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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

ANA LÚCIA RUIVO MACHADO

A VIDA NA ESCOLA, A ESCOLA NA VIDA...

CAMPINAS
2006
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO

ANA LÚCIA RUIVO MACHADO

A VIDA NA ESCOLA, A ESCOLA NA VIDA...

"Memorial apresentado ao Curso de Pedagogia -


Programa Especial de Formação de Professores
em Exercício nos Municípios da Região
Metropolitana de Campinas, da Faculdade de
Educação da Universidade Estadual de Campinas,
como um dos pré-requisitos para conclusão da
Licenciatura em Pedagogia."

CAMPINAS
2006
© by Ana Lúcia Ruivo Machado, 2006.

Ficha catalográfica elaborada pela biblioteca


da Faculdade de Educação/UNICAMP

Machado, Ana Lúcia Ruivo

M18v A vida na escola, a escola na vida... : memorial de formação / Ana Lúcia


Ruivo Machado. -- Campinas, SP : [s.n.], 2006.

Trabalho de conclusão de curso (graduação) – Universidade Estadual


de Campinas, Faculdade de Educação, Programa Especial de Formação de
Professores em Exercício da Região Metropolitana de Campinas (PROESF).

1.Trabalho de conclusão de curso. 2. Memorial. 3. Experiência de vida.


4. Prática docente. 5. Formação de professores. I. Universidade Estadual de
Campinas. Faculdade de Educação. III. Título.

06-358-BFE
AGRADECIMENTOS

"Aos
meus pais,

À minha filha e companheira Ana Gabriela,

Ao meu filho dedicado João Paulo,

Ao meu esposo e amigo João Rinaldo,

Às minhas colegas de sala, por nunca me deixarem desistir ou mesmo fraquejar durante
essas árduas noites de estudo."
“Peço-lhe que pare de ficar se desculpando por
ter a profissão mais importante do mundo”.
“William G. Carr"
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO..........................................................................................................05

1.) A ESCOLA NA VIDA...............................................................................................08

1.1 )CICATRIZES DO ENSINO TRADICIONAL........................................................09

1.2 )O QUE É A ESCOLA?.............................................................................................13

2).A VIDA NA ESCOLA................................................................................................14

2.1)UMA DAS MINHAS EXPERIÊNCIAS NO ENSINO FUNDAMENTAL...........17

2.2)A EDUCAÇÃO INFANTIL.....................................................................................24

2.3) APENAS BRINCANDO..........................................................................................27

3.)CUIDAR OU EDUCAR, NA EDUCAÇÃO INFANTIL?.........................................30

4.) A INFLUÊNCIA DA MÍDIA.....................................................................................32

5.) CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................35

6.)REFERÊNCIAS..........................................................................................................37
APRESENTAÇÃO

Mais um desafio!
Escrever este memorial realmente para mim será mais um desafio. De barreiras em
barreiras, superando obstáculos, caminhando com esperanças e ás vezes com dificuldades,
assim tem sido minha trajetória de vida. Vida profissional, e intelectual.
Participar do Curso de Pedagogia Específico para Professores em Exercício
(PROESF), oferecido pela Unicamp em parceria com as prefeituras da região metropolitana
de Campinas foi para mim de grande importância, na medida em que me distancio do
cotidiano em busca de novos elementos que venham de encontro às minhas indagações e
angústias, trouxe muitos momentos de reflexão, e um repensar em minha prática
pedagógica. Sem dúvida nenhuma foi uma grande oportunidade na minha vida. Todo o
curso me possibilitou conhecer diferentes teorias, e entender e relacioná-las com a prática.
Muitas vezes adotamos práticas pedagógicas, sem conhecer sua origem, o porque foram
desenvolvidos daquela maneira, em que contexto histórico está relacionado. O Proesf foi à
peça chave deste grande quebra-cabeça que é a educação.
Quero narrar aqui minha história por escrito para preservá-la do esquecimento e
para que sirva de motivação para todos os leitores, que sempre vale a pena buscar novos
conhecimentos. Pretendo relatar neste memorial, a importância das relações afetivas no
ensino aprendizado, marcas do ensino tradicional, e muitas experiências em sala de aula.
Que me baseando em alguns autores, contextualizados no Proesf, tornou minhas atitudes
como professora mais concreta, agora sim fundamentadas em teorias. Atitudes que julgava
importantes agora se tornam fundamentais. Outras que julgava corretas, agora me questiono
de certos procedimentos.
A vida na escola, e a escola na vida!

Mas qual é a importância de uma História?

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A IMPORTÂNCIA DE UMA HISTÓRIA

A importância de uma história?


Pergunte ao velhinho que passa,
Curvado pelo peso dos dias,
Olhos cansados, buscando o ontem,
Pés trôpegos, que talvez não pisem o amanhã...
Pergunte a ele sobre o tempo da escola,
Talvez tudo se tenha perdido,
Nas nuvens espessas dos dias passados...
Pergunte sobre matemática,
Talvez tudo tenha se tomado um denominador comum...
E os verbos do Português?
Talvez sejam todos particípios passados...
Os rios da Geografia,
Talvez se tenham perdido,
Confundidos nas geleiras do tempo...
Das Ciências, da Geometria,
Das histórias, de tudo o mais,
Tudo se esfumou, quase tudo se acabou!
Mas peça a esse velhinho,
Que lhe conte uma história...
E, surpreso, verá seus olhos brilharem,
Sorriem de novo e buscarem no tempo passado,
Um mundo que não passou...
Você vai ouvi-lo contar
De um tempo encantado de sonhos,
Quando montado num cavalo de nuvens,
Corria atrás dos raios de sol!
Ele vai lhe falar de mansinho,
Das tardes em que brincava

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Nos jardins de Branca de Neve...
De quanto lutou e venceu,
Os ladrões e piratas do mar,
Ao lado de Robson Crusoé...
Você vai estranhar que esse velhinho,
Já tenha usado calças curtas,
E soltando bolinhas de sabão...
Que tenha soltado pipas amarelas,
E corrido em carrinhos de rolimã...
Que tenha vencido o Capitão Gancho,
Tenha amado Peter Pan...
Que tenha corrido o mundo,
Montado num tapete voador,
Que tenha navegado os sonhos,
E tenha brincado de amor.
Mas você vai estranhar muito mais,
Se lhe perguntar quem lhe contou tantas histórias,
E ele, sorrindo um sorriso sem dentes, responder num sussurro:
Meu filho! Eu também tive um vovô!

(Franklinsandra H.)

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1.) A ESCOLA NA VIDA...

Nascida em Campinas, dezembro de 1968, filha de metalúrgico, e dona de casa, tive


uma infância agradável. Aos cinco anos tive meu primeiro contato com a escola pública.
Freqüentei por apenas uma semana uma escola de educação infantil, onde eu me lembro
que adorava freqüentar, mas ia aos berros, sob protesto, pois meu irmão menor ficaria
sozinho com minha mãe. A proposta era passar a semana toda na casa de meus avós, e nos
finais de semana ficar com minha mãe, digo com a família. A idéia não deu certo, não me
adaptei. Venci minha mãe pelo cansaço e vergonha, e ela me tirou da escola.
No outro ano ela me matriculou na pré-escola. Na Escola Municipal Dr João Alves
dos Santos, periferia de Campinas, escola da rede Municipal de ensino.
Do meu primeiro dia de aula apenas lembro de uma lancheira linda em formato de
uma casinha, e da hora do lanche onde eu chorava pelos cantos do pátio. Nesta época já
mais madura, freqüentei a sala da pré-escola. Nesta escola cursei além do pré, a primeira,
segunda séries. Fiz amigos que convivo até hoje, pessoas inesquecíveis.
O nome da primeira professora era Denise. Pouco me recordo das aulas de Denise,
apenas que era doce, meiga, não gritava, cantarolava muito, sempre com um sorriso no
rosto, sempre interessada e preocupada com os alunos. Eu adorava o parque e as atividades
livres, onde sempre arrumava uma brincadeira e fazia muitos amigos.
Recordo-me também que a pré-escola foi uma das melhores fases da minha vida!
Fase das mais belas recordações onde o mundo é visto através da ótica dos contos de fadas.
Onde mundo real e imaginário se confunde. Onde tudo é brincadeira.
Já na primeira série, a cartilha era a grande aliada do processo ensino aprendizado.
Um ensino tradicional. Decorar, copiar, ficar sentado, prestar atenção, ficar calado,
horários, proibido fazer perguntas. Não podíamos discordar, levar um exemplo de
casa.Tínhamos que acatar com tudo que os professores falavam, pois, eles sabiam o que
diziam, eles tinham o saber. Nós éramos crianças que não sabíamos de nada e estávamos lá
para aprender. Minha alfabetização se resumiu na memorização do código escrito.
Exatamente como Sergio Leite, explica: (...) ler e escrever são entendidos como atividades

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de codificação e decodificação, sendo o processo de alfabetização reduzido ao ensino do
código escrito, centrado na mecânica da leitura e escrita.(cf. LEITE, 2001, p 23).

