que torna possível no nosso pobre planeta o mistério da vida e a existência do homem, vem
ao nosso encontro em toda a sua maravilhosa grandeza. Assim começamos a compreender porque o Senhor
escolhe este pedaço de pão como símbolo seu. A criação com todos os seus dons aspira para além de si mesma a
algo de maior. Além da síntese das próprias forças, além da síntese também de natureza e de espírito que, de
certa forma, sentimos no pedaço de pão, a criação inclina-se para a divinização, para as santas núpcias, para a
unificação com o próprio Criador”24.

23
AUDIÊNCIA GERAL Quarta-feira, 7 de Setembro de 2005
24
HOMILIA NA SOLENIDADE DE CORPUS CHRISTI Quinta-feira, 15 de Junho de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 14

E por nós homens e para nossa salvação desceu dos céus


Qui propter nos homines et propter nostram salutem descendit de coelis

“Cristo não usa o seu ser igual a Deus, a sua dignidade gloriosa e o seu poder como instrumento de triunfo, sinal
de distância, expressão de esmagadora supremacia (cf. Fil.2, 6). Aliás, ele "despojou-se", esvaziou-se a si mesmo,
imergindo-se sem reservas na miserável e frágil condição humana. A "forma" (morphe) divina esconde-se em
Cristo sob a "forma" (morphe) humana, isto é, sob a nossa realidade marcada pelo sofrimento, pela pobreza,
pelo limite e pela morte (cf. Fil.2, 7)”25.

“A verdadeira novidade do Novo Testamento não reside em novas ideias, mas na própria figura de Cristo, que dá
carne e sangue aos conceitos — um incrível realismo. Já no Antigo Testamento a novidade bíblica não consistia
simplesmente em noções abstractas, mas na acção imprevisível e, de certa forma, inaudita de Deus. Esta acção
de Deus ganha agora a sua forma dramática devido ao facto de que, em Jesus Cristo, o próprio Deus vai atrás da
«ovelha perdida», a humanidade sofredora e transviada.

Quando Jesus fala, nas suas parábolas, do pastor que vai atrás da ovelha perdida, da mulher que procura a
dracma, do pai que sai ao encontro do filho pródigo e o abraça, não se trata apenas de palavras, mas constituem
a explicação do seu próprio ser e agir. Na sua morte de cruz, cumpre-se aquele virar-se de Deus contra Si
próprio, com o qual Ele Se entrega para levantar o homem e salvá-lo — o amor na sua forma mais radical.

O olhar fixo no lado trespassado de Cristo, de que fala João (cf. 19, 37), compreende o que serviu de ponto de
partida a esta Carta Encíclica: «Deus é amor» (1 Jo 4, 8). É lá que esta verdade pode ser contemplada. E
começando de lá, pretende-se agora definir em que consiste o amor. A partir daquele olhar, o cristão encontra o
caminho do seu viver e amar”26.

25
AUDIÊNCIA GERAL Quarta-feira, 1 de Junho de 2005
26
ENCÍCLICA DEUS CARITAS EST, 12
O Credo, comentado por Bento XVI 15

E encarnou pelo Espírito Santo no seio da Virgem Maria


Et encarnatus est de Spiritu Sancto, ex Maria Virgine

“Maria diz "sim" à grande vontade de Deus, uma vontade aparentemente demasiado grande para um ser
humano; Maria diz "sim" àquela vontade divina, coloca-se dentro desta vontade, insere toda a sua existência,
com um grande "sim", na vontade de Deus e assim abre a porta do mundo a Deus. Adão e Eva, com o seu "não"
à vontade de Deus, tinham fechado esta porta. "Seja feita a vontade de Deus": Maria convida-nos, também a
nós, a pronunciar este "sim", que às vezes parece tão difícil. Somos tentados a preferir a nossa vontade, mas Ela
diz-nos: "Tem coragem, também tu diz: "Seja feita a tua vontade", porque esta vontade é boa"27.

“Maria é grande, precisamente porque não quer fazer-Se grande a Si mesma, mas engrandecer a Deus. Ela é
humilde: não deseja ser mais nada senão a serva do Senhor (cf. Lc 1, 38.48). Sabe que contribui para a salvação
do mundo, não realizando uma sua obra, mas apenas colocando-Se totalmente à disposição das iniciativas de
Deus. É uma mulher de esperança: só porque crê nas promessas de Deus e espera a salvação de Israel, é que o
Anjo pode vir ter com Ela e chamá-La para o serviço decisivo de tais promessas. É uma mulher de fé: «Feliz de Ti,
que acreditaste», diz-lhe Isabel (cf. Lc 1, 45). O Magnificat — um retrato, por assim dizer, da sua alma — é
inteiramente tecido com fios da Sagrada Escritura, com fios tirados da Palavra de Deus. Desta maneira se
manifesta que Ela Se sente verdadeiramente em casa na Palavra de Deus, dela sai e a ela volta com
naturalidade. Fala e pensa com a Palavra de Deus; esta torna-se palavra d'Ela, e a sua palavra nasce da Palavra
de Deus. Além disso, fica assim patente que os seus pensamentos estão em sintonia com os de Deus, que o d'Ela
é um querer juntamente com Deus. Vivendo intimamente permeada pela Palavra de Deus, Ela pôde tornar-Se
mãe da Palavra encarnada.

Enfim, Maria é uma mulher que ama. E como poderia ser de outro modo? Enquanto crente que na fé pensa com
os pensamentos de Deus e quer com a vontade de Deus, Ela não pode ser senão uma mulher que ama”28.

27
HOMILIA DURANTE A CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA NA PARÓQUIA ROMANA DE SANTA MARIA CONSOLADORA Domingo, 18 de Dezembro de
2005
28
ENCÍCLICA DEUS CARITAS EST, 41
O Credo, comentado por Bento XVI 16

E se fez Homem
Et homo factus est

“No Menino de Belém cada homem descobre que é gratuitamente amado por Deus; na luz do Natal manifesta-
se a cada um de nós a bondade infinita de Deus. Em Jesus Pai celeste inaugurou uma nova relação connosco;
tornou-nos "filhos no mesmo Filho"”29.

“Só o Menino que jaz no presépio possui o verdadeiro segredo da vida. Por isso pede para ser acolhido, que se
lhe conceda um espaço em nós, nos nossos corações, nas nossas casas, nas nossas cidades e nas nossas
sociedades. Ressoam no coração e na mente as palavras do prólogo de João: "A quantos o receberam, aos que
nele crêem, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus" (1, 12). Procuremos estar entre quantos o
recebem. Diante dele não se pode permanecer indiferente.

Também nós, queridos amigos, devemos tomar continuamente posição.

Qual será então a nossa resposta? Com que atitude o acolhemos? Vêm em nossa ajuda a simplicidade dos
pastores e a busca dos Magos que, através da estrela, perscrutam os sinais de Deus; servem-nos de exemplo a
docilidade de Maria e a sábia prudência de José. Os mais de dois mil anos de história cristã estão cheios de
exemplos de homens e mulheres, de jovens e adultos, de crianças e idosos que acreditaram no Mistério do
Natal, abriram os braços ao Emanuel tornando-se com a sua vida faróis de luz e de esperança. O amor que Jesus,
nascendo em Belém, trouxe ao mundo, liga a si quantos o acolhem numa relação duradoura de amizade e de
fraternidade”30.

“Cada criança que nasce é sinal da confiança de Deus no homem e é uma confirmação, pelo menos implícita, da
esperança que o homem nutre por um futuro aberto à eternidade de Deus. A esta esperança do homem, Deus
respondeu nascendo no tempo como pequeno ser humano”31.

29
AUDIÊNCIA GERAL Quarta-feira, 3 de Janeiro 2007
30
AUDIÊNCIA GERAL Quarta-feira, 3 de Janeiro 2007
31
HOMILIA Na CELEBRAÇÃO DAS PRIMEIRAS VÉSPERAS DO ADVENTO Basílica Vaticana Sábado, 1° de Dezembro de 2007
O Credo, comentado por Bento XVI 17

Também por nós foi crucificado sob Pôncio Pilatos…


Crucifixus etiam pro nobis sub Pontio Pilato…

“O amor apaixonado de Deus pelo seu povo — pelo homem — é ao mesmo tempo um amor que perdoa. E é tão
grande, que chega a virar Deus contra Si próprio, o seu amor contra a sua justiça. Nisto, o cristão vê já esboçar-
se veladamente o mistério da Cruz: Deus ama tanto o homem que, tendo-Se feito Ele próprio homem, segue-o
até à morte e, deste modo, reconcilia justiça e amor”32.

