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COORDENACAO E SUBORDINACAO 13.1. Coordenagao Nos capitulos precedentes, estucamos diversosaspectos da estratura das oragdes, con- siderando.as isoladamente. Agora vamos estudar os recursos que a lingua tem para juntar diversas oragdes em uma estrutura sintaticamente coesa. Vamos comecar com a frase ‘Temos aqui duas realizagdes da construgéo transitiva, colocadas uma apés a otra ¢ conectadas pela palavra e. Podemos analisar essa frase como A sequéncia das duas oracdes (mais a palavra e no meio delas) é também uma construgdo!. Uma construgio que encerra mais de uma oragao € tradicionalmente chamada periodo composto. Em [2] 0 perfodo composto a sequéncia inteira, a saber, 0 vizinho fechou a casa e os ladrdes roubaram a TV; sua estrutura é bastante ota de [0 ¢ O}, onde ‘O"€ “ora couuon [BB cooenenncao sus 0RDINACAO. simples, sendo formada apenas de duas oragdes seguidas com e no meio, Mas, como chamar vveremos, ha periodos compostos bem mais complexes. Na frase [1] as duas oragdes so chamadas coordenadas, ¢ a palavra e se chama coordenador. A estrutura coordenada se caracteriza porter as duas (ou mais) or ges uma zo lado da outra, sem que uma faga parte da outra. Outros coordenadores além de e s40 mas, ou, logo e outras. Por exemplo, | 13.2. Subordinagao | Alem da coordenagdo, existe um outro processo gramatical bésico utilizado na | Iimgua para juntar oragGes: a subordinagao. Quando temos oragies subordinadas, j clas nao ficam uma ao lado da outra, mas uma dentro da outra, Para explicar iss0, ‘vamos comegar com a frase ‘Aqui temos uma oragao apenas, claro, Ela € composta de sujeito (a tia Rosa). verbo (disse) ¢ objeto (uma bobagem). O sujeito € Agente, o objeto é a Mensagem’. Com o verbo dizer, o objeto é de ocorréncia obrigatéria, tanto € assim que a frase seguinte é inaceitavel: Essas observagdes nao trazem nada de novo. Agora vamos considerar a frase Temos af 0 mesmo sujeito, a tia Rosa, ¢ o mesmo verbo, disse. Sabemos que © verbo dizer exige a presenga de um objeto; onde estd ele? wvidentemente, € que 0 Rafael é médico — nao s6 essa sequéncia esté no lu- gar normal do objeto, como tem 0 mesmo papel tematico, que convencionamos sdicional,“conjungio coordenativa’ N i grand Was aqui iso ndo importa; vamos chamar ess relaglo de Mensagem Taez se tate dew Paciente, m até nova order ‘anwanes po roma sasuino BRB) MARIO A. PERN chamar de Mensagem, Ea presenga da sequéncia que o Rafael é médico satisfaz a exigéncia do verbo dizer de que haja um objeto expresso na oracio. Por outro lado, que 0 Rafael é médico contém uma oragio, o Rafael é médico. Ou Seja, em [7] temos duas oragdes, nao apenas uma como em [5]. E. uma das oragées € parte do objeto da outra, ou seja, as duas oragdes ndo esto colocadkas lado a lado como fo caso das coordenadas vistas na seco anterior, mas uma delas esté dentro da outra Explicando melhor: se que 0 Rafael é médico € 0 objeto da oragao cujo verbo & idose, ese 0 Rafael é médico € parte desse objeto, entio, necessariamente, a oracao 0 Rat Bel é médico esti dentro da oracao cujo verbo € disse. E essa oragio maior € tia Rosa Bese que o Rafael é médico — composta, como todas as oragoes com o verbo dizer, de eicito (a tia Rosa), verbo (disse) c objeto (que o Rafael é médico). E- dentro dessa oragdo Bir, « tia Rosa disse que o Rafael é médico, encontramos uma outra oragao, o Rafael Mexico. Fsquuematicamente, essa situago pode ser representada assim: A oragdo maior — que se chama oragdo principal — esté entre colchetes, [ J; € | oracdo menor, chamada orag4o subordinada, est entre chaves, { }. Note-se que JS oracio principal é a sequéncia inteira, a tia