Os professores das séries seguintes reproduziam em sala de aula uma educação


nomeada por FREIRE (1983) como bancária, onde sua característica principal é que “está
baseada na transmissão do conhecimento e da experiência do professor”. (BORDENAVE E
PEREIRA apud POLIMENO, 2001, p.393).
Onde é atribuída uma importância significativa aos conteúdos da matéria, onde os
alunos absorvem, memorizam e reproduzem fielmente tudo que aprende nas provas. E essas
práticas avaliativas (provas), presentes nas salas são importantes indicadores do modo
como se concretiza a função classificatória da escola.
Segundo Freitas (2001), em uma concepção capitalista de educação, a avaliação
revela sua função excludente e um conceito de homem unilateralizado pela divisão de
trabalho, também destinada a hierarquizar os alunos, comparando-os e classificando-os.
Está sempre relacionada com o poder na medida em que significa controle pelo professor,
além de apresentar uma motivação artificial de estudo, uma vez que atribui notas que
valorizam (ou não) o desempenho do aluno na escola.

1.1) CICATRIZES DO ENSINO TRADICIONAL

A leitura em minha formação foi muito precária, não lia decorava textos que seriam
pedidos na avaliação. Uma leitura mecânica, sem prazer e entendimento.
Todo aquele fascínio que alguns amigos tinham pela leitura, nunca me abalaram, com
um mundo repleto de atrativos, audiovisuais, porque pegaria um livro, ficaria sentada,
quieta, lendo?
Nas palavras (...) “quem não teria o desejo de experimentar o que para o outro gera
tanto conhecimento, sabedorias e prazer?” (GROTTA, 2001).
Admiro quem tem prazer em ler. Acredito que o professor deva exercitar e
incentivar este hábito.

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Talvez tenha faltado um professor, interagindo mais, motivando e incentivando a
leitura, melhores bibliotecas, sugestões de uma literatura de acordo com a idade e o centro
de interesse. Acredito que houve uma falha, e falta de compromisso, não formaram uma
leitora, aqui, existe uma cicatriz. Marcas que suavizam com o tempo, mas nunca
desaparecem.
A maior preocupação dos professores era com a escrita, gramática, ortografia,
fazíamos listas e listas de separação de sílabas, conjugávamos verbos, líamos os textos dos
livros didáticos, com palavras que não faziam parte do nosso vocabulário, não usávamos o
dicionário, apenas o glossário anexo no livro. As redações eram feitas através do tema dado
pela professora, um clássico: Minhas Férias... Toda vez que voltamos de férias, tínhamos
que relatar o que tinha acontecido nas férias, muitas vezes eu criava situações para que
minhas férias ficarem mais interessantes. Mas era um tédio a falta de imaginação desses
professores.
Porém, de acordo com FONTANA a professora acusada de conservadora por causa
do método utilizado para ensinar, ou por alfabetizar usando a cartilha, muitas vezes o fazia
por não saber como conduzir junto aos alunos novas alternativas de trabalho (cf.
FONTANA, 2000, p.26). Provavelmente sua formação não lhe proporcionou reflexões
sobre sua postura nem apontou alternativas para seu modelo tradicional de alfabetização.
Foi este método que fui alfabetizada, foi este método que nos meus estágios eram
aplicados, quando cursava o magistério, e era esse método que eu, professora acreditava,
pois, se eu tinha aprendido dessa maneira, porque não ensinar assim?
Bom por sorte do destino nunca fui professora-alfabetizadora. Pois acredito que a
professora alfabetizadora é a grande responsável pelo início da formação de um leitor.
E cursando o Proesf, que fui entender melhor o que é Alfabetizar letrando, com a
disciplina Teoria Pedagógica e Produção em Língua Portuguesa sob a coordenação do
professor Sérgio Leite.
Alfabetizar letrando é uma visão diferente, do ensinar.” Letramento é, sobretudo,
um mapa no coração do homem, uma mapa de quem você é, e de tudo que pode ser.”
(Soares,1998).
Para uma sociedade grafocentrica, é de extrema importância ter domínio desse
código. Assistindo o filme Central do Brasil temos uma noção da necessidade de pessoas

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querendo se comunicar, e como é importante a função da leitura e escrita em sua em seu
uso social.
E como utilizar a leitura e a escrita para o aumento da qualidade de vida?
Pensando em Letramento como o resultado da ação de ensinar e aprender as
práticas sociais de leitura e escrita. O estado ou condição que adquiri um grupo social ou
um individuo como conseqüência de ter se apropriado da escrita e de suas práticas sociais.
A relação da criança com o processo letramento pode-se iniciar antes da aquisição
do código da escrita. A leitura de rótulos, slogans, propagandas, identificar através de
símbolos, em um banheiro público, se é masculino ou feminino, faz destas crianças um
leitor em potencial.
O processo de alfabetização, numa perspectiva do letramento, implica atividades
como ouvir e ler livros de histórias, pesquisar sobre assuntos de interesse das crianças,
buscando informações em enciclopédias, jornais ou revistas, freqüentar bibliotecas, abrir
espaços para desenvolver a criatividade com a escrita, como elaborar propagandas, brincar
de caça palavras. Trabalhar textos interessantes. Fazer da escola um espaço democrático,
aberto aos diferentes tipos de leitura.
Certa ocasião, já cursando o Proesf, resolvi trabalhar diferentes textos com meus
alunos da quarta série. Como era época de eleição, e eles detestavam ver propagandas
políticas, trabalhei este texto:

O analfabeto político

O pior analfabeto é o analfabeto político.


Ele não ouve, não fala, não participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel,
do sapato e do remédio depende das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito, dizendo que odeia
a política.
Não sabe que de sua ignorância nascem à prostituta, o menor abandonado, o
assaltante e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e
explorador das empresas nacionais e multinacionais.

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Texto de Bertolt Brecht, em Campanha da Fraternidade-96:
Fraternidade e Política – Justiça e paz se abraçarão
CNBB, Salesiana Dom Bosco,1996

O texto fez refletirmos juntos, e repensarmos nossas atitudes enquanto cidadãos.