“A hora de Jesus é a hora em que o amor vence. Por outras palavras: foi Deus que venceu, porque Ele é Amor. A
hora de Jesus quer tornar-se a nossa hora e tornar-se-á a nossa hora se nós, mediante a celebração da
Eucaristia, nos deixarmos envolver por aquele processo de transformações que o Senhor tem por finalidade.

A Eucaristia deve tornar-se o centro da nossa vida. Não é positivismo ou ambição de poder, se a Igreja nos diz
que a Eucaristia faz parte do domingo. Na manhã de Páscoa, primeiro as mulheres e depois os discípulos tiveram
a graça de ver o Senhor. Daquele momento em diante eles souberam que agora o primeiro dia da semana, o
domingo, teria sido o seu dia, o dia de Cristo. O dia do início da criação tornava-se o dia da renovação da criação.
Criação e redenção caminham juntas. Por isso o domingo é tão importante.

É belo que hoje, em muitas culturas, o domingo seja um dia livre ou, juntamente com o sábado, constitua até o
chamado "fim-de-semana" livre. Contudo, este tempo livre permanece vazio se nele não está Deus”33.

32
ENCÍCLICA DEUS CARITAS EST, 10
33
HOMILIA Colónia, Esplanada de Marienfeld, Domingo, 21 de Agosto de 2005
O Credo, comentado por Bento XVI 18

Padeceu
Passus

“O homem tem para Deus um valor tão grande que Ele mesmo Se fez homem para poder padecer com o
homem, de modo muito real, na carne e no sangue, como nos é demonstrado na narração da Paixão de Jesus. A
partir de lá entrou em todo o sofrimento humano alguém que partilha o sofrimento e a sua suportação; a partir
de lá se propaga em todo o sofrimento a consolação do amor solidário de Deus, surgindo assim a estrela da
esperança34”.

“Na escuridão impenetrável da morte Ele entrou como luz – a noite fez-se luminosa como o dia, e a trevas
tornaram-se luz. Por isso a Igreja justamente pode considerar a palavra de agradecimento e de confiança como
palavra do Ressuscitado dirigida ao Pai: “Sim, viajei até às extremas profundezas da terra, no abismo da morte e
trouxe a luz; e agora ressuscitei e permaneço para sempre seguro pelas tuas mãos”. Mas esta palavra do
Ressuscitado ao Pai tornou-se também uma palavra que o Senhor dirige a nós: “Ressuscitei e estou contigo para
sempre”, diz a cada um de nós. A minha mão de mantém. Onde quer que possas cair, cairás em minhas mãos.
Estou presente até mesmo nas portas da morte. Onde ninguém já não pode acompanhar-te e onde nada podes
levar, ali eu te espero e transformo para ti as trevas em luz”35.

“"Deus amou de tal modo o mundo, que lhe deu o Seu Filho único, para que todo o que n'Ele crê não pereça,
mas tenha a vida eterna" (Jo 3, 16). Sabemos que aquele "dar" da parte do Pai teve um desenvolvimento
dramático: chegou até ao sacrifício do Filho na cruz. Se toda a missão histórica de Jesus é sinal eloquente do
amor de Deus, a sua morte é um sinal completamente singular, na qual se expressou de modo total a ternura
redentora de Deus. Sempre, mas de modo particular neste tempo quaresmal, no centro da nossa meditação
deve portanto estar a Cruz; nela contemplamos a glória do Senhor que resplandece no corpo martirizado de
Jesus. Precisamente nesta doação total de si sobressai a grandeza de Deus, sobressai o seu ser amor. É a glória
do Crucificado que cada cristão está chamado a compreender, a viver e a testemunhar com a sua existência. A
Cruz a doação de si mesmo por parte do Filho de Deus é, definitivamente, o "sinal" por excelência que nos foi
dado para compreender a verdade do homem e a verdade de Deus: todos nós fomos criados e remidos por um
Deus que por amor imolou o seu único Filho. Eis por que na Cruz, como escrevi na Encíclica Deus caritas est,
"cumpre-se aquele virar-se de Deus contra Si próprio, com o qual Ele Se entrega para levantar o homem e salvá-
lo o amor na sua forma mais radical" (n. 12)”36.

34
ENCÍCLICA SPE SALVI, 39
35
HOMILIA NA VIGÍLIA PASCAL, Basílica de São Pedro Sábado Santo 7 de Abril de 2007
36
HOMILIA DURANTE A MISSA NA PARÓQUIA ROMANA DE "DEUS PAI MISERICORDIOSO" Domingo, 26 de Março de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 19

E foi sepultado
Et sepultus est

“Na Páscoa, alegramo-nos porque Cristo não ficou no sepulcro, o seu corpo não conheceu a corrupção; pertence
ao mundo dos vivos, não ao dos mortos; alegramo-nos porque – como proclamamos no rito do Círio Pascal – Ele
é o Alfa e simultaneamente o Ómega, e portanto a sua existência é não apenas de ontem, mas de hoje e por
toda a eternidade (cf. Heb 13, 8)”37.

“No Credo professamos a respeito do caminho de Cristo: “Desceu à mansão dos mortos”. O que acontece
então? Visto que não conhecemos o mundo da morte, podemos representar este processo de superação da
morte somente com imagens que permanecem sempre pouco apropriadas. Porém, com toda a sua insuficiência,
elas nos ajudam a entender algo do mistério. A liturgia aplica à descida de Jesus na noite da morte a palavra do
Sl 24 [23]: “Levantai, ó pórticos, os vossos dintéis, levantai-vos, ó pórticos eternos!” A porta da morte está
fechada, ninguém dali pode voltar para trás. Não existe uma chave para esta porta férrea. Cristo, porém, possui
a chave. A sua Cruz abre de par em par as portas da morte, as portas irrevogáveis. Elas agora já não são
intransponíveis. A sua Cruz, a radicalidade do seu amor é a chave que abre esta porta. O amor d'Aquele que,
sendo Deus, se fez homem para poder morrer – este amor tem a força para abrir esta porta. Este amor é mais
forte que a morte. Os ícones pascais da Igreja oriental mostram como Cristo entra no mundo dos mortos. A sua
veste é luz, porque Deus é luz. “A noite é clara como o dia, as trevas são como a luz” (cf. Sl 139 [138], 12). Jesus
que entra no mundo dos mortos leva os estigmas: as suas feridas, os seus padecimentos tornaram-se poder, são
amor que vence a morte. Ele encontra Adão e todos os homens que esperam na noite da morte. À sua vista
parece até ouvir a oração de Jonas: “Clamei a vós do meio da morada dos mortos, e ouvistes a minha voz” (Jn 2,
3). O Filho de Deus na encarnação fez-se uma só coisa com o ser humano – com Adão. Mas só naquele
momento, em que cumpre o extremo ato de amor descendo na noite da morte, Ele cumpre o caminho da
encarnação. Com a sua morte Ele leva Adão pela mão, leva todos os homens em expectativa para a luz”38.

“O verdadeiro Pastor é Aquele que conhece também o caminho que passa pelo vale da morte; Aquele que,
mesmo na estrada da derradeira solidão, onde ninguém me pode acompanhar, caminha comigo servindo-me de
guia ao atravessá-la: Ele mesmo percorreu esta estrada, desceu ao reino da morte, venceu-a e voltou para nos
acompanhar a nós agora e nos dar a certeza de que, juntamente com Ele, acha-se uma passagem.

A certeza de que existe Aquele que, mesmo na morte, me acompanha e com o seu «bastão e o seu cajado me
conforta», de modo que «não devo temer nenhum mal» (cf. Sal 23[22],4): esta era a nova «esperança» que
surgia na vida dos crentes39”.

37
HOMILIA NA VIGÍLIA PASCAL Basílica Vaticana, Sábado Santo, 15 de Abril de 2006
38
HOMILIA NA VIGÍLIA PASCAL Basílica de São Pedro Sábado Santo 7 de Abril de 2007
39
Encíclica Spe Salvi, 6
O Credo, comentado por Bento XVI 20

Ressuscitou ao terceiro dia


Et ressurrexit tertia die

“Da força deste amor, da fé firme na ressurreição de Jesus que funda a esperança, nasce e renova-se
constantemente o nosso testemunho cristão. É ali que se radica o nosso "Credo", o símbolo do qual atingiu a
pregação inicial e que continua inalterado a alimentar o Povo de Deus”40.

