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ABSTRACT
The purpose of this article is to analyze the importance of reports and critiques published at
Estado de S. Paulo, which were published in March 1995, March 1996 and March 1999. in this
period so that the Brazilian cinema came out of its almost total collapse in the initial years of the
presidency of Fernando Collor de Mello and returned to produce more and more feature films in
Brazil between 1995 and 1999, in the denominated period of Retomada.
Introdução
1
Doutor em Abordagens Teóricas, Históricas e Culturais das Artes pelo Instituto de Artes da UNESP;
Mestre em Processo e Procedimentos Artísticos pela mesma instituição. É docente dos cursos de
Comunicação da Belas Artes, Unisa e Cásper Líbero, onde também edita a Revista Esquinas. Jornalista de
formação, foi repórter e crítico de Arte e Cinema de cadernos culturais nos jornais Gazeta Mercantil e
Valor Econômico e da revista Forbes. E-mail para contato: marciorodri@gmail.com.
Evaldo Mocarzel realizaram reportagens, entrevistas e críticas que foram essenciais para
que filmes lançados no Brasil a partir de “Carlota Joaquina; princesa do Brazil” (1995),
de Carla Camurati, pudessem ser presença cada vez mais constante nas telas do mercado
exibidor brasileiro da segunda metade da década de 1990.
Para tanto, serão revisitados na análise não apenas os cadernos supracitados, mas
também livros como o editado por Felipe Lindoso para o programa Rumos Itáu
Cultural, em 2007, na área de Jornalismo Cultural, em cujas páginas é debatido o papel
essencial que o jornalismo cultural tem para a consolidação dos mais diferentes tipos de
produção artística no mercado de bens culturais brasileiro. Do mesmo modo, o trabalho
também resgatará as principais reflexões de Luiz Zanin Oricchio sobre a Retomada,
reunidas no livro “Cinema de Novo: um balanço crítico da Retomada”. Publicada, em
2003, a obra, como o próprio autor já adianta no prefácio, “é um relato analítico de um
período de trabalho (no Estado de S. Paulo)” cuja intenção é “dar sentido à experiência
fragmentária do cinema brasileiro" (2003, p. 22).
José Lewgoy. À direita, logo abaixo da foto, o leitor se deparava com a seguinte
legenda:
2
Elemento normalmente situado logo após o título jornalístico que contém as principais informações
que o leitor encontrará naquele texto.
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Parágrafo inicial de uma reportagem jornalística. Deve conter a principal informação que será noticiada
e explicada ao longo da reportagem.
No livro Jornalismo Cultural, Daniel Piza – que trabalhou tanto na Folha quanto
no Estadão - observa que “a Ilustrada ficou famosa (nos anos 1980) por seu gosto pela
polêmica” (PIZA, 2004, p. 40). Lembrando que tanto o jornal da família Frias quanto o
da família Mesquita só teriam cadernos diários dedicados à cultura a partir de meados
dos anos 1980 - em um fenômeno editorial diretamente relacionado ao fim da censura e
ao processo de Redemocratização do País -, Piza explica que a Ilustrada, mantendo um
tom de “variedades”, optou por pautas mais “quentes”4, como se diz no jargão
jornalístico, até meados dos anos 1990 em suas páginas culturais (p. 40-41).
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Em Jornalismo, pautas quentes são aquelas que se debruçam na cobertura de informações mais
factuais, relacionadas aos acontecimentos ligados ao cotidiano de um setor, sociedade, ou região.
Barreto inicia seu artigo frisando que os diretores brasileiros precisavam “evitar
erros do passado” e “repensar os métodos e conceitos de fazer filmes no Brasil”
(MOCARZEL (ed.), 1995, p. D4). Do alto de sua experiência de mais de três décadas
naquele momento, ele defendia que
“Como cinema não se faz somente com ideias na cabeça e câmeras na mão,
também foi dada a palavra aos novos produtores, aquelas pessoas que operam quase
todo tempo nos bastidores, fazem contas e tornam possíveis os sonhos dos diretores”
(ORICCHIO, 1996, p. D1), escreve Oricchio ao apresentar a edição do Caderno 2,
abrindo espaço para que, já na página seguinte, reportagem assinada por Bruno Vianna
alertasse que Glauber Rocha e os principais cânones estéticos e conceituais herdados do
Cinema Novo já não eram mais “um peso incômodo” para a nova geração de diretores
que surgia (ORICCHIO (ed.), 1996, p. D2). Como explica Vianna, para aquela então
nova geração era necessário
set de filmagem guiados pelas verbas captadas pelas leis federais de incentivo ao
cinema.
Além da extensa cobertura que se seguiu não apenas às indicações dos filmes
supracitados ao Oscar de Filme Estrangeiro, mas também a outras premiações nacionais
e internacionais que envolveram o cinema brasileiro produzido naquele período, o jornal
da família Mesquita sempre utilizou tais indicações e prêmios como “ganchos” para
aprofundar o debate sobre os desafios, méritos e problemas que envolviam o “novo
cinema brasileiro”.
