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INSTITUTO AFRO BRASILEIRO DE ENSINO SUPERIOR

Faculdade Zumbi dos Palmares

Faculdade de Direito

ADRIANA DIAS

UNIÃO HOMOAFETIVA: CASAMENTO CIVIL

São Paulo
2013
ADRIANA DIAS

UNIÃO HOMOAFETIVA: CASAMENTO CIVIL

Trabalho de Conclusão de curso apresentado


ao Colegiado de Curso com vistas à obtenção
do grau de Bacharel em Direito — 5º. Ano,
Noturno, do Curso de Direito da Faculdade
Zumbi dos Palmares, Instituto Afro-Brasileiro
de Ensino Superior.

Orientador: Prof. Carlos Henrique Trindade

São Paulo
Junho de 2013
FOLHA DE APROVAÇÃO

Nome da aluna: Adriana Dias

Título e subtítulo do trabalho: União Homoafetiva: Casamento Civil

A Banca Examinadora considera o trabalho: ________________________________

E atribui a nota: __________________________________

Professor: __________________________
Carlos Henrique Trindade

Data: ________________________
DEDICATÓRIA

O difícil de uma dedicatória é que são tantas as pessoas que passam pela
nossa cabeça, e parece injusto dedicar a apenas algumas, mas, esta dedicatória é
muito importante e válida, porque ela é primeiramente para uma pessoa especial
para Deus, mesmo que às vezes ela não se ache, ela é forte, determinada,
cabeça-dura, briguenta, justa, amiga, fiel aos propósitos, firme nos objetivos, uma
fé extrema, que mesmo quando muitos faltaram, a fé dela estava presente, mesmo
que pouca sem ela nada disso seria possível, então este trabalho é dedicado
a Adriana Dias. Pode até parecer um ato de convencimento, alto ego, mas só nós
e Deus sabemos verdadeiramente o que passamos e sentimos em nosso intimo
durante o percorrer das trajetórias escolhidas ou impostas pela vida, mas é
importante citar que ligados a mim e a minha trajetória de vida, existem pessoas
que mesmo distante por algumas vezes, estiveram tão próximas durante esses 5
anos, que eu jamais deixaria de dedicá-las todo o esforço e luta dos últimos
meses, Maria Elisabeth Reis (Tia Beth) e primo Alcides de Lima (Cidão) a vocês a
dedicatória é obrigatória porque nunca se silenciaram com o meu silêncio, nunca
se afastaram com a minha ausência e por isso nunca deixaram de expressar com
palavras a grandeza do amor, incentivo, fé e companheirismo nos momentos que
pensei desistir. “Amo Vocês”. Ao meu sobrinho tão incondicionalmente amado
Samuel Luis Dias da Silva , menino iluminado e grande responsável pela inspiração
de retorno e permanência às salas de aula, depois de tantos anos sem estudar,
criança que sempre transbordou meu coração de muita alegria, me fez repensar o
quanto é importante nos valermos de bons propósitos para servir de um mínimo se
quer de exemplo àqueles que amamos tanto e que seguirão um dia suas
trajetórias, sem a nossa presença.
AGRADECIMENTOS

Ao “Deus Uno” acima de tudo, aos Guardiões de Luz que me protegeu em


momentos que eu não acreditava que chegaria ao fim, a Lucimeire Santos, amiga,
irmã, parceira, que ficou ao meu lado em um dos momentos mais difíceis deste
ano de 2013, acreditou que eu conseguiria e disse "Você vai terminar esse
semestre sim Preta, você consegue, é guerreira e EU acredito em Você". Evellyn
Ferreira Guerra, amiga sem palavras, amor incondicional, parceira pra vida toda,
Denise Lopes amiga eterna que acreditou , incentivou e que esteve presente a
todo o momento, em orações e palavras. A Carolina Macari (querida amiga e
orientadora pessoal, advogada e Presidenta da comissão da Diversidade sexual e
combate a Homofobia da OAB de Diadema).

À tão especial Família Alexandre, Família Cecure, Família Candido


dos Santos em especial a “Dona Margarida Maria dos Santos” e seu “José
Candido” que nunca pouparam seu tempo e sua fé para dedicar suas orações a
meu favor (Mãe e Pai que Deus me presenteou). Ao Davi Candido dos Santos que
foi amigo de fazes e trajetórias difíceis, vivenciou muitas dificuldades percorridas
durante esses cinco anos e muitas vezes segurou minha mão quando eu não mais
acreditava que chegaria ao fim, e principalmente quando eu já estava perdendo a
crença na verdade do ser humano. Ao Jean Carlo, esse é impossível agradecer
com extensão de palavras, amigo fiel que levarei no coração pra vida toda, pessoa
de coração gigante e alma pura.

Nos momentos mais difíceis Deus nos mostra quem são nossos verdadeiros
amigos e que eles existem, por isso jamais deixaria de agradecer a duas amigas e
parceiras desses cinco anos de luta, que me acolheram com tanto amor neste
último ano tão difícil, que perguntaram na hora exata “Como você esta Adri?” e
deste dia em diante, nunca me abandonaram, nunca ficaram em cima de nenhum
muro, foram imparciais, porem companheiras, me ajudando e acolhendo e com
toda certeza foram verdadeiramente minhas amigas fiéis a vocês Vanessa Silvestre
e Barbara Danielle gratidão eterna, amigas para sempre.

Aos professores que tive a oportunidade de desabafar e expor meus medos,


anseios e muitas vezes meus problemas e que incrivelmente a todo o momento
usaram palavras de incentivo e força para que a caminhada seguisse em especial
ao professor Carlos Henrique Trindade que de forma repentina e confusa da minha
parte se dispôs a me ajudar. E a todos os mestres que contribuíram para que essa
jornada chegasse ao fim, dando margem para uma nova que seguirá para que eu
possa colher os frutos de minhas escolhas.

E sem esquecer jamais de agradecer a “todos” que não acreditaram que eu


chegaria ao fim, e também aos que por acreditarem que sempre fui guerreira
optaram em não segurar em minha mão quando eu mais precisei atitude que fez
grande diferença no trajeto da minha caminhada de agora em diante.
RESUMO

O objetivo do presente trabalho é verificar qual o tratamento dispensado


pelo Direito de Família às Uniões Homoafetivas, igualmente, o casamento
civil homoafetivo, com base em conceitos e construções históricas da
homossexualidade diferenciando homossexualidade, homossexualismo e
homoafetividade, princípios que norteiam o direito de família, famílias
Constitucionais e a importante evolução referente à união homoafetiva
amparada pela Constituição e o Supremo Tribunal Federal.
Palavras-chave: União homoafetiva, evolução histórica, casamento civil.
ABSTRACT

The purpose of this study is to verify the treatment meted out by the family
law to same sex unions, also, the civil marriage homoafetivo, based on
concepts and historical constructions of homosexuality differentiating
homosexuality, homosexuality and homoafetividade, principles that guide
the family law, Constitutional families and important developments
regarding same-sex Union backed by the Constitution and the Supreme
Court.
Keywords: Same-sex Union, historical evolution, civil marriage
SUMÁRIO

Introdução.................................................................................................................................10
Capítulo 1 A construção da identidade de gênero na sociedade civil.......................................12
1 Homossexualidade na História___________________________________________14
1.1 A Homossexualidade no Mundo Antigo________________________________16
1.2 Diferenciação dos termos Homossexualismo, homossexualidade e homoafetividade
______________________________________________________________________19
Capítulo 2 origem do direito das famílias.................................................................................23
2 Princípios do Direito de Família____________________________________________24
2.1 Evoluções do Direito de Família________________________________________27
2.2 Famílias Constitucionais_______________________________________________28
Capítulo 3 União homoafetiva e a regulamentação do casamento civil...................................32
3 União Homoafetiva e o Direito de Família____________________________________32
3.2 Regulamentações do Casamento Civil____________________________________37
Considerações finais.................................................................................................................40
Referências................................................................................................................................43
Anexo........................................................................................................................................45
INTRODUÇÃO

A intenção deste trabalho é de verificar o tratamento dispensado pelo direto de


família à união homoafetiva. No primeiro capitulo ilustraremos sobre as construções
da identidade de gênero da sociedade civil, conceito e construções históricas da
homossexualidade diferenciando homossexualidade, homossexualismo e
homoafetividade. Diante da leitura e desses assuntos encontramos explicações
cabíveis e adequadas referente à relação homoafetiva, pois a construção da
identidade nada mais é que a construção de opiniões, vontades e principalmente
construção cultural. Assuntos que podem ou não tornar-se polêmicos, nos dias
atuais, possuem fulcro na história da antiguidade, e como tudo que evolui, cabe ao
ser humano aceitar, compreender ou manter-se na ignorância não aceitando que é
preciso mudar, que direitos são realmente para todos, e assim os conceitos sobre
homossexualidade, homossexualismo e homoafetividade, também evoluíram,
perdendo paradigmas construídos através de ideias preconceituosas que
infelizmente ainda deixam resquícios nos seres humanos, que fazem questão de
praticar ações tão desnecessárias. Já no segundo capítulo trataremos sobre a
origem, princípios do direito de família, suas evoluções e amparo constitucional no
decorrer dos tempos. A família nasce da vontade de duas pessoas em estarem
juntas através do afeto mútuo, da vontade de compartilhar sonhos, objetivos e assim
poder construir através destes desejos pessoais, seu mundo pessoal nomeado
como familiar. A família evoluiu, saindo dos conceitos pregados pelas instituições
religiosas, na busca de independência para poder agir conforme suas necessidades
pessoais. O Estado sempre teve a missão de preservar a constituição familiar que
sustenta o alicerce construído através dessas vontades, baseadas na relação a dois.
No terceiro capítulo explanaremos sobre os princípios que norteiam o direito de
família, famílias Constitucionais e a importante evolução referente à união
homoafetiva amparada pela Constituição Federal e o Supremo Tribunal Federal.
Como tudo que merece e deve evoluir, identificamos o crescimento significativo que
ocorreu no direito de família, nas lutas constantes por respeito e liberdade de agir, o
amparo constitucional foi um forte aliado para as evoluções referentes ao direito de
família, principalmente referente às uniões homoafetivas, de forma árdua, mas que
remeteu os legisladores a pensar e repensar quanto aos desacertos apontados à
negativa de direito de constituição familiar homoafetiva.

O interesse pelo tema surgiu após identificar que de fato existe a união
homoafetiva, o sentimento de amor e carinho por pessoas do mesmo sexo. È sabido
que estas uniões sempre existiram, mesmo que de forma mascarada, diferente dos
dias atuais, pois a busca pelo amparo legal, baseados na dignidade da pessoa
humana, demonstra claramente que não existe mais interesse em manter
sentimentos e desejos afetivos desta união de maneira omissa e oculta.

A busca por direito igualitário nas uniões homoafetivas tornaram-se tão


frequentes e tomaram uma proporção e repercussão tão grande que o direito já não
pode mais vendar os olhos da justiça diante da situação que se apresenta, de
incontável núcleo regrado pelo afeto, formado por pares homoafetivos, por mais
incompreensível que seja para a sociedade admitir tais uniões, o fato é que elas
existem , precisam e merecem o devido amparo jurisdicional.

Deste feito tal situação e problemática remetem ao propósito de entender e


saber qual a ótica adotada pelo direito de família em relação a união homoafetiva,
para, assim conseguir o objetivo central da pesquisa, utilizando-se da pesquisa
bibliográfica, jurisprudências , julgados, sites responsáveis pela divulgação referente
a defesa da população homoafetiva, orientação de membro da comissão da
Diversidade sexual e combate a homofobia da OAB da cidade de Diadema.
CAPÍTULO 1

A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DE GÊNERO NA

SOCIEDADE CIVIL

Antes de se tratar das Uniões Homoafetivas, é necessário conceituar o termo


identidade de gênero, bem como suas construções na sociedade civil. “A opressão
dos homens sobre as mulheres, ou melhor, dito, de varões sobre as mulheres.
(SUNG, 2002, p.95)”.

O domínio da nossa língua pelo homem é tão determinante que é encontrado


dificuldades para falar sobre o assunto, e ou termo homem, quando citamos o ser
humano utilizamos o termo “homem” no sentido universal. Toda nossa língua e
nossa cultura estão marcadas por esta ideologia, pois desde o início aprendemos
através dos orientadores escolares, que para nos referirmos a um grupo composto
de um varão1 e várias mulheres, o plural deve estar no masculino, e de um simples
exemplo como este podemos verificar como a nossa língua e nossa cultura está
tão marcada por esta relação de domínio.

1
(latim varo, -onis ou varro, -onis, homem grosseiro) substantivo masculino.
Indivíduo do sexo masculino. = HOMEM; Indivíduo adulto; Homem respeitável; Homem esforçado,
valoroso.
13

Os seres humanos buscam a construção de um mundo humano, querendo


se relacionar entre si e com a natureza. A identidade sexual, a sexualidade
e as relações entre sexos diferentes também são construídas socialmente
e são interpretadas a partir da cultura. (SUNG, 2002, P. 96)

Tal afirmação exprime que não é possível alguém ter acesso puro e direto a
sua sexualidade e aos seus instintos sexuais, o que se aplica a do (a) outro (a),
pois estará sempre intercedido pela cultura, podemos assim dizer que são como
lentes de visão de uma cultura pela qual podemos visualizar a nossa identidade
sexual, nossa sexualidade e a dos outros também e com isto alcançamos a
proximidade como nossos instintos. “O gênero é o sexo socialmente construído. As
relações de gênero, as relações entre homens-varões e mulheres são socialmente
construídas, e não determinadas biologicamente”. (SUNG, 2002, p. 96- 97)

Atualmente a relação de gênero vivida é uma relação de desigualdade social


que tem base na diferença entre os sexos e legitimada em nome de um
determinismo biológico da superioridade de um dos sexos, o masculino, e de uma
determinada forma de viver a sexualidade, a heterossexual. É frequente a busca
para legitimar a desigualdade socialmente construída em nome de ciências da
natureza, que, nada mais são que ideologias travestidas de pseudocientificidade.
”Esta desigualdade social está articulada com outras formas de desigualdades,
distâncias e hierarquias sociais”. (SUNG, 2002, p. 97)

Na sociedade antiga, primeiro a família se preocupava com a produção


econômica para a qual as mulheres e escravos eram a força de trabalho. A
referência no sistema patriarcal não era puramente de um sistema de relações
sociais, econômicas, culturais e legais entre o varão e outros grupos e com animais
e propriedades de terra. Nestes sistemas, como nos atuais, o status das mulheres
variava conforme sua classe social. As mulheres que pertenciam às classes
dominantes usufruíam de alguns privilégios e confortos que as servas não
possuíam. ”O grande pensador Aristóteles, por exemplo, dizia que havia pessoas
destinadas por natureza a serem escravas e que a mulher representava a
passividade, enquanto que o homem, a força ativa. (SUNG, 2002, p.99)”.

Gênero esta ligada ao que é chamado de crítica da organização em que a


autoridade é exercida por homens em suas organizações sociais, ou seja, crítica que
tinha o homem como predominante nas decisões econômicas, sociais, políticas e
14

culturais. Como também a afirmativa de que a identidade sexual não esta dissociada
da identidade social, política e religiosa. No entendimento dos processos sociais é
acrescida a variante do gênero à da situação de classe e de raça 2.

1 Homossexualidade na História

Na visão conceitual de Paulo Roberto Iotti Vecchiatti a homossexualidade é


tão antiga quanto à heterossexualidade, pois tal assertiva acompanha a história da
humanidade e, se nunca foi aceita, sempre foi tolerada. Trata-se de uma realidade
que nunca deixou de existir, estando em toda parte desde as origens da historia
humana. Sendo amplamente interpretada e explicada, não sendo ignorada pela
sociedade, porém não admitida. Ao que segue:

A homossexualidade é tão antiga como a heterossexualidade (assertiva de


Goeth). Acompanha a historia da humanidade e, se nunca foi aceita,
sempre foi tolerada. É uma realidade que sempre existiu, e em toda parte,
desde as origens da historia humana. E diversamente interpretada e
explicada, mas, apesar de não admitir, nenhuma sociedade jamais a
ignorou. (VECCHIATTI, 2008, p.40).

Tal afirmação remete bem a homossexualidade ao longo da historia humana.


Sempre existiu, tendo apenas como variante o tratamento dispensado por
diferentes culturas, não era tido como anormal, pois no inicio dos tempos era
justamente considerado como a relação heteroafetiva. As culturas dividiram se em
aceitar e desprezar tal relação, remetendo a um momento também histórico em
que o lado político do mundo ocidental passou a condenar perversamente a
homossexualidade, dando abertura a todo o preconceito contra as pessoas
homossexuais, verifique:

A afirmação supratranscrita sintetiza bem a questão da homossexualidade


ao longo da história humana. Ela sempre existiu, sendo a única variação o
tratamento dispensado pelas diferentes culturas. No inicio dos tempos, o
comportamento homoafetivo não era tido como “estranho” ou “anormal”,
justamente por ser considerado tão anormal quanto o heteroafetivo.
Determinadas culturas passaram a valorizá-lo, ao passo que outras
passaram a desprezá-lo, até que, num dado momento histórico, a parcela
que dominava o poder político do mundo ocidental passou a condenar
ferozmente a homossexualidade, criando assim todo um estigma e
preconceito contra as pessoas homossexuais. (BRANDÃO, 2002, p.29).

2
Na sociedade, identidade de gênero se refere ao gênero em que a pessoa se identifica, se ela
se identifica com sendo um homem, uma mulher ou se ela vê a si como fora do convencional, mas
pode também ser usado para referir-se ao gênero que certa pessoa atribui ao individuo tendo
como base o que tal pessoa reconhece como indicações de papel social de gênero (roupas, corte
de cabelo, etc.).
15

É de grande valia mencionar a visão bíblica, uma vez que esta teve e tem
grande influencia sob a maioria dos países, senão todos. Esta é a lição de Chaim
Perelman: “(...) mesmo nas sociedades pluralistas, quando uma religião é
nitidamente majoritária, é nela que em geral se inspiram as decisões do legislador”.
(BRANDÃO, 2002, p.29).

A sociedade ocidental foi construída tendo como uma de suas bases o


cristianismo. A Igreja tem forte presença em grande parte dos países do mundo e
assim sua doutrina, consequentemente enraizou-se. ”A Bíblia em relação à
homossexualidade traz posicionamento bastante assertivo: é abominação”.
(BRANDÃO, 2002, p. 29).

Extraída da lei mosaica, de forma simples e descrita em Gênesis, 2:27 :


“Criou Deus , pois, o homem à sua imagem e semelhança, à imagem de Deus o
criou: homem e mulher os criou”.

Religiosamente, avalia-se que, se fosse da vontade e conveniência de Deus a


existência de seres do mesmo sexo, assim os teria criado. Todavia criou homem e
mulher. E esta criação não foi simplesmente pensando na eternidade da criatura.

A razão extraída da lei mosaica que fundamenta esta afirmação é bastante


simples e vem descrita em Gênesis, 2:27: “Criou Deus, pois, o homem à
sua imagem e semelhança, à imagem de Deus o criou: homem e mulher
os criou”. No meio religioso, pondera-se que, se Deus quisesse e achasse
conveniente a existência de seres de um só sexo, assim o teria feito.
Contudo criou homem e mulher. E os criou não apenas pensando na
perpetuação da criatura. (BRANDÃO, 2002, p. 29).

Diante das citações apresentadas traz se conclusão de que a Bíblia condena


que se mantenham relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo. A
homossexualidade ou pessoa homossexual, perante a Bíblia, torna-se digna de
misericórdia, cautela e absolvição divina.

A reprovação exposta remete a algumas condutas apontadas ao incentivo da


luxúria e lascívia, comportamentos estes que são contrários à criação divina, e não
a pessoa em questão.

As citações apresentadas convergem à conclusão de que, biblicamente,


condenável é a mantença de relações sexuais entre pessoas do mesmo
16

sexo. A pessoa homossexual, diante da Bíblia, é digna de misericórdia,


cuidado e perdão divino. A reprovação externada diz respeito a
determinadas condutas que por incentivarem a luxúria e a lascívia, quer
porque adotam comportamentos contrários à criação divina, e não a
própria pessoa. (BRANDÃO, 2002, P. 30).

1.1 A Homossexualidade no Mundo Antigo

O amor entre homens era habitual e aceito nas sociedades primitivas, na


forma de uma relação dos mais velhos e os mais novos (adolescentes)
sendo este o sexualmente passivo e o outro ativo. Tal pratica estavam
relacionadas aos mitos e lendas das tribos em questão, como tudo que
não esta cientificada, relacionada à sociedade. Para eles esta doutrina
traria ao menino a masculinidade, por meio do afastamento integral de sua
mãe e de qualquer outra mulher da tribo, o remetendo ao aprendizado dos
costumes masculinos de seu povo. A realização destas práticas estava
baseada em crer que somente com a concretização é que os meninos
alcançariam a fertilidade essencial a uma futura procriação. (SPENCER,
2008, p. 40 e 41).

Apesar disso, mesmo que estas culturas promovessem uma


pseudobissexualidade ritual de seus membros, no sentido da iniciação masculina
dos menores, existia uma grande maioria que tinha sua total atração voltada para
pessoas do mesmo sexo, mesmo que apenas para procriação tinha que manter
com o sexo oposto um relacionamento.

Diante da visão de uma das civilizações clássicas do mundo antigo,


importante se faz mencionar o caso da Babilônia, dos quais os cidadãos não se
importavam com a sexualidade (se homo, hetero ou bissexual), e sim ao status
social das pessoas ao quais estes se relacionavam, além do papel sexual que
estes exerciam (se ativo ou Passivo).

Vejamos as tribos Marind e Kiman. Nelas, todo menino, passada a


infância, era separado da mãe e tirado da casa das mulheres, para dormir
com o pai na casa dos homens. Aos primeiros sinais de puberdade, o tio
materno era designado para penetrar o menino analmente, fornecendo-lhe
dessa maneira o esperma que o tornaria forte. Os meninos permaneciam
nessa fase por cerca de três anos. [...] O homem Marind não interrompia
suas praticas homossexuais quando se casava. No processo de produzir
uma família, ele podia ser convocado para ser o iniciador do seu sobrinho,
durante três ou quatro anos. [...] O sistema de valores tribal colocava a
homossexualidade acima da heterossexualidade, que, nos seus mitos,
estava sempre associada ao medo da castração e da morte. [...] Havia
também um aspecto metafísico na relação homossexual, pois os
participantes acreditavam que ela tinha o poder de transformá-los física e
espiritualmente. [Segundo Deacon,] ‘A racionalização com que os nativos
justificam suas práticas homossexuais é a de que o órgão do menino se
torna grande e forte graças aos atos homossexuais de seu marido.
(VECCHIATTI, 2008, p. 41).
17

Pode causar estranheza mencionar apenas o amor entre homens e nenhuma


menção se fez sobre o amor entre mulheres. Isto acontece devido ao fato de existir
poucas referências do amor entre mulheres, fato gerador que trouxe o
entendimento de que devido o domínio dos homens daquela época, nada se
poderia dizer sobre relação sexual sem a presença de um homem. As mulheres
tinham sua sexualidade totalmente ignorada por ser vista à mercê de um homem.
Todavia qualquer histórico ocorrido “entre quatro paredes” entre duas mulheres, em
sua grande maioria passava por uma obscuridade, não dando oportunidade de um
resultado escrito sobre tais relacionamentos. Contudo, o amor entre mulheres
sempre existiu, assim como o amor masculino.
Diante das considerações mencionadas, fica evidente que o amor por
pessoas do mesmo sexo já existia e sem restrições era aceito por outros povos
além da Grécia Clássica e de Roma, povos estes vistos como os mais tolerantes
em se tratando de relações homoafetivas. Efetivamente foi sobre estes povos que
os historiadores mais se inclinaram para estudar a base da homossexualidade, o
que expõe por formarem elas o berço do mundo ocidental, desta formação dar-se a
principalmente à Grécia Clássica.

[...] A sexualidade das mulheres era completamente ignorada em virtude


de o preconceito da época pregar que a sexualidade delas dependia
necessariamente de um homem. Assim tudo o que ocorria “entre quatro
paredes” entre duas mulheres era, na maioria das vezes, ignorado, o que
ensejou pouca formalização escrita desses relacionamentos. Não
obstante, o amor entre mulheres sempre existiu, assim como o amor
masculino.