“Jesus já não está no sepulcro. Está numa vida inteiramente nova. Mas, como foi possível acontecer isso? Que
forças intervieram lá? Decisivo é o facto de que este homem Jesus não estava só, não era um Eu fechado em si
mesmo. Ele era um só com o Deus vivo, unido de tal modo a Ele que formava com Ele uma única pessoa.
Encontrava-Se, por assim dizer, num abraço com Aquele que é a própria vida, um abraço não apenas
sentimental, mas que englobava e penetrava o seu ser. A sua própria vida não era própria apenas d’Ele, era uma
comunhão existencial com Deus e um ser inserido em Deus, e por isso não podia realmente ser-Lhe tirada. Por
amor, pôde deixar-Se matar, mas precisamente assim rompeu o carácter definitivo da morte, porque n’Ele
estava presente a dimensão definitiva da vida. Ele era um só com a vida indestrutível, de modo que esta, através
da morte, desabrochou de novo.

Podemos exprimir a mesma coisa uma vez mais, mas partindo de outro lado. A sua morte foi um acto de amor.
Na Última Ceia, Ele antecipou a morte e transformou-a no dom de Si mesmo. A sua comunhão existencial com
Deus era, em concreto, uma comunhão existencial com o amor de Deus, e este amor é a verdadeira força contra
a morte, é mais forte do que a morte.

A ressurreição foi como que uma explosão de luz, uma explosão do amor que desfez o nó até então indissolúvel
entre «morre e transforma-se». Aquela inaugurou uma nova dimensão do ser, da vida, na qual, de modo
transformado, se integrou também a matéria, e através da qual surge um mundo novo”41.

40
HOMILIA Estádio Municipal "Bentegodi" Quinta-feira, 19 de Outubro de 2006
41
HOMILIA NA VIGÍLIA PASCAL Basílica Vaticana Sábado Santo, 15 de Abril de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 21

Conforme as escrituras
Secundum Scripturas

“Cristo ressuscitou! A paz esteja convosco! Hoje se celebra o grande mistério, fundamento da fé e da esperança
cristã: Jesus de Nazaré, o Crucificado, ressuscitou dos mortos ao terceiro dia, conforme as Escrituras. O anúncio
feito aos anjos, naquela aurora do primeiro dia depois do sábado, a Maria Madalena e às mulheres que foram ao
sepulcro, o ouvimos hoje com renovada emoção: “Por que buscais entre os mortos aquele que está vivo? Não
está aqui, ressuscitou!” (Lc 24, 5-6)”42.

“A sua ressurreição é o mistério qualificante do Cristianismo, o cumprimento superabundante de todas as


profecias de salvação, mesmo da que acabámos de ouvir na primeira Leitura, tirada da parte final do Livro do
profeta Isaías. De Cristo Ressuscitado, primícia da humanidade nova, regenerada e regenerante, nasceu, na
realidade, como predisse o profeta, o povo dos "pobres" que abriram o coração ao Evangelho e se tornaram, e
tornam-se sempre de novo, "sobreiros de justiça", reconstrutores de ruínas, restauradores de cidades desoladas,
estimados por todos como raça abençoada pelo Senhor (cf. Is 61, 3-4.9).

O mistério da ressurreição do Filho de Deus, que, tendo subido ao céu à direita do Pai, efundiu sobre nós o
Espírito Santo, nos faz abraçar com um só olhar Cristo e a Igreja: o Ressuscitado e os ressuscitados, a Primazia e
o campo de Deus, a Pedra angular e as pedras vivas, para usar outra imagem da Primeira Carta de Pedro (cf. 2, 4-
8). Assim aconteceu no início, com a primeira comunidade apostólica, e assim deve acontecer também agora”43.

42
MENSAGEM URBI ET ORBI PÁSCOA 2007
43
HOMILIA Estádio Municipal "Bentegodi" Quinta-feira, 19 de Outubro de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 22

E subiu aos céus


Et ascendir in coelum

“Em primeiro lugar, "elevando-se", Ele revela de modo inequívoco a sua divindade; volta para lá, de onde veio,
isto é, para Deus, depois de ter cumprido a sua missão na terra. Além disso Cristo sobe ao Céu com a
humanidade que assumiu e que ressuscitou dos mortos: aquela humanidade é a nossa, transfigurada,
divinizada, que se tornou eterna. Portanto, a Ascensão revela a "altíssima vocação" (Gaudium et spes, 22) de
cada pessoa humana: ela está chamada à vida eterna no Reino de Deus, Reino de amor, de luz e de paz”44.

“Lemos que quando os Apóstolos tentaram chamar a atenção do Ressuscitado sobre a questão da reconstrução
do reino terrestre de Israel, Ele "foi elevado ao céu à vista deles e uma nuvem subtraiu-o ao seu olhar". E eles
"estavam com os olhos fixos no céu, para onde Jesus se afastava" (Act 1, 9-10). Estavam portanto fixando o céu,
porque acompanhavam com o olhar Jesus Cristo, crucificado e ressuscitado, que era elevado ao céu. Não
sabemos se se aperceberam naquele momento do facto de que precisamente diante deles se estava a abrir um
horizonte magnífico, infinito, o ponto de chegada definitivo da peregrinação terrena do homem. Talvez o
tenham compreendido só no dia de Pentecostes, iluminados pelo Espírito Santo.

Contudo, para nós aquele acontecimento de há dois mil anos é muito claro. Somos chamados, permanecendo na
terra, a fixar o céu, a orientar a atenção, o pensamento e o coração para o mistério inefável de Deus. Somos
chamados a olhar na direcção da realidade divina, para a qual o homem está orientado desde a criação. Ali está
contido o sentido definitivo da nossa vida”45.

44
REGINA CAELI Domingo, 21 de Maio de 2006
45
HOMILIA DURANTE A CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA NO PARQUE DE BŁONIA Cracóvia, 28 de Maio de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 23

Onde está sentado à direita do Pai


…sedet ad dexteram Patris

Proclama-se: o Senhor é "excelso", "está sentado no alto", e ninguém é como ele; até para olhar para o céu se
deve "inclinar", porque "a sua majestade está acima dos céus" (Salmo 112, 4). O olhar divino dirige-se sobre toda
a realidade, sobre os seres terrenos e sobre os celestes. Contudo os seus olhos não são altivos nem afastados,
como os de um insensível imperador. O Senhor diz o Salmista "inclina-se para observar" (Salmo 112, 6)46.

“Mas qual é a "verdade" que Cristo veio testemunhar no mundo? Toda a sua existência revela que Deus é amor:
portanto, é esta a verdade da qual Ele deu testemunho pleno com o sacrifício da sua própria vida no Calvário. A
Cruz é o "trono" do qual manifestou a sublime realeza de Deus-Amor: oferecendo-se em expiação pelos pecados
do mundo, Ele derrotou o domínio do "príncipe deste mundo" (Jo 12, 31) e instaurou definitivamente o Reino de
Deus. Reino que se manifestará em plenitude no fim dos tempos, quando todos os inimigos, e por fim a morte,
tiverem sido submetidos (cf. 1 Cor 15, 25-26). Então o Filho entregará o Reino ao Pai e finalmente Deus será
"tudo em todos" (1 Cor 15, 28).

O caminho para chegar a esta meta é longo e não admite atalhos: de facto, é necessário que cada pessoa acolha
livremente a verdade do amor de Deus. Ele é Amor e Verdade, e quer o amor quer a verdade nunca se impõem:
batem à porta do coração e da mente e, onde podem entrar, trazem paz e alegria. É este o modo de reinar de
Deus; este é o seu projecto de salvação, um "mistério" no sentido bíblico da palavra, isto é, um desígnio que se
revela pouco a pouco na história”47.

46
AUDIÊNCIA GERAL Quarta-feira, 18 de Maio de 2005
47
ANGELUS Domingo, 26 de Novembro de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 24

De novo há-de vir em sua glória


Et iterum venturus est cum gloria

“No grande Credo da Igreja, a parte central conclui com as palavras: « ... de novo há-de vir em sua glória, para
julgar os vivos e os mortos ». Já desde os primeiros tempos, a perspectiva do Juízo influenciou os cristãos até na
sua própria vida quotidiana enquanto critério segundo o qual ordenar a vida presente, enquanto apelo à sua
consciência e, ao mesmo tempo, enquanto esperança na justiça de Deus. A fé em Cristo nunca se limitou a olhar
só para trás nem só para o alto, mas olhou sempre também para a frente para a hora da justiça que o Senhor
repetidas vezes preanunciara. Este olhar para diante conferiu ao cristianismo a sua importância para o
presente48”.