Cidadãos que participam de um processo de seleção que é a eleição. O quanto este processo

pode interferir em nossas vidas. E de quanto vale um voto. E como selecionar estes
candidatos. E o quanto às decisões coletivas podem interferir em nossas vidas cotidiana.
Acredito que estamos passando pôr um período de transição e discussão sobre como
se dá o processo ensino aprendizagem de leitura e escrita. O ensino tradicional que
amparava a prática docente, já não dá conta de instruir o aluno para os dias atuais,
precisando assim recorrer a outro modelo, emancipador.
As dificuldades e desafios são diversos a começar pela real situação que a escola
pública se encontra: salas superlotadas, problemas de estrutura física, problemas de
relacionamento profissional, falta de material pedagógico, organização curricular, livros
didáticos ou até mesmo falta de informação e formação dos professores sobre teorias e
conhecimentos que possam embasar sua prática.
Mas no modelo emancipador, é diferente o conhecimento prévio do aluno, é
valorizado, ele aprende e ensina. O dialogo é muito importante. O professor elabora aulas
flexíveis e contextualizadas, ou seja, baseadas nas experiências de vida e de linguagens das
crianças e assim construir coletivamente seu conhecimento.
São nessas atitudes tomadas diante da prática pedagógica que se revelam algumas
concepções como de homem, cidadania, sociedade e mundo.
Mas, não adianta fazer discursos politicamente corretos, pois como dito, são as
ações que nos revelam. O profissional tem que ser coerente consigo mesmo. Definir-se
como tradicional ou construtivista não significa nada, é preciso ter atitude e saber o que,
porque, e como fazer.
É essencial que o profissional tenha, um olhar e atitudes criticas para não se deixar
enganar ou ser induzido pôr algo dito ser verdade. Essencial também é acreditar no
potencial de nossas crianças, mudar nosso conceito na relação professor x aluno
aprendizado x desenvolvimento.

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Aceitar naturalmente que uma criança não aprende, não oportunizando a ela
conhecimento e a relação deste com sua vida, é condená-la ao fracasso escolar, profissional
e social. E para que isso não ocorra, o primeiro passo é fazer com que o aluno entenda a
função da escrita, para que e como utilizá-la.
Hoje não basta mais ser alfabetizado. Além de ler e escrever é necessário que o
aluno-cidadão saiba fazer uso desse conhecimento.
É imprescindível que o professor alfabetize letrando, isto é, trabalhe através de uma
relação afetiva positiva e dialógica onde o texto será à base do processo, pois o mesmo
constitui-se como uma unidade de sentido. Textos reais que possibilitam explorar
atividades que estejam dentro do seu contexto. Levando o aluno a refletir sobre a norma
padrão, a importância da mesma na sociedade e o poder instituído a ela.
Mas o que é a escola senão...

1.2) O QUE É ESCOLA?

A ESCOLA

Escola é...
O lugar onde se faz amigos,
Não se trata só de prédios, salas, quartos,
Programas, horários, conceitos..
Escolas é, sobretudo,gente,
Gente que trabalha, que estuda,
Que se alegra, se conhece, se estima,
O diretor é gente,
O coordenador é gente, o professor é gente,
O aluno é gente,
Cada funcionário é gente.
E a escola será cada vez melhor
Na medida em que cada um

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Se comporte como colega, amigo, irmão.
Nada de “ilha cercada de gente por todos os lados”.
Nada de conviver com as pessoas e depois descobrir
Que não tem amizade a ninguém,
Nada de ser como o tijolo que forma a parede,
Indiferente, frio, só.
Importante na escola não é só estudar, não é só trabalhar,
É também criar laços de amizade,
É criar ambiente de camaradagem,
E conviver, é se ‘amarrar nela’!
Ora é lógico...
Numa escola assim vai ficar fácil
Estudar, trabalhar, crescer,
Fazer amigos educar-se,
Ser feliz.
(Paulo Freire)

2.) A VIDA NA ESCOLA...

Sou professora desde 1989, formada no colégio Culto à Ciência, em Campinas.


Professora por acaso, quando terminei a oitava série, na Escola Estadual Professor Carlos
Cristovam Zink, na Vila Boa Vista, Campinas, fui cursar o colegial, na escola estadual
E.E.P.S.G Reverendo Prof José Carlos Nogueira, escola também do meu bairro, que
infelizmente não contribuiu muito para que eu passasse no vestibular. Na época, prestei
vestibular na Pucc, onde gostaria de cursar biologia. Devido às condições financeiras,
dificilmente conseguiriam fazer o curso. Assim sem querer parar de estudar, segui os
conselhos de minha mãe e fui cursar o magistério.
Para minha mãe é um grande orgulho ter uma filha professora.
Mesmo antes de me formar, já lecionava, na rede estadual de ensino, primeiro como
estagiária, logo depois assumindo uma sala de aula. Durante cinco anos lecionei para

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terceiras e quartas séries das escolas estaduais do meu bairro, onde que eu estudei, escolas
que fazem parte de minha história. Foi um orgulho quando conseguir lecionar nestas
escolas, pois vários profissionais professores antes meus mestres, agora eram meus colegas
de trabalho. Dei aulas até para sexta, sétima e oitava séries em caráter excepcional, pois não
tinha professor de Educação Artística, e a diretora conversou na delegacia de ensino, e me
atribuiu as aulas.
Eu lecionava à noite, para vários colegas, vizinhos, e tínhamos quase a mesma
idade. Eu sem nenhuma experiência, apenas acreditava que poderia dar certo tinha muita
vontade em aprender. Os alunos me respeitavam, e até admiravam, eu tão nova, já
lecionando para eles.
Logo me efetivei no estado.
Em 1992, comecei a lecionar também na Rede Municipal de Campinas, onde prestei
o concurso público, passei, fiquei na lista de espera, e fui chamada para lecionar, por vários
anos consecutivos, mais não consegui me efetivar.
A experiência na Educação Infantil foi de fundamental importância na minha vida,

pois me identificava muito, gostava muito do que fazia, me apaixonei pela Educação
Infantil, e mesmo não sendo efetiva na prefeitura, decidi deixar o estado onde era efetiva,
para me dedicar e exclusivamente. Fazer o que realmente gostava.
A base que o magistério me ofereceu sobre Educação Infantil, era muito pouca,
então procurei cursos, que a rede mesmo oferece para me aprofundar, e aprender a trabalhar
melhor, oferecer mais qualidade, mas o perfil, que acredito que um professor de Educação
Infantil deva ter, eu já tinha em mim.
Como já relatei sempre estudei em escolas públicas, infelizmente um estudo repleto
de falhas, sempre tive consciência dessa defasagem, achei que precisava saber mais. Os
anos passam, as crianças mudam, o mundo evolui, e eu cada vez mais sentia necessidade
em aprender, e o Proesf, foi à oportunidade, que eu tive em melhorar, e em aprender
principalmente que o conhecimento é uma eterna busca.
Como gosto do que faço, e sempre consigo estabelecer um vínculo afetivo com
meus alunos, e acredito que o professor deva ter um olhar especial com seus alunos, tem
que conquistá-los. Então resolvi relatar algumas experiências que foram de fundamental
importância demonstrar afetividade nas relações aluno x professor.

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Penso que o professor não deva se colocar em um pedestal, ter apenas uma relação
profissional. O professor tem que se envolver, participar, quebrar barreiras, e se relacionar,
e levar em consideração a vida do aluno. O professor é uma figura importante na vida do
aluno. É capaz de despertar boas lembranças, significativas aprendizagens, ou também ser
causador de vários traumas e fracassos escolar.
Alguns amigos educadores desconsideram essa relação de afetividade, acham que o
relacionamento entre professor x aluno deve ser restritamente profissional, estamos ali para
ensinar. Que não devemos nos envolver nos problemas particulares de cada aluno. Se ele
não aprende porque não tem uma base familiar estruturada, não tem condições econômicas,
ou os pais trabalham o dia todo e não tem tempo de olhar e orientar seus filhos.
Mas com um relacionamento diário não tem como não se envolver, a emoção é mais
forte, e o resultado é melhor ainda. Como não falar de afetividade trabalhando com seres
humanos? Segundo Cunha (1988) “Conforme o tom que fala, olhar que lança, o gesto que
esboça, a fala (do professor) adquiri um valor determinado para o conjunto de alunos e
certamente uma ressonância particular para alguns deles”.
As crianças de zero a seis anos de idade são pura emoção. Se o professor não for
carinhoso, meigo, envolvente, brincalhão, um pouco pai, mãe, tia, não vai conseguir um
vínculo com estas crianças. O toque também é um grande aliado, nesse processo, um
abraço, um carinho, uma palavra de conforto, são simples gestos e atitudes que fazem a
diferença.
Às vezes me pergunto... Só na Educação Infantil precisa de afetividade? As crianças
de primeira às quartas séries também precisam de afetividade, o ser humano precisa de
afeto.
Com base em uma recente experiência, que conclui, que as crianças maiores
também precisam de afeto por parte do professor.
Depois de vários anos na Educação Infantil, o destino me pregou uma peça.
No ano de 2004, já cursando o Proesf, não consegui sala na escola de educação
infantil que eu estava, e a sala mais próxima de minha casa, era uma a escola onde cursei a
pré-escola, a Escola Municipal Dr João Alves dos Santos. Uma comunidade difícil, muito
carente, crianças e jovens moradores de uma invasão, que conviviam no meio de drogas.
Que viviam histórias de vidas que eu nem sonhava. Aceitei o desafio!

