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Textos Difíceis da Bíblia II

Desceu Cristo ao Inferno ?1


I Pedro 3: 18-20
“Porque também Cristo morreu uma só vez pelos pecados, o justo pelos injustos,
para levar-nos a Deus; sendo, na verdade, morto na carne, mas vivificado no espírito; no qual também
foi, e pregou aos espíritos em prisão; os quais noutro tempo foram rebeldes, quando a longanimidade
de Deus esperava, nos dias de Noé, enquanto se preparava a arca; na qual poucas, isto é, oito almas
se salvaram através da água”

Introdução: :Este texto tem sido motivo de muitos embates entre teólogos e cristãos
interessados numa interpretação bíblica séria. Será que existe algo como uma descida de
Cristo em um mundo inferior entre a sua morte e ressurreição?
Existem pelo menos três correntes teológicas que apresentam interpretações diferentes a
passagem de I Pedro. As duas primeiras ensinam que Jesus desceu literalmente ao inferno,
enquanto a teologia reformada não entende assim2.
Antes de estudarmos a passagem em si, vejamos de maneira breve, como os arminianos e
luteranos entendem o texto:

I. INTERPRETAÇÕES DIFERENTES :
1) Interpretação Arminiana: ( nova oportunidade de salvação )
Eles entendem que os contemporâneos de Noé não tiveram nenhum redentor e nenhum
guia, portanto Deus teve que suprir-lhes esta deficiência e, assim, por fim, o Senhor
ressuscitado lhes trouxe a salvação. Para os arminianos a rejeição do Evangelho no passado,
não foi uma rejeição final e definitiva.
Uma interpretação curiosa é a de que a pregação do Evangelho no Hades foi dirigida
àqueles que não tiveram tempo de se arrepender durante o dilúvio.
Será que os arminianos estão certos ao ensinar que a morte não coloca um fim no
período em que Deus opera com Sua graça para salvar pecadores?
Será que existe neste texto de Pedro o ensino de uma nova oportunidade para os ímpios
se salvarem, mesmo depois de sua morte? Jesus está aqui pregando, evangelizando aos mortos
dando-lhes ainda uma oportunidade de salvação?
Dificuldade: Os santos do A.T. já haviam crido no Messias e, por isso, estavam justificados.
(Rm 4:3; Gl 3:6-9)
1
Estudo totalmente adaptado pelo Rev. Gildásio Reis do Artigo da Fides Reformata, volume IV - número I -
Janeiro/junho 1999, de autoria do Dr. Héber Carlos de Campos
2
No credo apostólico quando diz que Cristo “desceu ao inferno (Hades)” se refere a grande aflição e peso de
morte. Cristo sofreu a grande ira de Deus e Seu severo julgamento sobre si. Isto é o que significa desceu ao
inferno. Cristo experimentou as dores do inferno em Sua alma, o completo abandono de Deus.
Pergunta 44 do Catecismo de Heidelberg Por que se acrescenta: "desceu ao inferno"?
R. Porque meu Senhor Jesus Cristo sofreu, principalmente na cruz inexprimíveis angústias, dores e terrores (1)
Por isso, até nas minhas mais duras tentações, tenho a certeza de que Ele me libertou da angústia e do tormento
do inferno (2) . (1) Mt 26:38; Mt 27:46; Hb 5:7. (2) Is 53:5.
2) Interpretação Luterana:
O Luteranismo3 interpreta esta passagem dizendo que Cristo morreu e antes de ser
ressuscitado, teve seu espírito restituído ao corpo e, na totalidade de sua natureza humana, foi
ao inferno e pregou (proclamou) sua vitória a Satanás.
Dificuldade: Não havia tido ainda nenhuma manifestação de vitória de Cristo.
3) Interpretação Presbiteriana ( Reformada ):
Cristo não desceu ao inferno (Hades) literalmente. A expressão usada no Credo
Apostólico se refere a grande aflição e peso de morte. Cristo sofreu a grande ira de Deus e
Seu severo julgamento sobre si. Isto é o que significa desceu ao inferno. Cristo experimentou
as dores do inferno em Sua alma, o completo abandono de Deus Cristo pré-encarnado,
pregando através de Noé às pessoas que viveram antes do dilúvio.