“O "mistério da vontade" divina tem um centro que está destinado a coordenar todo o ser e toda a história
guiando-os à plenitude querida por Deus: é "o desígnio de recapitular em Cristo todas as coisas" ( cf Ef 1, 10).
Neste "desígnio", em grego oikonomia, ou seja, neste plano harmonioso da arquitectura do ser e do existir,
eleva-se Cristo, cabeça do Corpo da Igreja, mas também eixo que recapitula em si "o universo inteiro, tanto as
coisas celestes como as terrestres". A dispersão e o limite são superados e configura-se aquela "plenitude" que é
a verdadeira meta do projecto que a vontade divina tinha preestabelecido desde as origens49”

“A fé não significa somente aceitar um certo número de verdades abstractas acerca dos mistérios de Deus, do
homem, da vida, da morte e das realidades futuras. A fé consiste num íntimo relacionamento com Cristo, uma
relação fundamentada no amor daquele que nos amou primeiro (cf. Jo 4, 11), até à oferta total de si mesmo.
"Deus demonstra o seu amor para connosco: quando ainda éramos pecadores é que Cristo morreu por nós" (Rm
5, 8). Que outra resposta podemos dar a um amor tão grande assim, a não ser a de um coração aberto e pronto
a amar? Mas o que significa amar Cristo? Quer dizer confiar nele inclusive na hora da prova, segui-lo fielmente
também ao longo da Via-Sacra, na esperança que depressa chegue a manha da ressurreição. Confiando-nos a
Cristo nada perdemos, mas tudo adquirimos.

Nas suas mãos a nossa vida assume um verdadeiro sentido. O amor a Cristo expressa-se na vontade de
sintonizar a própria vida com os pensamentos e os sentimentos do seu Coração. Isto realiza-se mediante a união
interior baseada na graça dos Sacramentos, revigorada com a oração incessante, o louvor, a acção de graças e a
penitencia. Não pode faltar uma escuta atenta das inspirações que Ele suscita através da sua Palavra, das
pessoas com quem nos encontramos e das situações de vida quotidiana. Amá-lo significa permanecer em
diálogo com Ele, para conhecer a sua vontade e para a realizar prontamente”50.

48
ENCÍCLICA SPE SALVI, 41
49
AUDIÊNCIA GERAL Quarta-feira, 23 de Novembro de 2005
50
HOMILIA DURANTE A SANTA MISSA CELEBRADA NA PRAÇA "PILSUDSKI" Varsóvia, 26 de Maio de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 25

Para julgar os vivos e os mortos


Iudicare vivos et mortuos

“No juízo final Deus perguntar-nos-á se não amamos de maneira abstracta, mas concretamente, com as obras
(cf. Mt 25, 31-46). E sensibiliza-me sempre verdadeiramente, ao ler de novo estas linhas, o facto de que Jesus, o
Filho do homem e Juiz derradeiro, nos precede mediante esta acção, tornando-se Ele mesmo homem, fazendo-
se pobre e sequioso e, no final, nos abraça estreitando-nos ao coração. É assim que Deus realiza aquilo que
deseja que nós mesmos façamos: permanecer abertos aos outros e viver o amor não tanto com as palavras, mas
com as obras51”.

“A segunda parte do Credo conclui-se com a perspectiva do Juízo final e a terceira com a da ressurreição dos
mortos. Juízo talvez com isto nos seja inculcado de novo o medo? Mas, porventura não desejamos todos que um
dia seja feita justiça para todos os condenados injustamente, para quantos sofreram ao longo da vida, e depois
de uma vida cheia de sofrimentos foram engolidos pela morte? Não queremos porventura todos que o excesso
de injustiça e de sofrimento, que vemos na história, no fim se dissolva; que todos possam tornar-se alegres, que
tudo tenha um sentido? Esta afirmação do direito, esta união de tantos fragmentos de história que parecem
privados de sentido, de forma que os integram num todo no qual dominem a verdade e o amor: é isto que se
compreende com o conceito de Juízo do mundo. A fé não nos quer fazer medo; mas quer chamar-nos à
responsabilidade! Não devemos desperdiçar a nossa vida, nem abusar dela; também não devemos tê-la
simplesmente para nós; perante a injustiça não devemos permanecer indiferentes, tornando-nos seus
coniventes ou até cúmplices. Devemos compreender a nossa missão na história e procurar corresponder-lhe.
Não receio mas responsabilidade responsabilidade e preocupação pela nossa salvação, e pela salvação de todo o
mundo são necessárias”52.

“Só Deus pode criar justiça. E a fé dá-nos a certeza: Ele fá-lo. A imagem do Juízo final não é primariamente uma
imagem aterradora, mas de esperança; a nosso ver, talvez mesmo a imagem decisiva da esperança. Mas não é
porventura também uma imagem assustadora? Eu diria: é uma imagem que apela à responsabilidade. Portanto,
uma imagem daquele susto acerca do qual, como diz Santo Hilário que todo o nosso medo tem lugar no amor.
Deus é justiça e cria justiça. Tal é a nossa consolação e a nossa esperança. Mas, na sua justiça, Ele é
conjuntamente também graça. Isto podemos sabê-lo fixando o olhar em Cristo crucificado e ressuscitado. Ambas
– justiça e graça – devem ser vistas na sua justa ligação interior. A graça não exclui a justiça. Não muda a
injustiça em direito. Não é uma esponja que apaga tudo, de modo que tudo quanto se fez na terra termine por
ter o mesmo valor”53.

“O encontro com Ele é o acto decisivo do Juízo. Ante o seu olhar, funde-se toda a falsidade. É o encontro com Ele
que, queimando-nos, nos transforma e liberta para nos tornar verdadeiramente nós mesmos. As coisas
edificadas durante a vida podem então revelar-se palha seca, pura fanfarronice e desmoronar-se. Porém, na dor
deste encontro, em que o impuro e o nocivo do nosso ser se tornam evidentes, está a salvação. O seu olhar, o
toque do seu coração cura-nos através de uma transformação certamente dolorosa «como pelo fogo». Contudo,
é uma dor feliz, em que o poder santo do seu amor nos penetra como chama, consentindo-nos no final sermos
totalmente nós mesmos e, por isso mesmo totalmente de Deus. Deste modo, torna-se evidente também a
compenetração entre justiça e graça: o nosso modo de viver não é irrelevante, mas a nossa sujeira não nos
mancha para sempre, se ao menos continuámos inclinados para Cristo, para a verdade e para o amor54”

51
DISCURSO À CONFEDERAÇÃO NACIONAL DAS MISERICÓRDIAS DA ITÁLIA E AOS DOADORES DE SANGUE Sábado, 10 de Fevereiro de 2007
52
HOMILIA A SOLENE CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICANO ISLINGER FELD Regensburg, 12 de Setembro de 2006
53
ENCÍCLICA SPE SALVI, 44
54
ENCÍCLICA SPE SALVI, 47
O Credo, comentado por Bento XVI 26

E o seu Reino não terá fim


Cuius regni non erit finis

“A Constituição do Concílio Vaticano II sobre a Igreja no mundo contemporâneo Gaudium et spes: é um texto
profundamente imbuído de esperança cristã. Refiro-me de modo particular ao n. 39, intitulado: "Nova terra e
novo céu". Ali lê-se: "Deus ensina-nos que se prepara uma nova habitação e uma nova terra, na qual reina a
justiça (cf. 2 Cor 5, 2; 2 Pd 3, 13)... A expectativa da nova terra não deve, porém, enfraquecer, mas antes activar
a solicitude em ordem a desenvolver esta terra". Com efeito, encontraremos os bons frutos da nossa
laboriosidade, quando Cristo entregar ao Pai o seu Reino eterno e universal55”.