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2.1)UMA DAS MINHAS EXPERIÊNCIAS NO ENSINO
FUNDAMENTAL

Uma sala de quarta série, de alunos quase todos repetentes. Chegando lá me deparei
com uma clientela totalmente diferente da qual estava acostumada. Desde a faixa etária, a
condições econômicas. Fiquei com a professora da sala no meu primeiro dia de aula, pois já
era o mês de abril, época de finalização do bimestre, provas, notas. Eles já tinham uma
convivência, pois estavam já há vários anos estudando na mesma sala. Ela me passava as
instruções, os conteúdos já trabalhados. A professora estava saindo, pois seria orientadora
pedagógica em outra unidade, e disse que eu precisava ser muito brava, pois eles não
respeitavam, não levavam nada a sério, que a sala era muito difícil, que os outros
professores que também atuavam naquela classe, de Educação Física, Educação Artística,
professora de orientação sexual, e a professora de Proerd, (Programa Educacional de
Resistência às Drogas e a Violência) também não agüentavam a sala. Detalhe na frente dos
alunos. No primeiro dia fiquei chocada. Em um momento que eu circulava na sala senti
que um dos alunos me cutucou na perna com a ponta de um lápis bem afiado. Na hora senti
a picada, mas não disse nada, e como se nada tivesse ocorrido continue a circular pela sala,
verificando os cadernos dos alunos. Assim que terminou a aula, procurei a minha superiora,
na prefeitura, implorando para sair daquela sala. Eles me orientaram para ficar apenas uma
semana, até que providenciassem outra professora. Fiquei com a sala. No outro dia,
conversei muito com os alunos. Eles também me contaram suas angústias e que se sentiam
abandonados pela outra professora, pois ela não havia explicado o porque estava saindo,
então eu expliquei que não era devido o comportamento que a classe estava apresentando,
mas que seria difícil trabalhar daquela forma. Porque se comportavam daquela maneira?
Será que poderíamos ser amigos? Passou uma semana e não veio outra professora, e eu já
não sabia se queria deixá-los... Eles sentiriam rejeitados mais uma vez. Fui me envolvendo,
liguei para a supervisora, e disse que ficaria com a sala. Não quis abandoná-los. E aquela
sala me conquistou. Resolvi ficar, e provar para mim mesma, que seria possível, que eles
precisavam de mim, e eu também precisava deles. E a sala já estava rotulada a pior quarta
série, das quatro que havia na escola. Realmente no início eles me rejeitaram, gostavam da

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outra professora, mas com muita conversa, muita paciência, respeito, fui conquistando eles
e eles a mim. Certo dia a diretora veio me perguntar, o que eu fiz com a sala, quais eram os
meus métodos de disciplina, por que já fazia algum tempo que não ia ninguém para
diretoria. Já não ouvia tanto barulho quando passava pela aquela sala. E uma das primeiras
coisas que fiz foi contar minha história de vida para aquelas crianças, mostrar que eu era
um deles. Como já havia estudado naquela escola, contei minha trajetória de vida, como me
tornei professora, e que estava cursando um curso superior em uma das melhores
faculdades do Brasil. As disciplinas que eu estava cursando no Proesf, naquele momento
me ajudaram muito. A disciplina, Teoria Pedagógica e Produção em História, com a
professora assistente Mariana Ventura sob orientação da professora coordenadora Ernesta
Zamboni, serviu para me subsidiar com meus alunos, resgatar a historia de vida, deles,
pesquisar suas origem, valorizar, as suas raízes, mostrar a sua cultura, toda essa valorização
fez parte das aulas. Situar o aluno no momento histórico em que vive, perceber os fatos que
acontecem ao seu redor, contribuem para sua formação intelectual e social, para os eu
crescimento social e afetivo, desenvolvendo-lhe o sentido de perceber. O ensino iniciado
pela historia de vida dos alunos justifica-se porque estão interessados em temas cujo centro
são eles próprios. A construção do passado se dá no momento em que a criança tem
percepção do seu próprio eu e tenha iniciado a construção da sua própria identidade.
Quando orientei meus alunos na sistematização dos dados de sua própria vida e iniciou-se a
construção da sua história de vida. Acredito que coloquei um pouco de esperança em cada
coraçãozinho daquela sala. E tenho uma grande preocupação não só que o aluno aprenda,
mas que tenha vontade e desejo de aprender. Eles não tinham noção de quantos anos que
tinham que estudar, para se formar, que cursos poderiam fazer. Pareciam não ter muitas
perspectivas em relação ao futuro. Não planejavam o futuro, apenas viviam o presente. Não
tinham objetivos, iam para escola, pois senão o conselho tutelar, iria a suas casas tirar
satisfações com seus pais. Outros freqüentavam a escola, devido ao programa bolsa escola,
não podiam ter faltas, senão os pais não recebiam o beneficio. Gostar mesmo de freqüentar
com um objetivo eram poucos.
Como eu tenho um filho que cursava a sexta série, e tinha a mesma idade da maioria
dos meus alunos, pois vários estavam em defasagem escolar. Eu sabia o que eles gostavam,
me comunicava na linguagem deles, comentava sobre os programa que eles assistiam,

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conhecia as figurinhas do momento, entendia dos vídeos games da moda. Respeitava seus
gostos, entendia suas angustias. Ouvia, conversava, orientava, aprendia...
Os estudos baseados na abordagem histórico-cultural demonstram que a construção
do conhecimento ocorre a partir de um intenso processo constituído nas relações sociais, as
idéias encontradas em Vygotsky (1994) permitem defender que a construção do
conhecimento ocorre a partir de um intenso processo de interação entre as pessoas. As
experiências vividas em sala de aula despertara uma relação afetiva do aluno com o objeto
de conhecimento. O trabalho que o professor realiza , como ele interage, como trata o
conteúdo, que tipo de atividades utiliza, como corrige, como avalia, influência a construção
dessa relação.
Segundo Wallon (1971), a afetividade desempenha um papel fundamental na
construção e no funcionamento da inteligência e determina os interesses e as necessidades
individuais.
Foi um ano surpreendente. Aquelas crianças eram muito carentes, como precisavam
de atenção, de serem valorizadas, de perceberem que também são capazes. E elas provaram
que são capazes. O interesse aumentou muito, a participação, o envolvimento nas diferentes
disciplinas.
Organizamos projetos envolvendo diferentes disciplinas. Um campeonato de
futebol , e um campeonato de passa ou repassa. Este passa ou repassa, foi um campeonato
onde as crianças respondiam perguntas diversas, de história, geografia, matemática,
português, ciências, conhecimentos gerais, sobre Carlos Gomes, pois estudávamos sua vida
e obra, e perguntas sobre atualidades. E todas as quartas-séries participavam, e nós nos
uníamos mais ainda, em busca de um objetivo, que era a vitória. Mas talvez um objetivo
maior estivesse aí sendo alcançado e nós nem nos dávamos conta. A união da sala era
visível, meus batimentos cardíacos, me denunciavam, éramos uma equipe, lutando pelo
bem comum, sabendo ganhar, perder, discutir, criticar, participar.
No campeonato de futebol, formamos um time de meninos, e um time de meninas.
Jogava quarta A, contra a B, a C contra D e vice versa. As professoras eram as técnicas. Eu
consegui uniforme usado que foram doados para todas as turmas, e eles se sentiam muito
importantes. Felizes por representarem a sala, pelo envolvimento dos professores, que
defendiam e quase brigavam entre si por causa dos seus alunos.