A peculiaridade grega encontra-se em destaque na transmissão de


conhecimento oriundo do ato sexual de um homem mais velho com outro mais
novo, além de ter sido consagrada em sua célebre mitologia (no que foi seguida,
posteriormente, pelos romanos na mitologia greco-romana na qual diversos deuses
a praticavam.3
3
“ O mais famoso casal masculino da mitologia grega é o formado por Zeus e Ganimedes, mas
Apolo também estava constantemente raptando jovens efebos: Ciparisso, Admeto, Himeneu,
Carnus, Hipólito e outros. Hercules amava Foloctetes, Nestor, Adônis, Jasão e muitos mais. Adônis
foi seduzido por Dionísio. É talvez afirmar o obvio, mas as mulheres não aparecem nesses mitos
de iniciação. Onde estão, poder-se-ia perguntar, as mães de todos esses jovens dourados e o que
pensam elas dessas seduções? Como vimos nos exemplos etnográficos, as mães e o restante
das mulheres aceitam o papel que os jovenzinhos estão prestes a desempenhar, já que foram
ensinadas que é dessa maneira que eles se tornam homens. Somente assim o futuro da raça esta
assegurado. Mais uma vez, podemos ver que, se a pederastia ocupava um papel na estrutura
18

Em Roma a sexualidade manteve a principio, o mesmo modelo “bissexual”


anterior, do ponto de vista de ser comum o amor de homens mais velhos por
meninos-adolescentes, porém com uma sutil e perceptível diferença: entendia por
virilidade o extremo valor dado a esta. O homem romano acreditava que ser
dominador e agressivo quando forçava outros a sua submissão, e deste feito
estava lhes dando prazer.

Sendo assim, verificamos que existe diferença entre homens gregos e


romanos: os gregos galanteavam os meninos de seu interesse, agradando este
afim de que visualizassem a existência de boas intenções; já entre os romanos era
proibido o amor por meninos livres, devido à sexualidade estar ligada à dominação.
Remetendo-os apenas ao amor por meninos escravos.

A Grécia Clássica e o Império Romano davam o devido valor àquilo que se


entendia como sexualidade masculina, ou seja, aquela que tinha relação a parceiro
sexual ativo, e a mulher era apontada como cidadã de segunda classe, tal
machismo relacionava os homens adultos e sexualmente passivos a elas.

[...] A conduta do homem passivo era repudiada, por ser vista como uma
conduta feminina e não como um desprestigio ao amor homoafetivo.
Como a mulher era tida como “cidadã de segunda classe”, o machismo
existente na época equiparava os homens adultos que se mantinham
passivos na relação sexual a elas, no que tange a direitos, sendo apenas
isto o que se pode dizer da sexualidade desse período da historia humana.
Ou seja, o machismo é a origem remota da homofobia, ou seja, do
preconceito e da discriminação contra homossexuais. Mas se o homem
passivo era amplamente respeitado por outras atitudes suas (como Julio
César, nos campos de batalha), então se faziam vista grossa quanto à
questão da sua sexualidade. (VECCHIATTI, 2008, p. 46 e 47)

Na visão conceitual de Colin Spencer quanto à antiguidade referente ao tema


abordado nos capítulos em questão, diz se: “Contrariamente ao que estava para
acontecer, o mundo antigo parecia ter aceitado a sexualidade de maneira
descontraída. A legislação existente favorecia os homens, em grande parte por
causa da propriedade e da herança, mas nenhuma única crença ética tinha
selecionado ou favorecido uma expressão da sexualidade em relação á outra. Nem
havia um conceito do que é ‘natural’ ou ‘antinatural’ em formulação. Tudo isso iria
mudar a partir de 600 a.C.

social como um ritual sagrado, as mulheres não têm um papel e devem existir, subservientes, fora
do palco”
19

1.2 Diferenciação dos termos Homossexualismo, homossexualidade


e homoafetividade

Conforme a evolução do tempo o pensamento humano também evoluiu e com


isto foi se desprendendo dos dogmas religiosos que eram inquestionáveis e tidos
como verdades universais e para uma sociedade onde a razão pautada por uma
conduta laica é o que distingue se um comportamento é certo ou errado, no sentido
pelo qual o ser humano passou a buscar respostas cientificas, e não somente
religiosas, para justificar os fenômenos humanos.
Em se tratando da homossexualidade, pode-se dizer que esta evolução levou
os cientistas a considerarem inicialmente a homossexualidade não como um
pecado, do qual é defendido por muitas Igrejas, mas como uma doença, partindo
do principio de que a heterossexualidade seria a conduta sadia e a
homossexualidade, um distúrbio, um desvio de comportamental. Diante deste
pensamento criou-se a palavra “homossexualismo”, uma vez que o sufixo “-ismo”
significa “doença”. Logo, no principio, a ciência médica classificou o sentimento de
amor por pessoas do mesmo sexo como uma doença que deveria ser tratada.

O propósito deste trabalho não é se aprofundar no mérito das discussões


médico-psicológico a respeito da homossexualidade, no entanto é importante citar
algumas informações sobre o assunto.

Séculos de estudos sobre o assunto a ciência médica mundial concluiu que o


amor por indivíduos do mesmo sexo não constitui uma “doença”, um “desvio
psicológico”, uma “perversão” nem nada do gênero. Tal é o entendimento esposado
pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que, em sua Classificação
Internacional de Doenças n.10, em sua revisão de 1993 (CID 10/1993), passou a
considerar a homossexualidade como uma das manifestações naturais da
sexualidade humana, assim como a heterossexualidade 4. Dessa forma, deixada
4
A organização Mundial de Saúde - OMS – retirou, da ultima ‘Classificação Internacional de
Doenças’ (CID) divulgada, qualquer referencia à homossexualidade. A mudança foi significativa.
Com efeito, na CID 9, de 1975, o homossexualismo constava no capítulo das doenças mentais (
como ‘Desvios e Transtornos Sexuais’ sob o código 302), com diagnóstico psiquiátrico. Em 1985,
numa das revisões periódicas, a OMS publicou circular na qual o homossexualismo, por si só,
deixava de ser considerado como doença. Deveria passar por isso, do capitulo das doenças
20

de lado a afirmação de que a homoafetividade seria uma doença ou algo do


gênero, passou-se então a afirmar-se tratar ela de conduta natural ao ser humano,
assim como a heteroafetividade. (VECCHIATI, 2008, p.92)

Diante do entendimento médico-psicológico de não se tratar a


homossexualidade de uma doença, desvio ou perversão psicológica, foi alterado o
sufixo “-ismo” pelo sufixo “-dade”, que significa “modo de ser”. Logo, é
tecnicamente errada a utilização da palavra “homossexualismo”, sendo correto o
uso da palavra “homossexualidade”, como já citado anteriormente.

Diante do exposto, a ciência médica mundial já sustentou que a


homossexualidade não representa doença, depravação, desvio psicológico ou
qualquer outra classificação do gênero, deste modo é uma das livres
manifestações da sexualidade humana, estando ao lado da heterossexualidade. A
definição de origem da homossexualidade ainda traz polemica, questão esta ainda
distante de chegar a um consenso dos estudiosos a respeito.

Importante dizer que a insistência pela busca da causa da homossexualidade,


já demonstra preconceito, pois, não existe a preocupação em descobrir a origem
da heterossexualidade, uma vez que se algo origina uma, claramente algo origina
a outra.

Tal preconceito remete ao fato de a naturalidade da heterossexualidade ser


inquestionável, porém ainda se colocam dúvidas quanto à naturalidade da
homossexualidade. Não se trata de um questionamento sobre o heteroafetivo e sim
afirmar que o homoafetivo é tão normal quanto ele.

O posicionamento adotado neste trabalho, contudo, vai mais alem.


Entendo que a sexualidade seja inata à pessoa, sendo, portanto, genética
a sexualidade (seja ela homo, hétero ou bissexual). Afinal, se o meio
ambiente isoladamente considerado fosse capaz de definir a sexualidade
de uma pessoa, por meio de mensagens expressas, subconscientes etc.,
hoje não existiriam homossexuais pelo simples fato de ser nossa
sociedade heterossexista há muito tempo. Ora, se a criação dos pais, a
cultura e/ou o meio social definissem a sexualidade da pessoa, então não
seria possível o surgimento de homossexuais ante a constante pregação
social historicamente existente no sentido de que a heterossexualidade
mentais para o capitulo dos ‘sintomas decorrentes de circunstancias psicossociais’. Desde 1995,
porém quando da divulgação da CID, referências à homossexualidade não mais aparecem. Os
psiquiatras, incumbidos da tarefa de revisão da CID, concluíram não existirem sinais que
justifiquem considerar a orientação homossexual como doença ou mesmo como sintoma,
tratando-se apenas de uma manifestação do ser humano.
21

seria a única sexualidade “correta”, “aceitável”, e assim por diante. Em


outras palavras: a sociedade não faz apologia à heterossexualidade como
a exige de todas as pessoas, de forma expressa e implícita, donde me
parece ilógico defender que a sexualidade seria definida por fatores
“psicossociais” a partir do momento em que existem homossexuais em um
mundo no qual todos os fatores psicossociais direcionam a pessoa à
heterossexualidade. (VECCHIATTI, 2008, p.101-102)

A única influência dos fatores psicossociais na sexualidade ocorre na


manifestação das pessoas em geral , quando estas se apresentam como homo,
hétero ou bissexual, porém nunca na sexualidade em si a pessoa é homo, hetero
ou bissexual. Isto é a pessoa acaba não manifestando sua verdadeira sexualidade
devido ao preconceito e discriminação que existe na sociedade, dizendo com isto
que um homossexual que finge ser heterossexual, mantendo um relacionamento
heterossexual5, com o único intuito de não sofrer o preconceito e discriminação
atualmente apontada aos homossexuais.

A homossexualidade nada mais é que o romântico sentimento de amor por


uma pessoa do mesmo sexo, ou seja, a atração erótico-afetiva que uma pessoa do
mesmo sexo sente pela outra. Não se pode chamar isto de opção, simplesmente
porque ninguém escolhe em dado momento de sua vida se vai ser homo, hetero ou
bissexual: simplesmente as pessoas descobrem de uma forma ou de outra. Do
mesmo modo que não se consegue “trocar” de orientação sexual 6 no decorrer da
vida.

Sendo assim a homoafetividade revela a presença de uma ligação amorosa,


onde duas vidas se entrelaçam para assim criarem um convívio familiar. Convívio
este que trará obrigações, deveres e comprometimento, sendo este um dos
principais alicerces da família e por este motivo desejam ser reconhecidos como
tal, tendo direito ao casamento civil, podendo assim usufruir de todos os direitos
que a sociedade natural já usufrui, como a que existe entre os heterossexuais.

5
Por mais que um relacionamento envolva o contato sexual, muitas pessoas conseguem manter
uma relação sexual com outra sem, contudo, sentirem-se atraídas sexualmente por dita pessoa.
6
A expressão orientação sexual significa, tanto popular como tecnicamente, que o desejo está
“em direção a” determinado sexo biológico, não significando que a pessoa teria sido “orientada” a
ter esta ou aquela sexualidade, sendo que o entendimento neste ultimo sentido decorre de
tradução puramente literal dos significados dos termos isolados da expressão, o que afronta seu
correto entendimento.
22

CAPÍTULO 2

ORIGEM DO DIREITO DAS FAMÍLIAS

Importante falarmos sobre a origem do direito das famílias, uma vez que é
natural a vida a dois, a família nada mais é que uma afluência informal, de
concepção espontânea no meio social, do qual a composição ocorre por meio do
direito.

Como a linguagem condiciona o pensamento, é mister subtrair qualquer


adjetivação ao substantivo família e simplesmente falar em famílias. Como
refere Jones Figueiredo Alves, apenas uma consoante a mais sintetiza a
magnitude das famílias em suas multifacetadas formações. Assim, a
expressão direito das famílias melhor atende à necessidade de enlaçar, no
seu âmbito de proteção, as famílias, todas elas, sem discriminação, sem
preconceitos. (DIAS, 2011, p.28)

A família deixou de ser uma célula do Estado, e é atualmente encarada como


uma célula da sociedade, apontada como a base da sociedade, razão esta que
recebe especial atenção do Estado “A família, base da sociedade, tem especial
proteção do Estado”. A grande missão do Estado foi considerada sempre a de
preservar a constituição familiar sobre o qual sustentam seus alicerces. A família é
tanto uma estrutura pública como uma relação privada, visto que equipara o
cidadão como integrante do vínculo familiar e também como participe do contexto
social. “O direito das famílias, por dizer respeito a todos os cidadãos, revela-se
como o recorte da vida privada que mais se presta às expectativas e mais está
sujeito a criticas de toda sorte”. (DIAS, 2011, p.29)
23

2 Princípios do Direito de Família

A fonte essencial do direito de família é a Constituição Federal de 1988, vez


que são chamados de princípios constitucionais por terem como garantia na
CF/1988 os nossos direitos fundamentais. Além das regras legais, tem também os
princípios que vinculam as condições de justiça e de valores morais que compõem
os valores axiológicos7, verificando conexão interna e formação harmônica a todo
sistema jurídico. Tais princípios plainam sobre toda a organização jurídica, devendo
ser assistido também além das normas.

Uma nova maneira de ver o direito surge da Constituição Federal, que é


responsável pela imposição à eficácia dada a todas as suas normas manifestantes
de direitos e garantias fundamentais (CF 5º § 1.º). Desde o momento em que
aconteceu a constitucionalização do direito civil e a dignidade da pessoa humana, foi
ratificado como princípios do Estado Democrático de Direito (CF 1.ºIII), o positivismo
fez-se insuficiente. As regras jurídicas revelaram-se restritas, reduzidas para atender
ao comando constitucional.

“O princípio da interpretação conforme a Constituição é uma das mais


importantes inovações, ao propagar que a lei deve ser interpretada, sempre,
a partir da lei maior. Assim, os princípios constitucionais passaram a
informar todo o sistema legal de modo a viabilizar o alcance da dignidade
humana em todas as relações jurídicas”. (DIAS, 2011, p.57-58)

O direito de família por natureza própria é ordenado por extenso número de


normas de ordem pública. Todavia, tal situação não substitui esse ramo em direito
público. Em partes a doutrina buscou edificar o direito de família como membro do
direito público. A finalidade das normas de ordem pública no direito é limitar a
autonomia de vontade e a alternativa de as partes partilharem sobre suas próprias
normas nas relações jurídicas. Tal ordem sucede, então, de normas imperativas, em
oposição às normas supletivas. Não significando, com isto, que essas relações
assim ordenadas afastam-se do direito privado.

[...] Não se pode conceber nada mais privado, mais profundamente humano
do que a família, em cujo seio o homem nasce, vive, ama, sofre e morre. O
7
Ramo da filosofia que estuda os valores morais, ciência dos valores, estudo sobre os valores morais, padrão
dominante de valores, teoria sobre os valores morais.
24

direito de família visto como direito público prepara o terreno para um


intervencionismo intolerável do Estado na vida intima, como tantos que
ocorrem ordinariamente. (Venosa, 2011, p.11)

Importante citar que a família encontra-se embasada em vários princípios,


sendo alguns advindos da Constituição Federal de 1988, que são os verdadeiros
alicerces dos núcleos familiares, podendo assim mencionar alguns deles como fonte
importante de conhecimento quanto ao assunto abordado.

a) Princípio da afetividade

Na evolução que ocorre no direito de família o que se deve priorizar são as


relações de afetividade. De acordo com Maria Helena Diniz trata-se de princípio
decorrente do respeito da dignidade da pessoa humana, como norteador das
relações familiares e da solidariedade familiar.

E através deste princípio a família passa a ser consagrada como centro das
relações de afeto, confiança, solidariedade, colaboração, respeito e união entre os
membros que fazem parte da família.

b) Princípio do respeito da dignidade da pessoa humana

Princípio que se encontra amparado no art. 1º, III da Constituição Federal de


1988. Garante os direitos de personalidade de cada membro do grupo familiar,
constitui base da comunidade familiar, o que garante o completo desenvolvimento e
a pratica de todos os seus membros, sobretudo da criança e do adolescente (CF, art.
227) buscando com isto o crescimento sadio e harmonioso da pessoa humana, de
cada integrante da entidade familiar. Buscado com isto a construção de valores
morais, éticos, e sociais que cada um de seus integrantes levará consigo por toda a
vida.

Em síntese, o princípio da dignidade da pessoa humana, tem sido o foco de


discussão do direito de família, pois uma vez que existe o respeito entre as pessoas,
as objeções práticas de ordem familiar são facilmente resolvidas.

c) Princípio da igualdade jurídica dos cônjuges e companheiros

Pelos ensinamentos de Maria Helena Diniz, por este princípio, está o que
atina aos direitos e deveres referentes à sociedade conjugal e de convívio, o atual
25

código civil dá a ambos os consortes um poder de decisão, como a fixação de


domicílio pelo casal e não mais unicamente pelo marido, cabe a qualquer um deste
o direito de recorrer ao juiz para fazer prevalecer a sua vontade, desde que o
assunto seja essencial ao interesse do casal e dos filhos, não podendo assim tratar
de matéria personalíssima.

d) Princípio do pluralismo das entidades familiares

Por este princípio rompe-se a exclusividade do casamento e passa a haver o


reconhecimento de novos núcleos familiares, pois as famílias são fundadas no afeto,
uma vez que a norma constitucional envolve a família matrimonial e as entidades
familiares, ou seja, união estável e família monoparental.

e) Princípio da “ratio” do matrimônio e da união estável

Princípio segundo o qual o fundamento básico do casamento, da vida


conjugal é a afeição entre os consortes ou conviventes e a imprescindibilidade de
que perdure completa comunhão de vida, sendo o rompimento da união estável e a
dissolução do casamento uma decorrência do fim do afeto, uma vez que a união
espiritual e material de vida entre marido e mulher ou conviventes não pode ser
mantida ou restabelecida.

f) Princípio da liberdade

Tem como fundamento o livre poder de constituir uma união de vida familiar
através do casamento ou união estável, sem nenhuma imposição ou restrição de
pessoa jurídica de direito publico ou privado, concedendo ao casal livre decisão no
planejamento familiar, tendo a intervenção do Estado apenas ao que lhe compete
referente a propiciar recursos educacionais e científicos ao exercício desse direito,
quanto a convivência conjugal, na liberdade de aquisição e administração do
patrimônio familiar e a opção por um regime matrimonial mais conveniente, como
também a liberdade de escolha pela formação religiosa, cultural e educacional,
respeitando mutuamente a integridade moral e físico-psíquica dos integrantes da
família.
26

Conforme já mencionado o direito de família esta afastado das características


dos demais ramos do direito privado. A sociedade busca adequar e tutelar a família
de forma mais aceitável possível no tempo e no espaço. A intervenção do Estado na
formação da família tem interesse na preservação da célula que o sustenta.

2.1 Evoluções do Direito de Família

A partir do século XIX os códigos elaborados dedicaram-se a normas sobre a


família. Naquele tempo, a sociedade era grandemente rural e patriarcal,
preservando traços significativos da família da Antiguidade. A mulher aprofundava-
se nas tarefas domésticas, mas não lhe era concedido por lei os mesmos direitos
do homem. O marido era conceituado como o chefe, administrador, modelo da
sociedade conjugal. Nosso Código Civil 1916 foi fruto direto dessa época.

Em nenhuma outra área do direito houve tão grande evolução como no


Direito de Família. Foram tantas as modificações sociais ocorridas nas
últimas décadas que não seria demais afirmar que temos hoje, mormente
após a Constituição de 1988, um novo Direito de Família. Em razão disso,
inúmeros diplomas legislativos foram produzidos nas oficinas do direito,
como veremos a seguir, em busca da necessária harmonia entre a realidade
social e a lei. (CAVALIERI FILHO, 2007, p.106)

Desde a metade do século XX, no direito brasileiro o legislador aos poucos foi
vencendo dificuldades e objeções, permitindo direitos aos filhos ilegítimos e
transformando a mulher completamente capaz, até o ponto máximo que exerceu a
Constituição de 1988, que não mais diferencia a origem da filiação, discriminando os
direitos dos filhos, desconsiderando o predomínio do homem na sociedade conjugal.
A disputa legislativa foi intensa, particularmente em relação à emenda constitucional
que aprovou o divórcio. O atual estágio legislativo teve que superar barreiras de
natureza ideológica, sociológica, política, religiosa e econômica.

O código civil anterior, ou seja, de 1916, legitimava a família do início do século


passado, formada apenas pelo matrimônio. Na versão original possuía uma estreita
e discriminatória interpretação de família, restringindo-se ao grupo procedente do
casamento. Impossibilitava sua dissolução, fazia diferenciação entre seus membros
e trazia qualificações discriminatórias às pessoas unidas sem casamento e aos
filhos decorrentes desse convívio. As menções feitas às relações extramatrimoniais
27

e aos filhos ilegítimos eram penalizadas e serviam unicamente para restringir


direitos, numa inútil tentativa de proteção ao casamento.

Diversos avanços foram relevantes, e vários são os exemplos. Reparou alguns


equívocos e introduziu orientações pacificadas pela jurisprudência, como não mais
designar compulsoriamente a exclusão do sobrenome do marido do nome da
mulher. Na legislação anterior era inevitável a perda do nome quando da
transformação da separação em divórcio. O agente da separação não tinha direito
de alimentos, ainda que não tivesse meios de sobreviver. Em momento oportuno o
código garantiu o direito a alimentos mesmo ao cônjuge responsável pela
separação. Ainda assim alguns avanços não foram realizados, neste mesmo
momento.

A guarda compartilhada só veio muito depois. Mas continua carecendo de


regulamentação a posse de estado de filho, a filiação socioafetiva, de há
muito já reconhecidas em sede jurisprudencial. Também olvidou-se a lei civil
de normatizar as relações de pessoas do mesmo sexo, agora nominadas de
uniões homoafetivas.(DIAS, 2011, p.32)

Para Maria Berenice Dias, o legislador, infelizmente, também cometeu


inconstitucionalidades. Ao tratar desigualmente as entidades familiares decorrentes
do casamento e da união estável, gerou o Código Civil diferenciação sem respaldo
constitucional. A Constituição não estabelece qualquer hierarquia entre as entidades
às quais o Estado empresta especial proteção (CF 226). E, o que o constituinte não
distinguiu, não pode diferenciar a lei ordinária.

2.2 Famílias Constitucionais

Art. 226 - A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.


§ 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração.
§ 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.
§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável
entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua
conversão em casamento.
§ 4º - Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada
por qualquer dos pais e seus descendentes.
§ 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos
igualmente pelo homem e pela mulher.
§ 6º - O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia
separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou
comprovada separação de fato por mais de dois anos.
§ 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da
paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal,
competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o
28

exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de


instituições oficiais ou privadas.
§ 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um
dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito
de suas relações.

A constitucionalização do Direito Civil aconteceu quando se afastou “da


concepção individualista tradicional e conservadora da época das leis do século
passado”, assim as normas peculiares ao direito de família passam a ter validade
constitucional.

Nota-se que o legislador constituinte ampliou o conceito de família conforme


os interesses da sociedade, deixando de ser o casamento a única espécie criadora
de família legalmente amparada. Assim o legislador atribuiu status de família às
uniões estáveis entre pessoas do sexo oposto, ou seja, homem e mulher. Dando a
esse tipo de família proteção constitucional, pelo fato de exibir requisitos de
sentimento, estabilidade e responsabilidade necessária à execução das funções
autenticamente familiares.

As famílias monoparentais também foram outro tipo de família que passou a


ser admitida pela Constituição Federal de 1988, tendo como integrantes um dos
pais e seu(s) filho(s), dessa forma não são mais exigidos que tenha um casal
(homem e mulher) para que exista a relação familiar. Perante tal aspecto deixa de
existir a finalidade de procriação no seio da família.

A Constituição Federal rastreando os fatos da vida viu a necessidade de


reconhecer a existência de outras entidades familiares além das
constituídas pelo casamento. Assim, enlaçou no conceito de família e
emprestou especial proteção à união estável (CF 226 § 3.º) e à
comunidade formada por qualquer dos pais com seus descendentes (CF
226 § 4.º), que começou a ser chamada de família monoparental. (DIAS,
2011, p.41)

Conceituar família remete ao padrão extrínseco do homem e de uma mulher


relacionados pelo casamento e rodeados de descendentes. Contudo esse fato
transformou-se, e atualmente a sociedade já esta habituada com o afastamento
das famílias ao perfil convencional.

A convivência com famílias recompostas, monoparentais, homoafetivas


permite reconhecer que ela se pluralizou, daí a necessidade de flexionar
igualmente o termo que a identifica, de modo a albergar todas as suas
conformações. Expressões como famílias marginais, informais,
29

extramatrimoniais não mais servem, pois trazem um ranço discriminatório.


(DIAS, 2011, p.40)

A atual Constituição Federal produziu relevantes transformações na


sociedade e na vida das pessoas, podendo assim especificar algumas, devido sua
maior relevância e por aparecerem com exuberância. A primazia da dignidade da
pessoa humana está lastreada no princípio da igualdade e da liberdade, vasto
criador de um novo Estado Democrático de Direito que foi inserido no País.