“Desde o anúncio do seu nascimento, o Filho unigénito do Pai, que nasceu da Virgem Maria, é definido "rei" no
sentido messiânico, ou seja, herdeiro do trono de David, segundo as promessas dos profetas, para um reino que
não terá fim (cf. Lc 1, 32-33). A realeza de Cristo permaneceu totalmente escondida, até aos seus trinta anos,
transcorridos numa existência comum em Nazaré. Depois, durante a vida pública, Jesus inaugurou o novo Reino,
que "não é deste mundo" (Jo 18, 36) e no final realizou-o plenamente com a sua morte e ressurreição. Ao
aparecer ressuscitado aos Apóstolos, disse: "Toda a autoridade me foi dada no céu e sobre a terra" (Mt 28, 18):
esta autoridade brota do amor, que Deus manifestou plenamente no sacrifício do seu Filho. O Reino de Cristo é
dom oferecido aos homens de todos os tempos, para que todo aquele que acredita no Verbo encarnado "não
morra, mas tenha a vida eterna" (Jo 3, 16). Por isso, precisamente no último Livro da Bíblia, o Apocalipse, Ele
proclama: "Eu sou o Alfa e o Ómega, o princípio e o fim" (Ap 22, 13)56”.

55
ANGELUS Domingo, 27 de Novembro de 2005 Primeiro Domingo do Advento
56
ANGELUS Domingo 20 de Novembro de 2005 Solenidade de Cristo Rei do Universo
O Credo, comentado por Bento XVI 27

Creio no Espírito Santo


Et in Spiritum Sanctum

“Quando morreu na cruz, Jesus — como indica o evangelista — «entregou o Espírito » (cf. Jo 19, 30), prelúdio
daquele dom do Espírito Santo que Ele havia de realizar depois da ressurreição (cf. Jo 20, 22). Desde modo, se
actuaria a promessa dos « rios de água viva » que, graças à efusão do Espírito, haviam de emanar do coração dos
crentes (cf. Jo 7, 38-39). De facto, o Espírito é aquela força interior que harmoniza seus corações com o coração
de Cristo e leva-os a amar os irmãos como Ele os amou, quando Se inclinou para lavar os pés dos discípulos (cf.
Jo 13, 1-13) e sobretudo quando deu a sua vida por todos (cf. Jo 13, 1; 15, 13)”57.

“«Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós ...». Esta é a Igreja: nós, a comunidade de fiéis, o Povo de Deus, com os
seus Pastores chamados a fazer de guia do caminho; juntos com o Espírito Santo, Espírito do Pai mandado em
nome do Filho Jesus, Espírito d’Aquele que é “maior” de todos e que nos foi dado mediante Cristo, que se fez
“menor” por nossa causa. Espírito Paráclito, Ad-vocatus, Defensor e Consolador. Ele nos faz viver na presença de
Deus, na escuta da sua Palavra, livres de inquietação e de temor, tendo no coração a paz que Jesus nos deixou e
que o mundo não pode dar (cf. Jo 14, 26-27). O Espírito acompanha a Igreja no longo caminho que se estende
entre a primeira e a segunda vinda de Cristo: «Vou, e volto a vós» (Jo 14,28), disse Jesus aos Apóstolos. Entre a
“ida” e a “volta” de Cristo está o tempo da Igreja, que é o seu Corpo, estão esses dois mil anos transcorridos até
agora; estão também estes pouco mais de cinco séculos em que a Igreja fez-se peregrina nas Américas,
difundindo nos fiéis a vida de Cristo através dos Sacramentos e lançando nestas terras a boa semente do
Evangelho, que rendeu trinta, sessenta e até mesmo o cento por um. Tempo da Igreja, tempo do Espírito Santo:
Ele é o Mestre que forma os discípulos: fá-los enamorar-se de Jesus; educa-os para que escutem a sua Palavra, a
fim de que contemplem a sua Face; conforma-os à sua Humanidade bem-aventurada, pobre em espírito, aflita,
mansa, sedenta de justiça, misericordiosa, pura de coração, pacífica, perseguida por causa da justiça (cf. Mt 5,3-
10). Deste modo, graças à acção do Espírito Santo, Jesus torna-se a “Via” na qual caminha o discípulo58”.

57
ENCÍCLICA DEUS CARITAS EST, 19
58
HOMILIA Esplanada do Santuário de Aparecida VI Domingo de Páscoa, 13 de Maio de 2007
O Credo, comentado por Bento XVI 28

Senhor, que dá a Vida e procede do Pai e do Filho


Domium et Vivificantem qui ex Patri Filioque procedit

“O Pentecostes não é apenas a origem da Igreja e por isso, de modo especial, a sua festa; o Pentecostes é
também uma festa da criação. O mundo não existe por si mesmo; provém do Espírito criativo de Deus, da
Palavra criadora de Deus. E por este motivo reflecte inclusive a sabedoria de Deus. Na sua vastidão e na lógica
omnicompreensiva das suas leis, ela deixa entrever algo do Espírito Criador de Deus”59.

“O Paráclito, primeiro dom concedido aos crentes, activo já na criação (Gn 1, 2), está presente em plenitude na
vida inteira do Verbo encarnado: com efeito, Jesus Cristo é concebido no seio da Virgem Maria por obra do
Espírito Santo (Mt 1, 18; Lc 1, 35); no início da sua missão pública, nas margens do Jordão, vê-O descer sobre Si
em forma de pomba (Mt 3, 16 e par.); neste mesmo Espírito, age, fala e exulta (Lc 10, 21); e é n'Ele que Jesus
pode oferecer-Se a Si mesmo (Heb 9, 14). No chamado «discurso de despedida» referido por João, Jesus põe
claramente em relação o dom da sua vida no mistério pascal com o dom do Espírito aos Seus (Jo 16, 7).

Depois de ressuscitado, trazendo na sua carne os sinais da paixão, pode derramar o Espírito (Jo 20, 22), tornando
os seus discípulos participantes da mesma missão d'Ele (Jo 20, 21).

Em seguida, será o Espírito que ensina aos discípulos todas as coisas, recordando-lhes tudo o que Cristo tinha
dito (Jo 14, 26), porque compete a Ele, enquanto Espírito da verdade (Jo 15, 26), introduzir os discípulos na
verdade total (Jo 16, 13).

Segundo narram os Actos, o Espírito desce sobre os Apóstolos reunidos em oração com Maria no dia de
Pentecostes (2, 1-4), e impele-os para a missão de anunciar a boa nova a todos os povos. Portanto, é em virtude
da acção do Espírito que o próprio Cristo continua presente e activo na sua Igreja, a partir do seu centro vital que
é a Eucaristia60”.

59
HOMILIA NA VIGÍLIA DE PENTECOSTES Sábado, 3 de Junho de 2006
60
EXORTAÇÃO APOSTÓLICA SACRAMENTUM CARITATIS, 12
O Credo, comentado por Bento XVI 29

E com o Pai e o Filho é adorado e glorificado


Qui cum Patre et Filio simul adoratur et conglorificatur

“O Espírito Santo, pelo contrário, torna-nos filhos e filhas de Deus. Ele compromete-nos nesta mesma
responsabilidade de Deus pelo seu mundo, pela humanidade inteira. Ensina-nos a contemplar o mundo, o
próximo e nós mesmos com os olhos de Deus.
Nós realizamos o bem não como escravos, que não são livres de agir de outra forma, mas fazemo-lo porque
temos pessoalmente a responsabilidade pelo mundo; porque amamos a verdade e o bem, porque amamos o
próprio Deus e portanto também as suas criaturas. Esta é a liberdade verdadeira, para a qual o Espírito Santo
nos quer conduzir”61.

“É o Espírito quem garante a presença activa do mistério na história, Aquele que garante a sua realização ao
longo dos séculos. Graças ao Paráclito a experiência do Ressuscitado, feita pela comunidade apostólica nas
origens da Igreja, poderá ser sempre vivida pelas gerações sucessivas, porque transmitida e actualizada na fé, no
culto e na comunhão do Povo de Deus, peregrino no tempo. E assim nós agora, no tempo pascal, vivemos o
encontro com o Ressuscitado, não só como uma coisa do passado, mas na comunhão presente da fé, da liturgia,
da vida da Igreja. A Tradição apostólica da Igreja consiste nesta transmissão dos bens da salvação, que faz da
comunidade cristã a actualização permanente, na força do Espírito, da comunhão originária. Ela é chamada
assim porque surgiu do testemunho dos Apóstolos e da comunidade dos discípulos no tempo das origens, foi
entregue sob a guia do Espírito Santo nos textos do Novo Testamento e na vida sacramental, na vida da fé, e a
ela a esta tradição, que é toda a realidade sempre actual do dom de Jesus a Igreja refere-se continuamente
como ao seu fundamento e à sua norma através da sucessão ininterrupta do ministério apostólico62”.