Por outro lado, o Caderno 2 editado por Oricchio naquele março de 1999
constrói um contraponto à internacionalização e ao momento de euforia que vivia o
novo cinema brasileiro naquele momento, ao lembrar, em texto assinado por Beatriz
Coelho Silva que o grande público brasileiro “não têm o hábito de ir ao cinema” (1999,
D7). Entrevistando passageiros na Central do Brasil, no Rio de Janeiro, onde se passa
boa parte do ato de apresentação do longa-metragem de Walter Salles, a repórter do
Estadão frisa que os usuários da estação de trem torcem por Fernanda Montenegro no
Oscar, a quem “conhecem da TV”.
universo fílmico de origem brasileira. Tal atitude, também é importante destacar, não se
limitou aos Cadernos 2 Especiais analisados neste artigo, mas se estendem tanto para o
passado, ainda no período do Suplemento Literário do Estadão (1956-1974), quanto
para o presente o momento, no final da década de 10 do século XXI.
Outro ponto importante a ser ressaltado nos Cadernos 2 Especiais dos anos 1990
analisados é que tais publicações jamais limitaram suas reportagens ou sua atividade
crítica a analisarem questões estéticas que envolveram o “novo cinema brasileiro” que
emergia naquele momento. O que transparece ao se debruçar nas páginas de tais
suplementos parece ser muito mais um desejo de realizar uma análise estrutural mais
apurada do momento que vivia o cinema brasileiro, do que meramente noticiar fatos
conjunturais inerentes à produção e lançamento de longas-metragens nacionais no
circuito exibidor brasileiro e seu desempenho e festivais e premiações.
No caso das artes, essa voz se manifesta através (sic) da crítica, das
resenhas e dos ensaios. Portanto, historicamente, o que realmente vai
se desenvolver no jornalismo é a amplitude das vozes e do significado
das coisas. E para tecer essas amplitudes, não há como dispensar o
repórter, a reportagem ou a cobertura jornalística que oferece a
polifonia e a polissemia (LINDOLFO (ed.), 2007, p. 33).
Lorenzotti também destaca que como crítico de cinema escolhido para a parte de
Artes do Suplemento foi Paulo Emílio Sales Gomes que se tornaria, entre o início da
circulação do novo caderno cultural do Estadão, em 1956, até sua morte, em 1977, um
dos principais pensadores do cinema brasileiro no século XX, tendo atuado não apenas
no jornalismo, mas também como acadêmico na USP e na fundação do pioneiro curso
de Cinema da Universidade de Brasília (UNB) em 1965.
Oricchio inicia tal capítulo justamente alertando que “alguém deveria, um dia,
escrever uma história da crítica de cinema no Brasil” (ORICCHIO, 2003, p. 207) para
logo depois destacar que “um dos focos mais interessantes da abordagem (histórica)
seria o exame das relações entre críticos e o cinema brasileiro” (p. 209). Evidentemente
a linha de raciocínio desenvolvida pelo crítico de cinema levará justamente à história do
Suplemento Literário e ao nome de Paulo Emílio Sales Gomes que, para Oricchio, teve
entre outros méritos, o de ter sido o primeiro crítico “a levar o cinema a um plano de
dignidade intelectual” (p. 211).
Considerações finais
A frase nunca escrita por Gomes, mas talvez proferida de alguma maneira,
funciona assim para Oricchio como uma “adesão tática ao cinema nacional, ainda mais
num momento em que este se encontrava em outra de suas encruzilhadas habituais”
(ORICCHIO, 2007, p. 215-216). A “adesão tática” de Gomes ao cinema brasileiro, que
emerge com força especialmente após a eclosão do Cinema Novo, nos anos 1960,
todavia, parece ter sido integralmente adotada pelo Caderno 2 nos anos que seguiram à
Retomada e permanecem até os dias atuais.
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Em 2016, Oricchio seguia trabalhando no caderno 2 como colaborador fixo, publicando regularmente
reportagens e críticas e cobrindo os principais festivais de cinema do Brasil e do mundo.
As observações de Piza parecem ter sido escritas sob medida para analisar a
linha editorial adotada pelo Caderno 2 no final dos anos 1990 sobre como pautar, apurar
e enfocar o cinema nacional. Orientações essas que persistem no periódico paulistano
até os dias atuais. A despeito de toda a crise que vive o jornalismo brasileiro,
especialmente na área impressa, e que, evidentemente, também atinge hoje o jornal da
família Mesquita, o caderno cultural do Estadão segue sendo um dos maiores arautos do
cinema brasileiro sempre colocando o mercado de filmes no Brasil como um assunto
que precisa ser defendido, pensado e valorizado.
Não por acaso, o trecho acima mencionado, foi publicado no Jornal da Trade,
também pertencente ao grupo O Estado de S. Paulo. Mais uma prova de que, apesar de
todos os desafios, crises e ciclos, quando o assunto é cinema brasileiro as publicações
da família Mesquita preferem ser laudatórios e olhar para o que projetamos do País em
nossas telas de maneira mais complacente.
Referências:
ASCHER. N (ed.). Dossiê Cinema Brasileiro. Revista USP. São Paulo: USP, 1993. P.
4-173.
CINEMA da Retomada faz dez anos. E agora? O Estado de S. Paulo, São Paulo, 25 de
setembro de 2004, Caderno 2, p. D1.
LORENZOTTI, E. Suplemento Literário – que falta ele faz! São Paulo: Imprensa
Oficial, 2007.
MOCARZEL, E (ed.). O cinema solta sua voz. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 12 de
março de 1995, Caderno 2 Especial Domingo, p. D1-D7.
_______________ (ed.). Próxima estação: Oscar 99. O Estado de S. Paulo, São Paulo,
21 de março de 1999, Caderno 2, p. D1.
XAVIER, I. Movimentos táticos para um tempo sem estratégias. Revista Rumos, São
Paulo, nº 1, p. 84-88, dezembro/janeiro de 1999.