Um amplo avanço proveniente da Constituição Federal de 1988 foi o


reconhecimento jurídico-familiar das uniões amorosas, de cunho estável, composto
por duas pessoas e que está disposto no art. 226,§ 3º, da CF/1988.

Deste modo, a ideia do casamento civil como imprescindível à constituição de


uma família “legitima” foi extraída de nosso ordenamento jurídico com a vinda da
Constituição Federal de 1988, visto que esta passou a aceitar a união estável
como instituição familiar.

Diverso de alguns doutrinadores a Constituição Federal não delimitou a


família resultante da união amorosa tão somente àquela constituída por pessoas
de sexos diversos e assim não definiu o casamento civil como “regra” de família a
ser utilizada, pois este era o modelo anterior das constituições, que não se renovou
com a chegada da Carta Magna de 1988. Motivo este que a Constituição não
classificou em primeiro lugar a família, somente cita que a família é o pilar da
sociedade brasileira. No entanto, a Carta Magna não proibiu as uniões
homoafetivas, não mencionando também que a formação familiar se origina do
vinculo amoroso por meio da união heteroafetiva.

[...] é o amor romântico existente na relação, que vise a uma comunhão


plena de vida e interesses, de forma pública, continua e duradoura, razão
pela qual considero as uniões homoafetivas idênticas às heteroafetivas,
visto serem ambas as situações nas quais temos duas pessoas que se
amam em uma comunhão plena de vida e interesses, de forma pública,
continua e duradoura – mas, ainda que assim não se entenda, é inegável
que são idênticas pelo menos no essencial, que é o amor familiar, visto
que é ele o elemento formador da família contemporânea. (DIAS, 2011, p.
213)

Deste modo, sendo validada a entidade familiar resultante das uniões


amorosas entre pessoas de sexos diversos, merece reconhecimento as uniões
formadas por pessoas do mesmo sexo, em consequência da extensa explicação
30

ou da paridade, visto que é semelhante o amor familiar nos dois casos,


proporcionando aos pares uma harmonia plena de vida, em caráter constante,
público e duradouro, isto é, visando à constituição de uma família, e tal constituição
não se trata de algo com vinculo à filiação.

O direito civil tem extensa parte na Constituição, o que levou os temas sociais
a garantir relevante efetividade. Quando o Estado intervém nas relações de direito
privado permite o revigoramento das instituições de direito civil, e com o novo texto
constitucional, inevitável é ao intérprete fazer um novo desenho com relação ao
direito civil à luz da nova Constituição.

.
CAPÍTULO 3

UNIÃO HOMOAFETIVA E A REGULAMENTAÇÃO DO

CASAMENTO CIVIL

Maior parte dos países europeus já permite as uniões homoafetivas, e ativo é


o interesse do Parlamento Europeu para criação de lei viabilizando o casamento
homossexual na União Européia. O primeiro país que autorizou o casamento entre
pessoas do mesmo sexo foi a Holanda no ano de 2001, concedendo iguais direitos
e deveres, e equivalentes consequências jurídicas do casamento heterossexual.
Outros países seguiram no decorrer dos anos o mesmo interesse: Bélgica (2003),
África do Sul (2005), Espanha (2005), Canadá (2005). Os estados norte
americanos: Connecticut (2007), Iowa (2009), Vermont (2009), New Hampshire
(2010) e Columbia (2010). Na Noruega e Suécia em 2009, México, Portugal,
Argentina em 2010, sendo que a Argentina é o único país da América do Sul que
permite o casamento homossexual.

3 União Homoafetiva e o Direito de Família

As regras sociais estão aplicadas basicamente em todas as situações da vida


e cotidiano do cidadão, em períodos diferentes permitem e incentivam
determinados tipos de relações e desaprovam a ilegitimidade de tudo que escapa
do modelo extrínseco. Mas é indiscutível o quanto a conceito de família ampliou-
se, a Constituição Federal no caput do seu artigo 226 realizou a mais radical
transformação relativa ao âmbito de vigência da tutela constitucional à família. Traz
a relação matrimonializada, e também acolhe a família monoparental, que nada
mais é que o vínculo de um dos pais com seus filhos. Consequentemente para o
ajuste de um grupo familiar não mais é exigido como componente peculiar à
existência de um casal heterossexual. As evoluções num todo, contribuíram e
influenciaram no comportamento das pessoas e refletiu na estrutura familiar.
32

A Constituição exemplifica alguns tipos de entidades familiares, mas não cria


empecilhos à criação de outras instituições de família. Sendo assim, não
reconhece somente a união heterossexual como família, por ter como pressuposto
a diferença de sexo de seus membros. Considerar apenas o casamento, a união
estável e a família monoparental como elementos principais de constituição
familiar, remetem a desproteger um grande feixe de indivíduos, que dedicam seus
afetos a pessoas de sexos iguais ao seu. Diante de este convívio afetivo “gerar
família”, não resta outra opção a não ser reconhecer como entidade familiar digna
de proteção especial do Estado. Visto que a família é uma relação da ordem da
solidariedade, tendo como pressuposto o afeto, remetendo ao pensamento de que
todas as espécies de relação que tenham o afeto como seu principal alicerce,
tornam-se merecedoras de proteção do Estado. O amplo preconceito e rejeição
dos quais sempre foram direcionados aos homossexuais quanto à construção de
seus vínculos de união, estabeleceu a necessidade da geração de um novo
vocábulo que remova das uniões de pessoas do mesmo sexo aspectos unicamente
da ordem da sexualidade. Dando assim a nome de homoafetividade, para indicar
que os relacionamentos estão calcados muito mais na conexão que une o par, não
se restringindo ao simples propósito de natureza sexual. Embora as pessoas
permaneçam se nomeando e sendo nomeados como homossexuais, os elos
interpessoais que amparam, constituem uniões homoafetivas.

Apesar de o neologismo sofrer críticas isoladas de alguns integrantes dos


movimentos sociais, que receiam a eliminação do caráter erótico da
relação, o fato é que as expressões se popularizaram. Já estão
dicionarizadas e foram adotadas na histórica decisão do Supremo Tribunal
Federal8, que estendeu às uniões homoafetivas a mesma condição de
família assegurada às famílias heteroafetivas. (DIAS, 2011, p.109)

Diante do julgamento do Supremo Tribunal Federal, que aprovou a união


homoafetiva como entidade familiar, merecedora de iguais direitos e deveres da
união estável, não se pode mais excluí-la da definição de família, especialmente
em face do efeito vinculante do julgado.

De natureza própria, disciplinado por grande número de normas de ordem


pública no direito de família, ordem que prevalece ordenando sobre as relações
pessoais dos casais, motivo pelo qual o Estado sempre teve interesse no
direcionamento da família como célula básica, proporcionando-lhe proteção
8
STF, ADI 4.277 e ADPF 132, j. 05.05.2011, rel. Min. Ayres Brito
33

especial conforme descriminado na Constituição Federal. A família, base da


sociedade, tem especial proteção do Estado. (art. 226, caput, da CF).

Considerando suas características particulares, talvez seja melhor acreditar no


futuro muito próximo, o direito de família como um microssistema jurídico, membro
do conhecido direito social, embora este conhecimento seja difuso, na zona
intermediária quanto ao que se refere ao direito publico e o privado, possibilitando a
elaboração de um código ou estatuto da Família 9, o que já acontece com outras
legislações, e legislativamente seria o melhor e importante para acolher todos os
princípios do direito de família, alicerçar as mudanças e evoluções sociais.

A união homoafetiva não poderia ficar de fora dos princípios do direito de


família, uma vez que o direito nasceu para todos. As escolhas, mudanças e
evoluções da sociedade devem ser amparadas, respeitadas e principalmente
mediadas e conciliadas por profissionais devidamente habilitados e interessados no
crescimento histórico e cultural das uniões familiares.

3.1 Amparo Constitucional resguardado pelo STF

Considerando que o princípio da dignidade da pessoa humana garante a


todos o direito à felicidade e a uma vida digna e que, em virtude do padrão social
existente em torno do casamento civil, as pessoas que querem se casar somente
serão felizes se puderem se casar civilmente, é constatado que o casamento civil é
um direito fundamental tácito decorrente do princípio da dignidade da pessoa
humana por força do artigo 5º,§ 2º, da CF/1988 10, motivo este que a negativa
desnecessária lançada aos casais homoafetivos caracteriza inconstitucionalidade
por confronto ao princípio da dignidade da pessoa humana e ao dito direito
fundamental implícito. Contrapor semelhante tratamento aos casais homoafetivos
significa instrumentalizá-los para que o Estado conquiste um nocivo intuito de
estabelecer o padrão heteroafetivo a todos, em posição que atenta contra a
dignidade humana e a liberdade de consciência de homossexuais.

9
Projeto de Lei Nº 2.285/2007 - Deputado. Sérgio Barradas Carneiro
10
Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e
dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do
Brasil seja parte.
34

Com referência às leis do casamento civil e da união estável, tem-se que a


única explicação constitucionalmente válida dos supracitados dispositivos legais e
constitucionais é aquela segundo a qual a fraseologia “o homem e a mulher” deles
constante significa apenas a normatização das uniões heteroafetivas, sem que isto
expresse que estariam proibidos o casamento civil e a união estável entre pessoas
do mesmo sexo, considerando que a discriminação resultante de compreensão em
sentido contrário é arbitrária, uma vez que afronta a isonomia, a dignidade
humana, promoção do bem estar de todos e da liberdade de consciência, regras
que se caracterizam como direitos humanos fundamentais e normas
constitucionais de eficácia plena.

Em busca de suas garantias e prerrogativas, ratificadas na Constituição


Federal, a única maneira de a população LGBT 11 assegurar esses direitos foi
buscando o poder Judiciário. Lamentavelmente o legislador se acovarda no
momento de proporcionar direitos à minoria que esta sempre à mira de tanta
discriminação. Optando em se esconder em motivos meramente religiosos, por
temerem ser rotulados de homossexual, ou em alguns casos comprometer sua
reeleição. Porém ninguém pode ficar ao arbítrio de um Poder Legislativo estático e
preconceituoso que se recusa a cumprir a sua função que é de editar leis que
proporcionem efetividade aos comandos constitucionais. Porém a falta de lei não
remete a ausência de direitos. Diante da inércia do parlamento, é da Justiça a
obrigação de ocupar os vazios na legislação. O sistema jurídico valoriza primeiro o
respeito à dignidade da pessoa humana, baseados nos princípios da liberdade e
igualdade o que garante tratamento isonômico e proteção igualitária a todos.
Assim, qualquer violação de direito é digna de ser trazida a juízo. E, quando a
jurisprudência se fortalece, o legislador se sente obrigado a transforma-las em
normas legais, sob pena de perder um pedaço de poder.

É evidente que a omissão da lei prejudica o reconhecimento de direitos,


especialmente frente a situações que se deslocam de determinados estereótipos
convencionais, situação que só faz crescer a responsabilidade do Poder Judiciário.
Assim, não se pode recorrer ao silêncio da lei com intuito de negar direitos àqueles

11
Lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros.
35

que não estão adequados ao modelo imposto por uma moral conservadora, mas
que não insultem a ordem social.

A questão dos vínculos afetivos só surgiu nas Cortes Superiores no final do


século passado, mas precisamente no ano de 1998 a primeira decisão do Superior
Tribunal de Justiça que, certificando a existência de uma sociedade de fato,
garantiu ao parceiro homossexual a metade do patrimônio adquirido pelo esforço
comum.12 Condicionar a partilha de bens à prova da mutua colaboração, foi uma
predisposição extensamente majoritária. Assunto de pouca repercussão na época,
devido os tribunais afirmarem tratar de competências das Varas de Família.

No entanto, importante mencionar que a homoafetividade saiu mesmo da


obscuridade ou do armário como popularmente dizem, quando o Supremo Tribunal
Federal13 aceitou a união homoafetiva como entidade familiar. Decisão esta que se
transformou em um marco histórico na defesa dos direitos humanos, explanou
conforme a Constituição o artigo 1.723 do Código Civil que legitima a união
estável, excluindo então qualquer interpretação que prejudique o reconhecimento
da união contínua, pública e permanente entre duas pessoas do mesmo sexo
como “entidade familiar” , conhecida esta como sinônimo perfeito de “família”.

Assim, novamente o Poder Judiciário cumpriu com o seu papel de ser


guardião dos princípios constitucionais que devem gerir a sociedade, inclusive
quando a lei é omissa. Enfim, não se pode viver a opressão do Legislativo, do qual
os juízes se sujeitam às tentativas de segmentos que se ocultam atrás de preceitos
religiosos para mascarar comportamentos homofóbicos e discriminatórios. Diante
destes pressupostos, é merecedor enaltecer o Supremo Tribunal Federal quanto a
sua coragem, sensibilidade e sabedoria no momento que exerce o encargo que lhe
é conferido através da Constituição Federal que é o de corrigir possíveis falhas no
sistema legal. Possivelmente nunca se tenha visto um ato tão uniforme e
consensual da Suprema Corte brasileira, pelo menos no que se refere ao
resultado, ao conceituar que a união homoafetiva é, sim, um modelo familiar.

Em 2011, mais especificamente no dia 05 de maio teve início o julgamento


conjunto de duas demandas, que teve sua conclusão apenas no dia seguinte. A
12
STJ, REsp 148.897 – MG , 4ª T. j. 10.02.1998, rel. Min, Ruy Rosado de Aguiar.
13
ADI 4.277 e ADPF 132, j. 05.05.2011, rel. Min. Ayres Brito
36

Decisão foi unânime, tendo sido afirmado a sua eficácia, sem a exigência de
aguardar a publicação do acórdão ou o seu transito em julgado. Sendo assim, a
partir das 20 horas do dia 06 de maio de 2011 14 as uniões homoafetivas tiveram os
seus direitos firmados como entidade familiar, consentindo os mesmos direitos e
deveres de união estável.

3.2 Regulamentações do Casamento Civil

O casamento civil, ou união civil foi reconhecido em alguns países a mais de 20


anos, tendo a Dinamarca (1989) como o primeiro país a reconhecer a
homossexualidade e permitir que os casais realizassem o registro da união civil
estendendo a esta união à igualdade de direitos concedida aos heterossexuais

Ademais, considerando que a terminologia casamento (civil) é da máxima


influência, não somente por ser, nos dias de hoje, a única forma de obtenção de
todos os direitos conferidos pelo Direito de Família, em especial ao real padrão
social existente no que cabe ao desejo que as pessoas em geral têm de se casar
(dentre esses obviamente os homossexuais).

Considerando que não há fundamento lógico-racional que justifique a


discriminação das uniões homoafetivas em relação às heteroafetivas, não
pode o Direito pátrio colocar as uniões entre pessoas do mesmo sexo em
situação de menor dignidade do que as uniões entre pessoas de sexos
diversos, sob pena de inconstitucionalidade deste ato por afronta ao
princípio da dignidade da pessoa humana. (VECCHIATTI, 2008, p. 364)

No Brasil, por anos o silêncio foi algo muito constrangedor devido a projetos
de Lei emperrados no Congresso Nacional, sem qualquer probabilidade de
aprovação. Porém nada pode manter-se a mercê da falta de direito igualitário,
motivo pelo qual a luta pela igualdade e a regulamentação do casamento civil
homoafetivo foi respeitado e aprovado.

Se o ano de 2011 foi um ano importante na luta histórica da população LGBT,


o ano de 2013 não será diferente, alias finda uma luta de igualdade de direitos e
liberdade resguardado a todos independente de suas opções sexuais, anos de luta
que não foram em vão, como elencadas em outras lutas pela igualdade, a luta
pelos direitos civis, lutas como o movimento negro e o feminismo foram exemplos

14
ADI 4.277
37

de caminhos a serem seguidos, movimentos que não fez com que a vontade de
pessoas iguais fosse abandonada, que suas vozes fossem caladas diante de
tantos preconceitos, e homofobias.

15
Assim, na data de 14.05.2013 O Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
decidiu pelo casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, decisão esta que
passa a ser legal em todo o Brasil. Mas tão importante se faz, mencionar que neste
mesmo e atual ano, dois meses antes do anteriormente citado, tão precisamente
em 01.03.2013 os cartórios de registro do Estado de São Paulo passaram a
oficializar casamentos civis entre pessoas do mesmo sexo, sendo assim as uniões
homoafetivas ganharam o direito de serem civilmente oficializados dentro do
Estado de São Paulo, direito garantido graças ao provimento normativo do Tribunal
de Justiça do Estado de São Paulo, deste feito os casais homossexuais e
heterossexuais terão direitos igualitários no tocante ao reconhecimento legal e
social de suas famílias. O casamento civil igualitário já era uma realidade nos
estados de Alagoas, Bahia, DF, Espírito Santo, Piauí. São Paulo sendo incluso
nesta realidade deu margens para avançarem com a mesma força e vontade de
mudanças na legislação, com isto, explanar este mesmo direito aos outros
estados, de forma a garantir que nenhum casal homossexual sofra qualquer tipo de
discriminação legal e social.

Portanto a decisão que abrange todo o território nacional, proposta pelo


ministro Joaquim Barbosa, também presidente do Conselho Nacional de Justiça,
diz que “é vedada às autoridades competentes a recusa de habilitação, celebração
de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas
de mesmo sexo”. Então importante decisão fez com que os cartórios não mais
precisassem encaminhar aos juízes pedidos de habilitação para casamento,
pedidos estes que poderiam ser aprovados ou rejeitados, não cabendo aos
cartórios quaisquer tipos de intervenção.

Agora os cartórios de todo território nacional brasileiro deverão celebrar os


casamentos entre os casais homossexuais (dois homens ou duas mulheres) sem
caminhos diferentes dos casamentos realizados pelos casais heterossexuais.

15
Resolução Nº 175,de 14 de Maio de 2013.
38

Árdua e insistente foi à luta e vontade do povo LGBT para galgar seus direitos
que já existiam, mas que devido a tanta discriminação e crescente homofobia não
era exercido.

Todas essas conquistas, perseverança e evolução nos liames do direito civil,


constitucional e na pátria família, só demonstram o quanto é importante lutar pelos
direitos existentes, pelos que estão na Lei Maior, devidamente
constitucionalizados, nada pode ser feito ao contrario, nada por ser realizado de
forma a ferir os direitos e deveres do todo cidadão brasileiro, independente da
orientação sexual, ou identidade de gênero, mas por outro lado tudo deve ser feito
a fim de que todos sejam alicerçados pelo seus direitos fundamentais , aplicando o
respeito à dignidade , garantindo o direito a igualdade, buscando com que o
legisladores abandonem posturas omissas ou preconceituosas, que desfavorecem
toda e qualquer manifestação de direito igualitário.
39

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nota-se que as uniões e afetos entre as pessoas do mesmo sexo existem


desde a antiguidade, sociedades antigas como a Grécia não alimentavam quaisquer
discriminação sobre, pois o importante para eles era o que tivesse referencia ao
belo, já na sociedade romana a existência do envolvimento entre pessoas do mesmo
sexo sempre foi voltada para o lado machista e dominador do homem, motivo este
que eles toleravam a existência da união com intuito de preservar a visão de um
amor dominador e agressivo entre os homens romanos.

Por longo período de tempo, a homossexualidade foi vista e considerada


cientificamente com o uma doença, mas com a evolução e desapego à
discriminação criada em torno destas relações passou-se a entender que se trata de
uma orientação sexual, ou de forma mais adequada, um simples jeito de ser.

A sociedade passou por sua evolução natural dos tempos, com isto a família
passa a ser base, a célula central da sociedade, levando o direito a atender todos os
anseios da sociedade. Simultaneamente as uniões homoafetivas passaram a ser
cada vez mais frequentes e, resultando na necessidade de regulamentação destas
uniões.

Constituir família é um direito assegurado à sociedade em um todo, sendo


assim poderia a sociedade, o Estado permitir que as uniões homoafetivas
adormecessem em um status de mera sociedade de fato, sem seus direitos
40

igualitários, pois este nunca foi o intuito das pessoas do mesmo sexo que se unem
com base na afetividade, no amor, companheirismo, cumplicidade e acima de tudo
com o interesse de constituir suas famílias, serem reconhecidos perante a sociedade
e acima de tudo, perante a legislação pátria. Visto que tais uniões são públicas,
duradouras e compõe uma comunhão de vida afetiva, o que torna impossível negar
que sejam entidades familiares.

Ainda que alguns doutrinadores reconheçam as uniões homoafetivas, como


entidades familiares, justo se fez a luta desta sociedade de fato em buscar com que
a jurisprudência também preenchesse a lacuna que existia na legislação, para a
geração de efeitos jurídicos a essa imprescindível proteção do Estado, amparados
por uma legislação. É direito de todos quanto à vontade e necessidade de constituir
família, seja formada por casal heterossexual ou homossexual, e com isto torna-se
necessário um consenso pacífico no campo do direito de família, assegurando
juridicamente as uniões homoafetivas em um status de núcleo familiar.

Aspectos importantes acompanharam a luta pelo direito ao reconhecimento da


união homoafetiva na sociedade e principalmente para que existisse este consenso:

Abolição de preconceitos, em relação à pessoa homossexual – o


que já vem paulatinamente ocorrendo, visto que todos os anos, em
vários estados do país, em especial no estado de São Paulo é
realizada a Parada Gay. Estatisticamente o número de simpatizantes
que participam da festa, em prol da diversidade sexual e do
reconhecimento legal, tem aumentado de maneira considerável a cada
ano;

Pacificação jurisprudencial – Foram cada vez mais frequentes as


decisões que reconheciam a união entre pessoas do mesmo sexo;

Reconhecimento doutrinário – com a aceitação da sociedade


massificada e, a pacificação jurisprudencial, o reconhecimento
doutrinário torna-se consequência, respeitados doutrinadores
passaram a expor para sociedade através de livros, artigos,
41

enfatizando que esta união era de fato uma entidade familiar, não
tendo nada que pudesse negar seu reconhecimento.

 Projeto de Lei que tinha por objetivo disciplinar a união civil


entre pessoas do mesmo sexo, concedendo o tão almejado status de
núcleo ou entidade familiar. Mas devido a intrigas partidárias,
constantemente destacadas pela mídia, em consequência de crenças
religiosas, tais projetos ficaram a mercê de aprovação levando ao
descaso os anseios por respeito que a sociedade LGBT buscava.

Cumpre esclarecer que a luta sempre foi na questão de existir a necessidade


de uma legislação que ampare as uniões entre pessoas do mesmo sexo, as intrigas
partidárias devem ser deixadas de lado e, aos que discutem crenças religiosas, cabe
entender que Direito e religião são duas coisas bem distintas.

No entanto, apesar de anos a fio, a luta não parou, pois as entidades


envolvidas sempre se basearam que o Estado tem a função de resguardar os
anseios da sociedade composta por heterossexuais e homossexuais e, ao legislador
cabe à função de elaborar leis para preencherem as lacunas da legislação brasileira.

Sintetizando, o intuito desta pesquisa não era somente o casamento de


pessoas do mesmo sexo, mas sim que houvesse a proteção legal para as uniões
homoafetivas, conferindo direitos e deveres aos seus integrantes, assim como em
qualquer outra espécie de entidade familiar. Enfim, a família é direito assegurado a
todos, e a base da sociedade, portanto, a união entre pessoas do mesmo sexo
também merece e mereceu a tão requisitada especial proteção do Estado.
REFERÊNCIAS

BRANDÃO, Débora Vanessa Caús. Parcerias Homossexuais: Aspectos Jurídicos.


São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Sociologia Jurídica. 11ª. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2007.

DIAS, Maria Berenice. União Homoafetiva: o preconceito & a justiça 5ª. ed. rev.
Atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

__________________. Manual de Direito das Famílias. 8ª. ed. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2011.

DINIZ, Maria Helena. Manual de direito civil. Direito de Família. São Paulo: Saraiva
2011.

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil Brasileiro: direito de família. 28ª. ed. São Paulo:
Saraiva, 2004.

SUNG, Jung Mo. Conversando sobre ética e sociedade. Petrópolis: Vozes, 2002.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil Brasileiro: direito de família. 11ª. ed. São
Paulo: Atlas, 2011.(coleção direito civil v. 6)
43

VECCHIATTI, Paulo Roberto Lotti. Manual da homoafetividade: da possibilidade


jurídica do casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos.
Rio de Janeiro: Forense: São Paulo: MÉTODO, 2008.

Documentos eletrônicos

Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/24686-resolucao-que-disciplina-a-


atuacao-dos-cartorios-no-casamento-gay-entra-em-vigor-amanha>. Acesso em:
17/05/2013.

Disponível em: http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/resol. Acesso em: 17/05/2013.


ANEXO

Anexo A – Projeto de Lei Nº 2.285/2007

(Do Dep. Sérgio Barradas Carneiro)

Dispõe sobre o Estatuto das Famílias.