61
HOMILIA NA VIGÍLIA DE PENTECOSTES Sábado, 3 de Junho de 2006
62
AUDIÊNCIA GERAL Quarta-feira, 26 de Abril de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 30

Ele que falou pelos profetas


Qui locutus est per prophetas

“Os Apóstolos e os seus sucessores, os Bispos, são os depositários da mensagem que Cristo confiou à sua Igreja,
para que fosse transmitida íntegra a todas as gerações. A Sagrada Escritura do antigo e do novo Testamento e a
sagrada Tradição contêm esta mensagem, cuja compreensão progride na Igreja sob a assistência do Espírito
Santo.
Esta mesma tradição faz conhecer o cânone integral dos Livros sagrados e torna-os rectamente compreensíveis e
em vigor, de modo que Deus, o qual falou aos Patriarcas e aos Profetas, não cessa de falar à Igreja e, por meio
dela, ao mundo (cf. n. 8).
A Igreja não vive de si mesma mas do Evangelho e ao Evangelho vai buscar sempre a orientação para o seu
caminho63”.

“A vinda do Messias, prenunciada pelos Profetas, é o acontecimento qualitativamente mais importante de toda
a história, à qual confere o seu sentido último e completo.

Não são as coordenadas histórico-políticas que condicionam as opções de Deus mas, ao contrário, é o
acontecimento da Encarnação que "preenche" a história de valor e de significado. Nós, que vivemos dois mil
anos depois de tal acontecimento, podemos afirmá-lo, por assim dizer, também a posteriori, depois de
conhecermos toda a vicissitude de Jesus, até à sua morte e ressurreição.

Nós somos testemunhas da sua glória e, contemporaneamente, da sua humildade, do valor imenso da sua vinda
e do respeito infinito de Deus por nós homens e pela nossa história. Ele não preencheu o tempo, inserindo-se
nele do alto, mas "a partir de dentro", tornando-se pequenina semente para conduzir a humanidade à sua plena
maturidade.

Este estilo de Deus fez com que se tornasse necessário um longo período de preparação para chegar de Abraão
a Jesus Cristo, e que depois da vinda do Messias a história não terminasse, mas continuasse o seu percurso,
aparentemente igual mas na realidade já visitada por Deus e orientada rumo à segunda e definitiva vinda do
Senhor, no final dos tempos. De tudo isto é símbolo concreto, poderíamos dizer sacramento, a maternidade de
Maria, que um evento humano e, ao mesmo tempo, também divino64”.

63
ANGELUS Domingo, 6 de Novembro de 2005
64
HOMILIA Domingo, 31 de Dezembro de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 31

Creio na Igreja Una


Et unam

“a comunhão eclesial é suscitada e alimentada pelo Espírito Santo, guardada e promovida pelo ministério
apostólico. E esta comunhão, a que nós chamamos Igreja, não se alarga só a todos os crentes de um certo
momento histórico, mas abraça também todos os tempos e todas as gerações65”.

“A união com Cristo é, ao mesmo tempo, união com todos os outros aos quais Ele Se entrega. Eu não posso ter
Cristo só para mim; posso pertencer-Lhe somente unido a todos aqueles que se tornaram ou tornarão Seus. A
comunhão tira-me para fora de mim mesmo projectando-me para Ele e, deste modo, também para a união com
todos os cristãos. Tornamo-nos « um só corpo », fundidos todos numa única existência.

O amor a Deus e o amor ao próximo estão agora verdadeiramente juntos: o Deus encarnado atrai-nos todos a Si.
Assim se compreende por que o termo agape se tenha tornado também um nome da Eucaristia: nesta a agape
de Deus vem corporalmente a nós, para continuar a sua acção em nós e através de nós. Só a partir desta
fundamentação cristológico-sacramental é que se pode entender correctamente o ensinamento de Jesus sobre
o amor. A passagem que Ele faz realizar da Lei e dos Profetas ao duplo mandamento do amor a Deus e ao
próximo, a derivação de toda a vida de fé da centralidade deste preceito não é uma simples moral que possa,
depois, subsistir autonomamente ao lado da fé em Cristo e da sua re-actualização no Sacramento: fé, culto e
ethos compenetram-se mutuamente como uma única realidade que se configura no encontro com a agape de
Deus66”.

65
AUDIÊNCIA GERAL Quarta-feira, 26 de Abril de 2006
66
ENCÍCLICA DEUS CARITAS EST, 14
O Credo, comentado por Bento XVI 32

Santa
Sanctam

“A natureza íntima da Igreja exprime-se num tríplice dever: anúncio da Palavra de Deus (kerygma-martyria),
celebração dos Sacramentos (leiturgia), serviço da caridade (diakonia). São deveres que se reclamam
mutuamente, não podendo um ser separado dos outros”67.

“Também na sucessiva história da Igreja, o Senhor não esteve ausente: incessantemente vem ao nosso
encontro, através de homens nos quais Ele Se revela; através da sua Palavra, nos Sacramentos, especialmente na
Eucaristia. Na liturgia da Igreja, na sua oração, na comunidade viva dos crentes, nós experimentamos o amor de
Deus, sentimos a sua presença e aprendemos deste modo também a reconhecê-la na nossa vida quotidiana68”.
(…)

“Com a encarnação do Filho, a sua morte e ressurreição, Deus quis reconciliar consigo a humanidade e abri-la à
partilha da sua própria vida. Quem crê em Cristo Filho de Deus renasce "do alto", é como que regenerado por
obra do Espírito Santo (cf. Jo 3, 1-8). Este mistério actualiza-se no sacramento do Baptismo, mediante o qual a
mãe Igreja dá à luz os "santos".
A vida nova, recebida no Baptismo, não está sujeita à corrupção e ao poder da morte. Para quem vive em Cristo
a morte é a passagem da peregrinação terrena para a pátria do Céu, onde o Pai acolhe todos os seus filhos, "de
toda nação, raça, povo e língua"”69,

67
ENCÍCLICA DEUS CARITAS EST, 25
68
ENCÍCLICA DEUS CARITAS EST, 17
69
ANGELUS 1 de Novembro de 2005 Solenidade de Todos os Santos
O Credo, comentado por Bento XVI 33

Católica
Catholicam

“A Igreja é a família de Deus no mundo. Nesta família, não deve haver ninguém que sofra por falta do
necessário. Ao mesmo tempo, porém, a caritas-agape estende-se para além das fronteiras da Igreja; a parábola
do bom Samaritano permanece como critério de medida, impondo a universalidade do amor que se inclina para
o necessitado encontrado «por acaso» (cf. Lc 10, 31), seja ele quem for. Mas, ressalvada esta universalidade do
mandamento do amor, existe também uma exigência especificamente eclesial — precisamente a exigência de
que, na própria Igreja enquanto família, nenhum membro sofra porque passa necessidade. Neste sentido se
pronuncia a Carta aos Gálatas: « Portanto, enquanto temos tempo, pratiquemos o bem para com todos, mas
principalmente para com os irmãos na fé » (6, 10)70”.

“O novo povo de Deus, a Igreja, é um povo que provém de todos os povos. A Igreja desde o início é católica, esta
é a sua essência mais profunda. São Paulo explica e realça isto na segunda leitura, quando diz: "De facto, num
só Espírito, fomos todos baptizados para formar um só corpo, judeus e gregos, escravos e livres, e todos
bebemos de um só Espírito" (1 Cor 12, 13). A Igreja deve tornar-se sempre de novo aquilo que ela já é: deve
abrir as fronteiras entre os povos e romper as barreiras entre as classes e as raças. Nela não podem haver
esquecidos nem desprezados.

Na Igreja existem unicamente irmãos e irmãs livres em Jesus Cristo. Vento e fogo do Espírito Santo devem
infatigavelmente abater aquelas barreiras que nós homens continuamos a erguer entre nós; devemos sempre de
novo passar de Babel, do fechamento em nós mesmos, para Pentecostes.

Por isso, devemos continuamente pedir que o Espírito Santo nos abra, nos conceda a graça da compreensão, de
modo que nos possamos tornar o povo de Deus proveniente de todos os povos ainda mais, diz-nos São Paulo:
em Cristo, que como único pão a todos alimenta na Eucaristia e nos atrai para si no seu corpo martirizado na
cruz, nós devemos tornar-nos um só corpo e um só espírito71”.

