ocê conhece a qualidade da água com a qual você tem
contato diariamente? No ensino fundamental, aprendemos que a água pura é naturalmente inodora, insípida e incolor. Acontece que, a depender da sua origem, a água pode conter diversas outras substâncias, tais como sais dissolvidos e até microrganismos, modificando suas características. Em alguns casos, a qualidade da água se torna imprópria para a finalidade de consumo humano. A lei nº 9.433/97, a Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) estabeleceu como fundamento o respeito aos usos múltiplos das águas e como prioridade o abastecimento humano. Segundo a Portaria 2.914/2011 do Ministério da Saúde, que, dentre outras disposições, estabelece o padrão de potabilidade da água para consumo humano, a água potável é definida como aquela destinada à ingestão, preparação e produção de alimentos e à higiene pessoal, independentemente da sua origem. Como principal fonte de água, nos centros urbanos, as residências são comumente atendidas por redes de distribuição de água previamente tratada em Estações de Tratamento de Água – ETA, projetadas e operadas para atender os parâmetros da portaria mencionada acima. Como fontes alternativas, podem ser perfurados poços tubulares para a captação de água oriunda do lençol freático. Ainda que tenha sido perfurado um poço profundo, a água captada merece uma análise para que sejam identificadas as concentrações das mais diversas substâncias já presentes no solo diluídas na água, como o ferro, por exemplo, que deixa a água turva e com odor de ferrugem. Além disso, pode haver a presença de microrganismos diversos. Nesse contexto, um fato que demanda atenção é que, atualmente, grande parte das cidades brasileiras não possui um sistema de saneamento básico eficiente. Entre os 5.570 municípios brasileiros, 3.444 não possuem política de saneamento básico, o que significa 61,8% do total, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2018). Em decorrência disso, ainda segundo o IBGE, entre 2016 e 2017 mais da metade dos municípios baianos (216 das 417 cidades) tiveram ocorrências de endemias ou epidemias associadas à falta de saneamento básico. Deste modo, quando não há rede coletora de esgotos, um dos componentes da política de saneamento básico (Lei nº11.445/2007), muitos residentes de centros urbanos utilizam formas inadequadas de descartar seus esgotos e uma dessas formas é o descarte pelas fossas negras, nas quais os dejetos e águas residuárias entram em contato direto com o subsolo podendo atingir as águas subterrâneas contaminando-as e trazendo riscos ao meio ambiente e aos seres que nele vivem. Dentre todos os tipos de fossas, a fossa negra é a menos segura e que traz mais risco a saúde humana. Esse tipo de fossa é uma escavação profunda, que recebe os dejetos humanos e outros tipos de águas das residências, sem nenhum tipo de revestimentos nas paredes e na sua base, onde o seu fundo pode se aproximar ou entrar em contato com lençol freático, contaminando e até mesmo poluindo rios, lagos aquíferos, e o solo, tornando a água imprópria para consumo humano. É importante destacar que muitas doenças são causadas por águas contaminadas oriundas de esgotos domésticos, contendo fezes humanas, detergentes, entre outros causadores de doenças. Os dejetos humanos são o caminho certo para germes patogênicos de várias doenças, como por exemplo: cólera, hepatite, febre tifoide, febre paratifoide, amebíase, ancilostomíase, diarreias infecciosas, esquistossomose, teníase, entre outras. Nesse sentido, em 2013, o Ministério da Saúde publicou uma análise de indicadores relacionados à água para consumo humano e doenças de veiculação hídrica no Brasil, utilizando a metodologia da matriz de indicadores da Organização Mundial da Saúde (OMS). De acordo com o estudo, a taxa de urbanização, por exemplo, pode indiretamente gerar um aumento de internações e de óbitos relacionados ao saneamento ambiental inadequado, pois pode indicar o crescimento desorganizado da cidade, que tem como consequência a falta de serviços como saneamento básico, moradia e acesso à saúde. Desta forma, fica implícito que as doenças podem acarretar prejuízos para os cofres públicos, pois, além da perda da força de trabalho, são necessários tratamentos medicamentosos, e, em alguns casos, podem ocorrer internações e óbitos. Diante dessas informações, fica evidente que os centros urbanos possuem significativo potencial de degradação da qualidade dos solos e das águas subterrâneas e superficiais. Deste modo, conhecer a qualidade da água com a qual mantemos contato diariamente é vital, principalmente se ela não tiver passado por um sistema de tratamento adequado.
Hélio Medeiros é Engenheiro Ambiental e de Segurança do Trabalho, é consultor e perito
judicial. Atualmente trabalha no Departamento de Educação Ambiental da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Agricultura de Eunápolis-BA.