TÍTULO I - DAS DISPOSIÇÕES GERAIS............................................... arts. 1º a 9º

TÍTULO II - DAS RELAÇÕES DE PARENTESCO................................ arts. 10 a 14

TÍTULO III - DAS ENTIDADES FAMILIARES..........................................arts. 15 a 69

CAPÍTULO I - DAS DISPOSIÇÕES COMUNS................................... arts. 15 a 20

CAPÍTULO II - DO CASAMENTO....................................................... arts. 21 a 62

SEÇÃO I - DA CAPACIDADE PARA O CASAMENTO............................ art. 23


45

SEÇÃO II - DOS IMPEDIMENTOS.................................................. arts. 24 a 25

SEÇÃO III - DAS PROVAS DO CASAMENTO................................ arts. 26 a 27

SEÇÃO IV - DA VALIDADE DO CASAMENTO............................... arts. 28 a 34

SEÇÃO V - DOS EFEITOS DO CASAMENTO................................ arts. 35 a 37

SEÇÃO VI - DOS REGIMES DE BENS ........................................... arts. 38 a 53

SUBSEÇÃO I - DISPOSIÇÕES COMUNS.................................. arts. 38 a 44

SUBSEÇÃO II - DO REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL .......... arts. 45 a 50

SUBSEÇÃO III - DO REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL arts. 51 a 52


SUBSEÇÃO IV - DO REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS ................. art. 53

SEÇÃO VII - DO DIVÓRCIO E DA SEPARAÇÃO ............................. art. 54 a 62

SUBSEÇÃO I - DO DIVÓRCIO .................................................... arts. 54 a 56

SUBSEÇÃO II - DA SEPARAÇÃO ............................................... arts. 57 a 58

SUBSEÇÃO III - DISPOSIÇÕES COMUNS AO DIVÓRCIO E À


SEPARAÇÃO............................................................................................ arts. 59 a 62

CAPÍTULO III - DA UNIÃO ESTÁVEL .................................................. arts. 63 a 67

CAPÍTULO IV - DA UNIÃO HOMOAFETIVA ................................................. art. 68

CAPÍTULO V - DA FAMÍLIA PARENTAL ....................................................... art. 69

TÍTULO IV - DA FILIAÇÃO ................................................................... arts. 70 a 103

CAPÍTULO I - DISPOSIÇÕES GERAIS............................................... arts. 70 a 77

CAPÍTULO II - DA ADOÇÃO................................................................ arts. 78 a 86


46

CAPÍTULO III - DA AUTORIDADE PARENTAL................................... arts. 87 a 95

CAPÍTULO IV - DA GUARDA DOS FILHOS E DO DIREITO DE


CONVIVÊNCIA...............................................................................................................
.. arts. 96 a 103

TÍTULO V - DA TUTELA E DA CURATELA ....................................... arts. 104 a 114

CAPÍTULO I - DA TUTELA ............................................................... arts. 104 a 108

CAPÍTULO II - DA CURATELA ........................................................ arts. 109 a 114

TÍTULO VI - DOS ALIMENTOS .......................................................... arts. 115 a 121

TÍTULO VII - DO PROCESSO E DO PROCEDIMENTO.................... arts. 122 a 266

CAPÍTULO I - DISPOSIÇÕES GERAIS........................................... arts. 122 a 137

CAPÍTULO II - DO PROCEDIMENTO PARA O CASAMENTO....... arts. 138 a 163

SEÇÃO I - DA HABILITAÇÃO...................................................... arts. 138 a 145

SEÇÃO II - DO SUPRIMENTO DE CONSENTIMENTO PARA O CASAMENTO

...................................................................................................................art. 146

SEÇÃO III - DA CELEBRAÇÃO ................................................... arts. 147 a 152

SEÇÃO IV - DO REGISTRO DO CASAMENTO .......................... arts. 153 a 154

SEÇÃO V - DO REGISTRO DO CASAMENTO RELIGIOSO PARA


EFEITOS CIVIS ............................................................ arts. 155 a 161

SEÇÃO VI - DO CASAMENTO EM IMINENTE RISCO DE MORTE......arts. 162

a 163

CAPÍTULO III - DO RECONHECIMENTO DA UNIÃO ESTÁVEL


E DA UNIÃO HOMOAFETIVA............................. arts. 164 a 167

CAPÍTULO IV - DA DISSOLUÇÃO DA ENTIDADE FAMILIAR........ arts. 168 a 177


47

SEÇÃO II - DA AÇÃO DE DIVÓRCIO.......................................... arts. 168 a 172

SEÇÃO I - DA SEPARAÇÃO....................................................... arts. 173 a 177

CAPÍTULO V - DOS ALIMENTOS................................................... arts. 178 a 207

SEÇÃO I - DA AÇÃO DE ALIMENTOS........................................ arts. 178 a 192

SEÇÃO II - DA COBRANÇA DOS ALIMENTOS.......................... arts. 193 a 207

CAPÍTULO VI - DA AVERIGUAÇÃO DA FILIAÇÃO ........................ arts. 208 a 210

CAPÍTULO VII - DA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE..... arts. 211

a 219

CAPÍTULO VIII - DA AÇÃO DE INTERDIÇÃO................................. arts. 220 a 243

CAPÍTULO IX - DOS PROCEDIMENTOS DOS ATOS EXTRAJUDICIAIS..............

........................................................................................................... arts. 244 a 266

SEÇÃO I - DO DIVÓRCIO.............................................................. arts. 245 a 249

SEÇÃO II - DA SEPARAÇÃO........................................................ arts. 250 a 253

SEÇÃO III - DO RECONHECIMENTO E DA DISSOLUÇÃO DA UNIÃO

ESTÁVEL E HOMOAFETIVA..................................... arts. 254 a 258

SEÇÃO IV - DA CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO...............

......................................................................................................... arts. 259 a 262

SEÇÃO V - DA ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS .................. arts. 263 a 266

TÍTULO VIII - DAS DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS ......... arts. 267 a 274
48

TÍTULO I

DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 1.º Este Estatuto regula os direitos e deveres no âmbito das entidades
familiares.

Art. 2.º O direito à família é direito fundamental de todos.

Art. 3.º É protegida como família toda comunhão de vida instituída com a
finalidade de convivência familiar, em qualquer de suas modalidades.

Art. 4.° Os componentes da entidade familiar devem ser respeitados em sua


integral dignidade pela família, pela sociedade e pelo Estado.

Art. 5.º Constituem princípios fundamentais para a interpretação e aplicação


deste Estatuto a dignidade da pessoa humana, a solidariedade familiar, a igualdade
de gêneros, de filhos e das entidades familiares, a convivência familiar, o melhor
interesse da criança e do adolescente e a afetividade.

Art. 6.º São indisponíveis os direitos das crianças, dos adolescentes e dos
incapazes, bem como os direitos referentes ao estado e capacidade das pessoas.

Art. 7.º É dever da sociedade e do Estado promover o respeito à diversidade


de orientação sexual.

Art. 8.º A lei do país em que tiver domicílio a entidade familiar determina as
regras dos direitos das famílias.

Parágrafo único. Não se aplica a lei estrangeira se esta contrariar os


princípios fundamentais do direito brasileiro das famílias.

Art. 9.° Os direitos e garantias expressos nesta lei não excluem outros
decorrentes do regime e dos princípios adotados na Constituição, nos tratados e
convenções internacionais.

TÍTULO II
49

DAS RELAÇÕES DE PARENTESCO

Art. 10. O parentesco resulta da consanguinidade, da sócio afetividade ou da


afinidade.

Art. 11. São parentes em linha reta as pessoas que estão umas para com as
outras na relação de ascendentes e descendentes.

Art. 12. São parentes em linha colateral ou transversal, até o quarto grau, as
pessoas provenientes de um só tronco, sem descenderem uma da outra.

Art. 13. Contam-se, na linha reta, os graus de parentesco pelo número de


gerações, e, na colateral, também pelo número delas, subindo de um dos parentes
até ao ascendente comum, e descendo até encontrar o outro parente.

Art. 14. Cada cônjuge ou convivente é aliado aos parentes do outro pelo
vínculo da afinidade.

§ 1.° O parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos


descendentes e aos irmãos do cônjuge ou convivente.

§ 2.° A afinidade se extingue com a dissolução do casamento ou da união


estável, exceto para fins de impedimento à formação de entidade familiar.

TÍTULO III DAS ENTIDADES FAMILIARES

CAPÍTULO I
DAS DISPOSIÇÕES COMUNS

Art. 15. É dever da entidade familiar assegurar à criança, ao adolescente e


ao idoso que a integrem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a
salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade
e opressão.
50

Art. 16. As pessoas integrantes da entidade familiar têm o dever recíproco de


assistência, amparo material e moral, sendo obrigadas a concorrer, na proporção de
suas condições financeiras e econômicas, para a manutenção da família.

Art. 17. Qualquer pessoa integrante da entidade familiar tem legitimidade


para defendê-la em juízo ou fora dele.

Art. 18. A gestão dos interesses comuns da entidade familiar incumbe aos
integrantes civilmente capazes, de comum acordo, tendo sempre em conta o
interesse de todos os que a compõem.

Art. 19. A escolha do domicílio da entidade familiar é decisão conjunta das


pessoas que a integram, observados os interesses de todo o grupamento familiar.
Parágrafo único. Admite-se a pluralidade domiciliar para as entidades familiares.

Art. 20. O planejamento familiar é de livre decisão da entidade familiar,


competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e financeiros para o exercício
desse direito, vedado qualquer tipo de coerção por parte de instituições privadas ou
públicas.

CAPÍTULO II
DO CASAMENTO

Art. 21. O casamento é civil e produz efeitos a partir do momento em que os


nubentes manifestam a vontade de estabelecer o vínculo conjugal e a autoridade os
declara casados.

Art. 22. O casamento religioso submete-se aos mesmos requisitos exigidos


para o casamento civil e produz efeitos a partir da data de sua celebração.

Parágrafo único. O casamento religioso, para ter validade e equiparar-se ao


casamento civil, precisa ser levado a registro no prazo de 90 (noventa) dias de sua
celebração.

SEÇÃO I
DA CAPACIDADE PARA O CASAMENTO
51

Art. 23. Para o casamento das pessoas relativamente incapazes é


necessária autorização de ambos os pais, ou de seus representantes legais.

§ 1.° Havendo divergência entre os pais é assegurado a qualquer deles


recorrer a juízo.

§ 2.° Até a celebração do casamento os pais ou representantes legais


podem revogar justificadamente a autorização.

§ 3.° A denegação da autorização, quando injusta, pode ser suprida


judicialmente.

SEÇÃO II
DOS IMPEDIMENTOS

Art. 24. Não podem casar:

I - os absolutamente incapazes;

II - os parentes na linha reta sem limitação de grau;

III - os parentes na linha colateral até o terceiro grau, inclusive;

IV - os parentes por afinidade em linha reta;

V - as pessoas casadas.

Art. 25. Os impedimentos podem ser opostos, até o momento da celebração


do casamento, por qualquer pessoa.

Parágrafo único. Se o celebrante, ou o oficial de registro, tiver conhecimento


da existência de algum impedimento, será obrigado a declará-lo.

SEÇÃO III
DAS PROVAS DO CASAMENTO

Art. 26. O casamento prova-se pela certidão do registro civil.

§ 1.° Justificada a falta ou perda do registro, é admissível qualquer outra


prova.
52

§ 2.° O registro é levado a efeito no cartório do respectivo domicílio, ou, em


sua falta, no cartório da cidade em que passarem a residir.

§ 3.° Na dúvida entre as provas favoráveis e contrárias, julga-se pelo


casamento, se os cônjuges, cujo casamento se impugna, vivam ou viveram na
posse do estado de casados.

Art. 27. Quando a prova da celebração legal do casamento resultar de


processo judicial, o registro da sentença no cartório do registro civil produz efeitos
desde a data do casamento.

SEÇÃO IV
DA VALIDADE DO CASAMENTO

Art. 28. É nulo o casamento contraído:

I - pela pessoa absolutamente incapaz;

II - com infringência aos impedimentos legais.

III - por procurador, se revogada a procuração antes da celebração do


casamento.

Art. 29. A ação de nulidade do casamento pode ser promovida por qualquer
interessado ou pelo Ministério Público.

Art. 30. É anulável o casamento:

I - dos relativamente incapazes;

II - por erro essencial quanto à pessoa do outro cônjuge, anterior ao


casamento;

III - em virtude de coação;

IV - do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o


consentimento, no momento da celebração;
53

V - por incompetência da autoridade celebrante, salvo se tiver havido


registro do casamento.

Art. 31. O casamento do relativamente incapaz, quando não autorizado por


seu representante legal, pode ser anulado em até 180 (cento e oitenta) dias:

I - pelo menor, após adquirir maioridade;

II - por seus representantes legais a partir da celebração do casamento.

Art. 32. Não se anula o casamento quando os representantes legais do


incapaz assistiram a celebração ou, por qualquer modo, manifestaram sua
aprovação.

Art. 33. O prazo para ser intentada a ação de anulação do casamento é de


180 (cento e oitenta) dias, a contar da data da celebração.

Art. 34. Embora anulável ou mesmo nulo, o casamento em relação aos


cônjuges e a terceiros produz todos os efeitos até o trânsito em julgado da sentença.
Parágrafo único. A nulidade ou anulação do casamento dos pais não produz efeitos
em relação aos filhos.

SEÇÃO V
DOS EFEITOS DO CASAMENTO

Art. 35. O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na


igualdade de direitos e deveres dos cônjuges.

Art. 36. As relações pessoais entre os cônjuges devem obedecer aos


deveres de lealdade, respeito e assistência, tendo ambos responsabilidade pela
guarda, sustento e educação dos filhos.

Art. 37. A direção da sociedade conjugal é exercida, pelos cônjuges, em


colaboração, sempre no interesse da família e dos filhos.
54

§ 1.° Os cônjuges são obrigados a concorrer, na proporção de seus bens e


dos rendimentos do seu trabalho, para o sustento da família e a educação dos filhos,
qualquer que seja o regime de bens.

§ 2.° Se qualquer dos cônjuges estiver impedido ou inabilitado, o outro


exerce com exclusividade a direção da família, cabendo-lhe a administração dos
bens.

SEÇÃO VI
DOS REGIMES DE BENS
SUBSEÇÃO I
DISPOSIÇÕES COMUNS

Art. 38. Podem os nubentes estipular, quanto aos seus bens, o que lhes
aprouver.

§ 1.º Os nubentes, mediante declaração ao oficial de registro civil, podem


escolher qualquer dos regimes de bens estabelecidos neste Estatuto.

§ 2.º Não havendo declaração, vigora o regime da comunhão parcial de


bens.

§ 3.° Mediante escritura pública os nubentes podem estipular regime de


bens não previsto neste Estatuto, desde que não contrarie suas regras e princípios.

§ 4.º O regime de bens começa a produzir efeitos na data do casamento e


cessa com o fim da comunhão de vida.

§ 5.° Com a separação de fato cessa a responsabilidade de cada um dos


cônjuges para com as dívidas que vierem a ser contraídas pelo outro.

Art. 39. É admissível a alteração do regime de bens, mediante escritura


pública, promovida por ambos os cônjuges, assistidos por advogado ou defensor
público ressalvados os direitos de terceiros.

§ 1.º A alteração não dispõe de efeito retroativo.


55

§ 2.º A alteração produz efeito a partir da averbação no assento de


casamento.

Art. 40. Independentemente do regime de bens, qualquer dos cônjuges pode


livremente:

I - administrar e alienar os bens particulares, exceto os bens móveis que


guarnecem a residência da família;

II - praticar os atos de disposição e administração necessários ao


desempenho de sua profissão;

III - reivindicar os bens comuns, doados, gravados ou transferidos pelo outro


cônjuge sem o seu consentimento;

IV - demandar a resolução dos contratos de fiança e doação, realizados pelo


outro cônjuge.

§ 1.° As ações fundadas nos incisos III e IV competem ao cônjuge


prejudicado e a seus herdeiros.

§ 2.° O terceiro prejudicado tem direito regressivo contra o cônjuge que


realizou o negócio jurídico, ou contra os seus herdeiros.

Art. 41. Pode o cônjuge, independentemente da autorização do outro:

I - comprar, ainda que a crédito, o necessário à manutenção da família;

II - obter, por empréstimo, as quantias que tais aquisições possam exigir.

Parágrafo único. As dívidas contraídas para os fins deste artigo obrigam


solidariamente ambos os cônjuges.

Art. 42. Nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no
regime da separação:

I - vender, doar, permutar, dar em pagamento, ceder ou gravar de ônus real


os bens comuns;
56

II - pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos;

III - prestar fiança.

Parágrafo único. Cabe o suprimento judicial do consentimento quando um


dos cônjuges o denegue sem motivo justo, ou lhe seja impossível concedê-lo.

Art. 43. A anulação dos atos praticados sem outorga, sem consentimento, ou
sem suprimento do juiz, pode ser demandada pelo cônjuge a quem cabia concedê-
la, ou por seus herdeiros, até 1 (um) ano da homologação da partilha.

Art. 44. Quando um dos cônjuges não puder exercer a gestão dos bens que
lhe incumbe, cabe ao outro:

I - gerir os bens, comuns ou não;

II - alienar os bens móveis comuns;

III - alienar os imóveis e os bens móveis, comuns ou não, mediante


autorização judicial.

SUBSEÇÃO II
DO REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL

Art. 45. No regime de comunhão parcial, comunicam-se:

I - os bens adquiridos na constância do casamento, inclusive as economias


derivadas de salários, indenizações, verbas trabalhistas rescisórias e rendimentos
de um só dos cônjuges;

II - os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho


ou despesa;

III - os bens recebidos por doação, herança ou legado, em favor de ambos


os cônjuges;

IV - as pertenças e as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;


57

V - os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge,


percebidos na constância do casamento, ou pendentes quando cessada a vida em
comum.

Art. 46. Excluem-se da comunhão:

I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na


constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;

II - os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos


cônjuges ou em sub-rogação dos bens particulares;

III - as obrigações anteriores ao casamento, salvo se reverterem em proveito


comum;

IV - as obrigações provenientes de ato ilícito, salvo reversão em proveito do


casal;

V - os bens cuja aquisição tiver por título causa anterior ao casamento;

VI - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão.

§ 1.° Os instrumentos de profissão incluem-se na comunhão quando houver


a participação do outro na sua aquisição.

§ 2.° Presumem-se adquiridos na constância do casamento os bens móveis,


quando não provado que o foram em data anterior.

Art. 47. A gestão do patrimônio comum compete a ambos os cônjuges.

§ 1.o É necessária a anuência de ambos os cônjuges para os atos, a título


gratuito, que impliquem cessão do uso ou gozo dos bens comuns.

§ 2.o Em caso de malversação dos bens comuns, ou de outra hipótese


similar, pode ser atribuída a gestão a apenas um dos cônjuges ou antecipada a
partilha.
58

Art. 48. Os bens da comunhão respondem pelas obrigações contraídas por


qualquer dos cônjuges para atender aos encargos da família, às despesas de gestão
e às decorrentes de imposição legal.

Art. 49. A gestão dos bens constitutivos do patrimônio particular compete ao


cônjuge proprietário, salvo estipulação diversa.

Art. 50. As dívidas, contraídas por qualquer dos cônjuges na administração e


em benefício de seus bens particulares, não obrigam os bens comuns.

Parágrafo único. As dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges obrigam


os bens do outro na razão do proveito que houver auferido.

SUBSEÇÃO III
DO REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL

Art. 51. O regime de comunhão universal importa a comunicação de todos


os bens presentes e futuros dos cônjuges e de suas dívidas.

Art. 52. São excluídos da comunhão:

I - os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os


sub-rogados em seu lugar;

II - as dívidas anteriores ao casamento, salvo se reverterem em proveito


comum;

III - as obrigações provenientes de ato ilícito;

IV - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão.

§ 1.° Os instrumentos de profissão entram na comunhão se foram adquiridos


com esforço do outro cônjuge.

§ 2.° A incomunicabilidade não se estende aos frutos, quando se percebam


ou vençam durante o casamento.

SUBSEÇÃO IV
DO REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS
59

Art. 53. O regime da separação de bens importa incomunicabilidade


completa dos bens adquiridos antes e durante o casamento.

Parágrafo único. Os bens ficam na administração exclusiva do respectivo


cônjuge, que os poderá livremente alienar ou gravar de ônus real.

SEÇÃO VII
DO DIVÓRCIO E DA SEPARAÇÃO
SUBSEÇÃO I
DO DIVÓRCIO

Art. 54. O divórcio dissolve o casamento civil.

§ 1.° O divórcio direto se dá após a separação de fato por mais de 2 (dois)


anos.

§ 2.° A separação de fato se configura quando cessa a convivência entre os


cônjuges, ainda que residindo sob o mesmo teto.

Art. 55. O divórcio pode ser litigioso ou consensual.

Parágrafo único. O divórcio consensual pode ser judicial ou extrajudicial.

Art. 56. A separação de fato põe termo aos deveres conjugais e ao regime
de bens.

SUBSEÇÃO II
DA SEPARAÇÃO

Art. 57. É facultado aos cônjuges pôr fim à sociedade conjugal, mediante
separação judicial ou extrajudicial.

§ 1.° A iniciativa da separação pode ser de um ou de ambos os cônjuges.

§ 2.° A separação de corpos pode ser deferida pelo juiz antes ou no curso do
processo.

§3.° A separação de corpos põe termo aos deveres conjugais e ao regime de


bens.
60

Art. 58. Após 1 (um) ano da separação de corpos ou da separação judicial


ou extrajudicial, o divórcio pode ser requerido por um ou por ambos os cônjuges.

SUBSEÇÃO III
DISPOSIÇÕES COMUNS AO DIVÓRCIO E À SEPARAÇÃO

Art. 59. No divórcio e na separação são necessário:

I - definir a guarda e a convivência com os filhos menores ou incapazes;

II - dispor acerca dos alimentos;

III - deliberar sobre a manutenção ou alteração do nome adotado no


casamento; e

IV - descrever e partilhar os bens.

Parágrafo único. A partilha de bens pode ser levada a efeito posteriormente.

Art. 60. O divórcio e a separação não modificam os direitos e deveres dos


pais em relação aos filhos.

Art. 61. O pedido de divórcio ou de separação compete exclusivamente aos


cônjuges.

Parágrafo único. Quando um dos cônjuges estiver acometido de doença


mental ou transtorno psíquico, somente é possível o divórcio ou a separação judicial,
devendo o incapaz ser representado por curador, ascendente ou irmão.

Art. 62. O divórcio e a separação consensuais podem ser realizados por


escritura pública, com a assistência de advogado ou defensor público:

I - não tendo o casal filhos menores ou incapazes; ou

II - quando as questões relativas aos filhos menores ou incapazes já se


encontrarem judicialmente definidas.

CAPÍTULO III
DA UNIÃO ESTÁVEL
61

Art. 63. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem
e a mulher, configurada na convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida
com o objetivo de constituição de família.

Parágrafo único. A união estável constitui estado civil de convivente,


independentemente de registro, e deve ser declarado em todos os atos da vida civil.

Art. 64. A união estável não se constitui:

I - entre parentes na linha reta, sem limitação de grau;

II - entre parentes na linha colateral até o terceiro grau, inclusive;

III - entre parentes por afinidade em linha reta.

Parágrafo único. A união formada em desacordo aos impedimentos legais


não exclui os deveres de assistência e a partilha de bens.

Art. 65. As relações pessoais entre os conviventes obedecem aos deveres


de lealdade, respeito e assistência recíproca, bem como o de guarda, sustento e
educação dos filhos.

Art. 66. Na união estável, os conviventes podem estabelecer o regime


jurídico patrimonial mediante contrato escrito.

§ 1.º Na falta de contrato escrito aplica-se às relações patrimoniais, no que


couber, o regime da comunhão parcial de bens.

§ 2.º A escolha do regime de bens não tem efeito retroativo.

Art. 67. A união estável pode converter-se em casamento, mediante pedido


formulado pelo casal ao oficial de registro civil, no qual declarem que não têm
impedimentos para casar e indiquem o regime de bens que passam a adotar,
dispensada a celebração.

Parágrafo único. Os efeitos da conversão se produzem a partir da data do


registro do casamento.
62

CAPÍTULO IV
DA UNIÃO HOMOAFETIVA

Art. 68. É reconhecida como entidade familiar a união entre duas pessoas de
mesmo sexo, que mantenham convivência pública, contínua, duradoura, com
objetivo de constituição de família, aplicando-se, no que couber, as regras
concernentes à união estável.

Parágrafo único. Dentre os direitos assegurados, incluem-se:

I - guarda e convivência com os filhos;

II - a adoção de filhos;

III - direito previdenciário;

IV - direito à herança.

CAPÍTULO V
DA FAMÍLIA PARENTAL

Art. 69. As famílias parentais se constituem entre pessoas com relação de


parentesco entre si e decorrem da comunhão de vida instituída com a finalidade de
convivência familiar.