II. ANÁLISE PRESBITERIANA (REFORMADA ) DE I PEDRO 3:18-20


Vamos à análise do texto de I Pedro 3:18-20 e ver como nós Presbiterianos, teólogos
reformados, interpretamos a passagem:
1) Qual o significado das expressões “carne” e “espírito vivificado” ?
Neste texto, Pedro está contrastando dois estados de existência de nosso Redentor.
Os Dois Estados de Cristo:
A) O estado de limitação de Cristo - “Na carne”:. Este estado é a natureza humana de
Cristo. (cf. I Pe 4:1; I Jo 4:2; II Jo 7; Jo 1:14; I Tm 3:16; Rm 1:3-4 )
A expressão “morto na carne” faz referência quando Jesus morreu e saiu do estado de
fraqueza e de limitação.
B) O estado de não-limitação - “espírito vivificado” :
A expressão “vivificado no espírito” se refere à natureza divina de Jesus. Seu estado
antes de sua encarnação. E foi neste estado que Ele pregou aos “espíritos em prisão”.
Quando o texto fala que Jesus “vivificado em espírito foi e pregou, não está se
referindo a um lugar depois de sua morte, mas onde Ele estava quando havia desobedientes
dos tempos de Noé” (v. 20)
Foi neste espírito que Ele pregou através dos profetas.
A palavra “também”do v. 19 mostra a ênfase do estado de limitação para o estado de
não-limitação. Dito de outra forma: Cristo pregou quando estava em nosso meio, como
homem (dias de Sua carne), mas também pregou como Divino (não-limitação) nos dias de Noé
através dos profetas.

3
Há variações nas interpretações do luteranismo sobre a descida de Jesus ao Inferno, mas todas entendem esta
descida como uma descida literal
2) Quando Cristo pregou ?
O ensino desta passagem não é o que Cristo fez entre a morte e a ressurreição, 4 mas o
que Ele fez no seu estado antes da Encarnação - estado não-limitado, no tem de Noé. (cf. I Pe
1:8-12)
3) Qual o conteúdo da pregação ? O que Cristo pregou ?
Jesus pregou o evangelho aos contemporâneos de Noé. Espiritualmente Cristo estava
presente em Noé quando este era o “pregoeiro da justiça”- II Pe 2:5.
Em I Pe 1:10-11, o apóstolo mostra o evangelho sendo pregado pelos profetas.
Noé certamente pregou aos seus contemporâneos o evangelho e convocou-os ao
arrependimento e que cresceu na salvação de Deus.
4) Quem são estes “espíritos em prisão” ? A quem Cristo pregou ?
A expressão “espíritos em prisão” se refere às pessoas que no tempo de Noé (noutro
tempo) rejeitaram a sua pregação e que foram consideradas “espíritos em prisão”incapazes de
fazer qualquer coisa que os deixassem livres. Permaneceram no cativeiro espiritual;
permaneceram incrédulos quanto à mensagem pregada por Noé e na prisão de suas almas.

Conclusão: Concluímos portanto afirmando que:

 não aceitamos:
a) Uma descida literal de Cristo ao Inferno
b) Uma segunda chance de salvação aos desobedientes após sua morte

 Aceitamos:
a) Que Cristo esteve sempre presente tipologicamente no V.T, pregando através dos
profetas o Evangelho de Salvação ( Rm 4:3; Gl 3: 6-9, II Pe. 2:5 )
b) Que a “descida de Cristo no Hades”, conforme o Credo apostólico, não foi literal, mas
a grande aflição e peso de morte. Cristo sofreu a grande ira de Deus e Seu severo
julgamento sobre si.
FIM !

Igreja Presbiteriana Osasco


Rev. Gildásio Reis Fevereiro / 2001

4
Entre a Morte e a Ressurreição, Jesus estava no céu (Lc 23:43,46; II Co 12:2-4; Jo 19:30)

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