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Percebi o quanto à postura do professor pode amenizar os efeitos negativos de
sentimentos e emoções que desgastam e exigem grande mobilização, como ansiedade, o
medo, a frustração. Esta atuação pedagógica pode reduzir esses sentimentos canalizando
um sentimento positivo para o campo da cognição.
Segundo Dantas (1993), chama de “afetividade da lambida” as manifestações
epidérmicas, manifestações afetivas realizadas através do contato físico. Concordo que o
ato de se aproximar, de tocar com carinho nos alunos, mostrar interesse pelas suas dúvidas,
é de muita importância no processo de construção do aprendizado. E estes campeonatos,
atividades feitas fora da sala de aula, que unia os professores das salas, com os professores
de Educação Física, a professora de Educação Artística. E ficava mais completo dentro da
sala de aula, pois era para lá que fazíamos os questionamentos, elaborávamos regras, e
varias das problemáticas envolvidas, o número de alunos envolvidos, qual a melhor forma.
de atuação, eleição do time, leitura e produção de textos, debates de normas e regulamentos
Qual seria melhor forma de punição para os que fugissem as regras. E como eles eram
rigorosos na punição. Tornar essas crianças participativas críticas e leitoras foi um trabalho
árduo, mas acredito que uma semente foi plantada. Vários desses alunos continuarão
trilhando este caminho, e se tiverem professores que continuem incentivando esta busca.
Pois acredito que é através diferentes formas de linguagens, que conseguiremos
formar o cidadão leitor. Por que as pessoas têm acesso ao conhecimento produzido pela
humanidade, buscam informação, ampliam sua visão de mundo e tem a possibilidade de
exercer a cidadania de maneira consciente e crítica.
Assistindo o filme: O céu de Outubro me fez refletir que não podemos subestimar
nossos alunos. Contei a história para os meus alunos. E eles gostaram muito.
O filme relata a vida simples de uma comunidade que sobrevivia através do trabalho
de uma mina de carvão.
Um menino da comunidade, filho de um minerador, se destacava por ter idéias
diferentes, sonhava com outros ideais, com um futuro diferente.
Em certa ocasião, no colégio que estudava, houve uma feira de ciência, onde cada
grupo levaria a sua experiência.
O menino resolveu pesquisar sobre lançamentos de foguetes, e através de muita
leitura seu grupo acabou superando as expectativas. A professora que no começo

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subestimou os garotos, depois, vendo o empenho ficou muito interessada e começou a
incentivá-los.
Cada vez mais se aprofundando nas experiências, os meninos não desistiam, às
vezes os resultados não era muito satisfatório, e trouxe alguns problemas, mesmo assim
continuaram.
O pai do menino, não apoiava em nada nas experiências, e queria que ele
trabalhasse nas minas de carvão, pois o garoto teria um trabalho como o pai, uma
estabilidade, e trabalhar nas minas, era o único emprego que havia na região, não queria
que seu filho sonhasse com o impossível.
Mas os meninos não desistiram e cada vez mais tinham resultados melhores, e
foram chamando a atenção da comunidade, e ganharam até alguns admiradores.
Os meninos acabaram sendo convidados para expor seu trabalho em outra cidade
local, e conquistaram vários admiradores. A comunidade se orgulhava, e até o diretor da
escola que nunca tinha acreditado neles, agora se surpreendeu. No final da história o aluno
que acreditou em seu sonho, se aplicou em suas pesquisas tornou-se um astronauta.
Voltando a minha prática, hoje percebo o quanto foi fundamental ter conversado
com meus alunos, ter ouvido as dúvidas. Mostrar que eles são capazes e que não estavam
sozinhos. Pois este trabalho se refletiu dentro e fora da sala de aula. O empenho e o esforço
de cada um me realizava.
Lendo um texto de Trindade, (2000) “Olhando com o coração e sentindo com o
corpo inteiro no cotidiano escolar”, trabalhado no Proesf, percebo o quanto ela traduziu
meus sentimentos. Gosto de perceber em meus alunos, os seus jeitos, os cheiros, os
sorrisos, as implicâncias, os medos, as vestes, as palavras, e suas belezas, lembrar deles
com paixão, de um envolvimento ímpar e particular, saber de cada historia, fazer parte
dessa historia.

(...)a gente olha, mas não vê, a gente vê, mas não percebe, a gente percebe, mas
não sente, a gente sente, mas não ama, e, se a gente não ama a criança, a vida que
ela representa, as infinitas possibilidades de manifestação dessa vida que ela traz,
a gente não investe nessa vida, e se a gente não investe nessa vida, a gente não
educa e se a gente não educa no espaço/ tempo de educar, a gente mata, ou
melhor, a gente não educa para vida; a gente educa (se é que pode dizer assim)
pra uma morte em vida: a invisibilidade...¨ ( Trindade, 2000, p 9.)

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No início de minha carreira, por vários anos acreditei que estava fazendo o certo,
a minha sala de aula era organizada, carteira atrás de carteira, trabalho em grupo causava
muita polêmica, barulho, incentivava o individualismo, a concorrência, elogiava os bons
alunos, e não percebia que os problemas de aprendizagem, não estavam neles e sim em
mim, na minha forma de ensinar. E reproduzia o meu aprendizado. Não tinha consciência
disso. Percebo em minha prática, o quanto era técnica a educação, praticamente era
domesticar o individuo, ser pontual, não responder, aprender o básico, não questionar,
obedecer, preparar para o trabalho era a principal função da educação. O aluno não
precisaria saber mais que o suficiente, para trabalhar em uma firma, não tinha o direito de
sonhar com novos horizontes, seu destino já estava traçado. A sociedade precisava de mão
de obra, e não de cabeças pensantes. E nós, professores não enxergavam isso, ou trabalhar
assim era mais prático? Era só seguir uma cartilha, ou abrir um livro que o governo
mandava. Questionar uma matéria de jornal sairia do foco em que o professor estava
trabalhando. Ele não sabia, ou não queria abordar questões do cotidiano, tinha um conteúdo
a cumprir, notas para fechar, não podia gerar discussões em sala, isso faria muito barulho,
todos se empolgariam e iam querer participar. Não tinha espaço para todos, nem para
alguns, apenas para o professor. As práticas docentes na grande maioria das escolas de
primeiro grau continuam a reproduzir esquemas ultrapassados, e prejudiciais à
aprendizagem significativa e isto geram fracasso, repetência e a própria exclusão.

Esse é o modelo pelo qual eu fui alfabetizada, e que continuou até o magistério. E
como eu poderia mudar isso? Esse modelo de educação era o que eu conhecia, mas já não
concordava. E o sistema de ensino estava contaminado, e fazer algo diferente, era um
trabalho de convencimento, que passo a passo fui conquistando. Mas não sou a heroína
dessa historia, mudei muita coisa em minha prática, e tenho muito a que mudar. Percebo
que ainda há muitas coisas para aprender e que estabelecer um vínculo afetivo com o aluno
é muito importante, tento estreitar esta distância entre professor e aluno, abordar temas que
interessam a eles, falar na linguagem deles e ouvi-los, respeitá-los, e aceitá-los como são,
este seria o primeiro passo, para uma relação de produção de conhecimentos. Vejo que o
cuidar e o educar não esta vinculada à educação infantil, se estende da primeira à quarta
série. No infantil é um cuidar com contato, em dar atenção, carinho, higiene, alimentação,
atenção, colo, mas no ensino fundamental também temos que nos preocupar com o cuidar,

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em ter o cuidado em ouvir, orientar, prestar atenção, elogiar, fazer com que a criança se
sintam parte do conjunto, incluí-la na discussão, pedir opinião, para que ela faça parte desta
construção, seja protagonista desta história.