Rosa disse que o Rafael é médico, e nao Spenas parte dela; isso porque a subordinada € parte da principal — mais exatamen- Be € parte do seu objeto, que € que o Rafael é médico. Assim, podemos definir uma Scio principal como aquela que tem outra oracdo dentro de si; ¢ oracdo subordi- Sada € aquela que esté dentro de outra oragao. Na frase Kee vimos anteriormente, nio hé nem principal nem subordinada, porque nenhu- Ss das oragées esté dentro da outra. Ou, dizendo 0 mesmo de outra maneira, ne Shuma das oragdes tem fungSo dentro da outra. Ja em Simos que uma das oragdes tem fungdo dentro da outra: a subordinada o Rafael é Beédico € parte do objeto da principal, a tia Rosa disse que o Rafael € médico. Isso bode também ser representado graficamente como E © Rafael é médico cue 1 BJ) coorpe cao e ss20RDNAcAO Cada caixa representa uma orago — e note-se como a orago subordinada esti dentro da principal. {4 0 perfodo [1], composto por coordenagao, seria represen tado assim’: 13.3. Processos de jungiio gramatical ‘A coordenagio ¢ a subordinagio sio os dois provessos basicos de que dispoe a lingua para juntar unidades de mesma classe em uma unidade maior. Essa jungio nido afeta apenas as oragies, mas vale para a maioria das classes de formas. A coorde= nagio, em especial, se verifica com muitas classes, inclusive classes de palavras (as uunidades menores do que as palavras, a saber, os morfemas, sio isentas de processos de jungZo). Assim, temos nao apenas coordenagio de oragbes, como em mas coordenagao d de verbos: de sintagmas adjetivos: de sintagmas preposicionados: € até de preposigdes: Outras classes, como os artigos, por exemplo, ndo admitem coordenacao. 7Arigor, devera aver uma caixa encertando as duas coordenadas, porque o periodo também funciona ‘como wma oragio, Nao a incl para dear a opesigdo mais ears, LGRNANEA DO FORTLCLES BRASERO MARIO A. PERN Jéa subordinagio tem efeitos bem mais limitados, mas ainda assim nao se res- tringe a oragdes. E, possivel colocar SNs dentro de SNs, como em Aqui o SN maior (principal) € 0 inmao da minha namorada; cle contém um SN menor (subordinado), a minka namorada. Esse processo pode se repetir varias yeres, como se vé em O SN 0 esmalte das unhas do pé da Cristina contém 0 SN as unhas do pé da Cristina, que contém o SN 0 pé da Cristina, que por sua vez contém o SN a Cris- fina. Temos aqui nada menos do que quatro SNs subordinados uns aos outros, ou, melhor dizendo, um SN principal e trés subordinados; e desses trés subordinados, dois s40 também principais em relagdo a seus subordinados. Esquematicamente, podemos representar isso assim: O SN maior esta entre colchetes, {_]; seu subordinado esté entre chaves, { este tem um subordinado, que esti entre angulos, < >; ¢ este também tem tum subordinado, que esta Cristina € subordinado ao SN as unhas do pé da Cristina, mas € principal em entre parénteses: ( ). Dessa maneira, 0 SN 0 pé da relagao a a Cristina. Esse tipo de encaixamento, as vezes miiltiplo, € muito frequente na lingua. E ‘uma propriedade fundamental das linguas humanas, pois é um dos instrumentos que nos permitem ter recursos praticamente infinites de expressdo’. A subordina- gio, por exemplo, permite que se atribua um papel temitico ao sintagma que 0 Rafael é médico, quando queremos fazer dele uma Mensagem, O mesmo fendmeno pode ocorrer com rages, como, por exemplo, em FE facil ver que temos af trés oragdes, em trés niveis de subordinagio. ‘O outro insramento, clato, € a coordenagao, ccarnao 1 BI) coornexacAo & SuBORDINACAO 13.4. Conjungoes Uma oragdo como o Rafael é médico raramente aparece como complemento de algum verbo. O normal é marcé-la como subordinada através de una