§ 1.° Família monoparental é a entidade formada por um ascendente e seus


descendentes, qualquer que seja a natureza da filiação ou do parentesco.

§ 2.° Família pluriparental é a constituída pela convivência entre irmãos, bem


como as comunhões afetivas estáveis existentes entre parentes colaterais.

TÍTULO IV
DA FILIAÇÃO

CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
63

Art. 70. Os filhos, independentemente de sua origem, têm os mesmos


direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações e práticas discriminatórias.

Art. 71. A filiação prova-se pelo registro de nascimento.

§ 1.º Os pais devem registrar os filhos no prazo de 30 (trinta) dias do


nascimento.

§ 2.º Também se prova a filiação por qualquer modo admissível em direito,


quando houver posse de estado de filho.

Art. 72. Os filhos não registrados podem ser reconhecidos pelos pais,
conjunta ou separadamente.

§ 1.º O reconhecimento dos filhos é feito:

I - por documento particular ou escritura pública;

II - por testamento, ainda que incidentalmente manifestado;

III - por manifestação direta e expressa perante o juiz, mesmo que o


reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.

§ 2.º O ato de reconhecimento deve ser levado ao registro de nascimento.

§ 3.° O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser posterior


ao seu falecimento, se ele deixar descendentes.

§ 4.° O reconhecimento não pode ser revogado, nem mesmo quando feito
em testamento.

§ 5.º São ineficazes a condição e o termo apostos ao ato de


reconhecimento.

Art. 73. Presumem-se filhos:

I - os nascidos durante a convivência dos genitores à época da concepção;

II - os havidos por fecundação artificial homóloga, desde que a implantação


do embrião tenha ocorrido antes do falecimento do genitor;
64

III - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que realizada com
prévio consentimento livre e informado do marido ou do convivente, manifestado por
escrito, e desde que a implantação tenha ocorrido antes do seu falecimento.

Art. 74. O filho registrado ou reconhecido pode impugnar a paternidade,


desde que não caracterizada a posse do estado de filho em relação àquele que o
registrou ou o reconheceu.

Parágrafo único. O filho maior não pode ser registrado ou reconhecido


voluntariamente sem o seu consentimento.

Art. 75. O filho não registrado ou não reconhecido pode, a qualquer tempo,
investigar a paternidade ou a maternidade, biológica ou socioafetiva.

Parágrafo único. A sentença que julgar procedente a investigação produz os


mesmos efeitos do reconhecimento voluntário.

Art. 76. Cabe ao marido, ao convivente ou à mulher o direito de impugnar a


paternidade ou a maternidade que lhe for atribuída no registro civil.

§ 1.º Impugnada a filiação, se sobrevier a morte do autor os herdeiros


podem prosseguir na ação.

§ 2.° Não cabe a impugnação da paternidade ou maternidade:

I - em se tratando de inseminação artificial heteróloga, salvo alegação de


dolo ou fraude;

II - caso fique caracterizada a posse do estado de filho.

Art. 77. É admissível a qualquer pessoa, cuja filiação seja proveniente de


adoção, filiação sócio afetiva, posse de estado ou de inseminação artificial
heteróloga, o conhecimento de seu vínculo genético sem gerar relação de
parentesco.

Parágrafo único. O ascendente genético pode responder por subsídios


necessários à manutenção do descendente, salvo em caso de inseminação artificial
heteróloga.
65

CAPÍTULO II
DA ADOÇÃO

Art. 78. A adoção deve atender sempre ao melhor interesse do adotado e é


irrevogável.

Parágrafo único. A adoção de crianças e adolescentes é regida por lei


especial, observadas as regras e princípios deste Estatuto.

Art. 79. A adoção atribui a situação de filho ao adotado, desligando-o de


qualquer vínculo com os pais e parentes consangüíneos, salvo quanto aos
impedimentos para o casamento e a união estável.

Parágrafo único. Mantêm-se os vínculos de filiação entre o adotado e o


cônjuge, companheiro ou parceiro do adotante e respectivos parentes.

Art. 80. Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando.

Art. 81. Tratando-se de grupo de irmãos devem prioritariamente ser


adotados por uma mesma família, preservados os vínculos fraternos.

Parágrafo único. Somente é admitido o desmembramento mediante parecer


técnico indicativo da inexistência de laços afetivos entre os irmãos, ou se a medida
atender aos seus interesses.

Art. 82. A morte dos adotantes não restabelece o parentesco anterior.

Art. 83. O adotado pode optar pela substituição ou adição do sobrenome do


adotante.

Art. 84. As relações de parentesco se estabelecem entre o adotado e o


adotante e entre os parentes deste.

Art. 85. A adoção obedece a processo judicial.

§ 1.º A adoção pode ser motivadamente impugnada pelos pais.

§ 2.º É indispensável a concordância do adotando.


66

Art. 86. Os efeitos da adoção começam a partir do trânsito em julgado da


sentença, exceto se o adotante vier a falecer no curso do procedimento, caso em
que terá força retroativa à data do óbito.

CAPÍTULO III
DA AUTORIDADE PARENTAL

Art. 87. A autoridade parental deve ser exercida no melhor interesse dos
filhos.

§ 1.° Compete a autoridade parental aos pais; na falta ou impedimento de


um deles, o outro a exerce com exclusividade.

§ 2.° O filho tem o direito de ser ouvido, nos limites de seu discernimento e
na medida de seu processo educacional.

§ 3.° Aos pais incumbe o dever de assistência moral e material, guarda,


educação e formação dos filhos menores.

Art. 88. A dissolução da entidade familiar não altera as relações entre pais e
filhos.

Art. 89. Compete aos pais:

I - representar os filhos até 16 (dezesseis) anos e assisti-los, após essa


idade, até atingirem a maioridade;

II - nomear-lhes tutor por testamento ou documento particular.

Art. 90. Extingue-se a autoridade parental:

I - pela morte dos pais ou do filho;

II - pela emancipação;

III - pela maioridade;

IV - pela adoção;

V - por decisão judicial.


67

Art. 91. Constituindo os pais nova entidade familiar os direitos e deveres


decorrentes da autoridade parental são exercidos com a colaboração do novo
cônjuge ou convivente ou parceiro.

Parágrafo único. Cada cônjuge, convivente ou parceiro deve colaborar de


modo apropriado no exercício da autoridade parental, em relação aos filhos do outro,
e de o representar quando as circunstâncias exigirem.

Art. 92. Os pais, no exercício da autoridade parental, são gestores dos bens
dos filhos.

Parágrafo único. Não podem os pais alienar, ou gravar de ônus real os


imóveis dos filhos, nem contrair, em nome deles, obrigações que ultrapassem os
limites da simples administração, salvo por necessidade ou evidente interesse da
prole, mediante prévia autorização judicial.

Art. 93. Sempre que no exercício da autoridade parental colidir o interesse


dos pais com o do filho, a requerimento deste ou do Ministério Público, o juiz deve
nomear-lhe curador especial.

Art. 94. Perde por ato judicial a autoridade parental aquele que não a exercer
no melhor interesse do filho, em casos como assédio ou abuso sexual, violência
física e abandono material, moral ou afetivo.

§1.° A perda da autoridade parental não implica a cessação da obrigação


alimentar dos pais e nem afeta os direitos sucessórios do filho.

§2.° Os pais que perdem a autoridade parental também perdem os direitos


sucessórios em relação ao filho.

Art. 95. É possível, no melhor interesse do filho, o restabelecimento da


autoridade parental por meio de decisão judicial.

CAPÍTULO IV
DA GUARDA DOS FILHOS E DO DIREITO À CONVIVÊNCIA

Art. 96. A guarda dos filhos e o direito à convivência devem ser definidos nos
casos de:
68

I - separação dos pais;

II - divórcio;

III - invalidade do casamento;

IV - dissolução da união estável e da união homoafetiva;

V - de os pais não coabitarem.

Art. 97. Não havendo acordo entre os pais, deve o juiz decidir,
preferencialmente, pela guarda compartilhada, salvo se o melhor interesse do filho
recomendar a guarda exclusiva, assegurado o direito à convivência do não-guardião.

Parágrafo único. Antes de decidir pela guarda compartilhada, sempre que


possível, deve ser ouvida equipe multidisciplinar e utilizada a mediação familiar.

Art. 98. Os filhos não podem ser privados da convivência familiar com ambos
os pais, quando estes constituírem nova entidade familiar.

Art. 99. O não-guardião pode fiscalizar o exercício da guarda, acompanhar o


processo educacional e exigir a comprovação da adequada aplicação dos alimentos
pagos.

Art. 100. O direito à convivência pode ser estendido a qualquer pessoa com
quem a criança ou o adolescente mantenha vínculo de afetividade.

Art. 101. Quando a guarda é exercida exclusivamente por um dos genitores


é indispensável assegurar o direito de convivência com o não-guardião.

Parágrafo único. O direito à convivência familiar pode ser judicialmente


suspenso ou limitado quando assim impuser o melhor interesse da criança.

Art. 102. As disposições relativas à convivência familiar dos filhos menores


estendem-se aos maiores incapazes.

Art. 103. Verificando que os filhos não devem permanecer sob a guarda do
pai ou da mãe, o juiz deve deferir a guarda a quem revele compatibilidade com a
69

natureza da medida, de preferência levando em conta o grau de parentesco e


relação de afetividade.

Parágrafo único. Nesta hipótese deve ser assegurado aos pais o direito à
convivência familiar, salvo se não atender ao melhor interesse da criança.

TÍTULO V
DA TUTELA E DA CURATELA

CAPÍTULO I
DA TUTELA

Art. 104. As crianças e os adolescentes são postos em tutela quando a


nomeação for feita pelos pais em testamento ou documento particular, produzindo
efeitos com a morte ou perda da autoridade parental.

Art. 105. É ineficaz a nomeação de tutor pelo pai ou pela mãe que, ao tempo
de sua morte, não exercia a autoridade parental.

§ 1.º Nomeado mais de 1 (um) tutor sem indicação de precedência, entende-


se que a tutela foi atribuída ao primeiro, e que os outros lhe sucederão pela ordem
de nomeação.

§ 2.º É possível a instituição de 2 (dois) tutores quando constituem uma


entidade familiar.

Art. 106. Quem institui um menor de idade herdeiro, ou legatário seu, pode
nomear-lhe curador especial para os bens deixados, ainda que o beneficiário se
encontre sob a autoridade parental, ou tutela.

Art. 107. Na falta de tutor nomeado pelos pais ou no caso de recusa, o órfão
deve ser colocado em família substituta nos termos da legislação especial.

Art. 108. O tutor deve se submeter às mesmas regras da autoridade


parental, sob pena de destituição judicial do encargo.
70

CAPÍTULO II
DA CURATELA

Art. 109. Rege-se o instituto da curatela pelo princípio do melhor interesse


do curatelado.

Art. 110. Estão sujeitos à curatela:

I - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário


discernimento para a prática dos atos da vida civil;

II - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir a sua


vontade;

III - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência


mental, tenham discernimento reduzido;

IV - os excepcionais sem desenvolvimento mental completo.

Art. 111. É nomeado curador, preferencialmente:

I - o cônjuge, o convivente ou o parceiro do interdito;

II - o ascendente ou o descendente que se demonstrar mais apto.

Parágrafo único. Na falta das pessoas mencionadas neste artigo, compete


ao juiz a escolha do curador.

Art. 112. Não pode ser curador:

I - quem não tem a livre administração de seus bens;

II - quem tem obrigações para com curatelado, ou direitos contra ele;

III - o inimigo do curatelado;

IV - o condenado por crime contra a família;

V - o culpado de abuso em curatela anterior.


71

Art. 113. Quem esteja impossibilitado ou limitado no exercício regular dos


atos da vida civil, pode requerer que lhe dado curador para cuidar de seus negócios
ou bens.

Parágrafo único. O pedido pode ser formulado por quem tenha legitimidade
para ser nomeado curador.

Art. 114. O curador tem o dever de prestar contas de sua gestão de 2 (dois)
em 2 (dois) anos.

TÍTULO VI
DOS ALIMENTOS

Art. 115. Podem os parentes, cônjuges, conviventes ou parceiros pedir uns


aos outros os alimentos de que necessitem para viver com dignidade e de modo
compatível com a sua condição social.

§ 1.º São devidos os alimentos quando o alimentando não tem bens


suficientes a gerar renda, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença.

§ 2.° Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do


alimentando e dos recursos do alimentante.

§ 3.º Os alimentos devidos aos parentes são apenas os indispensáveis à


subsistência, quando o alimentando der causa à situação de necessidade.

§ 4.° Se houver acordo, o alimentante pode cumprir sua obrigação mediante


o fornecimento de moradia, sustento, assistência à saúde e educação.

Art. 116. O direito a alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a


todos os parentes em linha reta, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau,
uns em falta de outros, e aos irmãos.

Parágrafo único. A maioridade civil faz cessar a presunção de necessidade


alimentar, salvo se o alimentando comprovadamente se encontrar em formação
educacional, até completar 25 (vinte e cinco) anos de idade.
72

Art. 117. Se o parente que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em
condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de
grau imediato.

§ 1.º Sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem


concorrer na proporção dos respectivos recursos.

§ 2.º A responsabilidade alimentar entre parentes tem natureza


complementar quando o parente de grau mais próximo não puder atender
integralmente a obrigação.

Art. 118. Se, fixados os alimentos, sobrevier mudança da situação financeira


do alimentante, ou na do alimentando, pode o interessado requerer a exoneração, a
redução ou majoração do encargo.

Art. 119. A obrigação alimentar transmite-se ao espólio, até o limite das


forças da herança.

Art. 120. O crédito a alimentos é insuscetível de cessão, compensação ou


penhora.

Art. 121. Com o casamento, a união estável ou a união homoafetiva do


alimentando, extingue-se o direito a alimentos.

§ 1.° Com relação ao alimentando, cessa, também, o direito a alimentos, se


tiver procedimento indigno ofensivo a direito da personalidade do alimentante.

§ 2.° A nova união do alimentante não extingue a sua obrigação alimentar.

TÍTULO VII
DO PROCESSO E DO PROCEDIMENTO

CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
73

Art. 122. Os processos nas relações de família orientam-se pelos princípios


da oralidade, celeridade, simplicidade, informalidade, fungibilidade e economia
processual.

Parágrafo único. As ações previstas neste Estatuto têm preferência de


tramitação e julgamento.

Art. 123. As ações decorrentes deste Estatuto são da competência das


Varas de Família e os recursos devem ser apreciados por Câmaras Especializadas
em Direito de Família dos Tribunais de Justiça, onde houver.

§ 1.º Enquanto não instaladas varas e câmaras especializadas, as ações e


recursos serão processados e julgados nas varas e câmaras preferenciais, a serem
indicadas pelos tribunais.

§ 2.º As varas e câmaras especializadas ou com competência preferencial


devem ser dotadas de equipe de atendimento multidisciplinar e de conciliadores.

Art. 124. As ações pertinentes às relações de família podem tramitar em


segredo de justiça quando for requerida justificadamente pelas partes.

Art. 125. As medidas de urgência podem ser propostas durante o período de


férias forenses e devem ser apreciadas de imediato.

Art. 126. Nas questões decorrentes deste Estatuto a conciliação prévia pode
ser conduzida por juiz de paz ou por conciliador judicial.

Parágrafo único. Obtida a conciliação, o termo respectivo é submetido à


homologação do juiz de direito competente.

Art. 127. As ações relativas ao mesmo núcleo familiar devem ser distribuídas
ao mesmo juízo, ainda que não haja identidade de partes.

Art. 128. Em qualquer ação e grau de jurisdição, deve ser buscada a


conciliação e sugerida a prática da mediação extrajudicial, podendo ser determinada
a realização de estudos sociais, bem como o acompanhamento psicológico das
partes.
74

Art. 129. A critério do juiz ou a requerimento das partes o processo pode ficar
suspenso enquanto os litigantes se submetem à mediação extrajudicial ou a
atendimento multidisciplinar.

Art. 130. O Ministério Público deve intervir nos processos judiciais em que
houver interesses de crianças, adolescentes e incapazes.

Art. 131. É das partes o ônus de produzir as provas destinadas a demonstrar


suas alegações, competindo ao juiz investigar livremente os fatos e ordenar de ofício
a realização de quaisquer provas.

Parágrafo único. Inverte-se o ônus da prova, ficando o encargo probatório a


quem contrapõe interesse indisponível de criança, adolescente e incapaz.

Art. 132. O juiz pode adotar em cada caso a solução mais conveniente ou
oportuna para atender o direito das partes, à luz dos princípios deste Estatuto.

Art. 133. Em todas as ações pode ser concedida a antecipação de tutela,


bem como cumuladas medidas cautelares.

Parágrafo único. A apreciação do pedido liminar ou da tutela antecipada não


depende da prévia manifestação do Ministério Público.

Art. 134. Na inexistência de prova inequívoca, ou não se convencendo o juiz


da verossimilhança das alegações, para a apreciação da medida liminar, pode
designar audiência de justificação, a ser realizada no prazo máximo de 10 (dez)
dias.

§ 1.º A requerimento do autor, a audiência de justificação pode realizar-se


sem a intimação do réu, caso haja a possibilidade de sua presença comprometer o
cumprimento da medida.

§ 2.º O autor pode comparecer acompanhado de no máximo 3 (três)


testemunhas.

§ 3.º Apreciado o pedido liminar, com a ouvida do Ministério Público, deve o


juiz designar audiência conciliatória.
75

§ 4.º Da decisão liminar cabe pedido de reconsideração, no prazo de 5


(cinco) dias.

§ 5.º Da decisão que aprecia o pedido de reconsideração cabe agravo de


instrumento.

Art. 135. Nas ações concernentes às relações de família deve o juiz designar
audiência de conciliação, podendo imprimir o procedimento sumário.

Art. 136. Não obtida a conciliação, as partes podem ser encaminhadas a


estudo psicossocial ou a mediação extrajudicial.

Parágrafo único. Cabe ao juiz homologar o acordo proposto pelo conciliador


ou mediador com assistência dos advogados ou defensores públicos.

Art. 137. Aplicam-se subsidiariamente as disposições processuais


constantes na legislação ordinária, e especial.

CAPÍTULO II
DO PROCEDIMENTO PARA O CASAMENTO

SEÇÃO I
DA HABILITAÇÃO

Art. 138. A habilitação para o casamento é feita perante o oficial do Registro


Civil da residência de qualquer dos nubentes.

Art. 139. O pedido de habilitação deve ser formulado por ambos os


nubentes, ou por procurador com poderes especiais, mediante declaração da
inexistência de impedimento para o casamento.

Parágrafo único. O pedido deve ser acompanhado dos seguintes


documentos:

I - certidão de nascimento ou documento equivalente;

II - comprovação do domicílio e da residência dos nubentes;


76

III - declaração de duas testemunhas, parentes ou não, que atestem


conhecê-los e afirmem não existir impedimento para o casamento;

IV - em caso de casamento anterior, certidão de óbito do cônjuge falecido,


registro da sentença de divórcio ou da anulação do casamento;

V - havendo necessidade de autorização, documento firmado pelos pais,


pelos representantes legais ou ato judicial que supra a exigência.

Art. 140. O oficial deve extrair edital, que permanece afixado durante 15
(quinze) dias nas circunscrições do Registro Civil da residência de ambos os
nubentes.

Art. 141. É dever do oficial do Registro esclarecer aos nubentes a respeito


dos fatos que podem ocasionar a invalidade do casamento, bem como sobre os
diversos regimes de bens.

Art. 142. Os impedimentos devem ser opostos por escrito e instruídos com
as provas do fato alegado, ou com a indicação do lugar onde as provas possam ser
obtidas.

Art. 143. O oficial do Registro deve apresentar aos nubentes ou a seus


representantes a oposição.

Parágrafo único. Pode ser deferido prazo razoável para a prova contrária
aos fatos alegados.

Art. 144. Verificada a inexistência do fato impeditivo para o casamento, é


extraído o certificado de habilitação.

Art. 145. A eficácia da habilitação é de 90 (noventa) dias, a contar da data


em que foi extraído o certificado.

SEÇÃO II
DO SUPRIMENTO DE CONSENTIMENTO PARA O CASAMENTO
77

Art. 146. Recusando um dos pais ou o representante a autorização para o


casamento do relativamente incapaz, cabe ao outro pedir o suprimento judicial do
consentimento.

§ 1.º Recusada a autorização, o procedimento pode ser intentado pelo


Ministério Público ou curador especial nomeado pelo juiz.

§ 2.º Quem recusar a autorização, deve justificar a recusa no prazo de 5


(cinco) dias.

§ 3.º O juiz pode determinar a realização de audiência ou a produção de


provas, devendo decidir em até 5 (cinco) dias.

SEÇÃO III
DA CELEBRAÇÃO

Art. 147. O casamento deve ser celebrado pelo juiz de paz em dia, hora e
lugar previamente agendado.

Parágrafo único. Na falta do juiz de paz é competente a autoridade


celebrante na forma da organização judiciária de cada Estado.

Art. 148. A solenidade é realizada na sede do cartório, ou em outro local,


com toda a publicidade, a portas abertas, e na presença de pelo menos 2 (duas)
testemunhas, parentes ou não dos nubentes.

Art. 149. Presentes os nubentes, as testemunhas e o oficial do Registro, o


juiz de paz, ouvindo dos nubentes a afirmação de que pretendem casar por livre e
espontânea vontade, os declara casados, em nome da lei.

Art. 150. A celebração do casamento é imediatamente suspensa se algum


dos nubentes:

I - recusar a solene afirmação da sua vontade;

II - declarar que sua manifestação não é livre e espontânea;

III - mostrar-se arrependido.


78

Parágrafo único. O nubente que der causa à suspensão do ato não pode
retratar-se no mesmo dia.

Art. 151. Um ou ambos os nubentes podem ser representados mediante


procuração outorgada por instrumento público, com poderes especiais e com o
prazo de 90 (noventa) dias.

§ 1.º A revogação da procuração somente pode ocorrer por escritura pública


e antes da celebração do casamento.

§ 2.º Celebrado o casamento, sem que a revogação chegue ao


conhecimento do mandatário, o ato é inexistente, devendo ser cancelado.

Art. 152. O casamento de brasileiro, celebrado no estrangeiro, perante a


autoridade consular, deve ser registrado em 180 (cento e oitenta) dias, a contar do
retorno de um ou de ambos os cônjuges ao Brasil.

Parágrafo único. O registro deve ser feito no cartório do domicílio dos


cônjuges em que residiam ou onde passarão a residir.

SEÇÃO IV
DO REGISTRO DO CASAMENTO

Art. 153. Celebrado o casamento, o oficial lavra o assento no livro de registro


devendo constar:

I - os nomes, nacionalidade, data e lugar do nascimento, profissão e


residência dos cônjuges;

II - os nomes, nacionalidade, data de nascimento dos pais, consignando o


falecimento de algum deles;

III - a data e cartório que expediu o certificado de habilitação;

IV - os nomes, nacionalidade e domicílio das testemunhas;

V - o regime de bens do casamento e a identificação da escritura do pacto


antenupcial;
79

VI - o nome que os cônjuges passam a usar.

Art. 154. O assento do casamento é assinado pelo juiz de paz, os cônjuges e


por 2 (duas) testemunhas.

SEÇÃO V
DO REGISTRO DO CASAMENTO RELIGIOSO PARA EFEITOS CIVIS

Art. 155. Os nubentes habilitados para o casamento podem casar perante


autoridade ou ministro religioso.

Art. 156. O assento do casamento religioso, subscrito pela autoridade ou


ministro que o celebrar, pelos nubentes e por 2 (duas) testemunhas, deve conter os
mesmos requisitos do registro civil.

Art. 157. A autoridade ou ministro celebrante deve arquivar a certidão de


habilitação que lhe foi apresentada, devendo, nela, anotar a data da celebração do
casamento.

Art. 158. No prazo de 30 (trinta) dias, a contar da celebração, qualquer


interessado pode apresentar o assento do casamento religioso, ao cartório do
registro civil que expediu o certificado de habilitação.

§ 1.° O oficial deve proceder o registro do casamento no prazo de 24 (vinte e


quatro) horas.

§ 2.º Se o documento referente à celebração do casamento religioso omitir


algum requisito, a falta deve ser suprida por declaração de ambos os cônjuges
tomada por termo pelo oficial.

Art. 159. Do assento deve conter a data da celebração, o lugar, o culto


religioso.

Art. 160. O casamento religioso, celebrado sem a prévia habilitação perante


o oficial de registro civil, pode ser registrado no prazo de 90 (noventa) dias, mediante
requerimento dos cônjuges, com a prova do ato religioso e os demais documentos
exigidos para a habilitação do casamento.
80

Parágrafo único. Processada a habilitação, o oficial procede ao registro do


casamento religioso, devendo atender aos mesmos requisitos legais.

