A ANTIBIBLIOTECADE UMBERTO ECO, OU COMO PROCURAMOS
VALIDAÇÕES
O escritor Umberto Eco pertence àquela classe restrita de acadêmicos que
são enciclopédicos, perceptivos e nada entediantes. Ele é dono de uma vasta biblioteca pessoal (que contém cerca de 30 mil livros) e divide os visitantes em duas categorias: os que reagem com: “Uau! Signore professore dottore Eco, que biblioteca o senhor tem! Quantos desses livros o senhor já leu?”, e os outros — uma minoria muito pequena —, que entendem que uma biblioteca particular não é um apêndice para elevar o próprio ego, e sim uma ferramenta de pesquisa. Livros lidos são muito menos valiosos que os não lidos. A biblioteca deve conter tanto das coisas que você não sabe quanto seus recursos financeiros, taxas hipotecárias e o atualmente restrito mercado de imóveis lhe permitam colocar nela. Você acumulará mais conhecimento e mais livros à medida que for envelhecendo, e o número crescente de livros não lidos nas prateleiras olhará para você ameaçadoramente. Na verdade, quanto mais você souber, maiores serão as pilhas de livros não lidos. Vamos chamar essa coleção de livros não lidos de antibiblioteca. Nós tendemos a tratar o conhecimento como uma propriedade pessoal que deve ser protegida e defendida. Ele é um ornamento que nos permite subir na hierarquia social. Assim, essa tendência a ofender a sensibilidade da biblioteca de Eco concentrando-se no conhecido é uma parcialidade humana que se estende às nossas operações mentais. As pessoas não caminham por aí com anticurrículos dizendo o que não estudaram ou vivenciaram (esse é o trabalho de seus concorrentes), mas seria bom se o fizessem. Assim como precisamos colocar a lógica da biblioteca de ponta- cabeça, trabalharemos colocando o próprio conhecimento de pernas para o ar. Observe que o Cisne Negro é fruto da incompreensão da probabilidade das surpresas, os livros não lidos, porque levamos um pouco a sério demais as coisas que sabemos. Vamos chamar um antiacadêmico — alguém que se concentra nos livros não lidos e faz uma tentativa de não tratar seu conhecimento como um tesouro, nem como uma propriedade e tampouco como um mecanismo de aumento de autoestima — de empirista cético.