¨De acordo com Jean Piaget (1896-1980) o papel da afetividade é funcional na


inteligência, é fonte de energia. Ele explica esse processo por meio de uma
metáfora, afirmando que ¨a afetividade seria como a gasolina, que ativa o motor
de um carro mas não modifica sua estrutura¨(ibidem, p.5). Existe uma relação
intrínseca entre a gasolina e o motor (ou entre a afetividade e a cognição) porque
o funcionamento do motor, comparando com as estruturas mentais, não é possível
sem o combustível, que é a afetividade.¨

Quero que meus alunos adquiram este combustível que é a afetividade, para que
possam trilhar no caminho da sabedoria. Ver a criança como um ser social e histórico, que
faz parte de uma organização familiar, que está inserida em uma sociedade, com uma
determinada cultura, em um determinado momento histórico. Essa criança não é somente
marcada pelo meio social em que se desenvolve, mas também o marca.

BOLA DE MEIA, BOLA DE GUDE

Composição: Milton Nascimento e Fernando Brant

Há um menino, há um moleque,
Morando sempre no meu coração
Toda vez que o adulto balança
Ele vem pra me dar à mão

Há um passado no meu presente,


O sol bem quente lá no meu quintal
Toda vez que a bruxa me assombra
O menino me dá a mão
Ele fala de coisas bonitas
Que eu acredito que não deixarão de existir

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Amizade, palavra, respeito, caráter, bondade, alegria e amor.

Pois não posso, não devo,


Não quero viver como toda essa gente
Insiste em viver
Não posso aceitar sossegado
Qualquer sacanagem
Ser coisa normal

Bola de meia, bola de gude.


O solidário não quer solidão
Toda vez que a tristeza me alcança
O menino me da à mão.

2.2) A EDUCAÇÃO INFANTIL

TUDO O QUE EU DEVIA SABER NA VIDA APRENDI NO JARDIM DE


INFÂNCIA

Tudo o que eu preciso saber sobre a vida, o que fazer e como ser, eu aprendi no
Jardim de Infância. A sabedoria não estava no topo da montanha de conhecimento que é a
faculdade, mas sim, no alto do monte de areia do Jardim de Infância.
Essas são algumas coisas que aprendi: Dividir tudo. Ser justo. Não machucar
ninguém. Colocar as coisas de volta no lugar de onde foram tiradas. Pedir desculpas sempre
que magoar alguém. Lavar as mãos antes das refeições. Dar descarga. Leite com bolachas
faz bem para a nossa saúde.
Viver uma vida balanceada: aprender um pouco, desenhar um pouco, pintar um
pouco, cantar um pouco, dançar um pouco, brincar um pouco, trabalhar um pouco todos os
dias. Tirar uma soneca todas as tardes. Quando sair na rua olhar: carros, dar as mãos e ficar
junto.

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Lembra daquela sementinha de feijão no potinho de Danone? As raízes crescem
para cima e ninguém sabe com certeza como ou por que, mas todos nós somos todos
exatamente como ela.
Peixinhos, passarinhos, gatinhos e cachorrinhos e até mesmo a sementinha de feijão
no potinho de Danone, todos morrem assim como nós. E então lembre dos livros de
Chapeuzinho Vermelho e das primeiras palavras que você aprendeu. As maiores de todas:
Mamãe e Papai.
Tudo o que você precisa saber está lá em algum lugar. Regras sobre a vida, o amor,
saneamento básico, ecologia política, igualdade e fraternidade. Pegue qualquer um desses
termos e extrapole para sofisticadas palavras da linguagem adulta e então aplique em sua
vida familiar, trabalho, governo ou mundo, e tudo continua firme e verdadeiro.
Pense como o mundo seria melhor se todos nós o mundo inteiro tomássemos leite
com bolachas às três horas da tarde, todas as tardes e depois, deitássemos com nossos
travesseiros no sofá da sala para uma soneca. Ou então, se todos os governos tivessem
como política básica sempre colocar as coisas de volta no lugar de onde foram tiradas e
também sempre arrumar suas próprias bagunças. E continua verdade, não importa sua idade
quando sair para o mundo dê as mãos e fique junto.
(Fulghum, 1991)

Trabalho na educação infantil já há alguns anos, exatamente catorze. Quando


comecei a trabalhar com essa faixa etária fiquei muito feliz, por se tratar de crianças
pequenas. Trabalhar com o lúdico, brinquedos jogos e brincadeiras.
Iniciei em uma sala, com crianças na faixa etária, de cinco anos (infantil), crianças
que nunca tinham freqüentado uma escola. Alfabetizar era a única coisa que a orientadora
pedagógica disse que eu não poderia fazer. Mas o que ensinar para estas crianças, afinal de
contas estavam em uma escola. E eu estava vindo de uma quarta série, onde era conteúdo,
encima de conteúdo. Como avaliar estes alunos? Qual era a qualidade em educação que eu
poderia proporcionar aos meus alunos? As aulas deveriam ter conteúdos, temas, seqüência,
objetivos e interesses.
Por ser uma sala de emergência, (uma sala formada depois do início das aulas), e já
era final de fevereiro, ninguém me pediu planejamento, desconhecia a proposta da escola. É

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claro que eu não iria massacrar meus alunos com muitos conteúdos, elaborar aulas
maçantes, deixá-los preso em suas cadeirinhas tentando ser o centro das atenções. Para eles
pouco importava se tinha ou não tinha professor na sala, estavam ansiosos, cheio de
energia. Eles queriam atividades, ver coisas diferentes. Sair da rotina de suas casas onde
viviam presos devido à violência e com o babá eletrônica que é a televisão. Precisávamos
de espaços para dialogar, planejar o dia, entender nossa rotina, cumprir regras. Horários a
cumprir eram vários: hora de parque, hora de pegar livros na biblioteca, horário de vídeo,
horário de lanche, e tal hora tudo deveria estar no lugar, pois a sala deveria ficar em ordem
para a próxima turma. Então para me situar e situar meus pequenos alunos elaborei um
esquema de trabalho, explorava o que tínhamos em sala de aula, jogos, poucos brinquedos,
massinhas, tintas, conversávamos sobre regras, havia à hora das novidades, fila, não sair do
lugar, hora para mudar de mesa, ensinava a iniciais do nome. Elas copiavam suas iniciais.
Seria um esquema de ensino inspirado no ensino tradicional.

Dizem que mais difícil do que adquirir novos


conhecimentos é conseguir desprender-se dos velhos.
Abandonar uma idéia supõe renunciar
a uma parte de nosso pensamento daquele que
consideramos verdade durante muito tempo
e deixar-se fascinar pelo insólito.é nesta
capacidade de fascinação que
reside o gérmen do progresso.
(Moreno et al, 1999)

Com o passar dos anos, estudando mais, refletindo com os professores, vimos que
poderíamos fazer diferente, aquela forma de ensinar não estava interessando as crianças
Algo precisava ser repensado, em nossa prática. Precisávamos conectar a escola à vida.
Alguns anos depois... Comecei a trabalhar com projetos.
As aulas partiriam do centro de interesse em comum dos alunos. Eles teriam
espaços para se expressarem oralmente, dar oportunidade deles se organizar. Eles
poderiam sugerir as atividades que gostariam de fazer, deixar jogos em locais de livre
acesso. A sala teria cantinhos com atividades diversificadas. A turma teria momentos

26
coletivos, onde todos participariam das atividades, e momentos de escolhas individuais,
onde cada criança poderia escolher um cantinho para realizar suas atividades, eles se
dividiriam sem a minha intervenção. A sala seria organizada de forma que ficassem à
disposição das crianças jogos, brinquedos, cantinho da literatura, massa para modelar, tintas
pincéis, papéis.
E comecei a observar o que despertava interesse neles, o que chamava a atenção. Na
época nosso parque havia um coqueiro, e estava cheio de lagartas, e fomos trabalhar com
este tema. Observávamos, registrávamos, pesquisávamos...
Eu lia para as crianças, livros sobre lagartas, borboletas. Um menino pegou uma
lagarta no jardim, colocamos em um pote transparente, e observamos como ocorre a
metamorfose. Todos os dias assim que formávamos a roda, que chamamos de roda da
conversa, as crianças ficavam eufóricas para ver como nossa lagarta estava. E um belo dia
estava lá inacreditável! A lagarta se transformou em uma linda borboleta. Soltamos a
borboleta no parque, para viver em liberdade.
Toda vez que íamos ao parque eles me perguntavam onde estava a borboleta.
Fizemos um livro sobre a metamorfose. Cada observação que achamos significativa
fazíamos um desenho. E foi assim: trabalhando com projetos, dando sentido ao trabalho
pedagógico, incluindo a afetividade no meu cotidiano e valorizando o brincar, que venho
trabalhando na pré-escola.