Art. 161. O casamento produz efeito a contar da celebração religiosa.

SEÇÃO VI
DO CASAMENTO EM IMINENTE RISCO DE MORTE

Art. 162. Quando algum dos nubentes estiver em iminente risco de morte,
não obtendo a presença do juiz de paz, pode o casamento ser celebrado na
presença de 4 (quatro) testemunhas, que não tenham com os nubentes relação de
parentesco.

Art. 163. Realizado o casamento, devem as testemunhas comparecer


perante o cartório do registro civil mais próximo, dentro de 10 (dez) dias, devendo
ser tomada a termo a declaração de:

I - que foram convocadas por parte do enfermo;

II - que este parecia em perigo de morte, mas apresentava plena capacidade


para manifestar sua vontade;

III - que, em sua presença, declararam os nubentes, livre e


espontaneamente, receber-se em casamento.

§ 1.° Autuado o pedido e tomadas as declarações a termo, o oficial do


registro civil deve proceder as diligências para verificar se os nubentes podiam ter-se
habilitado, colhendo a manifestação do sobrevivente, em 15 (quinze) dias.

§ 2.º Comprovada a inexistência de impedimentos, o oficial procede ao


registro no livro do Registro dos Casamentos.

§ 3.° O casamento produz efeito a partir da data da celebração.

§ 4.° Serão dispensadas estas formalidades, se o enfermo convalescer e


ambos ratificarem o casamento na presença do juiz de paz e do oficial do registro.

§ 5.° Neste caso fica dispensada a habilitação para o casamento.


81

CAPÍTULO III
DO RECONHECIMENTO DA UNIÃO ESTÁVEL E DA UNIÃO HOMOAFETIVA

Art. 164. É facultado aos conviventes e aos parceiros, de comum acordo,


requerer em juízo o reconhecimento de sua união estável ou da união homoafetiva.

Art. 165. Dissolvida a união, qualquer dos conviventes ou parceiros pode


ajuizar a ação de reconhecimento de sua existência.

Parágrafo único. Na petição inicial deve a parte autora:

I - identificar o período da convivência;

II - indicar o regime da guarda dos filhos;

III - comprovar a necessidade de alimentos ou declarar que deles não


necessita;

IV - indicar o valor dos alimentos necessários à mantença dos filhos;

V - descrever os bens do casal e apresentar proposta de divisão.

Art. 166. A ação deve ser instruída com o contrato de convivência, se existir,
e a certidão de nascimento dos filhos.

Parágrafo único. A descrição dos bens do casal e a proposta de partilha é


facultativa.

Art. 167. Ao receber a petição inicial, o juiz deve apreciar o pedido liminar de
alimentos provisórios e designar audiência conciliatória.

Parágrafo único. A sentença deve fixar os termos inicial e final da união.

CAPÍTULO IV
DA DISSOLUÇÃO DA ENTIDADE FAMILIAR

SEÇÃO I
DA AÇÃO DE DIVÓRCIO
82

Art. 168. A ação de divórcio pode ser intentada por qualquer um dos
cônjuges ou por ambos.

§ 1.º O cônjuge acometido de doença mental ou transtorno psíquico é


representado por curador, ascendente ou irmão.

§ 2.º A inicial deve ser acompanhada da certidão de casamento e certidão de


nascimento dos filhos.

Art. 169. Não tendo havido prévia separação, deve a inicial:

I - indicar a data da separação de fato;

II - identificar o regime de convivência com os filhos menores;

III - declinar a dispensa dos alimentos ou a necessidade de um dos cônjuges


de percebê-los;

IV - indicar o valor dos alimentos necessários à mantença dos filhos.

Art. 170. Ao receber a inicial o juiz deve apreciar o pedido liminar de


alimentos provisórios.

Art. 171. Havendo filhos menores ou incapazes deve ser designada


audiência conciliatória.

Art. 172. No divórcio consensual, não existindo filhos menores ou incapazes


ou estando judicialmente decididas as questões a eles relativas, é dispensável a
realização de audiência.

SEÇÃO II
DA SEPARAÇÃO

Art. 173. Qualquer dos cônjuges pode propor a ação de separação.

Art. 174. Qualquer dos cônjuges, conviventes ou parceiros pode propor a


ação de separação de corpos.
83

§ 1.º A parte autora pode pleitear, justificadamente, sua permanência no lar


ou requerer o afastamento da parte-ré.

§ 2.º Havendo alegação da prática de violência doméstica aplica-se a


legislação especial.

Art. 175. Na inicial da ação de separação deve a parte-autora:

I - indicar o regime de convivência com os filhos menores;

II - declarar que dispensa alimentos ou comprovar a necessidade de


percebê-los;

III - indicar o valor dos alimentos necessários à mantença dos filhos.


Parágrafo único. A ação deve ser instruída com a certidão de casamento ou contrato
de convivência, se existir, e a certidão de nascimento dos filhos.

Art. 176. Ao receber a petição inicial o juiz deve apreciar o pedido de


separação de corpos e decidir sobre os alimentos.

Parágrafo único. Não evidenciada a possibilidade de risco à vida ou a saúde


das partes e dos filhos, o juiz pode designar audiência de justificação ou de
conciliação para decidir sobre a separação de corpos.

Art. 177. Comparecendo a parte-ré e concordando com a separação de


corpos, pode a ação prosseguir quanto aos pontos em que inexista consenso.

CAPÍTULO V
DOS ALIMENTOS

SEÇÃO I
DA AÇÃO DE ALIMENTOS

Art. 178. Na ação de alimentos, o autor deve:

I - comprovar a obrigação alimentar ou trazer os indícios da responsabilidade


do alimentante em prover-lhe o sustento;
84

II - declinar as necessidades do alimentando;

III - indicar as possibilidades do alimentante.

Art. 179. Ao despachar a inicial, o juiz deve fixar alimentos provisórios e


encaminhar as partes à conciliação ou designar audiência de instrução e julgamento.

§ 1.º Os alimentos provisórios são devidos e devem ser pagos desde a data
da fixação.

§ 2.º Quando da citação deve o réu ser cientificado da incidência da multa


de 10% sempre que incorrer em mora de 15 (quinze) dias.

Art. 180 Se o devedor for funcionário público, civil ou militar, empregado da


iniciativa privada, perceber rendimentos provenientes de vínculo empregatício, ou for
aposentado, o juiz deve fixar os alimentos em percentual dos seus ganhos.

Parágrafo único. O desconto dos alimentos dos rendimentos do alimentante


independentemente de requerimento do credor, salvo acordo.

Art. 181. Na audiência de instrução e julgamento o juiz colhe o depoimento


das partes.

§ 1.º Apresentada a contestação, oral ou escrita, havendo prova testemunhal


o juiz ouve a testemunha, independentemente do rol.

§ 2.º Ouvidas as partes e o Ministério Público, o juiz profere a sentença na


audiência ou no prazo máximo de 10 (dez) dias.

Art. 182. Da sentença que fixa, revisa ou exonera alimentos cabe recurso
somente com efeito devolutivo.

Parágrafo único. Justificadamente, o juiz, ou o relator, pode agregar efeito


suspensivo ao recurso.

Art. 183. Fixados alimentos definitivos em valor superior aos provisórios


cabe o pagamento da diferença desde a data da fixação. Caso os alimentos fixados
em definitivo sejam em valor inferior aos provisórios, não há compensação, não
dispondo a decisão de efeito retroativo.
85

Art. 184. Na ação de oferta de alimentos o juiz não está adstrito ao valor
oferecido pelo autor.

Art. 185. Cabe ação revisional quando os alimentos foram fixados sem
atender ao critério da proporcionalidade ou quando houver alteração nas condições
das partes.

Art. 186. A ação de alimentos pode ser cumulada com qualquer demanda
que envolva questões de ordem familiar entre as partes.

Art. 187. Havendo mais de um obrigado, é possível mover a ação contra


todos, ainda que o dever alimentar de alguns dos réus seja de natureza subsidiária
ou complementar.

Parágrafo único. A obrigação de cada um dos alimentantes deve ser


individualizada.

Art. 188. O empregador, o órgão público ou privado responsável pelo


pagamento do salário, benefício ou provento, no prazo de até 15 (quinze) dias, tem o
dever de:

I - proceder ao desconto dos alimentos;

II - encaminhar a juízo cópia dos 6 (seis) últimos contracheques ou recibos


de pagamento do salário;

III - informar imediatamente quando ocorrer a rescisão do contrato de


trabalho ou a cessação do vínculo laboral.

Art. 189. Rescindido o contrato de trabalho do alimentante, serão colocadas


à disposição do juízo 30% (trinta por cento) de quaisquer verbas, rescisórias ou não,
percebidas por ato voluntário do ex-empregador ou por decisão judicial.

§ 1.º Desse crédito, mensalmente será liberado, em favor dos alimentandos,


o valor do pensionamento, até que os alimentos passem a ser pagos por outra fonte
pagadora.

§ 2.º Eventual saldo será colocado à disposição do alimentante.


86

Art. 190. Fixada em percentual sobre os rendimentos do alimentante, a


verba alimentar, salvo ajuste diverso, incide sobre:

§ 1.º A totalidade dos rendimentos percebidos a qualquer título, excluídos


apenas os descontos obrigatórios, reembolso de despesas e diárias;

§ 2.º O 13º salário, adicional de férias, gratificações, abonos, horas extras e


vantagens recebidas a qualquer título.

Art. 191. A cessação do vínculo laboral não torna ilíquida a obrigação. Os


alimentos, neste caso, correspondem ao último valor descontado.

Art. 192. Os alimentos podem ser descontados de aluguéis e de outras


rendas ou rendimentos do alimentante, a serem pagos diretamente ao credor.

SEÇÃO II
DA COBRANÇA DOS ALIMENTOS

Art. 193. Fixados os alimentos judicialmente a cobrança será levada a efeito


como cumprimento de medida judicial.

Art. 194. Podem ser cobrados pelo mesmo procedimento os alimentos


fixados em escritura pública de separação e divórcio ou em acordo firmado pelas
partes e referendado pelo Ministério Público, Defensoria Pública ou procurador dos
transatores.

Art. 195. A cobrança dos alimentos provisórios bem como dos alimentos
fixados em sentença sujeita a recurso se processa em procedimento apartado.

Art. 196. Os alimentos definitivos, fixados em qualquer demanda, podem ser


cobrados nos mesmos autos.

Art. 197. Cabe ao juiz tomar as providências cabíveis para localizar o


devedor e seus bens, independentemente de requerimento do credor.

Art. 198. A multa incide sobre todas as parcelas vencidas há mais de 15


(quinze) dias, inclusive as que se venceram após a intimação do devedor.
87

Art. 199. Recaindo a penhora em dinheiro, o oferecimento de impugnação


não obsta a que o credor levante mensalmente o valor da prestação.

Parágrafo único. Sem prejuízo do pagamento dos alimentos, o débito


executado pode ser descontado dos rendimentos ou rendas do devedor, de forma
parcelada, contanto que, somado à parcela devida, não ultrapasse 50% (cinqüenta
por cento) de seus ganhos líquidos.

Art. 200. Para a cobrança de até seis parcelas de alimentos, fixadas judicial
ou extrajudicialmente, o devedor é citado para proceder ao pagamento do valor
indicado pelo credor, no prazo de 3 (três) dias, provar que o fez ou justificar a
impossibilidade de efetuá-lo.

Parágrafo único. Somente a comprovação de fato imprevisível que gere a


impossibilidade absoluta de pagar serve de justificativa para o inadimplemento.

Art. 201. O magistrado pode, a qualquer tempo, designar audiência


conciliatória, para o fim de ajustar modalidades de pagamentos.

§ 1.º Inadimplido o acordo, resta vencida a totalidade do débito, sem prejuízo


do cumprimento da pena de prisão.

§ 2.º Se o devedor não pagar, ou o magistrado não aceitar a justificação


apresentada, decretará a prisão pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses.

Art. 202. A prisão é cumprida em regime semi-aberto. Em caso de novo


aprisionamento, o regime é o fechado.

Art. 203. O devedor se exime da prisão comprovando o pagamento das


parcelas executadas, das prestações vencidas até a data do adimplemento, dos
juros e da correção monetária.

Art. 204. Cumprida a prisão, e não levado a efeito o pagamento, a cobrança


prossegue nos mesmos autos, pelo rito da execução por quantia certa.

Parágrafo único. Sobre a totalidade do débito e sobre as parcelas vencidas


até a data do pagamento incide multa, a contar da data da citação.
88

Art. 205. As custas processuais e os honorários advocatícios podem ser


cobrados nos mesmos autos.

Art. 206. Citado o réu, deixando de proceder ao pagamento, o juiz determina


a inscrição do nome do devedor no Cadastro de Proteção ao Credor de Alimentos e
demais instituições públicas ou privadas de proteção ao crédito.

§ 1.º O juiz deve comunicar o valor e o número das prestações vencidas e


não pagas.

§ 2.º A determinação não depende de requerimento do credor.

§ 3.º Quitado o débito, a anotação é cancelada mediante ordem judicial.

Art. 207. Em qualquer hipótese, verificada a postura procrastinatória do


devedor, o magistrado deve dar ciência ao Ministério Público dos indícios da prática
do delito de abandono material.

CAPÍTULO VI
DA AVERIGUAÇÃO DA FILIAÇÃO

Art. 208. Comparecendo o pai ou a mãe para proceder ao registro de


nascimento do filho menor de idade somente em seu nome, o Oficial do Registro
Civil deve comunicar ao Ministério Público, com as informações que lhe foram
fornecidas para a localização do outro genitor.

Art. 209. O Ministério Público deve notificar o indicado como sendo genitor,
para que, no prazo de 10 (dez) dias se manifeste sobre a paternidade ou
maternidade que lhe é atribuída.

§ 1.º Confirmada a paternidade ou a maternidade, lavrado o termo, o oficial


deve proceder o registro.

§ 2.º Negada a paternidade ou a maternidade, ou deixando de manifestar-


se, cabe ao Ministério Público propor a ação investigatória.
89

Art. 210. A iniciativa conferida ao Ministério Público não impede a quem


tenha legítimo interesse de intentar a ação de investigação.

CAPÍTULO VII
DA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE

Art. 211. Proposta ação investigatória por menor de idade ou incapaz,


havendo forte prova indiciária da paternidade, biológica ou socioafetivo, o juiz deve
fixar alimentos provisórios, salvo se o autor declarar que deles não necessita.

Art. 212. Havendo registro civil é necessária a citação daqueles indicados no


respectivo assento.

Art. 213. Postulando o autor sob o benefício da assistência judiciária, é de


responsabilidade do réu os encargos necessários para a produção das provas, se
ele não gozar do mesmo benefício.

Art. 214. Deixando o réu de submeter-se à perícia ou de injustificadamente


proceder ao pagamento do exame, opera em favor do autor a presunção de
veracidade dos fatos alegados na inicial.

Parágrafo único. A declaração da filiação deve ser apreciada em conjunto


com outras provas.

Art. 215. A ausência de contestação enseja a aplicação dos efeitos da


revelia.

Art. 216. A procedência do pedido desconstitui a filiação estabelecida


anteriormente no registro.

Parágrafo único. A alteração do nome deve atender ao melhor interesse do


investigante.

Art. 217. Transitada em julgado a sentença deve ser expedido mandado de


averbação ao registro civil.
90

Art. 218. A sentença de procedência dispõe de efeito declaratório desde a


data do nascimento do investigado.

Art. 219. A improcedência do pedido de filiação não impede a propositura de


nova ação diante do surgimento de outros meios probatórios.

CAPÍTULO VIII
DA AÇÃO DE INTERDIÇÃO

Art. 220. A interdição pode ser promovida:

I - pelo cônjuge, companheiro ou parceiro;

II - pelos parentes consangüíneos ou afins;

III - pelo representante da entidade em que se encontra abrigado o


interditando;

IV - pelo Ministério Público.

Art. 221. O Ministério Público só promoverá interdição:

I - em caso de doença mental grave;

II - se não existir ou não promover a interdição alguma das pessoas


designadas nos incisos I, II e III do artigo antecedente;

III - se, existindo, forem incapazes as pessoas mencionadas no inciso


antecedente.

Art. 222. Cabe ao autor especificar os fatos que revelam a incapacidade do


interditando para reger a sua pessoa e administrar os seus bens.

Parágrafo único. Justificada a urgência o juiz pode nomear curador


provisório ao interditando para a prática de determinados atos.

Art. 223. O interditando é intimado para comparecer à audiência de


interrogatório.
91

§ 1.º O juiz deve ouvir o interditando pessoalmente acerca de sua vida,


negócios, bens, consignando sua impressão pessoal sobre as condições do
interrogando.

§ 2.º O juiz, quando necessário, pode comparecer no local onde se encontra


o interditando para ouvi-lo.

Art. 224. No prazo de 5 (cinco) dias contados da audiência, o interditando


pode contestar o pedido, através de advogado.

Art. 225. Cabe ao juiz nomear perito para proceder ao exame do


interditando.

Parágrafo único. O juiz pode dispensar a perícia quando notória a


incapacidade.

Art. 226. Apresentado o laudo pericial, após manifestação das partes, se


necessário, o juiz designa audiência de instrução e julgamento.

Art. 227. A escolha do curador é feita pelo juiz e deve recair na pessoa que
melhor atenda aos interesses do curatelado.

Art. 228. Não pode ser nomeado curador:

I - quem não tem a livre administração de seus bens;

II - quem tem obrigações para com o curatelado, ou direitos contra ele;

Art. 229. Decretada a interdição, o juiz fixa os limites da curatela segundo o


estado ou o desenvolvimento mental do interdito.

Art. 230. Transitada em julgado, a sentença é inscrita no Registro de


Pessoas Naturais.

Art. 231. O curador é intimado a prestar compromisso no prazo de 5 (cinco)


dias.

Art. 232. Prestado o compromisso, o curador assume a administração dos


bens do interdito.
92

Art. 233. Havendo meio de recuperar o interdito, o curador deve buscar


tratamento apropriado.

Art. 234. O interdito pode ser recolhido em estabelecimento adequado,


quando não se adapte ao convívio doméstico.

Art. 235. A autoridade do curador estende-se à pessoa e aos bens dos filhos
menores do curatelado, que se encontram sob a guarda e responsabilidade do
curatelado ao tempo da interdição.

Art. 236. O curador deve prestar contas de sua gestão de 2 (dois) em 2


(dois) anos, ficando dispensado se renda for menor que 3 (três) salários mínimos
mensais.

Art. 237. O Ministério Público, ou quem tenha legítimo interesse, pode


requerer a destituição do curador.

Art. 238. O curador pode contestar o pedido de destituição no prazo 5 (cinco)


dias.

Art. 239. Ao deixar o encargo é indispensável a prestação de contas.

Art. 240. Em caso de extrema gravidade, o juiz pode suspender do exercício


da curatela, nomeando interinamente substituto.

Art. 241. Extingue-se a interdição, cessando a causa que a determinou.


Parágrafo único. A extinção da curatela pode ser requerida pelo curador, pelo
interditado ou pelo Ministério Público.

Art. 242. O juiz deve nomear perito para avaliar as condições do interditado.
Após a apresentação do laudo quando necessário, designa audiência de instrução e
julgamento.

Art. 243. Extinta a interdição, a sentença é averbada no Registro de Pessoas


Naturais.

CAPÍTULO IX
DOS PROCEDIMENTOS DOS ATOS EXTRAJUDICIAIS
93

Art. 244. Os atos extrajudiciais devem ser subscritos pelas partes e pelos
advogados.

Parágrafo único. O advogado comum ou de cada uma das partes devem


estar presentes no ato da assinatura da respectiva escritura.

SEÇÃO I
DO DIVÓRCIO

Art. 245. Os cônjuges podem promover o divórcio por escritura pública.

Parágrafo único. Os cônjuges devem apresentar as certidões de casamento


e de nascimento dos filhos, se houver.

Art. 246. Devem os cônjuges declarar:

I - a data da separação de fato;

II - o valor dos alimentos destinado a um dos cônjuges ou a dispensa de


ambos do encargo alimentar;

III - a permanência ou não do uso do nome;

IV - facultativamente, os bens do casal e sua partilha.

Parágrafo único. Não é necessária a partilha dos bens para o divórcio.

Art. 247. Havendo filhos menores ou incapazes é necessário comprovar que


se encontram solvidas judicialmente todas as questões a eles relativas.

Art. 248. Lavrada a escritura, deve o tabelião enviar certidão ao Cartório do


Registro Civil em que ocorreu o casamento, para averbação.

§ 1.º A certidão do divórcio deve ser averbada no registro de imóvel onde se


situam os bens e nos registros relativos a outros bens.

§ 2.º O envio da certidão aos respectivos registros pode ser levado a efeito
por meio eletrônico.
94

Art. 249. A eficácia do divórcio se sujeita à averbação no registro do


casamento.

SEÇÃO II
DA SEPARAÇÃO

Art. 250. É facultada aos cônjuges a separação consensual extrajudicial.

Art. 251. A separação consensual extrajudicial de corpos cabe aos cônjuges,


aos conviventes e aos parceiros.

Art. 252. A separação consensual pode ser levada a efeito por escritura
pública, na hipótese de:

I - Não existir filhos menores ou incapazes do casal;

II - Estarem solvidas judicialmente todas as questões referentes aos filhos


menores ou incapazes.

Art. 253. Na escritura deve ficar consignado o que ficou acordado sobre
pensão alimentícia, e, se for o caso, sobre os bens comuns.

SEÇÃO III
DO RECONHECIMENTO E DA DISSOLUÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL E
HOMOAFETIVA

Art. 254. Os conviventes e os parceiros podem, a qualquer tempo, buscar o


reconhecimento da união por escritura pública, indicando:

I - a data do início da união;

II - o regime de bens.

Art. 255. Encontrando-se os conviventes ou os parceiros separados, a


dissolução da união pode ser realizada mediante escritura pública, devendo ser
indicado:

I - o período da convivência;
95

II - o valor dos alimentos ou a dispensa do encargo;

III - facultativamente, a descrição dos bens e a sua divisão.

Art. 256. Havendo filhos menores ou incapazes, as questões a eles relativas


devem ser solvidas judicialmente.

Art. 257. Lavrada a escritura, cabe ao tabelião encaminhar certidão ao


Cartório do Registro Civil da residência dos conviventes ou parceiros, a ser
averbado em livro próprio.

Parágrafo único. A união é averbada no registro de nascimento dos


conviventes e dos parceiros.

Art. 258. Havendo bens deve proceder-se ao registro na circunscrição dos


imóveis e nos demais registros relativos a outros bens.

SEÇÃO IV
DA CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO

Art. 259. Os conviventes podem, de comum acordo e a qualquer tempo,


converter a união estável em casamento.

Art. 260. O pedido é formulado ao Oficial do Registro Civil das Pessoas


Naturais onde residem, devendo os conviventes:

I - comprovar que não estão impedidos de casar;

II - indicar o termo inicial da união;

III - arrolar os bens comuns;

IV - declinar o regime de bens;

V - apresentar as provas da existência da união estável.

Art. 261. Lavrada a escritura, deve o tabelião enviar certidão ao Registro


Civil em que ocorreu o casamento, para averbação.
96

§ 1.º A certidão do divórcio deve ser averbada no registro de imóvel onde se


situam os bens e nos registros relativos a outros bens.

§ 2.º O envio da certidão aos respectivos registros pode ser levado a efeito
por meio eletrônico.

Art. 262. A conversão somente tem efeito perante terceiros após ser
registrada perante o registro civil.

SEÇÃO V
DA ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS

Art. 263. A alteração consensual do regime dos bens pode ser formalizada
por escritura pública, sem prejuízo do direito de terceiros.

Art. 264. A alteração deve ser averbada na certidão de casamento e no


registro de imóveis dos bens do casal.

Art. 265. Caso os cônjuges, ou apenas um deles, seja empresário, a


alteração deve ser averbada na Junta Comercial e no registro público de empresas
mercantis.

Art. 266. A alteração só produz efeito perante terceiros após a averbação no


registro imobiliário e demais registros relativos a outros bens.

TÍTULO VII
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS

Art. 267. É ineficaz qualquer ato, fato ou negócio jurídico que contrariar os
princípios estabelecidos na Constituição Federal, em tratados ou convenções
internacionais das quais seja o Brasil signatário e neste Estatuto.

Art. 268. Todos os tratados e convenções internacionais que assegurem


direitos e garantias fundamentais de proteção aos integrantes da entidade familiar
têm primazia na aplicação do presente Estatuto.
97

Art. 269. Todas as remissões feitas ao Código Civil que expressa ou


tacitamente foram revogadas por este Estatuto, consideram-se feitas às disposições
deste Estatuto.