conjungio, como por exemplo que. Assim, na orago o objeto de disse, a unidade que recebe o papel temtico Mensagem, nao é 0 Rafael é médico, mas sim que 0 Rafael é médico. A conjungao que tem af a funcdo de mar car a oragao seguinte como subordinada. Existem muitas conjungdes em portugués, ¢ elas tém fungdes parcialmente di ferentes. Todas elas marcam oragdes como subordinadas, mas de manelras distintas Assim, a sequéncia que mais uma oragdo é um SN, e tem as propriedades sintiticas « semanticas dos SNs em geral. Por exemplo, pode ser objeto, como em [7]; ¢ pode ser sujeito, como em. E pode também vir depois de uma preposicio, formando urn sintagma prepo- sicionado: Esse SN, como vimos, é composto de que mais uma oragdo; ¢ essa é justamen- tea fungao do que: transformar uma oragdo em SN, de modo que possa aparecet como sueito, objeto ete. e receber as papéis tematicos correspondentes. Essa € a fungao das conjungdes em geral; assim, quando seguido de uma oragdo € um sin tagma adverbial, com 0 papel temtico de Tempo: Porque mais uma oragiio é um sintagma adverbial com o papel de Causa: Isso distingue as conjunges dos coordenadores’. Os coordenadores no alte- ram 0 potencial funcional das oragGes que combinam, ao passo que as conjungies fazem de uma oragio um sintagma nominal ou adverbial. Jhamados conjungies na gramstica tradicional Podemos assim coneluir que existem dois processos principais de juncio de orages — ou seja, de criagio de periodos compostos: a eoordenagdo, em que duas ‘ou mais) oragdes si colocadas lado a lado, sem que uma exerga nenhuma fungao dentro da outra, ¢ 2 subordinagio, em que uma oragio é (juntamente com sua conjuncio) inserida em outra como um de seus termos. O sintagma formado de conjungio + oraco tem uma fungo sintitica e um papel temitico dentro da outra oragio, O mesmo vale para estruturas nao oracionais, de modo que temos coordens- gao de SNs em o Jodo e a Maria, e subordinagdio de SNs em a mde da Maria. 13.5. Juncao sem marea Jomo vimos acima, as oragdes subordinadas podem ter estrutura idéntica as oragdes independentes (ou seja, que ocorrem sozinhas nos perfodos), mais uma marca, tipicamente uma conjungio. Veremos no capitulo seguinte que em outros ‘casos elas tem estrutura propria, que as marca como subordinadas: por exemplo, as oragées de subjuntivo, infinitivo gertindio. Mas, de qualquer maneia, a subord- nada é identificavel a partir de elementos formais: conjungao e/ou forma do verbo. Essa € a situagdo normal, mas talvez haja excegdes. Essas excegdes tém a ver com o chamado discurso direto, onde o verbo exprime uma maneira de dizer ¢ a fala referida ocorre com forma de oragio principal. Por exemplo, se corresponde bem de perto a embora haja diferengas semanticas: em [22] 0 emissor se compromete com a forma exata do que o rapaz disse, a0 passo que em [23] ele apenas comunica o contevido isto 6,0 rapaz pode ter dito “acho que n6s vamos ter chuva amanha”). Nao ha con- senso sobre se [22] constitu’ um perfodo ou mais de um, Assim, nem sequer se sabe se vai chover amanha em [22] € mesmo uma oragio subordinada. Isso nao precisa nos interessar aqui, pois € uma questi tedrica de pouca importincia. Ja no caso das coordenadas, a jung sem marca ocorte com frequéneia. Assim, se houver mais de duas oragBes coordenadas em um perfodo, normalmente apenas as duastiltimas sio ligadas por e, ow ete camo COORDENAGAO E SUEORDINACAO << Acontece também de todas as coordenadas aparecerem sem coordenador, mes- mo as duas tiltimas: A repetigio do coordenador tem um efeito de insisténcia, com énfase em todas as oragGes: [GRAWIEA DO PORTLCLES ASKER MARIO PERN

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