2.3) Apenas brincando

Quando estou construindo com blocos no quarto de brinquedos,


Por favor, não diga que estou apenas brincando.
Porque enquanto brinco estou aprendendo
Sobre equilíbrio e formas.
Quando estou me fantasiando,
Arrumando a mesa e cuidando das bonecas,

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Por favor, não fique com a idéia que estou apenas brincando.
Porque enquanto brinco estou aprendendo.
Eu posso ser mãe ou pai algum dia .
Quando estou pintado até os cotovelos,
Ou de pé diante do cavalete, ou modelando argila,
Por favor, não me deixe ouvir você dizer: ele está apenas brincando.
Porque enquanto brinco estou aprendendo.
Estou me expressando e criando.
Eu posso ser um artista ou um inventor algum dia.
Quando você me vê sentado numa cadeira
Lendo para uma platéia imaginária,
Por favor, não ria e pense que eu estou apenas brincando.
Porque enquanto brinco estou aprendendo.
Eu posso ser um professor algum dia.
Quando você me vê procurando insetos nos arbustos,
Ou enchendo meus bolsos com todas as coisas que encontro,
Não jogue fora como se eu estivesse apenas brincando.
Porque enquanto brinco estou aprendendo.
Eu posso ser um cientista algum dia.
Quando estou entretido com um quebra-cabeça,
Ou com algum brinquedo na minha escola,
Por favor não sinta que é um tempo perdido com brincadeiras
Porque enquanto brinco estou aprendendo.
Estou aprendendo a me concentrar e resolver problemas.
Eu posso estar numa empresa algum dia.
Quando você me vê cozinhando ou experimentando alimentos,
Por favor não pense que, porque me divirto, é apenas uma brincadeira.
Eu estou aprendendo a seguir instruções e perceber diferenças.
Eu posso ser um “chef” algum dia.

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Quando você me vê aprendendo a pular, saltar,
Correr e movimentar meu corpo,
Por favor, não diga que estou apenas brincando.
Eu estou aprendendo como meu corpo funciona.
Eu posso ser um médico, enfermeiro ou um atleta algum dia.
Quando você me pergunta o que eu fiz na escola hoje,
E eu digo, eu brinquei. Por favor não me entenda mal.
Porque enquanto eu brinco estou aprendendo.
Estou aprendendo a ter prazer e ser bem sucedido no trabalho.
Eu estou me preparando para amanhã.
Hoje, eu sou uma criança e meu trabalho é brincar.

( Anita Wadley)

3.) CUIDAR OU EDUCAR, NA EDUCAÇÃO INFANTIL?

“A história da creche liga-se às modificações do papel da mulher na sociedade e


suas repercussões no âmbito da família, em especial no que diz respeito à
educação dos filhos. Essas modificações inserem-se no conjunto complexo de
fatores contraditórios presentes na organização social, com suas características
econômicas, políticas e culturais. Em especial, a creche deve ser compreendida
dentro de um contexto social que inclui a expansão da industrialização e do setor
de serviços, ao mesmo tempo em que a urbanização se torna cada vez
maior”.(Oliveira, 1992, p17)

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Percebo que, a necessidade dos pais em de deixar seus filhos em um lugar seguro
onde, seja cuidado, vem desde o século XIX, com a revolução industrial, as mães
precisavam trabalhar e acabavam levando seus filhos. Surgem as salas de asilo, para abrigar
estas crianças e reproduzir a assistência que a mãe dava. Com o objetivo de cuidar das
crianças, dar alimentação e orientações de higiene e saúde.
Hoje ainda há esta preocupação dos pais em relação do cuidar. E após grandes lutas
e pressões por creches houve um aumento no número de creches domiciliares ou
comunitárias. E recentemente a visão de creche passa a ser considerada como direito da
criança. Mas esse direito ainda não é respeitado, há em meu município, Campinas, uma
procura enorme por vagas.
De acordo com a Constituição Federal de 1988, artigo 208, inciso IV- “A Educação
Infantil em creche e pré-escolas é um direito da criança, uma opção das famílias e um dever
do estado.”
O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8069/90) artigo 54, inciso IV prevê
que: É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente; “(...) atendimento em creche e
pré -escolas às crianças de zero a seis anos de idade”.
A creche passou a ser de fundamental necessidade nos dias de hoje, não só para os
filhos de mães trabalhadoras, mas para todas as crianças. Devido á redução dos espaços
urbanos para brincar, a violência urbana, a importância de interagir com o outro e também
há uma grande procura da creche devido à alimentação. Poucas são as opções para a
criança. E a creche passou a ser o local do cuidar e educar, onde as crianças têm condições
de desenvolvimento motor e cognitivo, a socialização, a merenda, higiene e profissionais
que se preocupam com seu bem estar.
A creche é um direito da criança, mas infelizmente não conseguimos atender todas
as crianças, precisamos de mais creches, e de melhores condições de trabalho. Para haver
uma melhor qualidade, e atender dignamente as crianças. O compromisso da creche não é
só com os pais, com a sociedade e, mas também um compromisso com a criança. É um
espaço onde professoras e monitores (educadores), desempenhando um trabalho integrado
em relação à parte pedagógica e as questões ligadas ao corpo higiene, alimentação e
afetividade. Refletindo um caráter escolar e familiar dentro da Educação Infantil.

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“O educador de creche também se constitui enquanto tal, nas relações que
estabelece tanto com as crianças, como com as famílias e com os outros
profissionais da instituição. Ele vai se constituir de forma diferente conforme
perceba o seu papel na creche e junto às crianças. Assim, poderá se ver como
alguém que apenas “cuida” e “toma conta” das crianças ou como alguém que
contribui ativamente para o desenvolvimento das mesmas.”
(Oliveira, 1992, p 32)

O cuidado e educação não estão separados, não há uma profissional (professora) que
educa, e outra que cuida (monitora), as duas atuações são educativas. Todos os
profissionais envolvidos no ambiente educacional fazem parte deste contexto.
A base do cuidado humano é compreender como ajudar o outro se desenvolver
enquanto ser humano. Cuidar significa valorizar e ajudar a desenvolver capacidades.
Para que este cuidar e educar se consolidem é preciso a cumplicidade dos pais. É
necessário criar vínculos considerando os pais como parte integrante do processo de
desenvolvimento de um bom trabalho, aceitando suas opiniões (diálogos), conhecendo e
respeitando as culturas das famílias, uma relação de confiança.
De acordo com os “Critérios para um atendimento em creches que respeitem os
direitos fundamentais das crianças MEC 1997”. Esclarece de forma integral uma melhor
qualidade, e compromisso que devemos ter com nossas crianças. Admito que só tomei
conhecimento deste livro cursando a disciplina de Educação Infantil, com a orientadora
Simone, e fiquei indignada por não ter acesso a este documento em minha escola. E desse
documento não ser socializado com professores e monitores, tratando-se de uma orientação
essencial para um trabalho de qualidade, respeitando os direitos das crianças. Questionei
minha orientadora, levei o documento para ser discutido e socializado com as monitoras.
Todos acharam de fundamental importância estudá-lo. E colocá-lo em prática.
Há sempre um questionamento que resiste em várias escolas de educação infantil
em que já trabalhei. “Aquela mãe não trabalha, porque deixa a criança na escola o dia
todo? A creche é o lugar para as crianças de mães trabalhadoras”.
Antes a minha visão era a mesma, questionava as mães. Sem levar em consideração
seus problemas que são vários, desde o desemprego, a falta de alimentos, a desestrutura
familiar. Se mãe daquela criança, não trabalha, devido ao enorme falta de emprego, passa

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inúmeras necessidades e ainda vamos privar a criança de um direito seu que é de freqüentar
uma escola.