Art. 270. A existência e a validade dos atos, fatos e negócios jurídicos,


constituídos antes da entrada em vigor deste Estatuto, obedecem ao disposto na Lei
n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002 e nas leis anteriores, mas os seus efeitos,
produzidos após a vigência deste Estatuto, aos preceitos dele se subordinam.

Art. 271. Salvo disposição em contrário deste Estatuto, mantém-se a


aplicação das leis especiais anteriores naquilo que não conflitarem com regras ou
princípios nele estabelecidos ou dele inferidos.

Art. 272. Até que por outra forma se disciplinem, continuam em vigor as
disposições de natureza processual, administrativa ou penal, constantes de leis
cujos preceitos ou princípios se coadunem com este Estatuto.

Art. 273. Fica revogado da Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código


Civil) o Livro IV - Do Direito de Família (arts. 1.511 a 1.783), os arts. 732 a 745; 852
a 854; 877 e 878; 888, II e III; 1.120 a 1.124-A do da Lei n. 5.869 de 11 de janeiro de
1973 (Código de Processo Civil), o Decreto-Lei n. 3.200/41 (casamento de parentes
em 3º grau), a Lei n. 5.478/1968 (Lei de Alimentos), os arts. 70 a 76 da Lei n.
6.015/73 (Lei dos Registros Públicos), a Lei n. 6.515/1977 (Lei do Divórcio) e a Lei n.
8.560/1992 (investigação oficiosa da paternidade).

Art. 274. Este Estatuto entra em vigor 1 (um) ano da data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

É com grande satisfação que oferecemos à sociedade este Estatuto das


Famílias. Tal proposta é resultado da luta e esforço de todos os militantes da área de
Direito de Família, consolidada pela Doutrina e Jurisprudência pátria e no
entendimento de que a boa Lei é aquela que consagra uma prática já adotada pela
sociedade.
98

O Livro de Direito de Família do Código Civil de 2002 foi concebido pela


Comissão coordenada por Miguel Reale no final dos anos 60 e início dos anos 70 do
século passado, antes das grandes mudanças legislativas sobre a matéria, nos
países ocidentais, e do advento da Constituição de 1988. O paradigma era o
mesmo: família patriarcal, apenas constituída pelo casamento; desigualdade dos
cônjuges e dos filhos; discriminação a partir da legitimidade da família e dos filhos;
subsistência dos poderes marital e paternal. A partir da Constituição de 1988,
operou-se verdadeira revolução copernicana, inaugurando-se paradigma familiar
inteiramente remodelado, segundo as mudanças operadas na sociedade brasileira,
fundada nos seguintes pilares: comunhão de vida consolidada na afetividade e não
no poder marital ou paternal; igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges;
liberdade de constituição, desenvolvimento e extinção das entidades familiares;
igualdade dos filhos de origem biológica ou socioafetivo; garantia de dignidade das
pessoas humanas que a integram, inclusive a criança, o adolescente e o idoso.
Nenhum ramo do Direito foi tão profundamente modificado quanto o Direito de
Família ocidental, nas três últimas décadas do século XX.

Durante a tramitação do projeto do Código Civil no Congresso Nacional,


após a Constituição de 1988, o Senado Federal promoveu esforço hercúleo para
adaptar o texto - antes dela elaborado - às suas diretrizes. Todavia, o esforço
resultou frustrante, pois não se poderia adaptar institutos que apenas faziam sentido
como expressão do paradigma familiar anterior à nova realidade, exigente de
princípios, categorias e institutos jurídicos diferentes. A doutrina especializada
demonstrou à saciedade a inadequação da aparente nova roupagem normativa, que

tem gerado intensas controvérsias e dificuldades em sua aplicação.

Ciente desse quadro, consultei o Instituto Brasileiro de Direito de Família -


IBDFAM, entidade que congrega cerca de 4.000 especialistas, profissionais e
estudiosos do Direito de Família, e que também tenho a honra de integrar, se uma
revisão sistemática do Livro IV da Parte Especial do Código Civil teria o condão de
superar os problemas que criou.

Após vários meses de debates, a comissão científica do IBDFAM, ouvindo


os membros associados, concluiu que, mais do que uma revisão, seria necessário
99

um estatuto autônomo, desmembrado do Código Civil, até porque seria


imprescindível associar as normas de Direito Material com as normas especiais de
Direito Processual. Não é mais possível tratar questões visceralmente pessoais da
vida familiar, perpassadas por sentimentos, valendo-se das mesmas normas que
regulam as questões patrimoniais, como propriedades, contratos e demais
obrigações. Essa dificuldade, inerente às peculiaridades das relações familiares, tem
estimulado muitos países a editarem códigos ou leis autônomas dos direitos das
famílias. Outra razão a recomendar a autonomia legal da matéria é o grande número
de projetos de leis específicos, que tramitam nas duas Casas Legislativas, propondo
alterações ao Livro de Direito de Família do Código Civil, alguns modificando
radicalmente o sentido e o alcance das normais atuais. Uma lei que provoca a
demanda por tantas mudanças, em tão pouco tempo de vigência, não pode ser
considerada adequada.

Eis porque, também convencido dessas razões, submeto à apreciação dos


ilustres Pares o presente Projeto de Lei, como Estatuto das Famílias, traduzindo os
valores que estão consagrados nos princípios emergentes dos artigos 226 a 230 da
Constituição Federal. A denominação utilizada - “Estatuto das Famílias” - contempla
melhor a opção constitucional de proteção das variadas entidades familiares. No
passado, apenas a família constituída pelo casamento - portanto única – era objeto
do Direito de Família.

Optou-se por uma linguagem mais acessível à pessoa comum do povo,


destinatário maior dessas normas, evitando-se termos excessivamente técnicos ou
em desuso. Assim, por exemplo, em vez de dizer “idade núbil” alude-se a casamento
da pessoa relativamente incapaz.

Entidades familiares - O Código Civil é iniciado com o casamento, tal qual


o Código de 1916, indiferente ao comando constitucional de tutela das demais
entidades. O Estatuto das Famílias, diferentemente, distribui as matérias, dedicando
o Título I às normas e princípios gerais aplicáveis às famílias e às pessoas que as
integram. Acompanhando os recentes Códigos e leis gerais de Direito de Família, o
Estatuto das Famílias enuncia em seguida as regras gerais sobre as relações de
parentesco. O título destinado às entidades familiares estabelece diretrizes comum a
todas elas, após o que passa a tratar de cada uma. Além do casamento, o Estatuto
100

das Famílias sistematiza as regras especiais da união estável, da união homoafetiva


e da família parental, na qual se inclui a família monoparental. A Constituição atribui
a todas as entidades familiares a mesma dignidade e igual merecimento de tutela,
sem hierarquia entre elas.

Casamento, regime de bens e divórcio - O Capítulo do casamento é o


mais extenso, dada a importância que a sociedade brasileira a ele destina,
sistematizando todas as matérias anexas ou conexas, de modo seqüenciado:
existência, validade, eficácia, regime de bens, divórcio e separação. A separação
dessas matérias feita pelo Código Civil, em direitos pessoais e direitos patrimoniais,
não foi bem recebida pela doutrina especializada, dada a interconexão entre ele e o

papel instrumental dos segundos. Além do mais, considerando que cada cidadão
brasileiro integra ao menos uma família, a lei deve ser compreensível pelo homem
comum do povo e não contemplar discutível opção doutrinária.

Foram suprimidas as causas suspensivas do casamento, previstas no


Código Civil, porque não suspendem o casamento, representando, ao contrário,
restrições à liberdade de escolha de regime de bens. Os impedimentos aos
casamentos foram atualizados aos valores sociais atuais, com redação mais clara.

Simplificaram-se as exigências para a celebração do casamento, civil ou


religioso, e para o registro público, com maior atenção aos momentos de sua
eficácia. Procurou-se valorizar a atuação do juiz de paz na celebração do casamento
civil.

Suprimiu-se o regime de bens de participação final nos aquestos, introduzido


pelo Código Civil, em virtude de não encontrar nenhuma raiz na cultura brasileira e
por transformar os cônjuges em sócios de ganhos futuros reais ou contábeis,
potencializando litígios. Mantiveram-se, assim, os regimes de comunhão parcial,
comunhão universal e separação total.

Por seu caráter discriminatório e atentatório à dignidade dos cônjuges,


também foi suprimido o regime de separação obrigatório, que a Súmula 377 do
Supremo Tribuna Federal (STF) tinha praticamente convertido em regime de
comunhão parcial. Definiu-se, com mais clareza, quais os bens ou valores que estão
101

excluídos da comunhão parcial, tendo em vista as controvérsias jurisprudenciais e a


prática de sonegação de bens que devem ingressar na comunhão.

Privilegiou-se o divórcio, como meio mais adequado para assegurar a paz


dos que não mais desejam continuar casados, definindo em regras simples e
compreensíveis os requisitos para alcançá-lo. Evitou-se, tanto no divórcio quanto na
separação, a interferência do Estado na intimidade do casal, ficando vedada a
investigação das causas da separação, que não devem ser objeto de publicidade. O
que importa é assegurar-se o modo de guarda dos filhos, no melhor interesse
destes, a fixação ou dispensa dos alimentos entre os cônjuges, a obrigação
alimentar do não guardião em relação aos filhos comuns, a manutenção ou
mudança do nome de família e a partilha dos bens comuns. A separação, o divórcio
e a mudança de regime de bens extrajudiciais, mediante escritura pública,
receberam regulamentação mais detida, quanto à sua facilitação, seus efeitos e à
preservação dos interesses dos cônjuges e de terceiros.

União estável - O Estatuto das Famílias procurou eliminar todas as


assimetrias que o Código Civil ostenta em relação à união estável, no que concerne
aos direitos e deveres comuns dos conviventes, em relação aos idênticos direitos e
deveres dos cônjuges. Quando a Constituição se dirige ao legislador para que
facilite a conversão da união estável para o casamento, não institui aquela em
estágio provisório do segundo. Ao contrário, a Constituição assegura a liberdade dos
conviventes de permanecerem em união estável ou a converterem em casamento.
Da mesma maneira, há a liberdade de os cônjuges se divorciarem e constituírem em
seguida, ou tempos depois, união estável entre eles, se não desejarem casar
novamente. Uniformizaram-se os deveres dos conviventes, entre si, em relação aos
deveres conjugais.

Optou-se por determinar que a união estável constitui estado civil de


“convivente”, retomando-se a denominação inaugurada com a Lei nº 9.263/96, que
parece alcançar melhor a significação de casal que convive em união afetiva, em
vez de companheiro, preferida pelo Código Civil. Por outro lado, o convivente nem é
solteiro nem casado, devendo explicitar que seu estado civil é próprio, inclusive para
proteção de interesses de terceiros com quem contrai dívidas, relativamente ao
regime dos bens que por estas responderão.
102

União homoafetiva - O estágio cultural que a sociedade brasileira vive, na


atualidade, encaminha-se para o pleno reconhecimento da união homoafetiva. A
norma do art. 226 da Constituição é de inclusão - diferentemente das normas de
exclusão das Constituições pré-1988 -, abrigando generosamente todas as formas
de convivência existentes na sociedade. A explicitação do casamento, da união
estável e da família monoparental não exclui as demais que se constituem como
comunhão de vida afetiva, de modo público e contínuo. Em momento algum, a
Constituição veda o relacionamento de pessoas do mesmo sexo.

A jurisprudência brasileira tem procurado preencher o vazio normativo


infraconstitucional, atribuindo efeitos às relações entre essas pessoas. Ignorar essa
realidade é negar direitos às minorias, incompatível com o Estado Democrático.
Tratar essas relações como meras sociedades de fato, como se as pessoas fossem
sócios de uma sociedade de fins lucrativos, é violência que se perpetra contra o
princípio da dignidade das pessoas humanas, consagrado no art. 1º, inciso III da
Constituição. Se esses cidadãos brasileiros trabalham, pagam impostos, contribuem
para o progresso do País, é inconcebível interditar-lhes direitos assegurados a
todos, em razão de suas orientações sexuais.

Filiação - A filiação é tratada de modo igualitário, pouco importando a


origem consangüínea ou socioafetivo (adoção, posse de estado de filho ou
inseminação artificial heteróloga). Almeja-se descortinar os paradigmas parentais,
materno-filiais e paterno-filiais que podem apreender, no plano jurídico, a família
como realidade sócioafetiva, coerente com o tempo e o espaço do Brasil de hoje,
recebendo a incidência dos princípios norteadores da superação de dogmas
preconceituosos.

Procurou-se distinguir com clareza, para se evitar as contradições


jurisprudenciais reinantes nesta matéria, o que é dever de registro do nascimento,
reconhecimento voluntário do filho, investigação judicial de paternidade ou
maternidade e impugnação da paternidade e da maternidade ou da filiação.
Nenhuma impugnação deve prevalecer quando se constatar a existência de posse
de estado da filiação, consolidada na convivência familiar duradoura. A presunção da
paternidade e da maternidade, antes fundada na necessidade de se apurar a
103

legitimidade do filho, passou a ser radicada na convivência dos pais durante a


concepção, sejam eles casados ou não.

Abandonou-se a concepção de poder dos pais sobre os filhos para a de


autoridade parental que, mais do que mudança de nomenclatura, é a viragem para a
afirmação do múnus, no melhor interesse dos filhos, além de contemplar a
solidariedade que deve presidir as relações entre pais e filhos. O direito de visita, já
abandonado pelas legislações recentes, é substituído pelo direito à convivência do
pai não-guardião em relação ao filho e deste em relação àquele. Os pais se separam
entre si, mas não dos filhos, que devem ter direito assegurado de contato e
convivência com ambos. Também é estimulada, sempre que possível, a guarda
compartilhada, no melhor interesse dos filhos. A tutela das crianças e adolescentes
teve suas regras simplificadas no Estatuto das Famílias, procurando harmonizá-las
com as constantes no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), eliminando-se
requisitos que se revelaram inúteis ou inibidores desse relevante múnus.

Quanto à adoção, e para se evitar as colisões com o modelo sistematizado


no Estatuto da Criança e do Adolescente ou o paralelismo legal hoje existente,
ficaram enunciados neste projeto de Estatuto das Famílias as normas e princípios
gerais, disciplinando-se a adoção de maiores e remetendo-se ao ECA a adoção de
crianças e adolescentes.

Alimentos - Os alimentos tiveram como matriz a máxima realização da


solidariedade familiar, eliminando-se os resquícios de causas ou condições
discriminatórias. Manteve-se a obrigação alimentar, infinitamente, entre os parentes
em linha reta e entre irmãos. Limitou-se em 25 anos a presunção de necessidade
alimentar do filho, quando em formação educacional. A partir daí exige-se a
comprovação da necessidade. Esclareceu-se que a obrigação alimentar dos
parentes em grau maior, por exemplo, dos avós em relação aos netos, é
complementar, se os pais não puderem atendê-la integralmente. Foi limitada a
irrenunciabilidade dos alimentos à obrigação decorrente do parentesco, bem como
se aboliu a vetusta idéia de valorar a culpa no rompimento das relações afetivas, eis
que nada agrega ao Direito Familiar.
104

Bem de família - O Estatuto das Famílias não mais cuida do chamado bem
de família voluntário ou convencional, de escassa utilidade ou utilização na
sociedade brasileira, principalmente por suas exigências formais e por gerar
oportunidades de fraudes a terceiros. Concluiu-se que a experiência vitoriosa do
bem de família legal, introduzido pela Lei nº 8.009/90, consulta suficientemente o
interesse da família em preservar da impenhorabilidade o imóvel onde reside, sem
qualquer necessidade de ato público prévio, e com adequada preservação dos
interesses dos credores.

Curatela - A continuidade da curatela no âmbito do Direito de Família


sempre foi objeto de controvérsias doutrinárias. Optou-se por mantê-la assim, tendo
em vistas que as interferências com as relações familiares são em maior grau.

Processo, procedimentos e revogações - O Estatuto das Famílias está


dividido em duas grandes partes, uma de Direito Material e outra de Direito
Processual. Tal providência evita a confusão, ainda existente no Código Civil, entre o
que é constituição, modificação e extinção de direitos e deveres, de um lado, e os
modos de sua tutela, principalmente jurisdicional, de outro.

Na parte destinada ao processo e aos procedimentos, sistematizaram-se os


procedimentos dispersos no próprio Código Civil, no Código de Processo Civil e em
leis especiais, que restarão ab-rogados ou derrogados. Por exemplo, a habilitação
para o casamento, que o Código Civil trata em minúcias, é procedimento e não
Direito Material.

Este Estatuto considera o processo como procedimento em contraditório. Na


ausência de contraditório, tem-se apenas procedimento, em substituição à antiga
jurisdição graciosa ou voluntária. As regras de processo e de procedimentos, nas
relações de família, não podem ser as mesmas do processo que envolvem disputas
patrimoniais, porque os conflitos familiares exigem resposta diferenciada, mais
rápida e menos formalizada, como ocorreu com o Estatuto da Criança e do
Adolescente - ECA. Daí a necessidade de concretizar os princípios da oralidade,
celeridade, simplicidade, informalidade e economia processual, além de preferência
no julgamento dos tribunais. O Estatuto das Famílias privilegia a conciliação, a
ampla utilização de equipes multidisciplinares e o estímulo à mediação extrajudicial.
105

Por fim, são indicadas as leis e demais normas jurídicas que ficam
revogadas expressamente conforme a Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro
de 1998 e Lei Complementar nº 107, de 26 de abril de 2001. A falta de revogação
expressa de antigas leis sobre relações de família tem levado a dúvidas, a exemplo
da continuidade ou não da vigência do Decreto-Lei nº 3.200/41, apesar do Código
Civil de 2002.

Em face de todo o exposto, conto com o decisivo apoio dos ilustres Pares
para a aprovação deste importante Projeto de Lei, que dispõe sobre o Estatuto das
Famílias.

Sala das Sessões, em 25 de outubro de 2007.

DEPUTADO SÉRGIO BARRADAS CARNEIRO

Anexo B REsp nº 148897/MG - 4ª Turma

Superior Tribunal de Justiça


REsp nº 148897/MG - 4ª Turma
Relator: Min. Ruy Rosado de Aguiar
Recorrente: M.A.P.
Recorrido: J.B.P.
Data do julgamento: 10/02/98
EMENTA: SOCIEDADE DE FATO. Homossexuais. Partilha do bem comum. O
parceiro tem o direito de receber a metade do patrimônio adquirido pelo esforço
comum, reconhecida a existência de sociedade de fato com os requisitos previstos
no art. 1363 do CCivil. RESPONSABILIDADE CIVIL. Dano moral. Assistência ao
doente com AIDS. Improcedência da pretensão de receber do pai do parceiro que
morreu com Aids a indenização pelo dano moral de ter suportado sozinho os
encargos que resultaram da doença. Dano que resultou da opção de vida assumida
pelo autor e não da omissão do parente, faltando o nexo de causalidade. Art. 159 do
CCivil.
106

Ação possessória julgada improcedente. Demais questões prejudicadas.


Recurso conhecido em parte e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUARTA
TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nessa
parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Votaram com o
Relator os Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo Teixeira, Barros Monteiro e César
Asfor Rocha. Ausente, justificadamente, o Sr. Min. Bueno de Souza.
Brasília-DF, 10 de fevereiro de 1998 - BARROS MONTEIRO, pres. - RUY
ROSADO DE AGUIAR, relator.
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Min. Ruy Rosado de Aguiar:
Adoto o relatório integrante do v. acórdão de fls. 310/313, verbis:
"M.A.P. ajuizou a presente ação que denominou de `ordinária de
reconhecimento de copropriedade, com consequente pedido de alteração de registro
imobiliário, c/c ação de indenização' contra J.B.P. à alegação de que (I), viveu com
J.A.P., filho de J.B., de 1.982 até 05 de outubro de 1.989, data em que faleceu J.;
que, durante este período, ambos foram sócios em três empresas; que, logo no
início da `coabitação', resolveram adquirir um apartamento, que foi comprado em
nome de J., porque, sendo ele funcionário do Banco do Brasil, podia obter
financiamento de parte do preço; que, em fins de 1.983, venderam o apartamento e
com o dinheiro obtido, acrescido com os lucros dos negócios em comum,
compraram outro, situado na rua A., nº 351, também, nesta Capital, onde reside até
hoje; que embora os imóveis tenham sido adquiridos em nome de J., ele contribuiu
em igualdade de condições para o pagamento, tanto da parcela inaugural como da
parte financiada, o que pode ser provado pelos documentos que juntou para
demonstrar a remessa do numerário à conta de J., expressamente para o fim de
quitar ditas prestações; que, a partir de 1985, J. deixou de trabalhar no Banco do
Brasil e ele assumiu todas as despesas com a aquisição do imóvel; que tinha uma
vida em comum com o falecido J. e arcava praticamente sozinho com as despesas
do lar; que, por mais este motivo, foi entabulado pelos sócios que, quando esgotado
o pagamento do financiamento, J. passaria a metade do imóvel para ele, fazendo
107

alteração no registro imobiliário; que com a morte de J., não lhe resta outra
alternativa senão buscar refúgio numa declaração judicial de existência de co-
propriedade, através da qual o pai do falecido J. haverá de submeter-se à perda da
metade do imóvel: (II), que, com a morte de J., as empresas faliram e as seqüelas
foram suportadas somente por ele; que, imediatamente, cessou o funcionamento da
empresa J.P.I.C.Ltda.; que o espólio de J. deveria arcar com a parte que lhe
competia, consubstanciada em diversas parcelas trabalhistas pagas a vários
empregados, débitos junto ao fisco, débitos de baixa das sociedades, pagamento de
consórcios do falecido e das sociedades e dívidas comerciais do relacionamento
com outras empresas; (III), que somente ele prestou socorro a J. durante a sua
enfermidade e custeou todas as despesas médico-hospitalares, inclusive as de
funeral, pelo que deve a herança do falecido responder pela indenização ora
pleiteada; (IV), que pelo fato de J. ter falecido por síndrome da imunodeficiência
adquirida (AIDS), foi criada em torno de sua incolumidade imediata suspeita, o que o
levou a um completo isolamento dentro da sociedade mineira; que se não bastasse
o seu próprio sofrimento e angústia, tal fato ceifou de vez toda a sua possibilidade
de produção; que tudo isto provocado por ato do falecido, reclama indenização por
dano moral, que a herança do de cujus deve responder.
Registro que em apenso ao presente feito corre ação de reintegração de posse
ajuizada pelo primeiro apelante J.B.P. em face do apelante adesivo M.A.P.".
A sentença que julgou as duas ações conexas tem o seguinte dispositivo:
"Quanto à ação possessória, comprovado nestes autos e reconhecido, a final,
o direito do autor sobre 50% do imóvel, pela co-propriedade do imóvel, deve ser
julgada improcedente, pois detém legitimamente o autor a sua posse, já que
adquirido com esforço comum.
Assim, considerando o acima exposto e o mais que dos autos consta, julgo em
parte procedente o pedido para conferir ao autor o direito à metade do imóvel
constituído pelo apartamento nº 202, da Rua A., nº 351, com inserção do seu nome
no Registro Imobiliário (3º Ofício do R.I., Matrícula xxx), além do direito ao
ressarcimento de 50% dos gastos feitos com a manutenção das sociedades
comerciais (docs. de fls. 103/142 e 237/250), a serem apurados por cálculo do
contador e devidamente corrigidos a partir do efetivo desembolso, com juros a partir
108

da citação, excluídos os gastos médico-hospitalares e danos morais, pelos motivos


acima deduzidos.
Custas e honorários, estes à base de 20% sobre o valor da causa, recíproca e
proporcionalmente distribuídos e compensados estes últimos entre as partes, à
razão de 70% pelo réu e 30% pelo autor" (fl. 242).
Irresignados com a r. sentença - continua o r. acórdão recorrido:
"Ambas as partes dela apelaram, J.B.P., argüindo, preliminarmente, nulidade
da r. sentença por negativa de prestação jurisdicional, à alegação de que o MM. Juiz
a quo não apreciou as suas preliminares de impossibilidade jurídica do pedido, de
inépcia da inicial e carência de ação, nas quais apontou diversas irregularidades
processuais que impediam o desenvolvimento válido e regular do processo, tais
como, infringência dos arts. 292, inciso III; 295, incisos III, V e respectivo parágrafo
único, incisos II, III e IV; e 301, inciso X do CPC; e no mérito, insurge-se contra o
deferimento da meação do apartamento, alegando que o fato de terem convivido, o
apelado e J., não é suficiente para o deferimento do pleito, até mesmo porque a
pretensão é amparada em instituto próprio do Direito de Família; que não existe em
nosso ordenamento jurídico lei que ampare tal pretensão; que o reconhecimento de
sociedade de fato para fins de partilha de patrimônio só pode ser aquela havida
entre homem mulher; que o teor de decidir da r. sentença apelada atenta contra o
seu direito de propriedade garantido pelo art. 5º, inciso XXII, da CF/88 e não
encontra suporte legal; faz análise da prova oral demonstrando ser ela favorável à
sua tese; pretende, também a reforma da r. sentença no que acolheu o pleito de
indenização dos gastos que o Recorrido alegou ter feito com a manutenção das
empresas T.P.P. Ltda. e J.P.I.C.Ltda., alegando que os documentos juntados às fls.
237/250, comprovando o pagamento desses gastos, na verdade só foram juntados
aos autos depois de encerrada a instrução do processo; que tais documentos
deveriam ter acompanhado a exordial; que sua juntada após a instrução do
processo feriu o disposto nos arts. 282 e 396 do CPC; que nenhum dos
mencionados documentos se refere a pagamento, feito pelo Recorrido, de débito de
responsabilidade sua, por isto, não se prestam a conferir direito de indenização ou
cobrança; insurge-se, finalmente, contra a parte da r. sentença que julgou
improcedente a ação de reintegração de posse, alegando que o Recorrente adesivo
está no imóvel a título de comodato, conforme provado com os depoimentos das
109

testemunhas que depuseram às fls. 277, 278 e 280; que terminado o comodato com
a notificação feita ao Apelado-Apelante adesivo, mesmo que se procedente o pedido
de meação feito pelo Autor, ainda assim, continuaria ele esbulhando o imóvel, já que
não teria 50% dele, impondo-se a procedência, por isto, do pedido de reparação de
danos feito nos autos daquela ação reintegratória.
Já o inconformismo de M.A.P. com a r. Sentença apelada reside no não-
deferimento de seu pedido de dano moral, ao argumento de que ensejou tal pedido
o fato de ter ele sido isolado na sociedade em face da notícia de que a pessoa com
a qual morava teria falecido por AIDS; que, por ter tido que cuidar de J., em razão de
a família tê-lo abandonado, tornou-se pública a relação que ele e J. sempre
procuraram disfarçar; que por isto, o pai de J. falhou e por isto há que arcar com a
indenização por dano moral".
A eg. 2ª Câm. Civ. do TAMG rejeitou as preliminares, deu "provimento ao
recurso do primeiro apelante J.B.P. para, reformando a r. sentença apelada, julgar
improcedente a `ação ordinária de reconhecimento de co-propriedade, com
consequente pedido de alteração de registro imobiliário, c/c ação de indenização'
contra ele proposta por M.A.P." e condenou este último a pagar as custas do
processo e honorários advocatícios que arbitrou em 20% sobre o valor da causa,
devidamente corrigidos, e julgou procedente a ação de reintegração de posse
proposta por J.B.P. contra M.A.P., assinando a este o prazo de 30 dias para
desocupação e entrega ao autor, primeiro apelante do apartamento 202, situado à
Rua A., n. 351, em Belo Horizonte, por ele indevidamente ocupado a partir da data
do término do prazo que lhe foi assinado na notificação de fls. 27 do apenso, ou
seja, a partir de 14.07.1994, condenando-o, ainda, a pagar a J.B.P. o valor da
locação do referido imóvel a partir da data da propositura da ação - 30.08.1994,
devendo o valor ser apurado em liquidação de sentença por arbitramento, com
acréscimo de juros e de correção monetária, e, em consequência, invertidos os ônus
da sucumbência na ação possessória.
Opostos embargos de declaração, estes foram parcialmente acolhidos, com
expresso indeferimento da preliminar de nulidade do julgamento e improvimento do
agravo retido, confirmado o acórdão embargado quanto ao mais. Irresignado o autor
ingressou com recurso especial por ambas as alíneas, alegando afronta aos arts.
110

