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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2019.0000563196

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação / Remessa Necessária nº


0010725-74.2015.8.26.0664, da Comarca de Votuporanga, em que é apelante ESTADO
DE SÃO PAULO, é apelado FABIANE MELO VILELA.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 10ª Câmara de Direito Público


do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento
aos recursos. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores TERESA RAMOS


MARQUES (Presidente), PAULO GALIZIA E ANTONIO CARLOS VILLEN.

São Paulo, 19 de julho de 2019.

Teresa Ramos Marques


Relator
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

10ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO


RECORRENTE: JUÍZO 'EX OFFICIO'
APELAÇÃO: 0010725-74.2015.8.26.0664
APELANTE: FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO
APELADA: FABIANE MELO VILELA
JUIZ PROLATOR: JORGE CANIL
COMARCA: VOTUPORANGA

VOTO Nº 22777

EMENTA

PROCESSO
Concurso público Polícia Militar Exame psicológico
Inaptidão Impossibilidade:

Não basta a previsão do exame psicológico no edital e no


decreto que regulamenta o concurso, pois somente lei formal pode
sujeitar o candidato a realizá-lo.

RELATÓRIO

Sentença de procedência do pedido, determinando que a autora seja admitida a


participar das etapas posteriores do concurso. Atribuiu à requerida o pagamento de
eventuais despesas processuais e honorários advocatícios fixados em R$ 1.200,00 (fls.
267/269).
Apela a Fazenda do Estado alegando, em síntese, que as regras previstas nos edital
do concurso de soldado da Polícia Militar do Estado de São Paulo foram cumpridas por
todos os candidatos e a autora não atendeu aos requisitos do certame e por esta razão, foi
reprovada no exame psicológico. Sustenta que os atos administrativos gozam de presunção
de legitimidade e veracidade e a exigência do exame psicológico encontra-se prevista no
Capítulo XI do referido edital, em estrita consonância com o princípio da legalidade
previsto no art. 37 da Constituição Federal. Aduz, ainda, que a exigência do exame
psicológico tem amparo no Decreto 41113/96 e no art. 18 da Lei Estadual 10621/68 e na
Lei Federal 4375/64. Alega, finalmente, que o laudo pericial apresentado pela autora não
demonstra de forma pormenorizada as especificações metodológicas necessárias contidas
no edital e pede o provimento do recurso (fls. 271/285).
Houve contrarrazões (fls. 290/302).

Apelação / Remessa Necessária nº 0010725-74.2015.8.26.0664 -Voto nº 22777 2


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FUNDAMENTOS

1. Fabiane Melo Vilela ajuizou demanda contra a Fazenda do Estado de São Paulo
alegando que prestou concurso público para preenchimento de uma das vagas de soldado
PM 2ª classe (edital DP 5/321/14) e, no entanto, foi ilegalmente considerada inapta na
avaliação psicológica individual. Objetivou a anulação deste ato e o consequente
prosseguimento nas demais etapas do concurso.

2. Sabe-se que o exame psicológico em concurso público deve estar previsto na


lei e no edital. A avaliação deve ser baseada em critérios objetivos e o Edital também
deve possibilitar ao candidato a interposição de recurso administrativo. Assim vem
decidindo o Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO EM MANDADO DE


SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. SOLDADO. EXAME PSICOLÓGICO.
REPROVAÇÃO. LEGALIDADE. PREVISÃO LEGAL E EDITALÍCIA. CRITÉRIOS
OBJETIVOS E PREVISÃO DE RECORRIBILIDADE.
1. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a legalidade do exame
psicotécnico em provas de concurso público está condicionada a observância de três
pressupostos, quais sejam, previsão legal, objetividade dos critérios adotados no
edital e possibilidade de revisão do resultado obtido pelo candidato, os quais estão
presentes no caso dos autos. Precedentes: AgRg no RMS 43.363/AC, Rel. Min.
Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 13/08/2014; AgRg no Ag 1.193.784/GO,
Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Quinta Turma, DJe 14/05/2014; AgRg no REsp
1404261/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 18/02/2014;
AgRg no AREsp 385.611/DF, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe
29/11/2013; AgRg no RMS 29.879/RO, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma,
DJe 29/11/2013.
2. Agravo interno não provido.
(AgInt no RMS nº 46058/SC, Rel. Min BENEDITO GONÇALVES, publicado em
28.3.17)

ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. PSICOTÉCNICO. EXAME DE


LEGALIDADE PELO PODER JUDICIÁRIO. POSSIBILIDADE. CRITÉRIOS OBJETIVOS
PARA AVALIAÇÃO DO CANDIDATO.
1. Conforme jurisprudência do STJ, é reconhecida a legalidade dos exames psicológicos
em concursos públicos se forem atendidos três padrões: previsão em lei, previsão no
edital, com a devida publicidade dos critérios objetivos fixados e, por fim, possibilidade
de recurso (AgRg no RMS 43.363/AC, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma,
julgado em 5/8/2014, DJe 13/8/2014).