4.) A INFLUÊNCIA DA MÍDIA

“Dia a dia nega-se às crianças o


direito de ser crianças.Os fatos,
que zombam desse direito, ostentam
seus ensinamentos na vida cotidiana.O
mundo trata os meninos ricos como se
fossem dinheiro, para que se acostumem
a atuar como o dinheiro atua. O mundo
trata os meninos pobres como se
fossem lixo, para que se transforme em
lixo. E os do meio, os que não são ricos
nem pobres, conserva-os atados à mesa
do televisor, para que aceitem desde
cedo, como destino, a vida prisioneira.
Muita magia e muita sorte têm as crianças
Que conseguem ser crianças.”

(Eduardo Galeano)

Em nossa sociedade capitalista, com essa influência constante da mídia, acabamos


preparando nossas crianças a se tornarem adultos muito cedo, e elas acabam sendo
impedidas de vivenciarem sua própria cultura. Dessa forma muitas crianças vêm sendo
tolhidas de vivenciar a própria infância, onde o lúdico, elemento essencial para o se
desenvolvimento, acaba não acontecendo. E quando esse lúdico é furtado estamos
preparando-os para serem adultos domesticados.
As crianças e as famílias pós-moderna vivem num cenário de conflitos e
contradições.
Diante das mudanças da estrutura família, as mães necessitam de trabalhar e as
crianças ficam sozinhas em casa ou são criadas pelos avós, e se voltam para televisão, que é
uma baba eletrônica, ou vão para os videogames, como forma de preencher o tempo dentro
de casa, ficando também socialmente sozinhas, além de se sobrecarregarem de obrigações
diárias, levando a esforçar-se para administrar o estresse da escola, trabalho em casa e a

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dinâmica interpessoal da família, trazendo como conseqüência à impotência, a
desesperança e o tédio. Dessa forma os pais se distanciam do seu papel de moldar a visão
de mundo e os valores de seus filhos, deixando esse papel para a mídia, que transforma as
crianças em seres dependentes e incompletos. Os valores familiares estão em constante
conflito, onde os filhos estão lutando com seus pais por privilégios de adultos e bens
materiais, conflitos esses oriundos da cultura infantil violenta, onde os produtos violentos
geram lucros, além de servir como fuga da realidade.

“Depois, reclamamos de uma juventude que só pensa, no computador, que


precisa de droga e do álcool para ser feliz, que não respeita o outro e nem o
planeta, que é individualista. Quando ele podia ter aprendido, estava fechado em
apartamentos ou condomínios assistindo TV horas a fio, freqüentando a escola e
os diversos cursos que os pais arranjavam para que ele tivesse o que fazer e se
“preparasse para o futuro”.(STEURER, 2001)

A criança passa ser vista como um problema, que precisa ser controlado, resultado
disso a causa da delinqüência infantil. A responsabilidade desse desajuste trava-se em
batalhas entre pais e mães, onde ao sexo feminino é atribuído maior parcela de culpa.

“No nível político, como a crença sustenta a ficção, ela reifica o status quo:
quando o pobre está convencido de que sua condição ruim é autoproduzida, a
maior parte da sociedade está liberada de qualquer responsabilidade”.
(Rubin, 1994 apud Kincheloe, 2001 p 71)

Outro aspecto é a questão social, onde os menos favorecidos são convencidos de


que são pobres porque não se esforçam. Idéia essa reforçada pela mídia, que produz
modelos, recriando o real e impedindo a formação de pensamentos, promovendo o desejo
do consumo, num contexto onde os empregos estão desaparecendo, trazendo como
conseqüência um sentimento de frustração, como resultado da contradição econômica.
Segundo, Kincheloe, p 80 2001, “Quase toda criança retratada na TV na era
contemporânea classifica a escola: (...) um lugar que ele considera chato, confinador e
baseado numa infância que há muito não existe”.

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Crianças do fim do século XX são colocadas em instituições inadequadas,
administradas com base na relação custo-eficiência, sem compromisso com bem estar.
São esquecidas a natureza e a força da energia vital dos jovens, enfraquecendo
assim, o crescimento cívico, psicológico e intelectual, ignorando o mundo que as cercam e
moldam suas vidas.
Não existe um espaço para examinar a natureza da cultura infantil e as forças que a
definem.
“Uma vez mais, os homens de marketing corporativo estão um passo à frente do
resto de nós, quando reconhecem a natureza cambiante da infância e colonizam
as ramificações psicológicas que tais mudanças produzem”.
(Kincheloe, 2001,p 81).

Enquanto isso o marketing corporativo reconhece as dificuldades da infância e


transforma a criança indesejada, em guerreiro pré-adolescente, encantando toda criança
pós-moderna.

À escola (sendo um lugar onde o pensamento é formado), cabe reformular seus


fundamentos, de modo a desenvolver o senso do caos da informação através da mídia que
desempenha grande papel na formação de conceitos e identidade, ajustando as crianças à
ordem social existente. Nosso trabalho como educadores, deve apoiar-se em estratégias de
resistência, que entendem o relacionamento entre pedagogia, produção de conhecimento,
formação de identidade e desejo, através da investigação de como a consciência das
crianças se produz em torno das relações de poder e justiça social, analisando os efeitos do
poder deixados pelas empresas produtoras da cultura infantil na psique de nossas crianças
quando sejam manipuladas, racistas, e dirigidos a uma determinada classe.

5.) CONSIDERAÇÕES FINAIS

A vida na escola, e a escola na vida descrevem o quanto à escola faz parte do meu
cotidiano. E a importância da escola para formar uma sociedade. Estou envolvida nesta
instituição desde meus cinco anos.

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Foram muitos anos de envolvimento às vezes sendo, um participante passivo, horas
como ativo.
Tenho consciência de suas deficiências, mas tento fazer a minha parte. Sei que
tenho muito para melhorar, e através da conscientização haverá uma valorização, desta
instituição.
Quero uma escola pública de qualidade, visando as mesmas oportunidades de
educação independente de classes sociais.
As cicatrizes do meu aprendizado, agora me servem de estímulos. Vivências que se
transformam e contribuem para mudanças. Pois estou diretamente envolvida neste
processo, agora com mais bagagem, e disposição para continuar nesta luta.
Ao final de cada tópico procurei concluir, no sentido de reverter o processo de
dominação, que está impregnada na escola pública. E que a afetividade é parte importante
nesse processo.
Percebo o quanto a mídia pode manipular, e influenciar.
Mas o professor é uma peça-chave dessa grande engrenagem que é educação, e ele
pode contribuir muito para reverter este quadro. Pois professor é insubstituível, e está
diretamente em contato com os alunos. A educação tem que ser valorizada.
Com uma educação articulada norteando as necessidades reais, em sintonia com a
vida, e com os acontecimentos. Havendo uma relação entre a instrução e a formação
ética.Valorizar os conhecimentos construídos historicamente pela humanidade e que cada
cultura decide transmitir às futuras gerações. E a formação ética, do cidadão, da busca do
desenvolvimento que dê as crianças condições físicas, psíquicas, cognitivas e culturais,
necessárias para uma vida pessoal digna e saudável e para poderem exercer e participar
efetivamente da vida política e da vida pública da sociedade, de forma crítica e autônoma.
Trazer para a sala de aula, a educação com valores, em busca de solução para os problemas
sociais.
Com alunos participantes, atuantes, envolvidos nas questões da sociedade onde
possam lutar por melhores condições e qualidade de vida.
Formaremos Homens, no sentido mais amplo da palavra. Pessoas humanas, dignas,
com o espírito de igualdade, solidariedade, cooperação, respeito.
Eu acredito na escola pública!

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6.) REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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