70
ENCÍCLICA DEUS CARITAS EST, 25
71
HOMILIA DURANTE A CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA PARA A ORDENAÇÃO DE 21 SACERDOTES NA SOLENIDADE DE PENTECOSTES Domingo,
15 de Maio de 2005
O Credo, comentado por Bento XVI 34

E apostólica
Et apostolicam Ecclesiam

“A Igreja foi constituída sobre o fundamento dos Apóstolos como comunidade de fé, de esperança e de
caridade. Através dos Apóstolos, remontamos ao próprio Cristo. A Igreja começou a construir-se quando alguns
pescadores da Galileia encontraram Jesus, deixaram-se conquistar pelo seu olhar, pela sua voz, pelo seu convite
caloroso e forte: "Vinde comigo e farei de vós pescadores de homens" (Mc 1, 17; Mt 4, 19)”72.

“Os Apóstolos e os seus sucessores são, portanto, os guardas e as testemunhas competentes do depósito da
verdade entregue à Igreja, e são também os ministros da caridade: dois aspectos que caminham juntos. Eles
devem pensar sempre na inseparabilidade deste duplo serviço, que na realidade é um só: verdade e caridade,
reveladas e doadas pelo Senhor Jesus. Neste sentido, o seu serviço é antes de tudo, um serviço de amor: a
caridade que eles devem viver e promover é inseparável da verdade que guardam e transmitem. A verdade e o
amor são dois rostos do mesmo dom, que vem de Deus e que graças ao ministério apostólico é conservado na
Igreja e nos alcança até ao nosso presente! Também através do serviço dos Apóstolos e dos seus sucessores o
amor de Deus Trindade nos alcança para nos comunicar a verdade que nos torna livres (cf. Jo 8, 32)!

Tudo o que vemos na Igreja nascente nos estimula a rezar pelos Sucessores dos Apóstolos, por todos os Bispos e
pelos Sucessores de Pedro, para que sejam realmente juntos os guardas da verdade e da caridade; para que
sejam, neste sentido, realmente apóstolos de Cristo, a fim de que a sua luz, a luz da verdade e da caridade,
nunca se extinga na Igreja e no mundo”73.

“A Tradição não é transmissão de coisas ou palavras, uma colecção de coisas mortas. A Tradição é o rio vivo que
nos liga às origens, o rio vivo no qual as origens estão sempre presentes. O grande rio que nos conduz ao porto
da eternidade. E sendo assim, neste rio vivo realiza-se sempre de novo a palavra do Senhor, que no início
ouvimos dos lábios do leitor: "E sabei que Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos" (Mt 29, 20)”74.

72
AUDIÊNCIA GERAL Quarta-feira, 15 de Março de 2006
73
AUDIÊNCIA GERAL Quarta-feira, 5 de Abril de 2006
74
AUDIÊNCIA GERAL Quarta-feira, 26 de Abril de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 35

Professo um só Baptismo
Confiteor unum Baptisma

“O que acontece no Baptismo? O que esperamos do Baptismo? Esperamos a vida eterna. É esta a finalidade do
Baptismo. Mas como pode ser realizado? Como pode o Baptismo dar a vida eterna? O que é a vida eterna?75”

“A grande explosão da ressurreição agarrou-nos no Baptismo para nos atrair. Deste modo ficamos associados a
uma nova dimensão da vida, na qual nos encontramos já de algum modo inseridos, no meio das tribulações do
nosso tempo. Viver a própria vida como um contínuo entrar neste espaço aberto: tal é o significado do ser
baptizado, do ser cristão. É esta a alegria da Vigília Pascal. A ressurreição não passou, a ressurreição alcançou-
nos e agarrou-nos. A ela, isto é, ao Senhor ressuscitado nos agarramos, sabendo que Ele nos segura firmemente,
mesmo quando as nossas mãos se debilitam. Agarramo-nos à sua mão, e assim seguramos também as mãos uns
dos outros, tornamo-nos um único sujeito, não apenas um só. Eu, mas já não eu: tal é a fórmula da existência
cristã fundada no Baptismo, a fórmula da ressurreição dentro do tempo. Eu, mas já não eu: se vivemos deste
modo, transformamos o mundo. É a fórmula que contrasta todas as ideologias da violência, e o programa que se
opõe à corrupção e à ambição do poder e do possuir76”.

75
HOMILIA NA FESTA DO BAPTISMO DO SENHOR Capela Sistina, 8 de Janeiro de 2006
76
HOMILIA NA VIGÍLIA PASCAL Basílica Vaticana Sábado Santo, 15 de Abril de 2006
O Credo, comentado por Bento XVI 36

Para a remissão dos pecados


in remissionem peccatorum

“Deus, no mistério do Baptismo, inclina-se sobre o homem; vem ao nosso encontro e deste modo aproxima-nos
entre nós. Porque o Baptismo significa que Jesus Cristo, por assim dizer, nos adopta como seus irmãos e irmãs,
acolhendo-nos assim como filhos na família do próprio Deus. Por conseguinte, deste modo faz com que sejamos
uma grande família na comunidade universal da Igreja”77.

“Jesus sopra sobre os apóstolos e dá-lhe de maneira renovada, maior, o sopro de Deus. Nos homens, não
obstante todas as suas limitações, existe agora algo absolutamente novo o sopro de Deus. A vida de Deus habita
em nós. O sopro do seu amor, da sua verdade e da sua bondade. Assim podemos ver aqui também uma alusão
ao baptismo e à confirmação a esta nova pertença a Deus, que o Senhor nos concede. O texto do Evangelho
convida-nos a isto: a viver sempre no espaço do sopro de Jesus Cristo, a receber vida d'Ele, de modo que ele
inspire em nós a vida autêntica a vida da qual morte alguma pode privar. Com o seu sopro, com o dom do
Espírito Santo, o Senhor relaciona o poder de perdoar. Ouvimos anteriormente que o Espírito Santo une, abate
as fronteiras, guia uns para os outros. A força, que abre e faz superar Babel, é a força do perdão. Jesus pode
conceder o perdão e o poder de perdoar, porque ele mesmo sofreu as consequências da culpa e dissolveu-as na
chama do seu amor. O perdão vem da cruz; ele transforma o mundo com o amor que nos doa. O seu coração
aberto na cruz é a porta pela qual entra no mundo a graça do perdão. E unicamente esta graça pode transformar
o mundo e edificar a paz”78.

77
HOMILIA NA SOLENE CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICANO ISLINGER FELD Regensburg, 12 de Setembro de 2006
78
HOMILIA DURANTE A CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA PARA A ORDENAÇÃO DE 21 SACERDOTES NA SOLENIDADE DE PENTECOSTES Domingo,
15 de Maio de 2005
O Credo, comentado por Bento XVI 37

E espero a ressurreição dos mortos


et exspecto resurrectionem mortuorum

“No Corpo místico de Cristo as almas dos fiéis encontram-se a superar a barreira da morte, intercedem umas
pelas outras, realizam na caridade um íntimo intercâmbio de dons.
Em tal dimensão de fé compreende-se também a prática de oferecer orações de sufrágio pelos defuntos, de
modo especial o Sacrifício eucarístico, memorial da Páscoa de Cristo, que abriu aos crentes a passagem para a
vida eterna”79.

“Que novidade realmente aconteceu ali através de Cristo? Sendo a alma do homem por si própria imortal desde
a criação, qual foi a novidade que Cristo trouxe? Sim, a alma é imortal, porque o homem de forma singular está
na memória e no amor de Deus, mesmo depois da sua queda. Mas a sua força não basta para elevar-se até
Deus. Não temos asas que poderiam levar-nos até aquela altura. Porém, nada pode contentar o homem
eternamente, se não o estar com Deus. Uma eternidade sem esta união com Deus seria uma condenação. O
homem não consegue chegar ao alto, mas deseja-o: “Clamei a vós...”

Só o Cristo ressuscitado pode elevar-nos até à união com Deus, onde nossas forças não podem chegar. Ele
carrega realmente a ovelha perdida sobre os seus ombros e a leva para casa. Vivemos sustentados pelo seu
Corpo, e em comunhão com o seu Corpo alcançamos o coração de Deus. E só assim a morte é vencida, somos
livres e nossa vida é esperança.

Este é o júbilo da Vigília Pascal: nós somos livres. Mediante a ressurreição de Jesus o amor revelou-se mais forte
do que a morte, mais forte do que o mal. O amor O fez descer e, ao mesmo tempo, é a força pela qual Ele se
eleva. A força através da qual nos leva consigo. Unidos ao seu amor, levados sobre as asas do amor, como
pessoas que amam descemos juntos com Ele nas trevas do mundo, sabendo que precisamente assim também
nos elevamos com Ele”80.