O concurso prestado pela autora é oriundo do Edital DP 5/321/14 (fls. 34/76),


publicado em outubro de 2014 (fls. 34). A Súmula Vinculante nº 44 dispõe que “só por lei
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pode se sujeitar a exame psicotécnico a habilitação de candidato a cargo público” e se


refere a “lei formal”.
No caso presente, todavia, a exigência é oriunda do Decreto nº 41.113/96, que
regulamentou a Lei Complementar nº 697/92 e incluiu a etapa do exame psicológico, de
caráter eliminatório, no concurso público de admissão.
Também no âmbito da Administração Direta e autárquica do Estado, foi o
Decreto nº 60.449/14 que, ao regulamentar os procedimentos relativos à realização de
concursos públicos, introduziu a aplicação do exame psicológico.
É certo, portanto, que o exame psicológico a que foi submetida a autora não está
previsto expressamente no texto da lei estadual que, por sua vez, permitiu ao decreto
grande amplitude na fixação dos exames a serem exigidos.
Já decidi que, não especificado na Súmula Vinculante 44 qual a lei que deverá ter
a previsão do exame em questão, quando necessário o uso de arma de fogo no exercício do
cargo, confere amparo legal ao exame psicotécnico, a Lei Federal 10.826/03, pertinente ao
registro, posse e comercialização de armas de fogo, instrumento utilizado para o exercício
da atividade policial.
Contudo, modifiquei meu entendimento porque, certamente, a lei formal que
limita o seu próprio decreto regulamentar e o edital é somente a lei estatutária específica
para a carreira para a qual se realiza o concurso público, sendo, portanto, a única seara para
impor a realização do exame psicológico e outros mais que o legislador considerar
necessários. Assim também já decidiu essa Câmara:

AÇÃO ORDINÁRIA. CONCURSO PÚBLICO. EXAME PSICOLÓGICO. Soldado PM 2ª


Classe. Probabilidade do direito e perigo de dano presentes. Exigência de aprovação em
exame psicológica prevista apenas em decreto. Inobservância da Súmula Vinculante n° 44.
Entendimento consolidado no STF no sentido de que só se pode submeter candidato de
concurso público a exame psicológico ou psicotécnico mediante previsão em lei em sentido
estrito, ou seja, aquela proveniente do Poder Legislativo. Impossibilidade de prever exame
psicológico apenas em decreto e edital do certame. Liminar deferida, para permitir ao
agravante que prossiga no concurso a despeito do resultado do exame psicológico. Agravo
de instrumento provido.
(Agravo de Instrumento nº 2162546-12.2016.8.26.0000, Rel. Des. MARCELO SEMER,
publicado em 15.9.16)

É certo que a Lei Complementar nº 1.291/16, sanou a falha, pois instituiu regras
para ingresso na polícia militar do Estado de São Paulo, prevendo, dentre as etapas do
concurso público, exames psicológicos destinados à avaliação das características cognitivas
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e de personalidade do candidato para o desempenho adequado das atividades inerentes à


carreira (art. 4º, IV).
No entanto, a nova legislação não é aplicável aos concursos anteriores,
respaldados na legislação então vigente, como no caso em tela, que ocorreu em 2014.
Neste sentido:
“Com efeito, a legislação específica aplicável ao certame impugnado não prevê a
realização de exame psicológico para o provimento dos cargos da Polícia Militar,
considerando-se, pois que as Leis Estaduais nºs 672/92, 10.261/68 e 10.123/68 não
dispõem especificamente sobre a avaliação psicológica como necessária à aprovação no
concurso público para Soldado PM 2ª Classe. A mera previsão em edital ou Decreto de nº
54.911/2009, contudo, não é suficiente para estabelecer como fase eliminatória em
concurso público a realização de exame psicológico, em que pese seja reconhecida a
necessidade e utilidade do referido exame em determinadas carreiras do setor público.
Nesse sentido, a norma regulamentadora só veio a ser implementada por intermédio da
Lei Complementar nº 1291/2016, em 23/7/2016, que, todavia, não é apta a regulamentar
concursos iniciados antes de sua vigência” (Apelação 1031246-08.2018.8.26.0053, 7ª
Câmara de Direito Público, Rel. Des. Magalhães Coelho, j. 15.3.2019).

3. Por fim, importante observar que o laudo pericial oficial constatou a ausência de
qualquer anomalia na autora, nos seguintes termos: “FABIANE MELO VILELA não é
portadora de transtorno ou doença mental, nem tem histórico destes males, e encontra-se
capacitada para exercer as atividades laborais típicas da vida de caserna” (fls. 260).
Além disso, já exerce o cargo de soldado da Polícia Militar, inclusive, colecionando
elogios decorrentes de sua atuação profissional (fls. 254/256).

4. Com base no § 11, do art. 85, do NCPC, em razão do trabalho adicional


promovido pelo advogado da autora (contrarrazões de apelação), majoram-se os honorários
advocatícios em R$ 250,00.

Destarte, pelo meu voto, nego provimento ao reexame necessário e ao recurso


voluntário.

Faculto aos interessados manifestar em dez dias eventual oposição ao julgamento


virtual de recursos futuros, para sustentação oral.

TERESA RAMOS MARQUES


RELATORA

Apelação / Remessa Necessária nº 0010725-74.2015.8.26.0664 -Voto nº 22777 5

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