159, 1.250, 1.251, 1.252, 1.363 do CC; 5º da LICC; 4º, 128, 130, 420, 459, 460 do
CPC, além de dissídio jurisprudencial.
Pretende o reconhecimento da co-propriedade do imóvel, a indenização pelo
dano moral (letra e, abaixo) e a improcedência da ação possessória, sendo que,
quanto a esta, alegou cerceamento de defesa pela impossibilidade de fazer prova da
existência de benfeitorias.
Sustenta: a) a relevância da união dos esforços, ainda que tacitamente
avençada; b) "mesmo num relacionamento entre pessoas do mesmo sexo, se
houver a confluência de esforços à formação de uma sociedade de fato, ainda que
de maneira indireta, mister a divisão do patrimônio, quando de sua dissolução"; c) a
co-propriedade prevista no art. 4º do CPC tem como premissa uma sociedade,
resultado de um esforço comum, e que não poderia ser objetada, apenas em razão
da preferência sexual dos sócios; d) tendo contribuído com numerário para a
aquisição do apartamento, o recorrente não tem um mero direito creditício sobre os
valores despendidos, mas direito real de propriedade sobre o imóvel, ainda que
proporcionalmente à sua participação nos gastos; e) o pai que foge da difícil
responsabilidade de assistir ao filho doente deve indenizar quem o substituiu nesse
encargo, arcando com todos os prejuízos morais que a doença acarretou ao
recorrente; f) carência da ação reintegratória, porquanto o mencionado comodato
estaria em plena vigência, sendo imprópria a pretensão; g) não poderia o acórdão
recorrido trancar a realização da prova pericial, que seria hábil a comprovar o direito
material suscitado pela parte; h) o pedido de perdas e danos jamais poderia
compreender os alugueres.
Com as contra-razões, o Tribunal de origem admitiu o recurso especial,
subindo os autos a este eg. STJ.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Min. Ruy Rosado de Aguiar (relator):
1. A primeira questão proposta no recurso versa sobre a possibilidade de ser
reconhecida a existência de sociedade de fato resultante da convivência entre duas
pessoas do mesmo sexo, a determinar a partilha do patrimônio adquirido durante
esse tempo.
111

Dispõe o art. 1.363 do CCivil: "Celebram contrato de sociedade as pessoas que


mutuamente se obrigam a combinar seus esforços ou recursos, para lograr fins
comuns".
Tratando-se de união heterossexual, a jurisprudência tem reconhecido o direito
de a companheira - que contribuiu, seja com a renda do seu trabalho produtivo ou
com o fornecimento de recursos próprios, seja mediante a prestação de serviços
domésticos - receber parte do patrimônio que se formou graças a essa conjugação
de esforços, destinados a garantir uma situação econômica estável.
Examinando os julgados que enfrentaram a questão, desde os primórdios do
surgimento dessa orientação jurisprudencial, vê-se que o eg. STF, em repetidas
ocasiões, ao aplicar a Súmula 380, reafirmou o seu entendimento de que "a
sociedade de fato, e não a convivência more uxorio é que legitima a partilha de
bens" (RE 84969/RJ - RTJ 80/260; RE 81099/MG, RTJ 79/229). Nesse último
recurso, o em. Min. Moreira Alves enfatizou a diferença que deve ser feita entre "a
sociedade de fato (que é de caráter puramente patrimonial) e comunhão de vida"
(RTJ 79/236). Neste Superior Tribunal de Justiça persistiu o mesmo entendimento,
acentuando-se a sociedade de fato como pressuposto para o reconhecimento do
direito à partilha do patrimônio comum dela resultante (REsp 45886/SP, 4ª Turma.,
rel. em. Min. Torreão Braz), constando da ementa do REsp 4599/RJ:
"A criação pretoriana inscrita no verbete de nº 380 da Súmula do STF tem por
referência os arts. 1363 de 1366 do CC; os efeitos patrimoniais, ali descritos,
decorrem do direito das obrigações" (3ª Turma, rel. em. Min. Nilson Naves).
Foi só mais tarde, com a evolução do direito de família, especialmente após a
Constituição de 1988, que o tema passou a ser tratado como uma questão familiar.
A hipótese dos autos não se equipara àquela, do ponto de vista do Direito de
Família, mas nada justifica que se recuse aqui aplicação ao disposto na norma de
direito civil que admite a existência de uma sociedade de fato sempre que presentes
os elementos enunciados no art. 1363 do CC: mútua obrigação de combinar
esforços para lograr fim comum. A negativa da incidência de regra assim tão ampla e
clara significaria, a meu juízo, fazer prevalecer princípio moral (respeitável) que
recrimina o desvio da preferência sexual, desconhecendo a realidade de que essa
união - embora criticada - existiu e produziu efeitos de natureza obrigacional e
patrimonial que o direito civil comum abrange e regula.
112

Kelsen, reptado por Cossio, o criador da teoria egológica, perante a


congregação da Universidade de Buenos Aires, a citar um exemplo de relação
intersubjetiva que estivesse fora do âmbito do Direito, não demorou para responder:
"Oui, monsieur, l'amour". E assim é, na verdade, pois o Direito não regula os
sentimentos. Contudo, dispõe ele sobre os efeitos que a conduta determinada por
esse afeto pode representar como fonte de direitos e deveres, criadores de relações
jurídicas previstas nos diversos ramos do ordenamento, algumas ingressando no
Direito de Família, como o matrimônio e, hoje, a união estável, outras ficando à
margem dele, contempladas no Direito das Obrigações, das Coisas, das Sucessões,
mesmo no Direito Penal, quando a crise da relação chega ao paroxismo do crime, e
assim por diante.
O v. acórdão recorrido admitiu "ter o autor dividido por longos anos o mesmo
teto com J., de ter sido sócio dele nas três empresas de que dão notícia os
documentos de fls. 27/35 e de ter mantido com ele conta-conjunta na Caixa
Econômica Federal nos anos de 1983 até 1985" (acórdão, fl. 315), além de
integrarem a prova documental oito (8) comprovantes bancários (“doc”), "constando
como remetente o apelante adesivo (autor da ação) e favorecido J.A.P. e trazem a
anotação de se destinarem a pagamento de prestação de compra de imóvel"
(acórdão, fl. 314). Houve, portanto, a colaboração direta do autor, com recursos
próprios e com participação pessoal nas empresas que ambos os parceiros
constituíram, a evidenciar a presença daquela "combinação de esforços" para o fim
comum de alcançarem meios para manutenção da convivência na qual ambos
estavam envolvidos.
É certo, como constou do douto voto do em. Dr. Carreira Machado, que do fato
de duas pessoas do mesmo sexo dividirem o mesmo teto, não importa por quanto
tempo, não resulta direito algum e não cria laço senão o da amizade. Porém, se em
razão dessa amizade os parceiros praticam atos na vida civil e adotam reiterado
comportamento a demonstrar o propósito de constituírem uma sociedade com os
pressupostos de fato enumerados no art. 1363 do CCivil, um de natureza objetiva
(combinação de esforços) e outro subjetivo (fim comum), impende avaliar essa
realidade jurídica e lhe atribuir os efeitos que a lei consagra. É certo que o legislador
do início do século não mirou para um caso como o dos autos, mas não pode o juiz
de hoje desconhecer a realidade e negar que duas pessoas do mesmo sexo podem
113

reunir esforços, nas circunstâncias descritas nos autos, na tentativa de realizarem


um projeto de vida em comum. Com tal propósito, é possível amealharem um
patrimônio resultante dessa conjunção, e por isso mesmo comum. O comportamento
sexual deles pode não estar de acordo com a moral vigente, mas a sociedade civil
entre eles resultou de um ato lícito, a reunião de recursos não está vedada na lei e a
formação do patrimônio comum é consequência daquela sociedade. Na sua
dissolução, cumpre partilhar os bens.
Poder-se-ia duvidar da presença do "fim comum" a que deveriam estar apostos
os parceiros quando trataram de adquirir o imóvel objeto da ação. Os autos revelam
e o mesmo r. acórdão assevera (fl. 321) que foi o autor quem se desvelou nos
cuidados com o companheiro durante a longa e devastadora enfermidade (AIDS),
prestando o auxílio que a família recusou, e também foi ele quem suportou em parte
(fl. 315) a cobrança dos débitos remanescentes das empresas que administravam
em conjunto. É razoável concluir, portanto, que os parceiros estavam determinados
à mútua assistência, a qual foi efetivamente prestada pelo ora autor e recorrente,
servindo-lhe de lastro para essa assistência o patrimônio formado pelo esforço
comum.
O recurso pode ser conhecido pela alínea a, uma vez que a regra do art. 1363
do CCivil, malgrado não mencionada expressamente no r. acórdão, teve sua
incidência denegada no caso dos autos. Conhecendo do recurso, dou-lhe nessa
parte provimento, pois os fatos admitidos nas instâncias ordinárias permitem se
reconheça a existência de uma sociedade celebrada entre o recorrente e J., tendo
sido o apartamento da Rua A. adquirido pelo esforço de ambos, e assim reconhecer
o direito do autor à metade daquele bem.
2. Como consequência do reconhecimento da propriedade comum do
apartamento que está sendo ocupado pelo autor para sua residência, o que já
acontecia antes do falecimento do parceiro, está ele exercendo a posse em razão de
direito que lhe resulta da comunhão, sem cometimento do alegado esbulho.
Portanto, nessa parte deve ser restabelecida a sentença de improcedência da ação
possessória. Com isso, fica prejudicado o tema da nulidade do processo por
cerceamento de defesa, e bem assim a condenação do recorrente ao pagamento
dos aluguéis pela ocupação do imóvel.
114

3. O recorrente não tem razão, porém, quando pleiteia indenização pelos danos
morais sofridos pelo fato de ter assistido o doente sem a colaboração do pai,
recaindo unicamente sobre o autor o desgaste emocional e social inevitavelmente
associado à AIDS. A pretensão não tem nenhum amparo. O fundamento do pedido
estaria na omissão do pai do doente, conduta culposa que ensejaria a incidência do
art. 159 do CCivil, suporte legal invocado pelo autor, nesse ponto.
Ora, é bem evidente que a situação de dor e de constrangimento a que ficou
exposto o autor decorreu exclusivamente da sua opção de vida, inexistindo qualquer
vinculação causal entre o comportamento omissivo do pai - fato reconhecido pelo
acórdão - e o alegado dano sofrido pelo recorrente. Não reconhecida a existência do
nexo de causalidade, inviável o conhecimento do recurso tocante à verba
indenizatória por dano moral.
4. Posto isso, conheço em parte do recurso, pela alínea a, e nessa parte lhe
dou provimento para reconhecer o direito de o autor receber em partilha a metade
do imóvel descrito na inicial, com procedência parcial da ação ordinária e
improcedência da ação possessória. O réu pagará integralmente as custas da ação
possessória e 2/3 das custas da ação ordinária, cabendo ao autor o restante 1/3
destas. O réu fica condenado a pagar honorários em favor do patrono do autor da
ação ordinária e réu na ação possessória, os quais são arbitrados em 15% do valor
atualizado da metade do imóvel em causa, aí já considerada a sucumbência parcial
na ação ordinária e a improcedência da ação de reintegração de posse.
É o voto.
VOTO
O Sr. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira:
O tema posto a apreciação e julgamento, sem dúvida alguma, é dos mais
atuais e relevantes.
A propósito, vale lembrar que em 1990 foi trazido a este Tribunal um caso onde
também se examinava o tema da repercussão patrimonial no relacionamento
homossexual masculino, o qual, no entanto, não ultrapassou a esfera da decisão
monocrática, uma vez que, desprovido o recurso de agravo, transitou em julgado a
decisão. Isso se deu no Agravo nº 2.445-RJ, de que fui relator (DJ de 19.4.1990).
Por outro lado, além do evidente interesse no tema, tanto assim que há,
inclusive, projeto tramitando no Congresso Nacional, com noticiário sempre presente
115

na mídia e debates entre especialistas, é de considerar-se que estamos vivendo um


momento extremamente fecundo no que diz respeito ao Direito de Família, o que se
dá em decorrência de mudanças que vêm da legislação - no Brasil tais mudanças se
fazem inclusive no campo do Direito Constitucional, com alterações havidas no
próprio texto constitucional, pela adoção dos princípios da igualdade jurídica dos
filhos e dos cônjuges -, mas também por evolução da própria ciência, a exemplo do
que ocorre com o DNA, com a fecundação in vitro, etc., e pelas mudanças
comportamentais na sociedade contemporânea.
Estas considerações, Sr. Presidente, que estou a fazer, na realidade não têm
maior pertinência, a meu sentir, no caso concreto, pois são próprias do Direito de
Família, enquanto que a questão a decidir é de natureza patrimonial, vinculada ao
Direito das Obrigações, tanto assim que não foi examinada, em segundo grau, no
Tribunal de Justiça de Minas Gerais, competente para os processos de Direito de
Família, mas sim no Tribunal de Alçada daquele Estado.
Outro aspecto a ser levado em consideração, a respeito, é que o objeto litigioso
deduzido em Juízo, por mais relevantes que sejam considerações paralelas, diz com
o direito obrigacional. Com efeito, embora permeadas as colocações com aspectos
de relacionamento afetivo e amoroso, de convivência humana, de busca da
felicidade, as causas de pedir e os pedidos estão vinculados ao Direito obrigacional.
Se assim é, se estamos examinando a causa sob o prisma do Direito
patrimonial, é de convir-se que já há uma farta jurisprudência neste Tribunal a
subsidiar a matéria, pouco importando que a causa envolva relacionamento
homem/mulher, homem/homem ou mulher/mulher. Logo, temos que enfrentá-la sob
o ângulo do Direito obrigacional. E, nesse campo, como demonstrou o Ministro
Relator, pode-se trazer não só a jurisprudência que se formou inicialmente no
Supremo Tribunal Federal, na vigência do sistema constitucional anterior, como
também a firme jurisprudência deste Tribunal, que tem sido enfática em afirmar que,
rompida a sociedade de fato, há proteção jurídica aos interessados que nela
estiveram envolvidos, inclusive para evitar o enriquecimento sem causa.
Dentro desse prisma, não vejo como não acolher a pretensão, conhecendo em
parte do recurso para, com base no artigo 1.363 do Código Civil, uma vez
reconhecida nas instâncias ordinárias a sociedade de fato, deferir o pedido no que
tange à ação ordinária.
116

Também indefiro o dano moral e dou por improcedente a pretensão no que


concerne à ação possessória.
Em conclusão, acompanho o Sr. Ministro Relator, inclusive quanto à
distribuição dos ônus da sucumbência.
VOTO
O Sr. Ministro Barros Monteiro:
Srs. Ministros, acompanho inteiramente o Sr. Ministro-Relator, tal como acabou
de fazer o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira.
Quanto à questão central, ou seja, a possibilidade de haver o reconhecimento
de uma sociedade de fato entre pessoas do mesmo sexo, advindas daí
consequências de caráter puramente patrimonial, penso que não há dúvida a
respeito, inclusive em face da jurisprudência emanada não só desta Corte, como
também do Supremo Tribunal Federal.
O princípio é o de que se os dois conviventes amealharam o patrimônio
comum, ao tempo da ruptura dessa sociedade de fato, há que se proceder à partilha
na proporção da contribuição de cada qual.
No ponto alusivo à matéria de direito ocorreu a vulneração inegavelmente do
art. 1.363 do Código Civil. Penso, ainda, que não há que se falar no caso em
reexame de matéria de fato, uma vez que a base empírica da lide, tal como teve
ocasião de lembrar o ilustre Relator, foi recolhida das assertivas constantes do
próprio acórdão recorrido, em que se admitiu ter havido a contribuição pessoal,
direta e efetiva, do de cujus, na formação do patrimônio comum.
Afinal, ponho-me de acordo na questão relativa à indenização por dano moral,
uma vez não configurados os seus pressupostos, assim como na parte atinente à
distribuição dos encargos da sucumbência.
VOTO
O Exmo. Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha: Senhor Presidente, Roberto Rosa, no
seu Direito Sumular, ao tecer comentários sobre o enunciado nº 380 da Súmula do
Supremo Tribunal Federal, segundo o qual, "comprovada a existência de sociedade
de fato entre concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do
patrimônio adquirido pelo esforço comum", observa que a jurisprudência do STF não
pretendeu dar foros de legalidade ao concubinato, mas apenas reconhecer as
117

consequências advindas dessa união, principalmente quando haja pretensão de


auferimento de vantagens conquistadas pelo esforço de ambos os cônjuges.
Daí a afirmação de Orosimbo Nonato, no RE nº 9.855, de ser possível
reconhecer, sem ferir a lei, uma comunhão ou sociedade de fato do homem com a
sua concubina. Essa sociedade pode derivar de interesses, esforços e contribuições
na formação de um patrimônio, dispensando forma especial.
Colaciono tais considerações porque elas, a meu sentir, se ajustam, com
acurada harmonia, ao tema ora posto em tablado, tendo-se em conta que o
reconhecimento da partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum dos
concubinos significou, à época, uma posição progressista, uma tomada de
consciência daquela colenda Corte para com os fatos da vida, que, de tão nítidos e
frequentes, já não mais podiam ser tangenciados, sob pena de deixar o magistrado
na desaconselhável posição de julgar com as janelas fechadas para a realidade.
Agora, tirante o fato - relevantíssimo, é certo - de que a sociedade de que se
cogita é formada por pessoas do mesmo sexo, tudo o mais tem os mesmos
contornos em que se inseriu, à época, aquela situação dos concubinos inspiradora
do verbete sumular acima anunciado: a sociedade de fato, o patrimônio formado
pelo esforço comum e o afeto recíproco que parecia haver entre os agora recorrente
e recorrido.
Ora, dessa situação em exame, o que se busca extrair é apenas o que seja
atinente a direitos patrimoniais. Nada se questiona com referência a efeitos
familiares.
Creio já ser chegada a hora de os Tribunais se manifestarem sobre essa união,
pelo menos nos seus efeitos patrimoniais, uma vez que não podemos deixar de
reconhecer a frequência com que elas se formam, por isso mesmo que tenho como
de bom alvitre sinalizarmos para a sociedade brasileira - e especialmente para os
que vivem em vida semelhante à que tiveram recorrente e recorrido - quais os
direitos que possam ser decorrentes dessa sociedade de fato.
Por tudo isso é que, atento-me apenas aos aspectos puramente patrimoniais,
que é apenas o que ora se questiona, mas sem perder de vista a motivação com
que foi criada essa sociedade de fato, de que são resultantes os benefícios
postulados, estou, em tudo e por tudo, acompanhando o que foi sábia e
exaustivamente exposto pelos eminentes Ministros Ruy Rosado de Aguiar, Sálvio de
118

Figueiredo Teixeira e Barros Monteiro, tanto para conferir ao recorrente os benefícios


patrimoniais decorrentes dessa união quanto também no que seja referente à
sucumbência, e ainda para excluir de sua pretensão os danos morais, que não vejo
como tê-los existentes, uma vez que ausentes aqueles pressupostos indispensáveis
para a sua concessão.
Destarte, conheço parcialmente do recurso e, nessa parte, lhe dou provimento.

Anexo C Resolução 175.

Edição nº 89/2013 Brasília - DF, quarta-feira, 15 de maio de 2013

Presidência

ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 14, DE 14 DE MAIO DE 2013

A realização de concurso público, de provas e títulos, é medida que se impõe


aos Tribunais imediatamente após a declaração de vacância de serventias e
órgãos prestadores de serviços notariais e de registro que atuem por delegação do
poder público ou oficializados, sob sua jurisdição, nos exatos termos do § 3º do art.
236 da Constituição Federal.

Precedente: Procedimento de Controle Administrativo nº 0002328-


10.2012.2.00.0000.

Ministro Joaquim Barbosa

Presidente

RESOLUÇÃO Nº 175, DE 14 DE MAIO DE 2013

Dispõe sobre a habilitação, celebração de casamento civil, ou de conversão


de união estável em casamento, entre pessoas de mesmo sexo.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas


atribuições constitucionais e regimentais,
119

CONSIDERANDO a decisão do plenário do Conselho Nacional de Justiça,


tomada no julgamento do Ato Normativo no 0002626-65.2013.2.00.0000, na 169ª
Sessão Ordinária, realizada em 14 de maio de 2013;

CONSIDERANDO que o Supremo Tribunal Federal, nos acórdãos prolatados


em julgamento da ADPF 132/RJ e da ADI 4277/DF, reconheceu a
inconstitucionalidade de distinção de tratamento legal às uniões estáveis
constituídas por pessoas de mesmo sexo;

CONSIDERANDO que as referidas decisões foram proferidas com eficácia


vinculante à administração pública e aos demais órgãos do

Poder Judiciário;

CONSIDERANDO que o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento do


RESP 1.183.378/RS, decidiu inexistir óbices legais à celebração de casamento
entre pessoas de mesmo sexo;

CONSIDERANDO a competência do Conselho Nacional de Justiça, prevista


no art. 103-B, da Constituição Federal de 1988;

RESOLVE:

Art. 1º É vedada às autoridades competentes a recusa de habilitação,


celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento
entre pessoas de mesmo sexo.

Art. 2º A recusa prevista no artigo 1º implicará a imediata comunicação ao


respectivo juiz corregedor para as providências cabíveis.

Art. 3º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação.

Ministro Joaquim Barbosa

Presidente

Secretaria Geral

Secretaria Processual

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