79
ANGELUS 1 de Novembro de 2005 Solenidade de Todos os Santos
80
HOMILIA NA VIGÍLIA PASCAL Basílica de São Pedro Sábado Santo 7 de Abril de 2007
O Credo, comentado por Bento XVI 38

E a vida do Mundo que há-de vir


Et vitam venturi saeculi

“O céu não pertence à geografia do espaço, mas à geografia do coração. E o coração de Deus inclinou-Se até ao
curral: a humildade de Deus é o céu81”.

“Vida eterna, para nós cristãos, não indica contudo somente uma vida que dura para sempre, mas sim uma nova
qualidade de existência, plenamente imersa no amor de Deus, que liberta do mal e da morte e nos põe em
comunhão infinita com todos os irmãos e irmãs que participam do mesmo Amor. Portanto, a eternidade pode
estar já presente no centro da vida terrena e temporal, quando a alma, mediante a graça, está unida a Deus, seu
derradeiro fundamento82”.

“Hoje, muitas pessoas rejeitam a fé, talvez simplesmente porque a vida eterna não lhes parece uma coisa
desejável. Não querem de modo algum a vida eterna, mas a presente; antes, a fé na vida eterna parece, para tal
fim, um obstáculo. Continuar a viver eternamente – sem fim – parece mais uma condenação do que um dom.
Certamente a morte queria-se adiá-la o mais possível. Mas, viver sempre, sem um termo, acabaria por ser
fastidioso e, em última análise, insuportável83”.

“De certo modo, desejamos a própria vida, a vida verdadeira, que depois não seja tocada sequer pela morte;
mas, ao mesmo tempo, não conhecemos aquilo para que nos sentimos impelidos. Não podemos deixar de
tender para isto e, no entanto, sabemos que tudo quanto podemos experimentar ou realizar não é aquilo por
que anelamos. Esta «coisa» desconhecida é a verdadeira «esperança» que nos impele e o facto de nos ser
desconhecida é, ao mesmo tempo, a causa de todas as ansiedades como também de todos os ímpetos positivos
ou destruidores para o mundo autêntico e o homem verdadeiro”84.

“ [Que] a eternidade não seja uma sucessão contínua de dias do calendário, mas algo parecido com o instante
repleto de satisfação, onde a totalidade nos abraça e nós abraçamos a totalidade. Seria o instante de mergulhar
no oceano do amor infinito, no qual o tempo – o antes e o depois – já não existe. Podemos somente procurar
pensar que este instante é a vida em sentido pleno, um incessante mergulhar na vastidão do ser, ao mesmo
tempo que ficamos simplesmente inundados pela alegria. Assim o exprime Jesus, no Evangelho de João: « Eu
hei-de ver-vos de novo; e o vosso coração alegrar-se-á e ninguém vos poderá tirar a vossa alegria » (16,22).
Devemos olhar neste sentido, se quisermos entender o que visa a esperança cristã, o que esperamos da fé, do
nosso estar com Cristo85”.

“Deus vem ao nosso encontro. Encaminhemo-nos também nós para Deus e assim iremos uns ao encontro dos
outros! Não deixemos sós, na medida das nossas possibilidades, nenhum dos filhos de Deus”86!

“Esta grande esperança só pode ser Deus, que abraça o universo e nos pode propor e dar aquilo que, sozinhos,
não podemos conseguir. Precisamente o ser gratificado com um dom faz parte da esperança. Deus é o
fundamento da esperança – não um deus qualquer, mas aquele Deus que possui um rosto humano e que nos
amou até ao fim: cada indivíduo e a humanidade no seu conjunto. O seu reino não é um além imaginário,
colocado num futuro que nunca mais chega; o seu reino está presente onde Ele é amado e onde o seu amor nos
alcança87”.

81
HOMILIA Basílica Vaticana 25 de Dezembro de 2007
82
ANGELUS Solenidade de Todos os Santos Quarta-feira, 1 de Novembro de 2006
83
ENCÍCLICA SPE SALVI, 10
84
ENCÍCLICA SPE SALVI, 12
85
ENCÍCLICA SPE SALVI, 12
86
HOMILIA NA SOLENE CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA NO ISLINGER FELD Regensburg, 12 de Setembro de 2006
87
ENCÍCLICA SPE SALVI, 31
O Credo, comentado por Bento XVI 39

Ámen
Amen

“Chegou o momento de reafirmar a importância da oração face ao activismo e ao secularismo que ameaça
muitos cristãos empenhados no trabalho caritativo. Obviamente o cristão que reza, não pretende mudar os
planos de Deus nem corrigir o que Deus previu; procura, antes, o encontro com o Pai de Jesus Cristo, pedindo-
Lhe que esteja presente, com o conforto do seu Espírito, nele e na sua obra. A familiaridade com o Deus pessoal
e o abandono à sua vontade impedem a degradação do homem, salvam-no da prisão de doutrinas fanáticas e
terroristas88”.

“A fé, a esperança e a caridade caminham juntas.

A esperança manifesta-se praticamente nas virtudes da paciência, que não esmorece no bem nem sequer diante
de um aparente insucesso, e da humildade, que aceita o mistério de Deus e confia n'Ele mesmo na escuridão.

A fé mostra-nos o Deus que entregou o seu Filho por nós e assim gera em nós a certeza vitoriosa de que isto é
mesmo verdade: Deus é amor! Deste modo, ela transforma a nossa impaciência e as nossas dúvidas em
esperança segura de que Deus tem o mundo nas suas mãos e que, não obstante todas as trevas, Ele vence,
como revela de forma esplendorosa o Apocalipse, no final, com as suas imagens impressionantes.

A fé, que toma consciência do amor de Deus revelado no coração trespassado de Jesus na cruz, suscita por sua
vez o amor. Aquele amor divino é a luz — fundamentalmente, a única — que ilumina incessantemente um
mundo às escuras e nos dá a coragem de viver e agir. O amor é possível, e nós somos capazes de o praticar
porque criados à imagem de Deus. Viver o amor e, deste modo, fazer entrar a luz de Deus no mundo: tal é o
convite que vos queria deixar!89”

88
ENCÍCLICA DEUS CARITAS EST, 37
89
ENCÍCLICA DEUS CARITAS EST, 39
O Credo, comentado por Bento XVI 40

O Credo, súmula da fé

A Igreja, por seu lado, oferece-nos uma pequena "Suma", na qual está expresso tudo o que é essencial: é o
chamado "Credo dos Apóstolos".

Normalmente ele está subdividido em doze artigos segundo o número dos doze Apóstolos e fala de Deus,
Criador e Princípio de todas as coisas, de Cristo e da sua obra da salvação, até à ressurreição dos mortos e à vida
eterna.

Mas na sua concepção básica, o Credo compõe-se só de três partes principais, e segundo a sua história não é
mais do que uma amplificação da fórmula baptismal, que o Senhor ressuscitado entregou aos discípulos para
todos os tempos quando lhes disse: "Ide, pois, fazei discípulos de todas os povos, baptizando-os em nome do
Pai, do Filho e do Espírito Santo" (Mt 28, 19).

Nesta visão demonstram-se duas coisas:

[Primeira] a fé é simples. Cremos em Deus em Deus, princípio e fim da vida humana. Naquele Deus que entra em
relação connosco, seres humanos, que é para nós origem e futuro. Assim a fé, contemporaneamente, é sempre
também esperança, é a certeza de que nós temos um futuro e não cairemos no vazio. E a fé é amor, porque o
amor de Deus nos quer "contagiar". Esta é a primeira coisa: nós simplesmente cremos em Deus, e isto traz
consigo também a esperança e o amor.

Como segunda coisa podemos constatar: o Credo não é um conjunto de sentenças, não é uma teoria.

Está precisamente ancorado no acontecimento do Baptismo num acontecimento de encontro de Deus com o
homem. Deus, no mistério do Baptismo, inclina-se sobre o homem; vem ao nosso encontro e deste modo
aproxima-nos entre nós.

Porque o Baptismo significa que Jesus Cristo, por assim dizer, nos adopta como seus irmãos e irmãs, acolhendo-
nos assim como filhos na família do próprio Deus.

Por conseguinte, deste modo faz com que sejamos uma grande família na comunidade universal da Igreja. Sim,
quem acredita nunca está sozinho. Deus vem ao nosso encontro. Encaminhemo-nos também nós para Deus e
assim iremos uns ao encontro dos outros90”!

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HOMILIA NA SOLENE CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA NO ISLINGER FELD, Regensburg, 12 de Setembro de 2006

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